domingo, 2 de setembro de 2018

Gestação Ectópica: Quando o Bebê se Desenvolve Fora do Útero




A gestação ectópica ocorre com a implantação e desenvolvimento do ovo fora da cavidade corporal do útero (BARBOSA et. al., 2004; NEME, PEREIRA, ZUGAIB, 2006) e ocorre com maior frequência em mulheres com idade entre 21 e 39 anos (NEME et. al., 2006). 

Nas últimas décadas foi constatado um aumento na incidência desse tipo de gestação em diversos países inclusive no Brasil, o que pode ter relação com o maior número de processos infecciosos tubários; métodos anticoncepcionais que interferem com a motilidade das trompas e plásticas tubárias (FERNANDES et. al., 2004; NEME et. al., 2006). 

Além disso, mulheres com antecedente de prenhez ectópica têm alta probabilidade de formar o ovo novamente fora da cavidade uterina (NEME et. al., 2006). 

O diagnóstico de gestação ectópica deve ser feito rapidamente para minimizar os riscos decorrentes da ruptura da trompa e é realizado por meio dos sintomas clínicos: dor aguda abdominal, tontura, vertigens, sangramento vaginal, alterações gastrintestinais, urinárias, escapulalgia e choque hemorrágico (NEME et. al., 2006). 

Porém, algumas vezes, as gestantes ectópicas são assintomáticas, o que dificulta o diagnóstico e sendo tardio, gera maior frequência de complicações e necessidade de tratamentos mais invasivos (JUNIOR, MONTENEGRO, SOARES, CAMANO, 2008; FERNANDES et. al., 2004; NEME et. al., 2006). 

Ao saber-se grávida e receber ao mesmo tempo o diagnóstico de prenhez ectópica, a mulher pode passar a vivenciar um processo de luto, decorrente da perda gestacional. 

Freud (1917) descreve o luto como algo que o ego tem que fazer para adaptar-se à perda do objeto amado, tirando o investimento libidinal do objeto perdido e colocando em outro objeto. 

A literatura apresenta várias dificuldades no processo de luto do aborto espontâneo, entre elas: ausência de uma memória concreta do feto, sentimento de culpa da mulher e risco de transtornos psicológicos (BOYCE, CONDON, ELLWOOD, 2002) como a depressão, que segundo Veiga (2009) é o prevalente nesta situação. 

A depressão é um dos transtornos psiquiátricos que enquanto síndrome inclui alterações de humor, cognitivas, psicomotoras, vegetativas e de inserção social (PEREIRA e LOVISI, 2008; PEREIRA, LOVISI, PILOWSKY, LIMA, LEGAY, 2009). Os sintomas decorrentes são sensação de tristeza, auto- desvalorização, culpa, fadiga, diminuição da capacidade de sentir prazer nas coisas, de concentração e de pensar. Além disso, ocorrem alterações do sono como dormir muito ou ter insônia, crises de sono, retraimento social, comportamento suicida e alterações do apetite, sendo mais comum a perda do mesmo (PEREIRA et. al., 2009; PORTO, 1999). 

As alterações psíquicas dependerão de vários fatores, entre eles: orgânicos, familiares, conjugais, sociais, culturais e da personalidade da gestante (PEREIRA e LOVISI, 2008). 

Há muitos fatores de risco para a depressão na gestação, entre eles: idade menor que 16 anos, histórico psiquiátrico, eventos estressantes ao longo da gravidez, conflitos conjugais, estado civil, desemprego, personalidade pouco organizada, relações afetivas pouco satisfatórias e abortamentos (CAMACHO et. al., 2006; PEREIRA e LOVISI, 2008). Além destes fatores, o suporte social recebido pela mulher é determinante para seu bem-estar emocional, especialmente o suporte do cônjuge (ARRUDA e MARCON, 2007). 

Segundo Benute et. al. (2009), em estudo com mulheres que realizaram abortamento espontâneo ou provocado, a mulher faz um movimento para buscar responsáveis a fim de não lidar com a angústia vivida pelo abortamento e, se ela consegue achar um culpado, sua angústia é projetada no outro, impossibilitando assim a reflexão e a elaboração do processo vivido. Porém, quando não é possível responsabilizar alguém, "a angústia gera conflito e este possibilita a compreensão e a integração do significado do abortamento" (p. 326). 

A perda gestacional representa uma ruptura na vida das mulheres, na qual há a reconstrução de sua identidade, fazendo com que a mulher tenha que lidar com sentimentos de impotência e incapacidade, causando grande impacto em sua feminilidade (QUAYLE, 1997; SANTOS, ROSENBURG, BURALLI, 2004; VEIGA, 2009). 

A partir da perda fetal, segundo Bartilotti (1998) a mulher percebe a impossibilidade da maternidade e tem um sentimento de fracasso.

Os sentimentos de incapacidade e fracasso ainda podem ser potencializados em decorrência de um "instinto maternal, na função de geradora de vida e condutora das relações familiares" (RANDAZZO, 1997). 

A perda gestacional representa uma ruptura na vida das mulheres, na qual há a reconstrução de sua identidade, fazendo com que a mulher tenha que lidar com sentimentos de impotência e incapacidade, causando grande impacto em sua feminilidade, já que para a mulher ser considerada socialmente mulher, ela tem que gerar filhos (BENUTE et. al., 2009). 

Referências Bibliográficas 

Arruda, D. C. de; Marcon, S. S. (2007). A família em expansão: experienciando intercorrências na gestação e no parto do bebê prematuro com muito baixo peso. Texto Contexto Enferm., 16 (1);

Barbosa, C. P.; Campoi, G. M.; Oliveira, K. M.; Santos, M. E.; Fasano, P. R.; Silva, P. D. V.; Peixoto, S.(2004). Concomitância de gestação tópica e ectópica. Rev. ARQ. MED. ABC, 29 (1); 

Bartilotti, M. R. M. B. (1998). Obstetrícia e Ginecologia: urgências psicológicas. In: Angerami-Camon (Org.), V. A. Urgências psicológicas no Hospital (pp.193 - 206). São Paulo: Pioneira;

Benute, G. R. G.; Nomura, R. M. Y.; Pereira, P. P.; Lucia, M. C. S. de; Zugaib, M. (2009). Abortamento espontâneo e provocado: ansiedade, depressão e culpa. Rev. Assoc. Med. Bras., 55(3);

Boyce, P.; Condon, J. T.; Ellwood, D. A (2002). Pregnancy Loss: a major life event affecting emotional health and well- being. Medical Journals Association, 176; 

Camacho, R. S.; Cantinelli, F. S.; Ribeiro, C. S.; Cantilino, A.; Gonsales, B. K.; Braguittoni, E.; Rennó Jr., J. (2006). Transtornos psiquiátricos na gestação e no puerpério: classificação, diagnóstico e tratamento. Rev. Psiquiatr. Clin, 33 (2);

Elito- Junior, J.; Montenegro, N.A.M.M.; Soares, R.C.; Camano, L. (2008). Gravidez ectópica não-rota- diagnóstico e tratamento. Situação atual. Rev. Bras. Ginecol. Obstet., 30 (3);

Fernandes, A. M. S.; Ribeiro, L. P.; Moraes, F. H.; Meira, P. C.; Sollero, C. A. Yamada, E. M.(2004). Prevalência de gestação ectópica de tratamento cirúrgico em hospital público de 1995-2000. Rev. Assoc. Med. Bras., 50 (4);

Freud, S. (1917). Luto e melancolia. In: Freud, S. Obras psicológicas completas de Sigmund Freud (pp. 269 - 291). Rio de Janeiro: Imago; 

Neme, B.; Pereira, P. P.; Zugaib, M. (2006). Prenhez Ectópica. In: Neme, Bussâmara (org.). Obstetrícia básica (pp. 372- 394). São Paulo: Editora Savier;

Pereira, P. K.; Lovisi, G. M. (2008). Prevalência da depressão gestacional e fatores associados. Rev Psiq Clín, 35 (4);

Pereira, P. K.; Lovisi, G. M.; Pilowsky, D. L.; Lima, L. A.; Legay, L. F. (2009). Depression during pregnancy: prevalence and risk factors among women attending a public health clinic in Rio de Janeiro. Rev. Cad. Saúde Pública, 25 (12); 

Porto, J. A. D. (1999). Conceito e diagnóstico. Rev. Bras. Psiquiatr., 21 (1) ;

Quayle, J. (1997). Óbito Fetal e Anomalias Fetais: repercussões emocionais maternas. In: ZUGAIB, M.; Tedesco, J. J.; Quayle, J. (orgs.) Obstetrícia Psicossomática (pp. 216 - 230). São Paulo: Atheneu; 

Randazzo, S. (1997). A Criação de Mitos na Publicidade: como publicitários usam o poder do mito e do simbolismo para criar marcas de sucesso. Rio de Janeiro: Racco;

Santos, A. L. D.; Rosenburg, C. P.; Buralli, K. O. (2004). Histórias de perdas fetais contadas por mulheres: estudo de análise qualitativa. Rev. Saúde Pública, 38 (2)e 

Veiga, D. S. (2009). Luto e aborto espontâneo. Rev. Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde, 4 (8). 

POR CARINE FRANCESCHI SAITO














-Graduada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2009); 
-Aperfeiçoamento em Psicossomática pelo Instituto Sedes Sapientiae (2007);
- Especialização em Psicologia Hospitalar  pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (2011);
- Aprimoramento em Psicologia Hospitalar com pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (2011);
- Especialização em Gestalt-Terapia pelo Instituto Sedes Sapientiae (2015); 
- Especialização em Sexologia pelo Instituto Paulista de Sexualidade (2018);
- Atuou como Psicóloga colaboradora na Unidade de Psiquiatria da Infância e Adolescência da Unifesp.
- Atua na área de Sexualidade e Saúde da Mulher desde 2010.
-Atende crianças, adolescentes e adultos em psicoterapia individual e de casais.
-Atua em consultório particular na Zona Oeste e Sul de São Paulo.
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Nota do Editor:


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Um comentário:

  1. Parabéns doutora por alerta necessário, mas infelizmente no 🇧🇷 a profilaxia (utilização de procedimentos e recursos para evitar doenças) é prevaricado nas atuações governamentais inseridas no contexto 😭😭😭🇧🇷🇧🇷🇧🇷🤗🤗🤗

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