quinta-feira, 30 de novembro de 2017

O Reconhecimento Simultâneo das Formas de Parentalidade


O direito de saber a verdadeira identidade tem relação com os princípios fundamentais resguardados na Constituição Federal, por exemplo, o princípio constitucional da prioridade absoluta ao interesse da filiação delineado no caput do art. 227 da Constituição.

É sabido e pacificado atualmente, que a filiação socioafetiva desenvolvida com os pais registrais não afasta os direitos dos filhos resultantes da filiação biológica, ou vice – versa.

Nesse sentido, em 2014, três julgamentos de primeira instância que começaram a delinear a multiparentalidade merecem relevo:

O primeiro foi pronunciado pela Vara de Família de Sobradinho, no Distrito Federal, atribuindo dupla paternidade, para todos os fins jurídicos, tanto para o pai biológico quanto para o socioafetivo. (Processo 2013.06.1.001874-5, j. 06.06.2014); 

A segunda sentença é da 15ª Vara de Família da Capital do Rio de Janeiro, prolatada pela magistrada e componente do IBDFAM Maria Aglae Vilardo, tendo reconhecido o direito dos três irmãos terem duas mães, a biológica e a socioafetiva, em seus registros de nascimento (fevereiro de 2014);e

O último julgado é da 3ª Vara Cível de Santana do Livramento, Rio Grande do Sul, decidindo a juíza Carine Labres que uma criança de 05 anos terá na certidão de nascimento o nome do pai biológico e do pai que a registrou e que com ela convive desde o nascimento (maio de 2014). (TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito de Família, vol.05. 11.ed.rev., atual.e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 434).

Do ano de 2015 merece relevo o acórdão prolatado pela Oitava Câmara Cível do TJRS, na Apelação Cível 70062692876. O julgado reconheceu a multiparentalidade entre duas mães – que viviam em união estável e posteriormente se casaram – e o pai biológico, amigo de ambas.

Em 2016, a partir da decisão do STF no RE 898.060/SC (com repercussão geral), foi pacificada, no sistema jurídico brasileiro, a multiparentalidade.

Assim, a existência de uma filiação socioafetiva não exclui a biológica e vice – versa. Reconhecida a pluriparentalidade, decorrem todos os efeitos jurídicos inclusive sucessórios, alimentícios e de visitação e guarda compartilhada.

O ministro Luiz Fux, relator do RE 898.060 (com repercussão geral), considerou que o princípio da paternidade responsável impõe que, tanto vínculos de filiação construídos pela relação afetiva entre os envolvidos, quanto aqueles originados da ascendência biológica, devem ser acolhidos pela legislação. Segundo ele, não há impedimento do reconhecimento simultâneo de ambas as formas de paternidade – socioafetiva ou biológica –, desde que este seja o interesse do filho. Para o ministro, o reconhecimento pelo ordenamento jurídico de modelos familiares diversos da concepção tradicional, não autoriza decidir entre a filiação afetiva e a biológica quando o melhor interesse do descendente for o reconhecimento jurídico de ambos os vínculos.

"Do contrário, estar-se-ia transformando o ser humano em mero instrumento de aplicação dos esquadros determinados pelos legisladores. É o direito que deve servir à pessoa, não o contrário", salientou o ministro em seu voto.

O entendimento do ministro Fux foi acompanhado pelos ministros Rosa Weber, Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio, Celso de Mello e Cármen Lúcia.

Para a ministra Rosa Weber, há possibilidade de existência de paternidade socioafetiva e paternidade biológica, com a produção de efeitos jurídicos por ambas. Na mesma linha, o ministro Ricardo Lewandowski reconheceu ser possível a dupla paternidade, isto é, paternidade biológica e afetiva concomitantemente, não sendo necessária a exclusividade de uma delas.

O ministro Marco Aurélio destacou que o direito de conhecer o pai biológico é um direito natural. Entre outros aspectos, o ministro Celso de Mello considerou o direito fundamental da busca da felicidade e a paternidade responsável, a fim de acolher as razões apresentadas no voto do relator.

Assim, restou fixada a seguinte tese jurídica para aplicação a casos semelhantes: "A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica, com todas as suas consequências patrimoniais e extrapatrimoniais".


Isto porque, eventual exclusão do nome do pai biológico do registro de uma pessoa estaria a excluir não só a memória do pai deste, mas todas as outras relações registrais (que também poderiam ser afetivas) de todos os parentes ligados ao pai biológico.

Da mesma forma, excluir o nome do pai socioafetivo também seria o mesmo que excluir toda a relação de afetividade havida entre "filho(a)" e "pai" e com os parentes do pai registral. 

Assim, em eventual ação interposta com este fim, é de rigor o reconhecimento da dupla parentalidade, devendo ser incluído no registro da parte autora de um ação dessa espécie, além do nome do pai registral, o nome do pai biológico.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

STF, RE 898.060/SC;

TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito de Família, vol.05. 11.ed.rev., atual.e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 434; e

TJRS, Apelação Cível 70062692876.


POR DANIELA COSTA QUEIROZ MEDEIROS















- Bacharel em Direito pela Universidade Estadual de Ponta Grossa;
-  Especialista em Direito e Processo Contemporâneo pela Faculdade de Telêmaco Borba;
Advogada OAB/PR 60.401
Telefone para contato:(42) 9917.2697
E-Mail: danielacostaqueiroz@hotmail.com

Nota do Editor:
Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

2 comentários:

  1. Interessante...

    A pergunta ou a observação que faço é em função de que a maioria dos relacionamentos onde o pai biológico nem sempre assume a paternidade, e ou a assume em 1 ª mão mas não assume de fato a criação da criança, deixando-a aos cuidados da mãe que encontra outro pessoa e passa a conviver com ela, aproximando a criança de forma a torna-la um pai AFETIVO, é que nem todo pai biológico tem EQUILÍBRIO para dividir o amor, as responsabilidades, a educação e os conceitos morais que forjariam o caráter dessa criança em um ambiente saudável...(?).

    E também, que não é fácil para um homem assumir um filho de outro, principalmente se em seu íntimo a aproximação do ex com sua atual esposa gere conflitos emocionais.

    Ainda sou fã da frase:
    PAI, É QUEM CRIA...

    ResponderExcluir