domingo, 30 de abril de 2023

Parentalidade: Uma faculdade de 50 semestres


Autora: Renata de Masi(*)




Pergunto-me se a parentalidade fosse apresentada como uma faculdade dessa magnitude, se seria conscientizador ou desanimador.

Muitos pais e mães se questionam em meu consultório que deveriam ter feito um curso antes da decisão de ter um(a) filho(a), pois não imaginavam que seria tão complexo. Sempre ficam com a sensação que, por mais que refletiram ou leram sobre o tema, não alcançaram a grandiosidade dessa escolha sentindo-se incapazes durante o percurso.

E seria possível um curso para amparar melhor essa decisão?

Independentemente da existência ou não de uma ‘graduação’, é de extrema importância falarmos e trocarmos sobre as dificuldades vividas pelos pais, sem esquecermos que faz muita diferença se esta ação está estruturada em um desejo.

Aí, vem a ‘vida’ e nos ‘matricula’, em um enlace inconsciente.

Pensando na parentalidade como um curso, como ele nos seria apresentado?

  •  Podemos pensar no primeiro módulo como a gestação (emprestar o corpo), a hora do parto e o puerpério (loucura saudável);
  •  O segundo módulo seria a famosa fase do reizinho em que os pais aprendem como ensinar amor e limite;
  •  O terceiro módulo vem com a arte de fazer amigos e a ponderação narcísica;
  • O quarto módulo atua na construção da importância do ser singular e grupal;· 
  •  O quinto módulo refere-se à sexualidade;
  • O sexto módulo trata do dizer de si e o seu lugar no mundo;
  •  O sétimo módulo fala sobre a empatia, ética e moral;
  •  O oitavo módulo diz respeito ao nó do amor e da justiça;
  •  O nono módulo lida sobre a responsabilidade; e
  • O décimo módulo trabalha com as escolhas, a sustentação das pressões e o caminho rumo à independência.
Todos esses módulos são acompanhados das quebras narcísicas, cultura, alianças familiares e traumas dos pais.

Esse é apenas o resumo de uma grade que duraria, em média, 50 semestres contando com um(a) filho(a) às voltas de 25 anos que já terminou a faculdade, ingressou na sua vida profissional e que, supostamente, estaria pronto para sair de casa.

Mas é claro que aqui teríamos muito o que discutir, pois não é verdade que isso acontece. Os filhos vêm conquistando a sua independência cada vez mais tarde, de 30 a 35 anos. Seria esse um alerta de ‘DP’? Algum módulo que precisaria ser revisto?

E não paramos aqui, pois a função da parentalidade caminha rumo a uma ‘pós-graduação’ até chegar a ‘livre-docência’ com o fim da vida dos pais.

Mas para onde olhamos para avaliar o alcance desse curso? Algumas palavras podemos registrar aqui: um sujeito suficientemente bom no amor, na profissão, na sexualidade, na ética, na gratidão, integrado em imagem e desejo… resumidamente, um sujeito que seja capaz de amar, trabalhar e desejar. Fácil assim!

Mas, e se dissermos que a parte mais difícil não está em nada disso? Pois esses módulos não são feitos de forma ativa apenas pela parte dos pais, temos a parte do(a) filho(a) que não é passivo e isso não controlamos. Não controlamos a forma que ele vai introjetar, projetar, registrar, lidar e reagir com o que fizemos como pais e com todos os acontecimentos e personagens que também pertenceram as fases vividas.

Conclusão: não os controlamos e nem controlamos todo o ambiente a que eles pertenceram, pertencem e pertencerão.

Como o sobrenome dos pais é culpa, o objetivo aqui proposto é, ao mesmo tempo, trazer a reflexão da dificuldade desses 50 semestres e aliviar com a conscientização que essa ‘formação’ é feita pelo encontro de todos (pais e filhos) nessa jornada.

Refletindo sobre a frase "Não há receita para educar filhos", entendo que existem apenas os ingredientes. O que não existe de maneira lógica são as quantidades e o modo de fazer. Na preocupação de fazerem o certo, quando se deparam com algo que está dando errado, cobram-se narcisicamente ficando, muitas vezes, míopes para com seus filhos.

Entendendo a complexidade das palavras na analogia desse texto e todo o desafio visto e o quanto a culpa pode sufocar os pais, saliento a importância de um desdobramento junto com um profissional da área da saúde emocional para refletirem juntos sobre as dificuldades da contemporaneidade da parentalidade, uma vez que o que temos para construir dentro dessas funções não há historicamente um referencial e o mundo futuro que aguarda esses filhos também será algo novel.

*RENATA DE MASI

















-Psicóloga e Psicanalista com atendimento a crianças e adultos em consultório particular em Santo André/SP;
-Psicóloga graduada na UniABC (2011);
-Pós em Psicopedagogia pela UniABC(2012);
-Supervisora clínica;
-Coordenadora do Espaço Rêverie
-Coordenadora do ILPC ABC
E-mail: reverieespaco@yahoo.com
Tel/WhatsApp: (11) 9.8487.6907

Nota do Editor:

Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

Nenhum comentário:

Postar um comentário