sábado, 19 de julho de 2025

PEI e Adaptações Curriculares são ferramentas para uma escola inclusiva?


Marilice Pereira Ruiz do Amaral Mello


A construção de uma escola verdadeiramente inclusiva é uma tarefa que exige mais do que boa vontade: demanda compromisso ético, conhecimento técnico, planejamento pedagógico e sensibilidade para acolher a diversidade humana.

Entre os instrumentos pedagógicos essenciais para tornar essa inclusão uma realidade, destacam-se as adaptações curriculares e o Plano Educacional Individualizado (PEI). Estes são recursos que vão muito além de ajustes esporádicos — são, na verdade, pilares que sustentam o direito à aprendizagem de estudantes com deficiência ou outras necessidades educacionais específicas, em todos os níveis de ensino, ou seja do Ensino Básico à Pós graduação.

Ao longo das últimas décadas, a legislação brasileira vem avançando significativamente na garantia de direitos à população com deficiência. Desde a Constituição Federal de 1988, passando por marcos importantes como a Declaração de Salamanca (1994), a Lei Brasileira de Inclusão (2015) e legislações específicas sobre o Transtorno do Espectro do Autista (TEA), como a Lei Berenice Piana (2012), o ordenamento jurídico brasileiro reforça que o acesso à educação não se limita à matrícula, mas implica permanência, participação e aprendizagem significativa.

Para tanto, o currículo escolar, é compreendido como o espaço de construção coletiva do saber, permeado por valores, práticas e decisões políticas. Em uma escola inclusiva, é preciso reconhecer que o currículo, tal como concebido originalmente, não atende igualmente a todos os estudantes. Daí a necessidade de adaptações curriculares, que são intervenções planejadas para tornar os conteúdos, objetivos e avaliações acessíveis àqueles que apresentam dificuldades significativas de aprendizagem ou condições específicas de desenvolvimento.

Nesse contexto, é importante distinguir os conceitos de currículo adaptado e plano educacional individualizado. O currículo adaptado responde à pergunta "o que será ensinado?", enquanto o PEI se debruça sobre "como será ensinado?" e "de que maneira esse conhecimento pode ser acessado por este estudante em particular?". Ou seja, enquanto o currículo define os conteúdos, o PEI organiza a prática pedagógica individualizada, com metas, estratégias, recursos e avaliações específicas.

Para que a inclusão realmente aconteça se faz necessário a compreensão das diferentes formas de adaptação. Adaptações curriculares: consistem na modificação dos objetivos de aprendizagem. Envolvem a seleção, reorganização ou simplificação de conteúdos, com base nas reais possibilidades do estudante. Adaptações instrucionais: referem-se à maneira como o conteúdo será ensinado. Podem incluir uso de recursos visuais, tecnologia assistiva, mudanças nos métodos pedagógicos, suporte de um mediador, entre outras. Adaptações alternativas: geralmente utilizadas como último recurso, buscam desenvolver habilidades funcionais e práticas em contextos que extrapolam a sala de aula regular, como habilidades de vida diária e social. Tais adaptações devem acontecer pensando na necessidade de cada estudante.

Para tanto, essas adaptações devem ser cuidadosamente planejadas e executadas, sempre com base em avaliações diagnósticas precisas, que identifiquem o repertório do estudante, seus interesses, suas dificuldades e potencialidades. A avaliação comportamental, por exemplo, com instrumentos como AFLS e VB-MAPP, permite mapear o que o aluno já sabe, o que está em processo de aquisição e o que ainda precisa ser aprendido.

Desta feita, o PEI é uma ferramenta pedagógica estratégica e centrada no estudante, criada para organizar, acompanhar e avaliar o processo de ensino-aprendizagem de alunos com deficiência. Ele deve conter informações claras sobre:

  • Dados do estudante;
  • Avaliação diagnóstica e protocolos validados;
  • Metas acadêmicas e funcionais;
  • Programas de ensino;
  • Adaptações e recursos;
  • Critérios de aprendizagem e
  • Instrumentos de avaliação e registro de progresso
Um outro fato importante é que não vem sendo cumprido, é que a elaboração do PEI deve ser feita em até 30 dias após o início do ano letivo, no caso de estudantes ingressantes, e ao final do ano anterior, para alunos que já frequentam a escola. É importante que o documento seja flexível e dinâmico, ou seja, sujeito a atualizações conforme o desenvolvimento do estudante e as necessidades identificadas no decorrer do processo.

Além da equipe pedagógica, a família deve ser envolvida na construção do PEI, tanto no fornecimento de informações quanto na validação das estratégias propostas. A escuta ativa do próprio estudante, quando possível, também contribui para um plano mais ajustado às suas reais necessidades e interesses.

Contudo, os Desafios na Implementação e Formação Docente são muitos. Apesar da existência de legislações claras e de instrumentos pedagógicos eficazes, a implementação de práticas inclusivas encontra diversos obstáculos no cotidiano escolar. Entre os principais, destacam-se:
  • A falta de formação continuada dos professores na área de educação especial e inclusão;
  • A ausência de recursos didáticos e humanos adequados, como mediadores e materiais adaptados;
  • O desconhecimento sobre como adaptar atividades, conteúdos e avaliações; e
  • A resistência institucional a mudanças profundas na organização do ensino.
Muitos educadores sentem-se despreparados ou inseguros diante da tarefa de planejar para a diversidade. Por isso, é urgente investir na capacitação de professores, tanto do ensino regular quanto do Atendimento Educacional Especializado (AEE). A formação deve contemplar conteúdos sobre legislação, avaliação, elaboração do PEI, estratégias pedagógicas diferenciadas e uso de tecnologias assistivas.

Além disso, é fundamental fortalecer a atuação de acompanhantes especializados — profissionais que apoiam a inclusão no dia a dia da escola, com formação específica, prática supervisionada e atualização constante. A legislação já prevê essa atuação, com carga horária mínima e conteúdos voltados ao TEA, comunicação, autonomia e registro de informações. Ações essas importantes para se garantir um PEI bem estruturado que parte de critérios éticos e técnicos.

Nossas considerações são que, a fim de garantir uma educação verdadeiramente inclusiva é necessário o compromisso coletivo diante de um ato de transformação. A elaboração e aplicação efetiva do PEI, articulada com um currículo adaptado e práticas pedagógicas inclusivas, é um passo essencial nesse caminho. Mais do que um documento, o PEI representa o reconhecimento do estudante como sujeito singular, com direito à aprendizagem, ao respeito e à participação plena na vida escolar.

A inclusão escolar não é apenas uma questão de presença física dos estudantes nas salas de aula, mas uma prática pedagógica consciente, planejada e comprometida com o desenvolvimento integral de todos. Para isso, é urgente investir na formação dos professores, reformular políticas públicas de educação inclusiva e promover uma cultura escolar que valorize as diferenças como potência para o aprendizado coletivo. O PEI, quando utilizado com intencionalidade e afeto, torna-se um caminho viável para que a escola, de fato, se transforme em espaço de pertencimento, aprendizagem e cidadania.

Para isso, é preciso romper com modelos padronizados, investir na formação continuada, construir redes de apoio e adotar metodologias inovadoras que favoreçam a inclusão.

"A inclusão só acontecerá realmente quando nos transformarmos.

Assim, quando tivermos a verdadeira inclusão, é porque nos transformamos."

MARILICE PEREIRA RUIZ DO AMARAL MELLO














-Graduação em Pedagogia com habilitação Pré-Escolar pela UniversidadeMetodista de Piracicaba (1984);

-Mestrado em educação com linha de pesquisa em Gestão e políticas educacioinais pela Universidade Metodista de Piracicaba (2001);

-Doutorado em educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo- PUCSP (2013);

-Pós-graduação em Análise do Comportamento Aplicada em Pessoas com TEA.Universidade Federal de São Carlos-UFSCAr (2019);

-Pós - Doutorado pela UNEB- Campus VI- Caetité-BA, no Programa de Pós-graduação e em Ensino, Linguagem e Sociedade (PPGELS) - 2022;

- Pós - graduanda em Neuropsicopedagogia Clínica e Institucional pela Faculdade Censupeg

-Tem mais de 40 anos de caminhada com atividades na educação como professora e gestora em diferentes níveis de ensino ;

São suas palavras:

"Em 2020 reativei meu Canal do Youtube com lives e vídeos, com conteúdos voltados a educação e desenvolvimento humano;
Sou idealizadora do projeto do "Café com Pauta" que apresentam temas relacionados ao TEA e inclusão escolar e
Ao longo da minha trajetória de mais de 40 anos, dedico-me à formação de professores e à promoção de práticas pedagógicas inclusivas, interdisciplinares e sensíveis à diversidade humana"

Contatos:


Instagram: @marilicemello e

Nota do Editor:

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