segunda-feira, 4 de maio de 2020

Aberrações Eleitorais: Resultado da Pandemia?


Autora: Renata Leitão(*)


 Falar em pandemia ao meio de uma, pode parecer muito do mesmo; Falar dos efeitos dessa pandemia, nas mais diversas áreas que nos atingem, também acaba por ser repetitivo. 

Mas, os efeitos são tão extensivos que até a democracia em sua essência – eleitoral - é atingida com um forte golpe. Em meio a loucura mundial e nacional, do incerto, dia 17 de abril, Carlos Fávaro assume vaga no Senado por MT após cassação de Selma Arruda.

Testemunhamos a posse de um Senador não eleito pelo sufrágio popular. Este que, deveria ser, um dos pilares mais fortes e eretos de uma sociedade democrática. 

​A Senadora Juíza Selma Arruda, como se sabe, perdeu o seu mandato por decisão da Justiça Eleitoral, por não ter observado as regras de arrecadação e aplicação de recursos de campanha.

​Naquela oportunidade, suscitou-se a questão que, por força de seu afastamento, dever-se-ia admitir que o candidato derrotado, mas de maior votação entre os demais, fosse convocado em caráter precário a ocupar a cadeira vaga, até a realização de novas eleições.

​O pedido foi analisado pelo Plenário do Tribunal Superior Eleitoral e, por decisão de expressiva maioria – que contou com o voto de três Ministros do STF –, foi indeferido, tendo presente que tal solução importaria denegar o princípio da maioria, pois um candidato que não expressa o querer do corpo eleitoral passaria a ocupar a cadeira reservada a um candidato legitimamente eleito.

​Ao ver o seu pedido negado, o candidato Carlos Fávaro buscou o apoio de seu partido (PSD) e do Governador do Estado de Mato Grosso, Mauro Mendes (aliado político), para ingressar com Ações de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs nºs. 643 e 644).

​Nessas ações, alegaram, em suma, que o fato de a representação do Estado de Mato Grosso no Senado ficar desfalcada de um representante imporia grave prejuízo ao Estado, que, sub-representado, teria menor poder de resistência em face do Poder Central.

​Despachando o pedido liminar em 31 de janeiro de 2020, o Presidente Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, houve por bem deferir monocraticamente a medida, a ser referendada pelo Plenário, assegurando ao candidato batido no pleito o exercício do mandato que lhe foi negado pelas urnas. 

​O tema é cercado de forte polêmica, que urge ser examinada pela nossa Corte Suprema, sob pena de se instaurar quadro de ilegitimidade de poder que só se viu igual no tempo dos senadores biônicos.

​Em uma democracia, não há salvação para a falta de voto. Não se concebe que um candidato que perdeu eleição (e que, como é óbvio, não representa a maioria) seja guindado ao posto da Casa Legislativa como legitimado a falar em nome dos eleitores do Estado.

​Eleição não é como concurso público em que se o primeiro colocado não puder assumir convoca-se o segundo, pois no concurso público apura-se essencialmente o conhecimento formal, ao passo que na eleição apura-se essencialmente a legitimidade, sendo esse um ponto fundamental de nossa ordem constitucional. 

​Aventa-se com o prejuízo pela sub-representação do Estado, mas é de se considerar, todavia, que os conflitos de interesse entre as referidas Unidades da Federação não são tão frequentes, nem mesmo agudos.

​Muito pior seria a possibilidade de substituição de um Senador da situação por outro de oposição ou vice-versa. Aí sim se teria uma grave distorção da vontade popular, num intolerável atentado contra a legitimidade do pleito.

​Ainda que no caso concreto isto não esteja em discussão – a ADPF se destina precipuamente ao exame dos preceitos constitucionais – trata-se de importante aspecto para definir o desate do litígio. 

Destaca-se, por fim, que a eleição suplementar para o cargo de Senador de MT, convocada para o dia 26 de abril passado, foi suspensa por conta da pandemia, sem prazo para ser retomada. 

Um episódio triste, pois o TSE e TER/MT perderam a oportunidade de inovar, implementar, reduzir custos. Poderiam ter autorizado uma campanha diferente, apenas pelas redes sociais e meios de comunicação. Quão mais barata seria essa campanha? 

​Mas, a eleição foi suspensa, o terceiro candidato derrotado foi empossado. Um tapa na cara da democracia. 

E agora? Saberá o STF dar solução a essa situação, o que se espera que seja urgente.

*RENATA PAULI LEITÃO - OAB/MT 10.476 e OAB/DF 55.310 suplementar



-Advogada graduada pela Universidade Federal de Mato Grosso(2003);
-Especialista em Direito Tributário e Eleitoral 
-Atuando em Mato Grosso e Brasília


Nota do Editor:

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