Autora :Palloma Parola Del Boni Ramos (*)
O artigo 14 da Constituição Federal, exemplificativamente, trata dos direitos políticos, que expressam a soberania popular, ou seja, a participação da população nas decisões políticas do Estado.
Dessa forma, conclui-se que, ao exercer seus direitos políticos, o cidadão expressa a sua vontade. No entanto, com as Fake News, a liberdade de se expressar à vontade é reduzida, uma vez que essas notícias são usadas em um jogo político de grande repercussão com o auxílio da internet e das redes sociais disponíveis.
A rapidez com que são divulgadas se deve ao interesse financeiro e/ou político envolvido na criação de diversas notícias falsas, visando propagar-se através da população. Dessa maneira, como aponta Diogo Rais[1]:
É muito comum o uso das primeiras vítimas como uma espécie de elo para compor uma corrente difusora das fake News. Assim aquelas pessoas que de boa-fé acreditaram estar em contato com uma verdadeira notícia, passam ainda que sem perceber – a colaborar com a disseminação e difusão dessas notícias falsas.
A intenção de propagar informações falsas é beneficiar alguém ou grupo, além de ter um impacto negativo na opinião pública. Dessa forma, conforme Goltzman [2](2022):
O conteúdo da desinformação é pensado, criado, editado e disseminado para manipular. Logo, o conteúdo pode ser completamente falso ou conter elementos reais com edições para alcançar os fins almejados. O conteúdo pode ser feito para beneficiar uma pessoa ou grupo. Empresas contratam pessoas com objetivo de desinformar por meio de notícias em sites hospedados muitas vezes utilizando mais elementos reais do que fictícios em sua escrita. O dano causado tem objetivo, com intento político, por exemplo eliminar um candidato rival, ou um interesse econômico, como auferir dinheiro através dos cliques de publicidade. Utilizam multimeios (sítios eletrônicos, boots, trolls, mídias sociais, mensagens instantâneas) tudo controlado por algoritmos para atingir mais pessoas, em menor tempo e com maior precisão.
A disseminação de notícias falsas constitui um desafio à Justiça, uma vez que as redes sociais são criadas por empresas transnacionais e usadas em diversas esferas sociais no Brasil. Apesar de, historicamente, a divulgação de notícias falsas ser usada, com o surgimento da internet e das redes sociais, o dinamismo na replicação de informações é algo inédito, em um mundo extremamente conectado.
Atualmente, segundo informações coletadas pela plataforma "We Are Social" e "Meltwater", estima-se que a população brasileira é composta por 181.8 milhões de pessoas conectadas à internet, ou seja, quase 85% da população. Outro dado relevante da pesquisa é a internet ser usada para obter informações, e 77,6% para manter-se informado sobre notícias e acontecimentos.[3]
O novo estudo da Kaspersky revela que 62% dos brasileiros entrevistados não reconhecem notícias falsas.[4]
A influência das notícias falsas na população e os danos aos direitos políticos causados pela manipulação para desacreditar um candidato e influenciar a decisão do cidadão de exercer seus direitos como cidadão no pleito eleitoral.
Sendo assim, a atuação do Poder Judiciário é crucial para minimizar os efeitos das notícias falsas, garantindo a transparência que deve ser assegurada à população. No entanto, é relevante ter em mente as dificuldades enfrentadas para evitar tais práticas por parte das empresas Transnacionais, responsáveis pelas redes sociais, bem como a rapidez na massificação da desinformação.
O Tribunal Superior Eleitoral - TSE[5], estabeleceu parcerias com as principais redes sociais visando estabelecer uma cooperação no combate à desinformação. Conforme o site do TSE, estão envolvidas na parceria as seguintes redes sociais: Facebook, X, Instagram, Flickr, YouTube, SoundCloud, TikTok, LinkedIn e Kwai.
Além disso, o Tribunal Superior Eleitoral — TSE visa afastar a desinformação (além das parcerias), por meio de decisões judiciais que sejam razoáveis, ou seja, que, em tese, não silenciam o debate político, com base no artigo 323 do Código Eleitoral, que atribui como crime de denunciação caluniosa àquele que divulgar informação falsa.
O artigo 22 da Lei Complementar no 64 de 1990[6] assegura que partidos políticos, candidatos e candidatos podem abrir uma investigação judicial para investigar o uso incorreto de notícias falsas. Além disto, a Resolução n.º 23.714/2022[7] estabelece a retirada da desinformação para diminuir o tempo em que a desinformação permanece disponível para a sociedade.
Também está em discussão no Senado, o Projeto de Lei n° 2.630/2020[8], visando regular as redes sociais, criando normas para as redes sociais, para evitar danos individuais e coletivos.
A questão causa discussões intensas, uma vez que a desinformação pode causar incerteza nos direitos políticos do cidadão, uma vez que sua vontade pode ser modificada. Enquanto isso, alguns consideram que a regulamentação das mídias sociais pode afetar o direito de expressão nas redes sociais.
De qualquer forma, a subjetividade em analisar se o conteúdo é falso ou não, bem como seus efeitos, necessita de uma análise ponderada, para não ferir direitos fundamentais e prejudicar a sociedade.
Conclusão:
Este estudo objetivou identificar como as Fake News interferem na autonomia de vontade do cidadão e no exercício de seus direitos políticos, os quais são relevantes.
Foram levantados dados, corroborando a afirmação de que a população brasileira, com acesso à internet, utiliza-a como uma forma de obter informações, ou seja, manter-se atualizado. Além disso, a pesquisa concluiu ser possível que a população não compreenda que a notícia é falsa.
Assim, a internet se transforma em um ambiente de disseminação de informações falsas, que terminam por afetar a sociedade. Dessa forma, é crucial que o Poder Judiciário atue para evitar danos maiores.
Diante disso, o Tribunal Superior Eleitoral — TSE intensificou sua atuação no sentido de diminuir a desinformação, mediante parcerias, decisões judiciais e outros meios.
No entanto, as decisões devem ser ponderadas, para não prejudicar o direito à liberdade de expressão, bem como buscar um contraponto, visando assegurar os direitos políticos como expressão da mais legítima vontade e transparência das informações compartilhadas.
REFERÊNCIAS
[1] RAIS, Diogo (coord). Fake News: a conexão entre a desinformação e o direito. 2 ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020;
[2] GOLTZMAN, Elder Maia. Liberdade de expressão e desinformação em contextos eleitorais: parâmetros de enfrentamento com base nas sentenças da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Belo Horizonte: Fórum, 2022, p. 63.;
[6] https://www.planalto.gov.br/cciviL_03/////LEIS/LCP/Lcp64.htm
[7] https://www.tse.jus.br/legislacao/compilada/res/2022/resolucao-no-23-714-de-20-de-outubro-de-2022
[8] https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2256735
*PALLOMA PAROLA DEL BONI RAMOS
-Graduada em Direito pela Universidade Nove de Julho - 2014;
- Pós Graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2018);
-Pós Graduada em Direito Constitucional e Direitos Humanos pelo Ius Gentium
Conibrigae - Universidade de Coimbra (2020);
-Mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (Bolsa CAPES/PROSUC - 2023);
-Doutoranda (Bolsa Mérito do Instituto Presbiteriano Mackenzie);
-Pesquisadora do
Grupo de Pesquisa: "O Sistema de Seguridade Social";
-Membra da
Comissão de Comunicação (COMUNICAMACK) de publicações em idiomas inglês e
italiano;
-Membra da Equipe de Apoio à Produção Científica - Sucupira (PPGDPE -
Mackenzie) e
- Defensora na Vigésima Terceira Turma do Tribunal de Ética da Ordem
dos Advogados do Brasil - São Paulo.
Nota do Editor:
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