Autora: Camila Lavaqui Gonçalves (*)
Nos últimos anos, a economia digital transformou de forma significativa o mercado de trabalho, trazendo à tona profissões que antes nem existiam, como influenciadores digitais, freelancers e motoristas de aplicativos. Essas novas ocupações oferecem flexibilidade e liberdade, mas também apresentam desafios, especialmente quando o assunto é pensão alimentícia. A informalidade presente em muitas dessas atividades torna complicado comprovar renda, o que afeta diretamente os processos de pensão.
Diferente de empregos tradicionais com carteira assinada e salário fixo, profissionais da economia digital lidam com rendimentos variáveis, que podem depender da demanda do mercado ou até da estação do ano. Isso torna difícil a comprovação exata da renda, pois, em muitos casos, parte desses ganhos não é formalizada. Sem um registro claro dos rendimentos, como calcular um valor de pensão que seja justo para ambas as partes?
A lei define que a pensão alimentícia deve ser baseada nas necessidades de quem recebe e na capacidade financeira de quem paga. Mas quando a renda é incerta, como no caso dos profissionais digitais, o cálculo justo desse valor se torna um verdadeiro desafio.
Em empregos formais, o salário é um dado claro, tornando o cálculo da pensão relativamente simples. Já no caso dos trabalhadores da economia digital, a variação nos ganhos complica essa conta. Muitos recebem pagamentos em contas pessoais, sem separar suas finanças profissionais, o que dificulta ainda mais rastrear a real capacidade de pagamento. E, sem documentos financeiros consistentes, é um desafio apresentar provas em um processo judicial.
E então surgem perguntas: como calcular a renda real de alguém sem holerite? Como garantir que a pensão seja justa, tanto para quem paga quanto para quem recebe?
A renda variável não apenas complica o cálculo inicial da pensão, mas também influencia nos pedidos de revisão. Um mês pode ser financeiramente bom para um motorista de aplicativo, mas o seguinte pode trazer ganhos baixos, seja por problemas no carro ou por menor demanda. O mesmo acontece com influenciadores que podem fechar grandes campanhas em um mês e ter rendimentos baixos nos meses seguintes. A instabilidade financeira desses profissionais precisa ser levada em conta para evitar injustiças.
Hoje, muitos juízes recorrem a outras formas de medir a capacidade econômica desses trabalhadores, analisando movimentações bancárias, declarações de Imposto de Renda ou dados fornecidos por plataformas digitais. Ainda assim, é um processo que pode ser complexo.
Com o crescimento da economia digital, o sistema jurídico também precisa evoluir. A formalização do trabalho digital, por exemplo, por meio do MEI (Microempreendedor Individual), pode ajudar a simplificar a comprovação de renda. Assim, trabalhadores digitais teriam mais facilidade em apresentar documentos financeiros adequados.
Além disso, a transparência nas informações financeiras é crucial para que as decisões nos processos de pensão sejam justas. Tanto alimentantes quanto alimentandos precisam se comprometer a fornecer documentos completos e precisos, evitando decisões que não reflitam a realidade.
A economia digital trouxe novas oportunidades, mas também desafios para o Direito de Família. A informalidade e a renda variável dificultam a fixação de um valor justo de pensão alimentícia. Para lidar com isso, é fundamental que o sistema jurídico, advogados e partes envolvidas estejam preparados para enfrentar essa nova realidade, garantindo que os direitos sejam respeitados de maneira equitativa.
* CAMILA LAVAQUI GONÇALVES
-Advogada graduada em Direito pela Faculdade de Direito, Universidade Presbiteriana Mackenzie (2019);
-Curso de extensão de Planejamento Sucessório pela Fundação Armando Alvares Penteado (05/2019);
-Curso de extensão de Psicologia Judiciária: o Universo da Lei, o Comportamento Humano e as Emoções pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (06/2019);
-Curso de expansão cultural: A Família no Judiciário pelo Instituto Sedes Sapientiae (06/2019); e
-Pós-Graduação lato sensu em Direito de Família e Sucessões pela Escola Paulista de Direito (2020).
Nota do Editor:
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