terça-feira, 29 de janeiro de 2019

A Lei Maria da Penha e a Possibilidade de Retratação da Vítima


Autora: Thais Lamas(*)

Palavras chave: Mulher; Violência Doméstica e Familiar, Lei Maria da Penha; Retratação.
Apesar de várias pessoas não reconhecerem a credibilidade quanto à eficácia da Lei 11.340/2006, intitulada como Lei Maria da Penha, deve-se admitir que o referido dispositivo, desde a sua promulgação, tem se tornado um marco histórico em nosso país, cujo seu intuito é coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, com a efetiva punição do agressor.
Preliminarmente ao tema, insta ressaltar que existem crimes dos quais o processo inicia-se através de uma ação penal privada, da qual ocorre com a representação da vítima ou de seu representante legal. A ação penal pública condicionada refere-se aquela que, apesar de ser ajuizada pelo Ministério Público, depende de representação do ofendido, que manifesta a sua vontade no sentido de instaurá-la, pois sem ela o inquérito não poderá ser iniciado.
Há outros casos em que o processo inicia-se através de ação penal pública incondicionada, onde caberá ao Ministério Público ofertar a denúncia, instaurando o processo independente de anuência da vítima, que se torna apenas um objeto processual, como ocorrem nos crimes contra a vida, racismo, tráfico ilícito de drogas, entre outros previstos em nosso ordenamento jurídico.
Na prática, verifica-se que, em situações de violência doméstica e familiar contra a mulher, a vítima mesmo que venha a exercer o seu direito de representação, por muitas vezes acaba se retratando, no sentido de encerrar o procedimento investigatório, seja pelo receio da impunidade, vergonha, dependência financeira ou simplesmente por uma grande pressão psicológica por parte do seu próprio agressor, principalmente quando as ofensas acontecem rotineiramente.
Ciente disso, o legislador trouxe como uma possível solução no enfrentamento destas situações, estabelecendo uma previsão legal, para que a desistência de prosseguimento na ação por parte da ofendida pudesse ocorrer somente perante a presença do juiz e de um representante do Ministério Público, em uma audiência designada especialmente para essa finalidade, ato este do qual ocorre antes de iniciar o processo, ou seja, antes do recebimento da denúncia pelo órgão ministerial. Conforme estabelece o artigo 16 da Lei 11.340/2006:
"Art. 16.  Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público."

Essa audiência é imprescindível para a desistência, pois, possibilita ao magistrado e o Ministério Público constatar se a vítima vem suportando algum tipo de intimidação, por parte do agressor, especialmente porque a decisão de retratar deve ser voluntária e livre de vícios de consentimento, pois, na maioria dos casos, mesmo após sofrer vários atos de agressão, a ofendida se retrata da representação em razão de ameaças por parte do agressor.

Adequada se tornou tal medida, uma vez que assegura à vítima um acesso pessoal às autoridades especializadas em casos de violência desta natureza, que ao invés de incentivar a retratação, conscientizará e a encorajará sobre a necessidade de dar prosseguimento ao processo.


Contudo, é importante ressaltar que, quando há prática de lesão corporal no âmbito da violência doméstica, a ação será pública incondicionada à representação, conforme entendimento já assentado pelo Superior Tribunal Federal, o que significa que o Ministério Público poderá movê-la independente de interesse da vítima.

O artigo 41 da Lei Maria da Penha afasta ainda, a necessidade de representação da ofendida para crimes dessa natureza, onde determina a inaplicabilidade da Lei dos Juizados Especiais (Lei 9.099/95), excluindo assim a permissão da aplicação de penas alternativas, consideradas inadequadas para a hipótese, como a possibilidade de multa como única sanção e a prestação pecuniária.


Determina a norma supracitada que:

"Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995."
Quando uma mulher é violentada, toda a sociedade sai ferida deste fato, pois ela é a uma estrutura familiar saudável, que por sua vez é o alicerce de uma nação sólida, organizada, justa e próspera. Uma vez rompida ou maculada essa base, os reflexos são amplamente visíveis e perversos, o que por si só justifica esta cautela especial à mulher por parte do Estado, que reconheceu tal importância ao implantar a Lei Maria da Penha no § 8º do art. 226 da Constituição da República. Mencionado dispositivo, aduz que:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
(...)
§8º -  O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.

Por fim, o intuito prevalece no sentido de que este mesmo Estado, do qual reconheceu essa ilustre função da mulher no meio social, trabalhe efetivamente, de modo que as instituições realmente possam dar o devido suporte para as vítimas de violência doméstica, prestando seus múnus público como descritos em lei, trabalhando muito no sentido da prevenção, pois, somente assim teremos uma sociedade bem mais justa e próspera.


REFERÊNCIAS:
1)    BRASIL. Código Penal Brasileiro. Saraiva. São Paulo. 2017.
2)    BRASIL. Lei 11.340 de 07 de agosto de 2006.
3)    BRASIL. Lei 9.099/95 de 26 de setembro de 1995.
*THAIS LAMAS








- Advogada e consultora jurídica, atuante nas áreas do Direito Criminal, Cível e Família;
- Membro da Comissão de Assuntos Criminais e Direitos Prisionais da OAB/MG;
- Pós-graduanda em Direito Penal e Processual Penal 
Nota do Editor:
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Um comentário:

  1. Perfeito, carissima. Mas a Lei Maria da Penha apenas serviu para mostrar e ampliar o conhecimento de que nossas mulheres passam e passavam nas mãos de homens covardes. Esta lei tanto comemorada não EVITA que nossas filhas sejam mortas.

    Em verdade eu vos digo, a distância entre a felicidade é segurança de uma mulher, estão as suas ESCOLHAS.

    Falta a esta lei a EFETIVIDADE e a rapidez concreta.

    ■Penas MÍNIMAS OBRIGATÓRIAS SEM SAIDINHA E SEM REDUÇÕES E INDULTOS SEJA O CRIME DOLOSO OU CULPOSO O réu PRIMÁRIO OU DELATOR
    Esse conceito precisa de apoio e VOZ.
    ■ Agressão à mulher, 5 anos de PENA MÍNIMA
    ■ Matar a mulher 30 anos de PENA MÍNIMA
    Lembrem-se que pena mínima obrigatória não seria desconfigurada pelas Leis de Execuções penais...🤔🇧🇷🤗🤗🤗🤗

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