1) Conceito
O abandono digital é um conceito
jurídico emergente que se refere à negligência dos pais ou responsáveis em
monitorar e orientar o uso das tecnologias digitais por crianças e
adolescentes. No contexto do Direito de Família, essa omissão pode ser entendida
como uma falha no cumprimento dos deveres parentais, resultando em potenciais
danos ao desenvolvimento físico, emocional e social dos menores.
Apesar do uso da internet ser a maioria das vezes dentro do próprio lar, dando a falsa ilusão de segurança, o uso sem supervisão é comparado a deixar o jovem ou criança sozinho na rua. O abandono digital se manifesta quando os responsáveis não estabelecem limites, não acompanham ou não educam os jovens sobre os riscos e responsabilidades associados ao uso da internet e dispositivos digitais.
2) Autoridade Parental e Deveres dos Pais
Inicialmente é importante frisar que o dever de cuidado com crianças e adolescent4es não se restringe apenas a família, como expõe o art. 227 da Constituição Federal, abrange também a sociedade e Estado. Como os pais que detém o poder de autoridade parental, é esperado que eles exerçam o papel de fiscalização com mais rigor.
A autoridade parental, conforme o Código Civil brasileiro, confere aos pais o dever de cuidar, educar e proteger os filhos menores. No ambiente digital, esses deveres se ampliam para incluir a supervisão do uso da internet, garantindo que as crianças e adolescentes estejam protegidos de conteúdos impróprios e interações perigosas. A jurisprudência brasileira tem reconhecido a importância da atuação dos pais na orientação digital, destacando que a omissão nesse aspecto pode configurar uma violação dos deveres parentais, com possíveis repercussões legais.
3) Supervisão ou Superproteção
A supervisão no uso das tecnologias digitais deve ser equilibrada para evitar a superproteção, que pode limitar o desenvolvimento das habilidades digitais dos menores. Juridicamente, os pais são incentivados a adotar medidas razoáveis de controle e orientação, utilizando ferramentas de controle parental e promovendo o diálogo aberto sobre as experiências digitais dos filhos. Não restam dúvidas de que os pais devem acompanhar o que seus filhos consomem na internet, mas de forma proporcional a cada caso concreto, como idade de cada filho, maturidade, relação de confiança, etc.
É fato que os filhos devem e vão acessar as redes, e que em alguns casos, esse acesso não trará apenas benefícios aos menores, mas também aos pais. Sendo assim, os jovens não são apenas suscetíveis a serem vítimas nas redes, eles podem ser, na autores de crimes cibernéticos, por isso a necessidade de supervisão. A doutrina jurídica enfatiza que a supervisão deve ser proporcional e adequada à idade e maturidade da criança, evitando tanto a negligência quanto a restrição excessiva.
4) A Responsabilidade Civil no Abandono Digital
A responsabilidade civil dos pais
no contexto do abandono digital pode ser acionada quando a negligência em
supervisionar e orientar o uso das tecnologias resulta em danos aos filhos. O
art. 927 prevê que: “Aquele que, por ato ilícito ( arts. 186 e 187 ),
causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. Se usarmos de referência o
abandono afetivo, que já é passível de reparação civil, o abandono digital
também seria apto a reparação.
Mas e a reponsabilidade das empresas de tecnologia? Tem sido um desafio jurídico, tendo em vista que não há no ordenamento jurídico determinação ideal para expor crianças as telas, bem como idade para ingresso nas redes sociais. O Instagram determina ser 13 anos de idade mínima para ingresso na plataforma, mas há muitos jovens com menos idade, dando informação falsa, para ingressar na plataforma. No entanto, ainda não temos uma norma que puna as redes sociais apenas pelo erro de fiscalização de idade dos donos de perfis, assim como crimes cometidos por menores nas redes.
Analogamente, a omissão em proteger os filhos de riscos digitais pode configurar um ato ilícito, gerando a obrigação de reparar danos morais ou materiais sofridos pelos menores. A jurisprudência tem evoluído para reconhecer a importância da proteção digital, destacando casos em que a falta de supervisão resultou em consequências prejudiciais para os menores.
5) Conclusão
O mundo este em constante
mudança, ainda mais o mundo digital, e o Direito precisa acompanhar suas
mudanças, havendo ainda um vácuo legislativo enorme sobre o abandono digital.
O abandono digital representa um desafio significativo no Direito de Família, exigindo uma abordagem jurídica que equilibre a proteção dos menores com a promoção de sua autonomia digital.
A responsabilidade dos pais em educar e supervisionar o uso das tecnologias é fundamental para garantir um ambiente seguro e propício ao desenvolvimento saudável das crianças e adolescentes. A responsabilidade civil no abandono digital reforça a necessidade de uma atuação parental diligente, destacando a importância de políticas públicas e iniciativas educacionais que promovam a conscientização sobre os riscos e responsabilidades no ambiente digital. Assim, o Direito de Família deve continuar a evoluir para abordar as complexidades do mundo digital, assegurando a proteção e o bem-estar dos menores.
Referências bibliográficas
Constituição Federal de 1988;
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) - Lei nº 8.069/1990;Código Civil; e
Revista
IBDFAM – Família e sucessões