Onde não há um bom governo, o povo arruína-se. Onde há
muitos conselheiros, ali haverá salvação” (Provérbios de Salomão,
11:14).
31 de outubro.
Aumento exponencial da violência em toda a sociedade. Profundos contrastes
socioeconômicos e uma crescente do sentimento nacionalista. Generalização do
sentimento de insatisfação em relação ao "poder".
O ano é 1517. O
contexto acima descrito é o cenário que impulsionou Martinho Lutero afixar à
porta da igreja de Wittenberg as suas Noventa e Cinco Teses, maneira usual de
convidar uma comunidade acadêmica para debater algum assunto. Uma das maiores
motivações da "reforma de Lutero" estava relacionado a um aspecto socioeconômico
devido a venda das indulgências (o perdão das penas temporais do pecado)
pela Igreja. Mesmo sob severa resistência papal, os efeitos da reforma de
Lutero ecoaram por toda Europa e surtem efeitos até os dias atuais. Lutero e
outros reformadores, a que destacamos João Calvino (1538), não estavam buscando
inovar, mas restaurar antigas verdades colhidas das Sagradas Escrituras que
haviam sido esquecidas ou obscurecidas pelo tempo e pelas tradições humanas, relacionadas
à salvação e à vida cristã, mas que repercutiram inclusive no desenvolvimento
social e econômico de várias nações.
Aliás, o
teólogo João Calvino trouxe para a sociedade de sua época, através de seus
pensamentos e ideias, novos rumos para o cidadão e seu exercício da cidadania,
constituindo um modelo-exemplo, deixado na cidade de Genebra, como:
político-administrativo, educacional e assistencial. Sua atuação foi tão
especial que muitos outros habitantes de outras regiões da Europa vieram até
Genebra a fim de aprender seu modelo, além de levarem para as suas terras padrões
que justificam até os dias atuais o desenvolvimento e manutenção do "status quo" dos valores que norteiam países, principalmente as nações anglo-saxônicas.
31 de outubro
de 2023. Aumento exponencial da violência no mundo, revelada pelas guerras
entre Rússia e Ucrânia, Israel e o grupo terrorista Hamas. No cenário
brasileiro, inúmeros episódios de violência se acumulam nos noticiários, decretando
inclusive a única justificativa de existência de um "Estado", que nas lições de
Frédéric Bastiat[1],
para apenas garantir a segurança dos indivíduos. Nem isso o Estado tem
realizado com eficiência essa sua função de existência e organização.
Assim como os
atores que promoveram para a reforma protestante, urge no cenário atual um
movimento nacionalista representando a sensação de poder que nasce dos
indivíduos para cima, e não do Estado para baixo.
O foco é a necessidade
de uma reforma do Estado e seu pacto federativo em preeminência ao já
desgastado texto da PC 45/2009 que emenda o texto constitucional a um novo
sistema tributário.
Enquanto o
Governo Brasileiro propõe ao indivíduo um novo sistema tributário – de cima
para baixo - cabe ao cidadão apontar para o governo – de baixo para cima - a
necessidade de se repensar o pacto federativo e toda a sua dilatada estrutura
financeira que sufoca o orçamento público e, por conseguinte, refletindo um
aumento da arrecadação tributária e o estrangulamento da capacidade financeira
do indivíduo.
A Constituinte
em 1988 adotou o Federalismo como a forma de organização estatal, justificada principalmente
pela existência de heterogeneidades que são visualizadas no território
brasileiro.
Algumas
justificativas do Federalismo residem na grande extensão e diversidade da sua
base territorial, a coexistência de múltiplos grupos étnicos ou linguísticos,
as desigualdades regionais de caráter cultural, político ou socioeconômico, as
diferenças ou rivalidades no processo de formação das elites e das sociedades
locais.
Ocorre que o apelo do populismo dos governos nas últimas décadas avocando à tesouraria nacional as pautas sociais e o emparelhado desenfreado na máquina pública administrativa, inclusive o sobressalto da criação das unidades federativas – os Municípios -, além de desvirtuar a gênese que motivou a consolidação do federalismo fiscal, tornou o país refém do aumento da carga tributária.
Fernando Facury Scaff leciona[2] que "essa atividade financeira é elemento essencial do Estado. Não há como se conceber um Estado, mesmo em suas formas pré-modernas, sem ela".
Ou seja, para
atender todo o chamado "Estado Social" que o qual proclama amplo rol de
direitos sociais e de sua estrutura estatal, a Constituição Federal de 1988
recepcionou os conceitos de subsistência financeira advindas do magistério de
Aliomar Balleiro e principalmente das diretrizes e estrutura de captação de
quantia em favor do Estado nos termos da Lei n. 4320/1964. Em brevíssima
síntese, para não desviar o foco do presente artigo, o conceito que empresta o
direito financeiro ao chamado Federalismo Fiscal varia na ideia de alocar
receitas e despesas públicas entre os entes políticos.
Devemos "reformar
a reforma" implementada às Finanças Públicas com o advento da Lei de
Responsabilidade Fiscal (LC n. 101/2000), em que apenas é permitida a contenção
de gastos frente as receitas auferidas. Precisamos mais do que isso. É urgente
a necessidade de, a título de ilustração, diminuir o número de municípios, promovendo
a fusão das estruturas políticas com munícipios que poderão promover a
indispensável autonomia financeira. Exemplificando, a PEC nº 188/2019, que
propõe a reforma do pacto federativo, porém travada a sua tramitação por um
Congresso Nacional que comparada à Igreja do século XVI, está mais preocupado com
a arrecadação de "novas indulgências".
Portanto, a visão atemporal da necessidade da reforma do Estado e toda a sua estrutura financeira com ênfase na diminuição do gasto público permite-nos concluir ser um delírio do atual governo em promover primeiramente a reforma tributária como a "tábua de salvação" no cenário brasileiro.
A esperança e,
sobretudo, expectativas de que tenhamos "novos Luteros, Calvinos..." que, com
ousadia e autoridade técnica, estimulem mobilizar a sociedade, quer por meio de
produções como este modesto texto, ou por meio de medidas legislativas efetivas,
visando proteger a liberdade de cada indivíduo frente aos abusos do Estado.
De Wittenberg
à Brasília, São Paulo, e a cada Estados e Municípios pelo Brasil, sigamos sempre
reformando.
REFERÊNCIAS
[1] BASTIAT, Frédéric. A LEI. 1850.
[2] SCAFF, Fernando Facury. Orçamento republicano e liberdade igual: ensaio sobre direito financeiro, república e direitos fundamentais no Brasil. Belo Horizonte: Fórum, 2018. p. 41
*ROBSON DOS SANTOS AMADOR
-Advogado graduado pela Universidade BNrás Cubas (2000);
- Pós graduado no LLM- Master of Law em Direito Tributário pelo INSPER – SP (2010;
-Mestrando em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de Buenos Aires – Argentina;
- Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET (2002); e
-Professor em diversos cursos de
graduação e pós graduação em Direito e Administração de Empresas.
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