quinta-feira, 29 de setembro de 2022

A Comoriência


 Autor: Sergio Luiz Pereira Leite (*)

Em que pese esse assunto não constar diretamente, no Código Civil, na parte que trata do direito das sucessões, ele é muito importante na sucessão legítima, visto sob determinado prisma. Vejamos, então.

 

As origens etimológicas da palavra comoriência vem do latim commorientia, enfeixando o significado de morte simultânea de duas ou mais pessoas. No dizer de Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald representa, pois, o falecimento simultâneo de duas ou mais pessoas, em circunstâncias que não permitam identificar o premoriente.

 

Em nosso Código Civil, tal situação está prevista em seu artigo 8º, que diz, verbis:

"Se dois ou mais individuas falecerem na mesma ocasião, não se podendo averiguar se algum dos comorientes precedeu aos outros, presumir-se-ão simultâneamente mortos."

 

Como se percebe, essa previsão legal não está capitulada no Livro V, Título I, do Código Civil, que trata especificamente do “Direito das Sucessões”, que abrange o artigo 1.772 em diante.

 

Mas esse instituto, em que pese inserido no Livro I, Título I, Capítulo I do nosso Código Civil, que trata das Pessoas, interfere, em certas situações, na sucessão legítima. E justificamos a razão dessa assertiva.

 

O regime de bens adotado entre os cônjuges sempre se fez à sua vontade. Mas no silêncio dos nubentes, o regime jurídico adotado é, atualmente, o da comunhão parcial de bens, na conformidade do que dispõe o artigo 1.629 do Código Civil, que passou a admitir, no § 2º a sua alteração.

 

Pois bem, estas explicações introdutórias se fazem necessárias, porque a partir da edição do novo Código Civil Brasileiro (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002), houve sensível modificação na forma da sucessão, pois o cônjuge supérstite passou a concorrer com os herdeiros filhos, conforme preceitua o inciso I do artigo 1.829. Por tal dispositivo legal, o cônjuge sobrevivente, além da sua meação, concorre com os descendentes (salvo se casado pelo regime da comunhão universal ou na separação obrigatória de bens).

 

Ou seja, o cônjuge sobrevivente, no Codex revogado, não figurava em concorrência com os herdeiros, apenas estava como herdeiro em terceiro lugar na vocação hereditária. Bem por estas considerações é que se torna importante a conjugação desses artigos com o artigo 8º, que trata da comoriência.

 

Um exemplo clássico sempre aventado é o do casal que, em viagem por estrada de rodagem, sofre um acidente e ambos vêm a falecer. É impossível, na maior parte das vezes, definir quem morreu em primeiro lugar. Dessa maneira, a comoriência se aplica sem dúvida.

 

Com a evolução do casamento, do instituto da união estável e até mesmo das uniões homo afetivas, a análise da comoriência merece relevo, pois podem ocorrer situações como as contidas no exemplo acima dado e muitos outros assemelhados.

 

Serve também o alerta de que se trata de uma presunção relativa e, portanto, pode ser contestada. De qualquer maneira, com a comoriência a vocação hereditária é integralmente dos herdeiros filhos em primeiro lugar e sem qualquer concorrência.

 

Assim também, na falta dos filhos e se existirem ascendentes, estes serão chamados a suceder, como também, caso não existam ascendentes, os colaterais serão os chamados a suceder.

 

Estas são as breves considerações que faço sobre o tema.


* SERGIO LUIZ PEREIRA LEITE



Advogado militante nas áreas cível e criminal na Comarca de Tietê, Estado de São Paulo.








Nota do Editor:

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