Autora: Mônica Falcão Pessoa(*)
Em tempos modernos, nos quais um like vale como moeda de troca, em que o consumismo desenfreado leva à precarização das relações sociais, em que as relações tradicionais de trabalho sofrem grande abalo, como podemos situar a educação de nossos cidadãos, jovens ou adultos, diante destes tempos, de acordo com Zygmund Bauman, líquidos?
O consumismo faz parte da vida dos seres humanos desde o nascimento, afinal consumimos energia mesmo quando no ventre de nossas mães, além de bens, produtos, serviços e recursos naturais. Tristemente percebemos que, na sociedade líquido-moderna, a humanidade consome a si mesma.
O estilo valorizado por nossa sociedade transforma tudo em produto e, pior, em produto fadado à rápida obsolescência.
Presenciamos uma data de validade curta para aparelhos eletrônicos, peças de vestuário, profissões e profissionais, educação e cultura. Tudo parece ser consumido e descartado rapidamente, formando uma montanha de lixo.
Nesta sociedade líquido-moderna de consumidores, assim que temos um desejo satisfeito, percebemos a sensação de que algo já está ultrapassado, o que traz a vontade de consumir mais para preencher um vazio que se forma eternamente. Para Bauman, a vida líquida faz com que a diferença entre objetos e consumidores seja efêmera, pois ninguém pode se tornar sujeito sem primeiro virar mercadoria.
Enredada em seus próprios desejos, a sociedade de consumo torna a insatisfação permanente, pois deprecia e desvaloriza os produtos tão logo adquiridos, tornando o "velho" em "defasado", impróprio para continuar sendo utilizado, tendo como único destino a lata de lixo. E o consumismo afeta não só a relação entre o ser humano e o planeta como também fere mortalmente a dignidade e a moral humana, tornando tudo precificável, descartável e indiferente.
De acordo com Santos (2000): "Consumismo e competitividade levam ao emagrecimento moral e intelectual da pessoa, à redução da personalidade e da visão do mundo, convidando, também, a esquecer a oposição fundamental entre a figura do consumidor e a figura do cidadão".
Nesse processo de consumo acelerado, a própria existência nos parece turva, então nada mais atraente e acolhedor do que aquilo que uma visita ao futuro nos oferece: inteligência artificial, computadores em rede, a qualidade de vida mantida por uma indústria tecnológica a preços módicos. Mas como vislumbrar o futuro coisificando tudo aquilo que é necessário para a existência do ser humano como cidadão?
Em momento de pandemia, as relações humanas se tornaram digitais por necessidade ou foi apenas por antecipação do futuro? Toda a sociedade foi obrigada a se adaptar à comunicação digital e aqueles que não foram capazes disso tornaram-se descartáveis como produtos obsoletos.
A desumanização dos vínculos empregatícios chegou até a educação, e vimos a redução do número de educadores de forma dramática. Universidades demitiram professores com anos de experiência com a desculpa de que a era tecnológica permite que apenas um professor dê aula para milhares de alunos ao mesmo tempo.
A educação virou bem de consumo e, como tal, passível ser negociada e descartada ao sabor da moda e de tendências políticas. Vemos consumidores decidindo como querem a educação de seus filhos não pelo conhecimento, mas como clientes que não podem ser contrariados. O método X dá mais status do que o Y, meu filho é bilíngue, não admito que o professor reclame com meu filho!
Quando voltaremos a enxergar a educação como formação humana do indivíduo? Quando deixaremos o egocentrismo de lado para percebermos que juntos poderemos construir um futuro melhor?
REFERÊNCIAS:
SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. Rio de Janeiro: Record, 2000;
BAUMAN, Zygmund. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001;
BAUMAN, Zygmund. Vida para consumo: a transformação das pessoas em mercadorias. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.
-Professora Universitária de Português e de Literatura Brasileira, formada pelo Mackenzie;
- Mestre e Comunicação e Semiótica pela PUC/SP;
- Tutora em programas de leitura como "Quem Lê Sabe Por Quê".
Nota do Editor:
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