Autora: Mariana Costa(*)
Está aberto no Brasil, de uma forma muito mais veemente desde a edição da Lei Maria da Penha, Lei nº. 11.340/2006, o debate sobre a violência doméstica e familiar contra a mulher.
De acordo com a Lei Maria da Penha, configura violência doméstica e familiar contra a mulher "qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:
I – no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;
II – no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa."
Desde 2006, organismos governamentais e não governamentais acompanham a evolução dos números da violência doméstica, incluindo os tipos de violência, a periodicidade dos casos, denúncias realizadas e demandas levadas ao Poder Judiciário.
Até antes do isolamento social, esses números expressavam que a maior parte dos casos de violência doméstica ocorriam aos finais de semana, período durante o qual o convívio entre os familiares se torna mais próximo. Com a quarentena imposta pelo COVID-19, por consequência o convívio familiar também se estendeu em termos de tempo e testemunhamos um aumento nos números da violência doméstica e intrafamiliar.
Conforme o Fórum Brasileiro de Segurança Pública - FBSP[1], houve um aumento considerável nos atendimentos de violência doméstica pela polícia militar (por meio do canal 190), notadamente no estado de São Paulo que teve aumento de 44,9% em relação ao mesmo período no ano anterior nos casos de violência doméstica. Ainda segundo o FBSP, nos estados do Acre, Mato Grosso, Rio Grande do Norte e São Paulo os índices de feminicídio também cresceram.
A nota técnica do Fórum Brasileiro de Segurança Pública indica também que, embora tenha havido aumento no número de casos, no sentido contrário, houve a diminuição das denúncias, o que se deve ao fato de que as vítimas muitas vezes estão impedidas de sair de suas residências para pedir ajuda e/ou buscar os meios judiciais.
A Organização das Nações Unidas - ONU também tem demonstrado preocupação com o tema e com o crescimento dos casos de violência contra meninas e mulheres durante a pandemia em vários países ao redor do mundo.
A diretora-executiva da ONU Mulheres, Phumzile Mlambo-Ngcuka, escreveu em artigo que "O confinamento está promovendo tensão e tem criado pressão pelas preocupações com segurança, saúde e dinheiro. E está aumentando o isolamento das mulheres com parceiros violentos, separando-as das pessoas e dos recursos que podem melhor ajudá-las."[2], revelando uma realidade que é comum a mulheres de várias nacionalidades.
O artigo de Mlambo-Ngcuka não cita a situação enfrentada pelas mulheres brasileiras, mas adverte que "Abrigos e linhas de ajuda para mulheres devem ser considerados um serviço essencial para todos os países, com financiamento específico e amplos esforços para aumentar a conscientização sobre sua disponibilidade."
De fato, a ONU tem recomendado que os países invistam nas organizações não governamentais de apoio à mulher e em serviços online, que sejam mantidas as atividades judiciárias para que as vítimas tenham acesso à justiça e às medidas judiciais cabíveis, além de estimular a criação de meios de denúncia acessíveis às vítimas de forma segura e sem exposição da vítima ao agressor e mais uma série de recomendações voltadas ao combate à escalada da violência doméstica e familiar no mundo.
Embora essa coluna seja direcionada ao Direito das Famílias, existe uma relação estreita entre a violência doméstica e as questões jurídicas familiares, ademais é de extrema relevância lançar uma luz sobre essa ascendente da violência doméstica para que a sociedade se mobilize em prol da adoção de medidas de prevenção e combate nos moldes apontados pela Organização das Nações Unidas e já implantadas em diversos países.
No Brasil, o FBSP ressaltou o lançamento do aplicativo para que as mulheres possam denunciar a violência doméstica via internet, anunciado pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, chamado "Direitos Humanos Brasil", já disponível nas plataformas AppStore e PlayStore, o aplicativo também inclui, segundo a pasta ministerial, outras funcionalidades do canal "Disque 100", recebendo assim denúncias de violência intrafamiliar contra crianças e adolescentes.
No entanto, é possível verificar nas avaliações e resenhas sobre o aplicativo inúmeras reclamações de usuários que apontam dificuldades de cadastro, problemas na instalação e indisponibilidade. As medidas até então tomadas no Brasil se demonstram até o momento muito incipientes frente ao panorama enfrentado.
REFERÊNCIAS
[1] Nota Técnica – Violência Doméstica Durante a Pandemia de Covid-19 – Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Disponível em: http://forumseguranca.org.br/wp-content/uploads/2018/05/violencia-domestica-covid-19-v3.pdf
*MARIANA COSTA
-Advogada, inscrita na OAB/DF nº 41.871;
-Especialista em Direito Processual Civil
-Atuante nas áreas de Família, Sucessões, Direito da Mulher, Criança e Adolescente, Direito Homoafetivo,e
-Mediadora Familiar.
Currículo completo em https://br.linkedin.com/in/marianacostaadvogada
Nota do Editor:
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