sábado, 17 de outubro de 2020

Avaliação em tempos de ensino remoto


 Autora: Cristiane Rosa(*)

Avaliar vem do latim a + valere. Significa atribuir valor e mérito ao objeto em estudo. Portanto, avaliar é atribuir um juízo de valor, aferir e mensurar os conhecimentos adquiridos pelos alunos.

Segundo a LDB (Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional - Lei nº 9.394, de 20/12/1996) a avaliação deve ser contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais.

Na perspectiva dos PCN´s (Parâmetros Curriculares Nacionais) para o primeiro e segundo ciclo do ensino fundamental, avaliação é um conjunto de atuações com a função de alimentar, sustentar e orientar a intervenção pedagógica. Deve acontecer "contínua e sistematicamente por meio da interpretação qualitativa do conhecimento construído pelo aluno" (idem, p. 81). É instrumento que procura conhecer o quanto o aluno se aproxima ou não da expectativa de aprendizagem que o professor tem em determinados momentos da escolaridade, em função da intervenção pedagógica realizada.

A avaliação deve ser aplicada como parte do processo educativo e tem, basicamente, dois objetivos: as avaliações somativas mostram o resultado de um período e as avaliações formativas mostram o que foi assimilado e as lacunas que precisam ser supridas. Para Perrenoud (1999), a efetivação de uma prática avaliativa transformadora deve torná-la formativa. E como classificar os processos avaliativos aplicados nesse ano atípico que vivemos em 2020, no qual as escolas se reinventaram, se atualizaram, ou simplesmente fizeram o que foi possível?

Algumas escolas já adotavam critérios da avaliação educacional diversificado, no qual utilizam vários recursos, estratégias, técnicas, instrumentos e medidas de modo que os resultados, após analisados, pudessem alimentar o planejamento, o acerto de rota e a reconstrução de atividades educativas. A escola que já aplicava essa metodologia em sala de aula, certamente não teve dificuldade para adaptar para esse período de aula remota. Minha opinião pessoal é que crianças matriculadas no ensino fundamental I não tem maturidade para avaliações com questões de múltiplas escolhas e, lamentável a escola que se baseia apenas nesse método, como instrumento de avaliação para, assim, para atribuir um rótulo ou uma nota a esse estudante.

O parecer nº 5/20, do Conselho Nacional de Educação (CNE), homologado dia 29 de maio pelo Ministério da Educação (MEC), aponta para a importância, no retorno das aulas presenciais, da realização de avaliação diagnóstica para identificar o "desenvolvimento em relação aos objetivos de aprendizagem e habilidades que se procurou desenvolver com as atividades pedagógicas não presenciais e construir um programa de recuperação, caso necessário, para que todas as crianças possam desenvolver, de forma plena, o que é esperado de cada uma ao fim de seu respectivo ano letivo". Cabe aos pais e responsáveis cobrar para que essa avaliação diagnóstica aconteça de fato e seu resultado seja tratado de forma a suprir as deficiências identificadas na aprendizagem.

Juliana, aluna do 6º ano de uma escola particular, toma seu banho, almoça e vai para a aula (virtual). Acessa o link e argumenta:

- Mãe a aula de português está com o horário errado e não entra.

A mãe pega o telefone, liga para a escola e é informada que o link correto já foi enviado e Juliana deve tentar novamente fazer o login. Ufa! Entrou.

A professora de português começa explicando sobre os tempos verbais. As crianças interferem a explicação, o dispersas pelos ambientes que veem na tela do computador. Juliana pergunta:

- Raul, que jogo é esse na prateleira do seu quarto?

Raul responde: - É o banco imobiliário.

- Mariana, vamos jogar roblox no intervalo – pergunta Raul.

Enquanto isso... Jorge e Vinicius jogam Dragon Ball Legend durante a aula, utilizando o celular.

E a cada minuto a "pro" de Língua Portuguesa chama a atenção dos alunos e pede que todos mantenham o foco... um desafio e tanto. Imagina avaliar!

A propósito essa semana comemoramos o Dia do Professor! Esse sim, mais do que nunca merece a nossa nota 10!

*Cristiane Rosa



 







-Bacharel em Comunicação Social com habilitação em Relações Públicas pela Universidade de Taubaté-Unitau(1994);
-
Especialista Marketing e Comércio Exterior pelo Instituto Nacional de Pós Graduação -INPG (1997);
-Licenciada em Letras-Português e Inglês pelo Centro Universitário Brás Cubas (2018);
- Especialista em Comunicação e Marketing de Serviços pelo Centro Universitário Brás Cubas (2019);.
-Graduação em Pedagogia pelo Centro Universitário Brás Cubas (2020)
-Atualmente é Embaixadora da Estante Mágica e
Consultora na área de Marketing, Captação e Retenção de Alunos para instituições de ensino

Nota do Editor:

Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

sexta-feira, 16 de outubro de 2020

A Função Social da Defensoria frente à Automação do Atendimento


 Autora: Aline Teles(*)


A pandemia mundial causada pelo Novo Coronavírus, forçou uma adoção de sistemas automatizados, que já se falava que iria acontecer esta automação no futuro. 

Em meio às restrições impostas pelas autoridades, órgãos de atendimento ao público tiveram que migrar para o atendimento eletrônico, entre tais órgãos está a Defensoria Pública do Estado de São Paulo. Sim, falarei especificamente da DPE de São Paulo. O atendimento jurídico da Defensoria Pública está sendo realizado de forma remota, por e-mail, telefone, whatsapp. O atendimento remoto tem sido eficaz para as pessoas que alcançam tal atendimento e o órgão tem feito adaptações cada vez mais precisas para possibilitar que os assistidos sejam atendidos.

Ocorre que, ainda que eficiente e uma ótima ferramenta, o atendimento remoto feito pela Defensoria Pública, por determinação das autoridades, exclui quem mais precisa de tal atendimento. A exclusão digital é evidente no Brasil, e a automação do atendimento da Defensoria Pública não alcança quem tanto precisa da assistência jurídica prestada por tal órgão.

Conforme pesquisa da TIC DOMICÍLIOS, realizada pelo Centro regional e Estudos para Desenvolvimento da Sociedade da Informação (CETIC), em 2019, 74% da população tinha acesso à internet, o que correspondia a 134 milhões de pessoas e 71% dos lares do país. 

Segundo analista da CETIC, se falarmos do nível de indivíduo, pode-se afirmar que o usuário de internet no Brasil é predominantemente urbano, escolaridade maior, principalmente médio e superior; tende a ter idade entre 10 e 45 anos e, sobretudo, são pessoas das classes mais altas, A e B.

Ainda segundo a pesquisa realizada ano passado, a cada cinco pessoas, uma afirma que só consegue acessar a internet através da rede emprestada do vizinho. 

A Defensoria Pública tem como função, prestar assistência jurídica gratuita a pessoas de baixa renda ou em situação de vulnerabilidade social. 

O atendimento remoto nas triagens iniciais pela Defensoria Pública restringe o acesso de parte deste público aos serviços da Defensoria Pública. 

Apesar de todo o suporte, um sistema que define qual o caso do assistido e o encaminhamento para um chat diretamente com Defensores, estagiários e Servidores. Apesar dos inúmeros pontos positivos da automação do atendimento, que permite, inclusive, maior número de atendimentos, é preciso olhar para o público que não possui acesso às ferramentas tecnológicas. Trabalhei por 2 anos na Defensoria Pública do estado de São Paulo, unidade Vila Mimosa na cidade de Campinas/SP, lidei diretamente com atendimento ao público, com a orientação jurídica e posso afirmar que, a maioria do público que a Defensoria assiste não possui amplo acesso a informação. 

Some-se a isso àqueles que, ainda que tenham internet em casa não possuem acesso à mesma de forma plena, isto é, não sabem explorar canais de atendimento, não sabem usar aplicativos. Idosos que não tem nenhum suporte de ninguém para orientar como fazer, pessoas que em sua maioria não sabem lançar mão de tantas ferramentas. 

Outrossim, ainda temos àqueles que não sabem especificar o seu direito, sabem que tem o direito, mas qual a demanda a ser iniciada depende da narrativa fática, que muitas vezes o assistido não sabe expressar, o contato pessoal ajuda para que seja possível ouvir e extrair os elementos constitutivos do direito do assistido. Neste sentido, o sistema automatizado prejudica uma vez que, a primeira etapa é justamente a identificação do problema, se o assistido já possui dificuldade de especificar as coisas pessoalmente em um sistema com predeterminações fica ainda mais difícil. 

Para agravar ainda mais, existem pessoas em situação de rua, por exemplo, tal público não possui infraestrutura, não possui acesso à internet, e não pode ser excluído. 

Felizmente, a Defensoria Pública do Estado de São Paulo entende que deve haver outro canal. Não tenho informações de que há de fato outro tipo de canal de atendimento para situações em que o assistido não consiga ter acesso aos canais virtuais. 

Importante mencionar que não se trata de decisão da Defensoria, apesar das unidades já estarem buscando automação dos sistemas antes da pandemia, o sistema de atendimento remoto foi forçado para preservação da saúde de todos. No entanto, apesar de positiva a forma de atendimento virtual, acredito que é preciso pensar em deixar uma porta aberta para garantir o acesso de todos. 

A realidade é muito complexa, e muitas vezes a assistência que a pessoa busca extrapola as predeterminações do sistema. 

Acredito que exclusão socioeconômica desencadeia a exclusão digital, ao mesmo tempo que a exclusão digital aprofunda a exclusão socioeconômica. 

A inclusão digital deveria ser fruto de uma política pública com destinação orçamentária a fim de que ações promovam a inclusão e equiparação de oportunidades a todos os cidadãos. No entanto, enquanto não temos isso, a Defensoria Pública precisa levar em conta todos os seus potenciais assistidos, àqueles com baixa escolaridade, baixa renda, limitações físicas e etárias, àqueles em situação de vulnerabilidade social.

O atendimento remoto da Defensoria é positivo até certo ponto, e muito embora, todos estejam desempenhando um papel fundamental nesta nova etapa, se não pensar que há pessoas sendo excluídas por não ter acesso aos recursos necessários para atendimento virtual, a Defensoria Pública simplesmente deixa de cumprir a sua função social. SE apenas um assistido deixar de ter acesso aos serviços pela inviabilidade de acesso ao atendimento disponibilizado, a função social do órgão deixa de fazer sentido. Estaremos criando castas, castas determinadas pelo critério da digitalização.

É tempo para refletir alternativas, nem tudo é positivo, ainda que parte do trabalho venha dando grandes resultados. A assistência Jurídica gratuita não pode ficar restrita aos que possuem condições intelectuais ou econômicas de acessar um sistema de atendimento. 

REFERÊNCIAS

https://www1.folha.uol.com.br/poder/2020/09/tecnologia-chega-a-atendimento-juridico-para-pessoas-de-baixa-renda.shtml 

https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1807-17752005000100005

https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/05/cerca-de-70-milhoes-no-brasil-tem-acesso-precario-a-internet-na-pandemia.shtml


ALINE DA SILVA TELES














-Graduada em Direito pela Universidade Paulista (2018);
-Estagiária da Defensoria Pública do Estado de São Paulo;
-Natural de Alagoas, hoje residente e domiciliada em Campinas-SP;
São suas palavras: Como anseio por um Brasil melhor, no sentido político e social, escolhi cursar direito para a partir do judiciário contribuir para que essa melhora deixe de ser utopia.

Nota do Editor:
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quinta-feira, 15 de outubro de 2020

É possível um Direito das Sucessões mais atual?


 Autora: Giselda Hironaka(*)

O perfil do Código Civil promulgado em 2002 não esteve em conexão com o alvorecer do século XXI; ao contrário, refletiu apenas o perfil oitocentista que já qualificava a legislação anterior (1916) baseado nos arcaicos pilares do patrimonialismo, do individualismo, do voluntarismo e do conservadorismo em sede familiar.

Mas a construção doutrinária insistente e a determinação corajosa das decisões judiciais foram os caminhos que o direito encontrou para conseguir, aos poucos, passo a passo, organizar adequadamente a normativa do direito sucessório brasileiro que havia nos chegado, no início deste século, plena de erros, dúvidas e controvérsias.

Assim, por exemplo, poderíamos perguntar o que teria podido justificar e fundamentar o pensamento do legislador brasileiro, ao decidir-se por não incluir o companheiro na seleção dos contemplados na ordem da vocação hereditária? Foi o que aconteceu, pela dicção do infeliz art. 1.790 CC, que nasceu padecendo da "grave doença" da inconstitucionalidade, e que exigiu da sociedade brasileira, mormente a jurídica, anos a fio de gritos para que esta declaração se desse. Apenas em maio de 2017, por força de julgamento do Recurso Extraordinário 878.694-MG, sob a relatoria do Ministro Roberto Barroso.

Assim também, e por exemplo, o legislador brasileiro, ao escolher implantar no direito sucessório brasileiro o instituto da concorrência sucessória, não previu a comum hipótese de o falecido ter deixado descendentes comuns e descendentes exclusivos, com os quais concorram o cônjuge ou o companheiro sobrevivo. Concorrência sucessória com descendência híbrida do falecido, como cunhamos chamar, assunto sobre o qual tanto nos debruçamos, em esforços enormes a partir de difíceis reflexões matemáticas e algébricas que tendessem a encontrar solução para a repartição justa dos quinhões hereditários entre o cônjuge concorrente e a descendência híbrida do autor da herança. Apenas em junho de 2019, o STJ determinou que a solução seria a de não reservar a quarta parte ao cônjuge ou ao companheiro sobrevivos, quando essa concorrência assim se desse. Esta foi a decisão no julgamento do Recurso Especial 1.617.650-RS, sob a relatoria do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino.

Duas grandes conquistas no sentido de esclarecimento e pacificação de tumultuada jurisprudência, ambas situações causadas pela inconsistência legislativa do Código Civil de 2002, mas resolvidas pela corajosa posição de nossas altas Cortes, o nosso STF e o nosso STJ. Seria o suficiente? Francamente, a resposta é não.

Há ainda muito o que se avançar para corrigir o anacronismo da lei, e a indisposição do legislador de observar e analisar a mudança do mundo, da vida e das pessoas que compõem a família. Sem este mais acurado exame, o legislador infraconstitucional não trouxe essas alterações dos fatos sociais familiares e sucessórios para o corpo da codificação.

Este trabalho de matizar contemporaneamente a lei será um trabalho difícil e, às vezes, legislativamente infrutífero.... Provavelmente este trabalho caberá sempre mais à resposta judicial dada aos casos concretos levados às bases dos Tribunais e Cortes, do que exatamente ao próprio Poder Legislativo, como seria de se esperar, certamente...

Com brevidade, desejo mostrar as três situações que ainda merecem a transformação e adaptação da Lei Civil, em matéria sucessória, aos dias atuais, a esta nossa contemporaneidade. 

E assim trago, primeiro, as reflexões a respeito da legítima dos herdeiros necessários: a legítima deve permanecer na lei brasileira tal como está, ou deve ser excluída, tornando ilimitada a liberdade de testar? Ou deve ser mantida, mas com outro perfil mais consentâneo com a realidade, e com outro índice percentual de limitação desta liberdade de testar? 

Trago, também, as reflexões a respeito do tema que não se cala nunca: o companheiro é herdeiro necessário? Vamos nos lembrar que, recentemente tivemos uma excelente oportunidade de encontrar resolvida esta questão, no famoso RE 878.694/MG, sob a relatoria do Ministro Roberto Barroso. Mas, como tão bem sabemos, um dos princípios que rege a atividade decisória do juiz é o princípio da congruência. Foi a adstrição a esse princípio que impediu o Supremo de avançar na discussão do regime sucessório do companheiro, não obstante a provocação do IBDFAM para que Corte se manifestasse acerca da aplicabilidade, às uniões estáveis, do art. 1.845 e de outros dispositivos do Código Civil que conformam o regime sucessório dos cônjuges (EDcl. no RE 878.694/MG). A decisão unânime dos Ministros foi pela rejeição dos embargos de declaração, aduzindo que "não há que se falar em omissão do acórdão embargado por ausência de manifestação com relação ao art. 1.845 ou qualquer outro dispositivo do Código Civil, pois o objeto da repercussão geral reconhecida não os abrangeu. Não houve discussão a respeito da integração do companheiro ao rol de herdeiros necessários, de forma que inexiste omissão a ser sanada" (EDcl. no RE 878.694/MG, STF, relator Ministro Roberto Barroso, dj. 23/10/2018). Acertou o Supremo, mas a questão, infelizmente, permaneceu não resolvida. 

Por derradeiro, ainda registro reflexões a respeito de ser possível, por meio de documento consensual ou por meio de pacto antenupcial, a renúncia antecipada à herança. Seria possível? E assim, teríamos a grande questão: a renúncia antecipada da herança constitui pacto sucessório de sorte a atrair a incidência do art. 426 do Código Civil, para taxá-lo como pacta corvina? A resposta, quer gostemos ou não, é claramente sim. Em tempos de elevado relativismo axiológico e desconsideração (quiçá, desconhecimento) à lei, não se pode simplesmente ignorar um comando legislativo cogente, democraticamente posto e, para todos os efeitos, constitucional. Assim sendo, e sem prejuízo de eventuais propostas de lege ferenda que alterem esse cenário, registro que hoje não é possível a renúncia antecipada da futura herança de uma pessoa ainda viva, por incidência da vedação do art. 426 do Código Civil. 

Como vimos antes, já foram bem significativas as conquistas que obtivemos. Nos dias de hoje, e com olhos postos no futuro, penso que devemos prosseguir em busca soluções para os demais assuntos sobre os quais ainda pendem dúvidas, ou sobre os quais controvérsias se intensificam. Soluções que nos virão, provavelmente, pela via do sempre corajoso Poder Judiciário brasileiro. 

*GISELDA MARIA FERNANDES NOVAES HIRONAKA



















-Advogada graduada pela Faculdade de Direito da USP(1972);
-Professora Titular de Direito Civil da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo – USP;
-Coordenadora Titular do Programa de Mestrado e Doutorado da Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo – FADISP;
-Coordenadora Titular da área de Direito Civil dos cursos de Especialização da Escola Paulista de Direito;
-Fundadora e Diretora Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM;
-Diretora Nacional do Instituto Brasileiro de Direito Civil – IBDCivil e
-Ex Procuradora Federal.

Nota do Editor:

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quarta-feira, 14 de outubro de 2020

A Relação dos Consumidores com Provedores de Serviço de Telefonia e Internet


 Autor: Alceu Albregard Junior(*)

Em 11 de setembro último, o Código de Defesa do Consumidor completou trinta anos de sua publicação e em 11 de março próximo iremos festejar trinta anos da vigência de uma legislação que é reconhecida como uma das mais modernas do mundo em defesa dos consumidores.

Porém, as três décadas de existência do direito consumerista, ainda temos muitos anseios a serem atendidos. Dentre as relações de consumo que a lei do consumidor ainda não conseguiu atingir por completo a sua finalidade destacamos os serviços de telefonia fixa, móvel, internet e TV a cabo.

A redação do artigo 2º do CDC deixa evidente que essas empresas prestadoras de serviço estão, também, sujeitas à norma do CDC:

"Art. 2º. Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final."

Embora não nos pareça haver dúvida, diante da clareza da redação que define como consumidor qualquer pessoa física ou jurídica, e no outro polo, o fornecedor de serviço ou produto, há decisões judiciais que excluem da proteção do CDC algumas relações de consumo, como vemos abaixo:

"Dito isto, verifico que a ré é Operadora de Telefonia e serviços correlatos. A pessoa jurídica, por sua vez, é uma sociedade de advogados. Possível concluir, portanto, que o contrato de prestação de serviços em tela presta-se à consecução dos fins da pessoa jurídica autora, como item de fomento às suas atividades, sendo certo que, sob este ângulo, inexiste relação de consumo a ser tutelada, afastando-se da aplicação das disposições do Código de Defesa do Consumidor."(1)

Decisões como a acima mencionada acabam por ser revistas pelos nossos tribunais, que vêm firmando o entendimento no sentido de que o consumidor, mesmo sendo pessoa jurídica, é hipossuficiente em relação à empresa de telecomunicações, tanto no caráter econômico como na possibilidade de produção de provas em sua defesa e, assim, acabam por determinar a aplicação do CDC nos entraves jurídicos entre as partes.

Devido a algumas particularidades defendidas pelas prestadoras de serviço de que tratamos, apenas a lei de consumo não foi suficiente para regular as relações entre consumidores e essas prestadoras de serviço.

Assim, sendo concessionárias do poder público, essas prestadoras de serviço também se submetem, além do CDC, às normas emanadas pela agência reguladora competente, no caso, a ANATEL.

Pela Resolução nº 632, de 07 de março de 2014, a ANATEL aprovou o Regulamento Geral dos Serviços de Telecomunicações, como norma complementar ao CDC, específica ao setor de telecomunicações, englobando o fornecimento de serviço telefônico fixo, telefonia celular, internet e serviços de televisão por assinatura.

Pela referida norma, a ANATEL buscou fixar princípios básicos na relação de consumo voltada aos serviços de telecomunicações.

De fato, o artigo 5º da referida Resolução diz o seguinte:

"O atendimento aos Consumidores é regido pelos seguintes princípios:

I - confiabilidade, transparência, clareza e segurança das informações;

II - rastreabilidade das demandas;

III - presteza e cortesia;

IV - eficácia; e,

V - racionalização e melhoria contínua."

 Esse artigo da resolução, norteador da relação entre o consumidor e a prestadora de serviços de telecomunicações, busca estabelecer condições para um clima de tranquilidade e segurança na interação entre as partes contratantes.

Essa tranquilidade e segurança é refletida ainda nos artigos seguintes, como vemos:

"Art. 7º Todo atendimento deve receber um número de protocolo a ser informado ao Consumidor.

§ 1º Para fins do disposto no caput, deve ser utilizada sequência numérica única na Prestadora, contendo o ano em sua composição, para possibilitar ao Consumidor o acompanhamento.

 

§ 2º Nas interações originadas pelo Consumidor, o protocolo deve ser informado no início do atendimento.

§ 3º O protocolo deve ser enviado por meio de mensagem de texto ao contato telefônico informado pelo Consumidor ou mensagem eletrônica, em até 24 (vinte e quatro) horas da postulação, contendo data e hora do registro, para todos os serviços abrangidos no presente Regulamento."

Todavia, apesar da existência de toda a regulação, os consumidores das prestadoras de serviços de telecomunicações continuam desamparados.

Basta tentarmos rescindir o contrato com a prestadora, seja parcial, seja na totalidade, para verificarmos que essas empresas não atendem, quer o CDC, quer as resoluções da ANATEL e, mesmo assim, permanecem impunes.

Vejamos o que dizem os artigos 8ª e 9º da Resolução 632 da ANATEL:

Art. 8º As informações solicitadas pelo Consumidor devem ser prestadas imediatamente e suas reclamações resolvidas no prazo máximo de 5 (cinco) dias úteis a partir do seu recebimento.

Art. 9º As solicitações de serviços que não puderem ser efetivadas de imediato devem ser efetivadas em, no máximo, 10 (dez) dias úteis a partir de seu recebimento.

É exatamente nestes artigos que as operadoras sentem conforto para desatender os princípios básicos fixados pelo regulamento. Considerando que os prazos de atendimento pelas operadoras começam a ser contados a partir da data do recebimento da reclamação ou da solicitação, basta que que não forneçam ao consumidor os meios para provar quando, e se, foi feita a reclamação ou a solicitação. Essas empresas não deixam disponível aos consumidores qualquer canal de comunicação que não seja o telefone, e o número de protocolo fornecido "no início" da chamada, está disponível, pelo tempo que a prestadora do serviço entender que deva estar disponível.

Porém, também nesse ponto nossos tribunais vêm firmando entendimento em favor do consumidor.

Em recente decisão o Tribunal de Justiça de São Paulo assim definiu a obrigação de apresentar a gravação do contato entre a operadora e o consumidor:

"Se é assim, competia à ré provar a inexistência de cancelamento na data de 24.8.18, do que ela não se desincumbiu, já que, não só não impugnou a mencionada alegação e diálogo, como não juntou a referida gravação e, repita-se, era seu o ônus desta prova, não só pela inversão do ônus da prova, mas à luz do art. 373, inciso II, do CPC. Deste modo, a conclusão possível é a de que os autores solicitaram o cancelamento em 24.8.18, conforme afirmaram, e que foram indevidamente cobrados, não sendo exigíveis os débitos que a ré a eles imputou, referentes aos meses de outubro e novembro de 2018, provenientes do contrato nº 33243434490."(2)

REFERÊNCIAS

1. Processo nº 1124833-40.2018.8.26.0100;

2. Acórdão nº 2020.0000791899 - 29ª Câmara de Direito privado do TJ/SP - Relatora Des. Sílvia Rocha.

*ALCEU ALBREGARD JUNIOR










-Graduação em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie(1985);
-Atua principalmente nas áreas dos Direitos Tributário,Imobiliário e Consumidor.
Contato: alceu.adv@albregard.com.br
Nota do Editor:
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terça-feira, 13 de outubro de 2020

Diferenças entre Homicídio Doloso e Culposo


 Autor: Raphael Werneck(*)

Mais uma vez venho escrever um pequeno artigo para essa seção do blog que administro.

Esse, no entanto, ao contrário dos outros que já escrevi não versará sobre um tema tributário, que é a área de minha especialização,  e sim  sobre uma tema de uma das áreas do Direito que mais gostava quando estava nos bancos acadêmicos da minha velha e querida Faculdade de Direito da USP. Escreverei hoje esse pequeno artigo sobre Direito Penal em homenagem a meu avô  Raphael Corrêa de Sampaio que,  como professor das Arcadas, lecionou essa matéria anteriormente denominada Direito Judiciário Penal  de 1911 a 1937.

O tema escolhido é o Homicídio (do latim hominis excidium) e que é  o ato de uma pessoa matar outra.

Previsto no art. 121 do Código Penal DECRETO-LEI No 2.848, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1940) o homicídio é um dos crimes contra a vida,  que conforme as circunstâncias atenuantes ou agravantes poderá acarretar ao seu autor uma pena que variará entre 6 e 30 anos.

O homicídio pode ser subdivido em diversas espécies e entre estas  podemos citar a do feminicídio (homicídio contra a mulher) e a do infanticídio (homicídio contra a criança). Em outras oportunidades focarei nestas modalidades.

No presente artigo, o foco a ser dado será a intenção ou não de seu agente que fará com  que o seu crime seja considerado doloso ou culposo.

Dizemos que estamos diante de um homicídio doloso quando o assassino comete o crime com intenção ou dolo. Este dolo pode ser direto se o crime foi praticado com a intenção de matar e indireto se o assassino não tinha intenção, mas por exemplo , organizou um evento que causou a morte da vítima.

As punições previstas no Código Penal em relação a essa modalidade de homicídio variam de 6 a 20 anos em regime semiaberto ou fechado no caso de um homicídio simples assim considerado aquele praticado por quem dirigiu bêbado e atropelou alguém e de 12 a 30 anos em regime exclusivamente fechado, se o homicídio foi praticado por uma qualificadora, como por exemplo, matar por veneno ou fogo ou ainda por motivo torpe como ocorre quando o crime é cometido por racismo ou vingança.

Já o crime de homicídio é considerado culposo quando o mesmo  é praticado por negligência, imprudência ou imperícia.  Nessa modalidade a  pena que será aplicada será de detenção de 1 a 3 anos.

O homicídio como vimos é um crime que ainda pode e muito  ser explorado e prometo-lhes que surgindo a oportunidade voltarei a fazê-lo.

*RAPHAEL SAMPAIO WERNECK





  








-Advogado graduado pela Faculdade de Direito da USP(1973);
- Consultor tributário;
- Atualmente Analista Editorial e
-Administrador do O Blog do Werneck


Nota do Editor:

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segunda-feira, 12 de outubro de 2020

Atlas velho


 Autor: Edson Alves Domingues(*)

Costumo assistir um programa na TV, que mostram lugares do Brasil, e do mundo, pelos olhos de um pássaro, voando, e desde cedo sou apaixonado por geografia. Em quase todos os programas, tenho a curiosidade de acompanhar os roteiros através dos mapas das regiões visitadas, como viajando por terra aquilo que vejo pelo alto. Vejo a região em que se localizam, as estradas, os rios e praias que permeiam essas viagens. Faço isto com um Atlas geográfico que tenho, há algum tempo. 

Notei que os mapas que utilizava eram do ano de 2005, mais ou menos, e cheio de intenções, me comprometi a atualizar e adquirir um mais novo, que desse informações novas, afinal as estradas foram duplicadas, novas construídas. 

Fui a uma das livrarias mais famosas e maiores para dar cumprimento à minha promessa, e qual não foi a minha surpresa, quando o vendedor me informou que os que ainda existiam estavam em prateleiras mais baixas, onde eu quase tinha de sentar no chão para pega-las, e disse ainda que não eram mais impressos, pois os aplicativos de celular, e a busca na rede era muito mais preciso e exato, e a procura era muito baixa. 

Frustrado, fui embora, refletindo sobre a tecnologia que nos acompanha hoje, que facilita bastante as informações, e os caminhos que outrora eu fazia procurando em mapas, cheio de dobras e que muitas vezes tinha de parar o carro em um posto para procurar o destino, agora em alguns cliques, eu consigo. 

Um GPS, ou o Waze, me dão todo o trajeto sem ter grandes preocupações, basta clicar o endereço, e lá estará uma moça a me indicar o caminho que deva tomar, a hora provável de chegada ao destino, e nem preciso conhecer o caminho, basta seguir as ordens. 

Eu, que adorava viajar, olhar as boiadas que permeavam o caminho, buscar estradas alternativas, que me dariam a paisagem mais bonita, olhar as árvores frutíferas à beira da estrada, e até fazer um breve lanche à sombra de árvores, ou ainda entrar numa cidade qualquer no caminho, estava agora sob as ordens da máquina que me facilitava o caminho. 

Tomei consciência de que a tecnologia privilegia e facilita enormemente os destinos que queremos chegar, mas nesses anos de vida, tenho aprendido que o nosso destino final já sabemos, só não quando ele ocorrerá, mas que o importante mesmo é o caminho que percorremos, e que definem a nossa história. 

Fiquei com o Atlas velho mesmo!

*EDSON ALVES DOMINGUES











-Psicólogo formado pela Universidade de Guarulhos – 1977;
-Especializado em Psicodrama, com titulação em Terapeuta, Terapeuta de Alunos, Professor e Supervisor pela Federação Brasileira de Psicodrama; 
-Especializado em Terapia de Casais e Família pelo Instituto Bauruense de Psicodrama e
-Psicólogo Clínico, por 20 anos. 

Nota do Editor:

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domingo, 11 de outubro de 2020

Estamos em mudança


 Autora: Tatiana H. Abdo(*)



Pois é... "estou de mudança".  Mas... e não é  que estamos sempre de mudança? Interna ou externa. Às vezes somos nós que queremos, às vezes algo de fora nos força a mudar.

O fato é  que estamos sempre de mudança e tudo ao nosso redor também está sempre em transformação.

Então por que é  que por vezes mudar assusta tanto? Acho que estamos falando do desconhecido, daquilo que nos surpreende e que temos que ser criativos para lidar.

Criativos porque o novo demanda respostas diferentes, sair da zona de conforto.

Toda vez que buscamos algo novo nos deparamos com dificuldades e desafios. E não é  lindo isso? Estar vivo é  sempre uma busca, buscar sermos cada vez mais nós mesmos.

Desde a nossa concepção já estamos de mudança. Nosso corpo, nosso ambiente. O tempo passa e as coisas mudam. Nós mudamos. Mas então por que  é  que mudar assusta tanto, se lidamos com isso desde o nosso primeiro sopro de vida?

Isso me faz lembrar do tal mito da caverna..  Sinto como se tivesse uma caverna dentro da outra e viver fosse seguir se despreendendo de cada uma delas. Um infinito de desconhecidos prontos para serem enfrentados.

Dá medo e às vezes até paralisa, mas quando conseguimos sair e olhamos pra trás, é  tão bom perceber que vencemos e que estamos mais fortes para o próximo desconhecido.

Outro dia, em uma conversa  sobre as fases da vida, acabamos falando sobre o Mário, videogame da minha época. Parecia ter infinitas fases, mas  vencer cada uma delas gerava um êxtase imenso.  Mal sabia, mas já estava aprendendo sobre vencer os desafios da vida.

Algumas mudanças são mais marcantes e exigem mais de nós, mas por mais difíceis que sejam, são as que escrevem as melhores histórias, que deixam marcas na memória. Como por exemplo mudar para uma casa sem mobília no meio de uma pandemia... não me parece agradável, mas sei que o tempo vai me fazer rir disso ainda..  “lembra quando sua casa não tinha onde sentar?” é... muitas risadas ainda vão rolar desse momento. Aliás, posso dizer que já rolaram.

Saindo um pouco da minha bolha pessoal, estamos vivendo uma época de muitas mudança e incertezas, momento esse em que temos que nos desafiar, ousar e usar ao máximo da nossa capacidade criativa para transpor as dificuldades e os medos desses dias.

Não é  fácil, mas vai passar. E tenho certeza que cada um de nós terá  muitas histórias para contar da época em que o mundo parou. As máscaras coloridas, as “lives" em casa, os cursos online, o sol na janela, o cozinhar inventado.

Se reparar bem, não há nada de novo, apenas ressignificado e direcionado às necessidades da vida adulta.  Talvez seja a hora de deixar a nossa voz interna ativa, lembrar e dar espaço à nossa criança interior, que usava o tempo pra pintar, atuar com os coleguinhas, dar aula para os bichinhos de pelúcia , olhar para o céu e ver coisas nas formas das nuvens, fazer biscoitos em família.

Seja como for, que tenhamos coragem  para enfrentar o que há lá fora e que encontremos sempre um lugar onde possamos ser cada vez mais quem somos.

*TATIANA H.ABDO -CRP 06/87427




 

 







- Graduada  em Psicologia pela PUC-SP (2006), 

 Graduada em Música pela EMESP 

 -Pós-graduada em Psicodrama.

- Durante sua trajetória, trabalhou na área da saúde em instituições como Hospital das Clínicas, CAPS e NASF; na área de recursos humanos como Consultora em assessment e R&S de executivos e no terceiro setor com orientação vocacional.

-Atendimentos apenas ONLINE (enquanto durar a pandemia)

- Além de articulista neste Blog, possui um site onde explora outros temas relacionados à psicologia. (www.tatianaabdo.wix.com/psicologia)

Contato: (11) 99974-9694 / tatiana.abdo@hotmail.com / @tatianaabdo.psicologia

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