sábado, 9 de maio de 2020

O Estudo da Música em tempos de Pandemia


Autor: Carlos Soares(*)



O presente texto apresenta algumas reflexões sobre a prática musical e seus benefícios em tempos de pandemia. Em função da epidemia de coronavírus, o mundo entrou em uma verdadeira distopia. Mudanças radicais, profundas e demasiado rápidas já deixam rastros significativos em nossa sociedade. Em função das diversas modalidades de distanciamento social, grande parte da população necessitou, forçosamente e a contragosto, e muitas vezes com consequências financeiras catastróficas, voltar-se para a própria casa.

Nesse cenário, há de se imaginar que a ansiedade e o stress decorrentes serão contundentes. O enclausuramento, muitas vezes com crianças, por longos períodos; o espirro que se transforma em medo de contaminação; a preocupação demasiada (e cabida) com os entes queridos em grupo de risco; o olhar desconfiado das pessoas, muitas vezes destacados pelo uso de máscaras, no supermercado ou farmácia, que nos detecta como possíveis (e tão somente) vetores de contágio. Isso sem falar da carga psicológica das notícias e números arrebatadores das vítimas e cadáveres empilhados pelo mundo, inclusive naqueles países considerados elite mundial que afetam a psiquê das pessoas de forma considerável.

É neste contexto, brevemente resumido acima, que divido com os leitores minha experiência com música nos tempos de pandemia e dou algumas orientações quanto aos benefícios das atividades musicais.

 Comecei com o estudo da música, mais especificamente do violão, aos doze anos. Tocar desde então tornou-se uma espécie de necessidade física e mental. Uma válvula para a necessidade de expressão e, ao mesmo tempo, um ritual de concentração e exercício que mais tarde associei, entre inúmeras esferas, à meditação. A prática e o estudo da música passaram a fazer parte do meu cotidiano até então. Durante mais de 20 anos, concomitante a minha formação acadêmica, dei aulas de violão e toquei profissionalmente. Fiz graduação, mestrado e doutorado em composição musical na UFRGS, em Porto alegre, Assim como ingressei como docente na Universidade Federal de Pelotas.


Com a suspensão das aulas presenciais e as atividades administrativas que faço parte restritas a diversas reuniões à distância, precisei, como muitas pessoas, reorganizar o tempo e minha relação com a casa. No tempo que sobra, tenho me dedicado, fora às questões acadêmicas (preparação de aulas em modalidades virtuais, leituras relacionadas, desenvolvimento de materiais e reuniões), e alguns cursos em EAD de áreas diversas, a três atividades musicais regulares: o estudo de solfejo; o estudo do violoncelo e algumas dicas de violão para minha namorada. Estudar solfejo (ou ritmo, ou percepção) - é um interesse particular onde busco sanar algumas lacunas de formação - e estudar um instrumento é prática corriqueira e cotidiana na vida de qualquer músico e professor.


Porque cito as aulas de violão que estou dando para minha namorada? Creio que ela tenha um perfil que pode ser compatível com inúmeras pessoas, de diversas faixas etárias, etnias, condições financeiras que se beneficiariam com as práticas de um instrumento nesses tempos de pandemia e distanciamento social. Ela estudou violão com alguns professores durante a adolescência por períodos de tempo variados, mas estava há vários anos sem ter contato algum com o instrumento. Meses atrás, passei alguns exercícios para ela estudar em casa. Como vi que ela estava se dedicando e aproveitando as aulas, forneci novos materiais semanalmente. Quando fomos pegos pela pandemia, pude observar o quanto o instrumento foi benéfico para ela, pois propiciou momentos de imersão total em uma prática nova.

Como o setor da economia cultural é um dos mais afetados economicamente pela crise infectológica, aconselharia a qualquer pessoa que quisesse começar o estudo de um instrumento que realizasse aulas on line com algum professor de confiança. Essa modalidade já é bem comum e aceita no ensino dos instrumentos. Vários professores, inclusive, estão se especializando na prática. A orientação de um bom profissional é importante por questões metodológicas, que se manifestam em quatro etapas: elaboração de um percurso de ensino individualizado; correção de problemas posturais e feedbacks constantes; a correção de percurso de acordo com as respostas do aluno; e a desconstrução de alguns mitos e preconceitos musicais.

Para cada aluno, dependendo da faixa etária, do tipo de interesse estético, o profissional deve estabelecer percursos viáveis de aprendizado. Equívocos no estabelecimento de percurso podem gerar resultados desastrosos na autoestima do indivíduo, que, na maioria das vezes, vai associar suas dificuldades com "falta de talento" e "incompetência" pessoais e não com problemas metodológicos do professor. 

Cabe ao professor, por meio de observação criteriosa evitar que o aluno adquira vícios posturais, comuns entre os iniciantes, e facilmente corrigidos nos períodos iniciais de aprendizagem. Cabe também ao professor, diante da observação constante da evolução e dos sinais de estímulo do aluno, estabelecer correções de percurso para otimizar os níveis de aprendizagem. 

Por último, a prática musical é cheia de mitos e preconceitos que acabam atrapalhando a compreensão do aluno. Cabe ao professor elucidar e desmistificar para o aluno questões como talento, virtuosismo, genialidade, sucesso, etc.. Passei por essa experiência de ficar alguns anos sem professor de violoncelo e percebi, quando retomei as aulas, o quanto a orientação é fundamental. Perdi, com certeza, tempo valioso e uma evolução maior no meu estudo por não ter feedback externo e ajuda em definir um percurso viável de aprendizado. Mesmo com minha experiência musical.

Em não havendo condições financeiras para começar o estudo de um instrumento, o que é bastante explicável em momentos de crise, a segunda opção é procurar o aprendizado on line. Muito comum entre alguns jovens hoje em dia, esse procedimento, dependendo das aptidões naturais do indivíduo, pode dar frutos. Embora, sem sombra de dúvidas, o caminho seja mais árduo e demorado.


O estudante não tem, geralmente, a percepção de que o ensino de um instrumento é um processo físico/motor e mental que necessita ser trilhado aos poucos. Ele não percebe que o nível de dificuldade deve ser progressivo e interrompido por diversas "voltas" e revisões. Falta para a maioria dos alunos a consciência de que os resultados virão lentamente com disciplina e tempo. A sonoridade, por exemplo, é um conceito que o aluno pode desenvolver erroneamente a partir da audição dos grandes músicos e bandas. A tendência é que o aluno comece com o instrumento achando que vai instantaneamente reproduzir a sonoridade de seus músicos prediletos. No entanto, no mundo real, a sonoridade é construída com prática e tempo. Desconhecer essas peculiaridades do ensino pode gerar no aluno a sensação de que ele não tem aptidão ou talento.


Diversos são os benefícios do ensino da música e do instrumento para o ser humano. Apontarei agora alguns deles: aumento na capacidade de memorização; aumento da auto disciplina e paciência; desenvolvimento da coordenação motora; redução do estresse; promove o conhecimento de diversas culturas; fortalece a concentração. Existem diversos estudos que investigam os benefícios das atividades musicais e suas consequências que encorajo o leitor a pesquisar.

            


Por fim, deixo algumas dicas de estudo:

1. De preferência, toque em um local sossegado e longe dos barulhos (e ouvidos) da casa; 

2. Tenha consciência de que seu som não será agradável nos primeiros tempos de estudo. Isso não significa que você é um mal instrumentista, pelo contrário, o resultado sonoro certamente é o melhor possível em seu nível; 

3. Esclareça a seus familiares o ítem 2. Muitas vezes, por não entender de música, as pessoas próximas desencorajam os alunos, realizando críticas infundadas. 

4. Toque TODO o dia. Mesmo que seja por pouco tempo. 

5. Procure tocar com a máxima concentração. Quando passamos a pensar em outras coisas, é tempo de parar e trocar de atividade; 

6. Ouça diversos músicos, de diversos instrumentos, gêneros e estilos. Construa um conhecimento musical amplo; 

7. Tente entender as manifestações musicais sem preconceitos e evitando as palavras: gosto e não gosto; bom e ruim e esses conceitos binários; pense nas características da música; 

8. Tente, na medida do possível, estudar, simultâneo ao instrumento, teoria musical e percepção;


Meu orientador, professor Antônio Carlos Borges Cunha, dizia que os momentos de crise são oportunidades para crescimento e aperfeiçoamento. Suas palavras encontram nos dias de hoje repercussões amplificadas em mim. Espero que os leitores aproveitem as dicas e que saiam desse momento de crise (que passará, com certeza) modificados, mais sensíveis e mais musicais. 

Bom estudo!!

*CARLOS WALTER SOARES















-Doutor em Música, com habilitação em Composição Musical, e 
-Professor Adjunto da Universidade Federal de Pelotas.

Nota do Editor:

Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

sexta-feira, 8 de maio de 2020

A Casa e a Rua


Autora: Aline Teles(*)


Inicialmente esclareço que vou utilizar-me deste espaço e deste texto para trazer à baila a importância da obra "A casa e a Rua: espaço, cidadania, mulher e morte no Brasil" de Roberto DaMatta. O texto será inteiramente destinado a falar sobre o ponto de vista do autor na obra, com intuito de fazermos refletir sobre nosso comportamento na sociedade brasileira.

A Casa & a Rua é um livro essencial para compreender a sociedade brasileira e sua intrincada rede de relações. A ideia central do estudo é que, no Brasil, a casa e a rua não representam apenas espaços geográficos, mas são, acima de tudo, o que DaMatta chama de entidades morais, esferas de ação social.

O mesmo autor do clássico livro "o que faz o brasil, Brasil?", Em seu livro sobre A casa e a rua, o antropólogo Roberto DaMatta, esmiúça o caráter dual e paradoxal da sociedade brasileira, com uma lógica servindo para as relações privadas – casa – e outra lógica bem distinta orientando as relações públicas – a rua.

Nas palavras do próprio antropólogo:
Quando digo então que "casa" e "rua" são categorias sociológicas para os brasileiros, estou afirmando que, entre nós, estas palavras não designam simplesmente espaços geográficos ou coisas físicas comensuráveis, mas acima de tudo entidades morais, esferas de ação social, províncias éticas dotadas de positividade, domínios culturais institucionalizados e, por causa disso, capazes de despertar emoções, reações, leis, orações, músicas e imagens esteticamente emolduradas e inspiradas.

DaMatta nos deixa lições claras já no início do livro quanto escreve uma carta ao seu leitor e dela que farei maior parte das menções deste texto, uma vez que, o momento é oportuno.

Estamos vivenciando um momento de pandemia, é inevitável que ao escrevermos sobre qualquer tema não façamos menção ao Corona Vírus (COVID-19), para muitos é um momento único na sua história, para a maioria é momento único na história mundial. Cancelamento de grandes eventos musicais, esportivos e políticos.

O cenário é crítico, seja qual for a sua posição, reconhecer que o cenário é extremamente delicado é uma questão de caráter, eu diria. Ainda que você defenda soluções/medidas distintas de outros, não dá p\ara tratar a questão com desdém como tem feito alguns líderes políticos, inclusive, o Presidente da República Federativa do Brasil.

Dedicarei algumas linhas para falar sobre o nosso Chefe do poder Executivo, que eu apoiei em detrimento de outros na eleição de 2018. No entanto, não acredito que é possível concordar 100% com as ações do governo, dele ou de qualquer outro. Me chamarão de "isentona" ou talvez de comunista, não tem problema, só acredito que o Presidente falha em não esquecer a campanha e focar em exercer o cargo para o qual já foi eleito. A forma como o governo tem lidado com a pandemia deixa explícito a seita mitológica bolsonariana, como bem escreveu Vinicius Lima, estudante de jornalismo na UNICARIOCA, que tem acompanhado, inclusive, a situação da Argentina, país em que residiu durante toda a sua adolescência.

O jornalista em formação escreveu que:
"Um governo que se baseia em narrativa e permanece no processo eleitoral desde 2014, quando começou a organizar-se em campanha para candidatar-se a presidente em 2018. Muita narrativa eleitoral e muito desgoverno, assim é o governo de Bolsonaro até aqui. Além disso, promove um discurso absolutista-autoritário-uno. Baseado tão somente em seu personagem e seus apoiadores fanatizados. A imprensa mente, o Mandetta (ex-ministro da saúde) é egocêntrico, quer aparecer, o Rodrigo Maia (presidente da câmara) é golpista, o Moro é traidor e qualquer crítico às posturas bolsonaristas faz parte da "ova esquerda"

E é exatamente o que penso atualmente, como já escrevi anteriormente, lulismo e bolsonarismo são as duas faces de uma mesma moeda. Para complementar, o estudante de jornalismo também faz menção à isso, só que de forma mais contudente: "Se no período petista qualquer que se opusesse ao governo era fascista, no atual governo, os que o criticam são esquerdistas, socialistas, comunistas. No fim das contas,s o bolsonarismo tornou-se (ou sempre foi) um lulopetismo às avessas."

Finalizo aqui as opiniões quanto ao governo atual na pessoa de Jair Messias Bolsonaro e retorno ao tema central do texto, que é tentar nos fazer pensar sobre quem somos na sociedade brasileira e, por consequência, nos fazer refletir quem somos nessa crise, que se tornou uma tríplice crise – econômica, saúde e política.

A mensagem que extraí do livro mencionado anteriormente é que nós, brasileiros, temos visão egoísta, só pensamos naquilo que pode nos atingir, apesar da enorme fama de povo solidário, será que somos bem assim?

É possível observarmos que, em meio a uma Pandemia que atinge números cada vez mais alarmantes a gente pense apenas no que está nos atingindo, se ninguém na nossa casa foi infectado eu não preciso ficar em casa, até que alguém da minha família morra, aí sim é importante.

Doutro ponto, é possível observar aqueles que não precisam se preocupar com subsistência clamando para que se mantenham fechados os comércios, afinal eu não passarei por nenhuma necessidade mesmo, até que eu venha a passar e aí sim é uma questão importante.

Quem é você em tempo de pandemia?

Roberto DaMatta sintetiza bem nosso comportamento para com o outro – a rua e o nosso sentimento para com os nossos – a casa. Neste contexto utilizarei as palavras do próprio autor sobre o assunto.
"é possível "ler" o Brasil de um ponto de vista da casa, da perspectiva da rua e do ângulo do outro mundo. E mais: essas possibilidades estão institucionalizadas entre nós. Não se trata de uma mera variação empírica, dessas que ocorrem na Inglaterra, Espanha ou Pasárgada. Não! Trata-se de uma variação sistemática, previsível e legitimada, que todos os brasileiros adultos aprenderam e serão capazes de prever com razoável precisão. Leituras pelo ângulo da casa ressaltam a pessoa. São discursos arrematadores de processos ou situações. Sua intensidade emocional é alta. Aqui, a emoção é englobadora, confundindo-se com o espaço social que está de acordo com ela. Nesses contextos, todos podem ter sido adversários ou até mesmo inimigos, mas o discurso indica que também são "irmãos" porque pertencem a uma mesma pátria ou instituição social. Leituras pelo ângulo da rua são discursos muito mais rígidos e instauradores de novos processos sociais. É o idioma do decreto, da letra dura da lei, da emoção disciplinada que, por isso mesmo, permite a exclusão, a cassação, o banimento, a condenação. Já as leituras pelo prisma do outro mundo são falas inteiramente relativizadoras e muito mais inclusivas, onde as misérias do mundo são criticamente apontadas. Seu tirocínio é que há um outro lugar e uma outra lógica, que nos condena a todos a uma igualdade perante forças maiores do que nós."

É importante ressaltar que, DaMatta não previa o cenário atual, nem com relação à saúde, nem político, tampouco, econômico, mas já fazia menção ao comportamento social brasileiro, à dualidade política e a necessidade de mudança.

Seguinte este raciocínio, Roberto DaMatta escreve que:
"O resultado disso é um sistema de classificação diferenciado e, naturalmente, complementar, que sempre foi percebido e interpretado como “incompleto”, "inacabado", "incongruente" ou "imaturo", como se estivesse a meio caminho e indeciso entre várias tendências históricas. Mas o que temos, realmente, é um sistema que apresenta três modos diferenciados e complementares de "ordenar" e também de reconstruir e construir (ou inventar) a experiência social brasileira. Assim, sabemos que em casa podemos fazer coisas que são condenadas na rua, como exigir atenção para a nossa presença e opinião, querer um lugar determinado e permanente na hierarquia da família e requerer um espaço a que temos direito inalienável e perpétuo. Em casa somos todos, conforme tenho dito, "supercidadãos". Mas e na rua? Bem, aqui passamos sempre por indivíduos anônimos e desgarrados, somos quase sempre maltratados pelas chamadas "autoridades" e não temos nem paz, nem voz. Somos rigorosamente "subcidadãos" e não será exagerado observar que, por causa disso, nosso comportamento na rua (e nas coisas públicas que ela necessariamente encerra) é igualmente negativo. Jogamos o lixo para fora de nossa calçada, portas e janelas; não obedecemos às regras de trânsito, somos até mesmo capazes de depredar a coisa comum, utilizando aquele célebre e não analisado argumento segundo o qual tudo que fica fora de nossa casa é um "problema do governo"! Na rua a vergonha da desordem não é mais nossa, mas do Estado. Limpamos ritualmente a casa e sujamos a rua sem cerimônia ou pejo... Não somos efetivamente capazes de projetar a casa na rua de modo sistemático e coerente, a não ser quando recriamos no espaço público o mesmo ambiente caseiro e familiar."

Frise-se, "Na rua a vergonha da desordem não é mais nossa, mas do Estado". Esta ideia parece que ecoa na cabeça de todo brasileiro, ainda que neguemos, aqui ou ali a gente acredita nisso de fato. Tal ideia nos faz terceirizar nossas responsabilidades com o país de modo que qualquer mal que venha ocorrer não é responsabilidade nossa até que chegue à nossa casa. Mas o que faz o brasil, Brasil? Não somos nós?!

Não sou capaz de discordar do grande autor Roberto DaMatta quando ele menciona que aparecem claramente duas linhas bem marcadas da reflexão brasileira sobre o Brasil. Há uma produção onde o Brasil é visto como uma sociedade formada e, na sua raiz, dominada por famílias patriarcais, feudais e escravocratas, lutando entre si pelo poder político numa espécie de universo social hobbesiano, posto que vazio de instituições e valores. E uma outra produção que, ao contrário, está muito mais preocupada em demonstrar quase que o justo oposto.

O problema de todo esse exagero tem sido interpretado como decorrência de posturas políticas. A visão da casa e da família seria de "direita"; a perspectiva da economia e das classes sociais, de "esquerda". O que não é bem assim.

Por fim, para fecharmos a reflexão é preciso entender que o ponto de vista dualístico é problemático, é totalmente possível juntar a família com a classe social, a religiosidade popular com a economia capitalista, a lealdade aos amigos com a lealdade ideológica.

É totalmente possível, na minha opinião, pensarmos em medidas menos drásticas para todos durante uma pandemia e pensarmos em soluções menos impactante para a economia, pensando no melhor para nossa casa, o Brasil.

"se mesmo assim tudo lhe for desagradável, se considerar a casa mal construída, se o café estiver frio e fraco e a cerveja muito quente, se tudo – enfim – lhe parecer errado ou ruim, então eu só lhe peço que se lembre de uma coisa: a casa, afinal de contas, é brasileira. Nela, se há regras para o anfitrião, há também normas para a visita. E que até mesmo quando não se gosta, se pode dizer isso educada e generosamente".
 Roberto Damatta

REFERÊNCIAS

DAMATTA, R. (1997). A casa e a rua: Espaço, cidadania, mulher e morte no Brasil. Rocco.
LIMA, V. (27 de ABRIL de 2020). ideas ilexicas. Fonte: medium.com: https://medium.com/@ideiasillexicas/coronav%C3%ADrus-evidencia-seita-mitol%C3%B3gica-bolsonariana-93106491c351

*ALINE DA SILVA TELES














- Advogada graduada em Direito pela Universidade Paulista (2018);
-Estagiária da Defensoria Pública do Estado de São Paulo;
-Natural de Alagoas, hoje residente e domiciliada em Campinas-SP;
São suas palavras: Como anseio por um Brasil melhor, no sentido político e social, escolhi cursar direito para a partir do judiciário contribuir para que essa melhora deixe de ser utopia.

Nota do Editor:
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quinta-feira, 7 de maio de 2020

Alimentos em Época de Quarentena


Autora: Sabrina Blaustein Regino de Mello(*)


Em 31 de dezembro de 2019 o mundo enfrenta um vírus vindo da China, que causa complicações respiratórias (Covid-19), e a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou no dia 11/03/2020 a pandemia de Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus (Sars-Cov-2). 

O primeiro caso no Brasil surgiu em 26/02/2020, a confirmação também era a primeira da doença na América Latina. 

Já em 11/03/2020 as aulas e serviços foram suspensos, e o Distrito Federal foi a primeira unidade da federação a estabelecer medidas de distanciamento social. O mesmo aconteceu nos dias seguintes em estados como São Paulo, em 16 de março, e, a partir daí os demais estados também passaram a tomar medidas de quarentena. 

Diante do quadro instalado de pandemia mundial, numa situação caótica as pessoas tem suas preocupações aumentadas e em especial sobre a questão econômica do País, sendo que muitas empresas dispensaram seus colaboradores, além de empresários e comerciantes que fecharam suas portas. 

A situação é extrema, havendo grande mudança econômica mundial, no entanto, enquanto o filho se encontra sob o poder familiar, os pais não devem alimentos, o dever é de sustento, que é uma obrigação constitucional (CF 229), a qual determina que os pais tem o dever de assistir, criar e educar os filhos menores. Deveres inerentes ao poder familiar (CC 1634 e ECA 22), sustento, guarda e educação. 

Nesse contexto a crise econômica gerada pelo novo Covid-19 já reflete nos pedidos de revisão de pensão alimentícia na justiça, que corre o risco de não ser solvida durante o período de quarentena. 

A lei consagra o princípio da proporcionalidade ao estabelecer que a fixação de alimentos deve atentar as necessidades do alimentado e as possibilidades do alimentante a prestá-los (CC 1694, §1o), tal exigência desse parâmetro é que permite a revisão dos alimentos, caso haja alteração em um dos vértices desse binômio, a qualquer tempo, é possível rever o valor do encargo (CC 1699).

Sendo assim não é possível simplesmente deixar ou diminuir a parcela alimentar, tendo em vista que para qualquer alteração é necessário uma decisão judicial. A simples comunicação feita pelo devedor expondo suas dificuldades financeiras não produz qualquer efeito jurídico. 

Apesar da pandemia com paralisações de atividades o vírus não trouxe nenhuma regra que suspende o pagamento dos alimentos ou que impeça a sua tutela jurisdicional. 

O nosso ordenamento jurídico deve evitar comportamentos oportunistas em ações revisionais de pensão alimentícia durante o período pandêmico causado pelo Covid-19, devendo para qualquer diminuição a prova da mudança financeira do devedor, e considerar que sua redução deve ser como a pandemia temporária. 

A desobediência ao pagamento de alimentos, seja pela diminuição ou por sua falta de pagamento, sem que haja respaldo judicial poderá resultar numa cobrança de alimentos judicial. 

Mesmo que seja requerido em juízo a revisão de alimentos em virtude da pandemia, é necessário provar que a renda foi afetada, provando que houve uma diminuição na renda do devedor e que ela não é suficiente para arcar com o pagamento integral da pensão, não pode ser operada com base na mera alegação da pandemia por Covid-19. 

E no caso de ser deferida a diminuição dos alimentos, é importante se atentar se a mudança é temporária ou se perdurará no tempo, tendo em vista que a pandemia é transitória, e não perdurará no tempo, terá fim. 

A situação vivida é algo inédito no Brasil, no entanto os pais devem lembrar que as verbas alimentares dos filhos devem ser pagas, tendo em vista que se trata de uma obrigação vinculada à sobrevivência dos que necessitam, abrangendo não só alimentos, mas também educação e saúde dos filhos. 

Priorizar a vida e a integridade física, lembrando que o pagamento da pensão alimentícia é essencial para a manutenção dessas duas condições básicas do ser humano, que são direitos fundamentais, sendo assim não podem ser suspensos, ou reduzidos sem que se tenha a mais completa avaliação de fundamentos e provas. 

Sendo assim, o que dever imperar é o bom senso, em prol da saúde, segurança e proteção aos direitos dos que necessitam de alimentos, sabendo que a situação que passamos deverá ser breve, voltando o devedor a condição anterior a pandemia.

*SABRINA BLAUSTEIN REGINO DE MELLO













-Graduação em Direito pela Universidade Brás Cubas;
-Pós-graduação em:
   -Direito Civil e Direito Processual Civil pela Faculdade Legale;
      -Direito e família e Sucessões pela Faculdade Legale; 
- Graduanda em Direito tributário pela Faculdade Legale 
- Conciliadora e Mediadora no CEJUSC de Mogi das Cruzes - SP e
 - Advogada sócia da Mello Assessoria Jurídica.


Nota do Editor:

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quarta-feira, 6 de maio de 2020

Pandemia (COVID-19) e as Relações Contratuais


Autora: Luciane Roma(*)

Conforme amplamente divulgado pela mídia mundial, a propagação do Coronavírus (COVID-19) tem impactado de forma direta as relações de consumo, e com isso as surgem as dúvidas quanto ao cumprimento das obrigações nos mais diversos tipos de contratos, sejam eles de fornecimento de mercadorias, prestação de serviços, locação, turismo, passagens áreas, etc.

Um dos setores afetados pelo COVID-19, é o TRANSPORTE AÉREO, isso porque diante do isolamento social mundial, necessário se faz a solicitação de cancelamento ou remarcação de passagens aéreas. 

Para trazer um norte aos consumidores de passagem área, foi publicada a MP nº 925/2020 que dispõe sobre providências emergenciais para a aviação civil brasileira. O texto da MP estabelece que os contratos de transporte aéreo firmados até 31 de dezembro de 2020, o prazo para o reembolso do valor relativo à compra de passagens aéreas será de 12 (doze) meses, onde os consumidores ficarão isentos das penalidades contratuais, por meio da aceitação de crédito para utilização no prazo de doze meses, contado da data do voo contratado. 

A rede de HOTELARIA e AGÊNCIA DE TURISMO também sofreram grande impacto inicial com a pandemia do COVID-19, que tornou inevitável a suspensão dos serviços. Assim, para trazer soluções aos consumidores de forma prática as empresas do ramo de hotelaria, estão oportunizando seus clientes/consumidores duas opções: uma delas é deixar o crédito em aberto para um momento posterior; a outra é efetuar o reembolso sem retenção do valor da multa

Importante consignar que é dever do fornecedor disponibilizar ao consumidor todos os canais possíveis de comunicação: telefone, e-mail, site, sob pensa de infringir o artigo 6º, III, CDC. 

De certo, não só os contratos de relação de consumo foram afetados diante da existência do COVID-19, mas vários outros contratos previstos em legislação especifica como: locação, educacional, empresarial, contrato particulares como prestação de serviço, etc. 

Desta forma, análise de pandemia pelo Coronavírus, é evidente que tal situação configura-se como "força maior", ante a imprevisibilidade dos efeitos do fato, atingindo e impactando diversas relações, que podem justificar o inadimplemento e fazer com que o devedor não responda pelos prejuízos resultantes desses eventos se expressamente não se houver por eles responsabilizado (art.393 do Código Civil). 

Outro assunto polêmico refere-se aos CONTRATOS DE LOCAÇÃO, isso porque diante do cenário de caos econômico muitas empresas permanecem fechadas ou com redução de funcionamento, por isso surge a dúvida relacionada ao pagamento do "aluguel". 

Pois bem, está em tramite em nosso país o projeto de lei (PL 1.179/2020) de autoria do senador Antonio Anastasia (PSD-MG) prevendo que não será concedida uma liminar para desocupação de imóveis urbanos nas ações de despejo até 30 de outubro de 2020. O referido projeto foi aprovado no Senado, mas deve passar pela Câmara dos Deputados e, caso aprovado, pela sanção pelo Presidente. 

O Projeto serve para ações iniciadas desde o dia 20 de março. O projeto ainda incluía um artigo que permitia o atraso do pagamento de aluguel por demissão ou redução salarial, mas foi retirado. Cumpre destacar que antes dessa norma, uma liminar retirava o locatário em até 15 dias do imóvel. Com a nova regra, até o dia 30 de outubro NÃO poderá ocorrer o despejo. 

Enquanto o projeto tramita no Congresso Nacional, os operadores do direito em defesa de seus clientes, tem postulado perante a Justiça o "AJUSTAMENTO EXCEPCIONAL" dos contratos de locação, com base na grave crise econômica e social imprevisível às partes. 

Assim, as empresas que sofreram impacto direto em suas atividades econômicas durante o período de quarentena, podem pleitear perante a "REVISÃO EPISÓDICA DOS ALUGUERES", demonstrando o prejuízo econômico devido o COVID-19, e o Judiciário tem concedido liminares para redução de até 70% (setenta por cento) do valor dos alugueres durante o período que perdurar a pandemia, tal fato se dá em busca do equilíbrio nas relações jurídicas privadas mantendo a saúde financeira e econômica das empresas, evitando assim de levá-las à quebra. 

Tais ações possuem embasamento no Código Civil e na Lei de Inquilinato, que prevê acontecimentos extraordinários ou imprevisíveis como uma pandemia. 

Claro que tais recursos servem para evitar a extinção ou desfazimento contratual e para tanto, necessário a intervenção de um advogado capaz de identificar e por meio de provas convencer o juízo da aplicação de tais institutos. 

Gostou do artigo?! Compartilhe agora para que mais pessoas conheçam sobre seus direitos! 

*LUCIANE MARIA MARCOS ROMA

- Formada em Direito pela ULBRA (2005);
- Pós Graduada “Lato Sensu” em Ciências Criminais pela UNAMA (2008);
- Pós Graduanda em Direito de Família e Sucessões pela Faculdade Legale (2020);
- Associada a ADFAS – Associação de Direito de Família e Sucessões
Área de atuação: Direito de Família e Consumidor na cidade de Cascavel/PR
Facebook: Luciane Roma



Nota do Editor:


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terça-feira, 5 de maio de 2020

Exclusão do ICMS da Base de Cálculo do PIS e Cofins: STF a serviço do Contribuinte do ou do Fisco?


Autor: Greick Campos(*)


O julgamento do recurso extraordinário RE 574.706, que teve sua repercussão geral reconhecida através do tema 69, tratou sobre a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins.

Para fins de esclarecimento a aqueles que não estão acostumados com o vocabulário jurídico, a repercussão geral, sobre o próprio conceito do STF, ocorre nos casos em que "o julgamento de temas trazidos, em recursos extraordinários, que apresentem questões relevantes sob o aspecto econômico, político, social ou jurídico e que ultrapassem os interesses subjetivos da causa[1]", ou seja, unifica o entendimento de um certo tema, em âmbito nacional, nos tribunais inferiores, para que as demais ações, de mesmo pedido, tenham a mesma decisão. 

O Supremo Tribunal Federal entendeu que o ICMS não deve compor o faturamento das empresas, tendo de ser excluído da base de cálculo do PIS e Cofins. Para muitos, esse julgado ficou conhecido como a maior vitória dos contribuintes neste século.

A decisão acima acaba com o pagamento do tributo sobre tributo, na qual este resultado trará economia as empresas, melhorando o fluxo de caixa, em época de crise que ainda não sabemos até que ponto poderá chegar. 

Todavia, o leitor pode estar se perguntando: se os ministros do STF julgaram o presente caso, em favor do contribuinte / empresário, que motivo haveria para ficar preocupado?

A resposta ao questionamento se dá pelo fato da União, na busca de reduzir os prejuízos sofridos com a decisão, protocolou recurso (embargos de declaração) na qual pede o esclarecimento sobre a aplicação da modulação dos seus efeitos. Em outras palavras, o questionamento é de quando valerá os efeitos da decisão, se da data do julgamento, da época (retroativo), ou ainda arbitrar para uma data futura.

Só para termos uma ideia sobre o impacto no orçamento público, segundo a advogada-geral da União, Grace Mendonça, informou que a Receita Federal deixará de arrecadar R$ 250,3 bilhões em tributos que estavam sendo questionados na Justiça desde 2003, bem como a eventual desvinculação do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins também fará com que o Fisco deixe de obter daqui para frente R$ 20 bilhões por ano.

O julgamento do referido recurso seria primeiramente na data de 05/12/2019, depois remarcado para 01/04/2020, e que devido a pandemia e políticas de isolamento social adotadas, devido ao coronavírus (Covid-19), teve novamente adiado seu julgamento, sem nova data prevista.

O prolongamento torna-se preocupante, uma vez que devido as medidas de isolamento social adotadas no país, segundo estudos trazidos pelo Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), a arrecadação de impostos no Brasil pode sofrer uma queda de até 39,3%. O Ministério da Economia informou também que a previsão, até o presente momento, de perda das receitas públicas será, no ano de 2020, na casa de R$ 13,2 bilhões de reais.

Diante deste cenário preocupante, caberá mais uma vez ao STF definir o andamento do caso, se garantirá a vitória total e irrestrita dos contribuintes beneficiado no presente caso, ou se devido ao interesse público, visando o equilíbrio de uma economia já desiquilibrada, determinar que seus efeitos sejam alcançados somente a conta da data da decisão transitada e julgada. 

Quanto aos contribuintes que se enquadrarem neste caso, como manifestado exaustivamente por colegas advogados, especializados na área tributária, devem ajuizar a ação o mais rápido possível, sob risco de ocorrência da modulação dos efeitos, acarretando consequentemente na impossibilidade da restituição dos valores pagos indevidamente nos últimos cinco anos, inviabilizando a utilização destes créditos que podem garantir a manutenção da saúde financeira de muitas empresas.

REFERÊNCIA

[1]Disponibilizado em:
na data de 03/05/2020. 

*GREICK DE CARVALHO CAMPOS-OAB/RS 103418  













- Graduado em Direito pelo Centro Universitário Ritter dos Reis - UNIRITTER - Canoas/RS (2014);
- Sócio Fundador do Escritório Campos & Kindler Advogados - com sede Canoas/RS e
- Áreas de Atuação: 
  Tributário, Trabalhista, Empresarial e Cível
CONTATOS:
Telefone: (51) 99291.7310

Nota do Editor:

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segunda-feira, 4 de maio de 2020

Aberrações Eleitorais: Resultado da Pandemia?


Autora: Renata Leitão(*)


 Falar em pandemia ao meio de uma, pode parecer muito do mesmo; Falar dos efeitos dessa pandemia, nas mais diversas áreas que nos atingem, também acaba por ser repetitivo. 

Mas, os efeitos são tão extensivos que até a democracia em sua essência – eleitoral - é atingida com um forte golpe. Em meio a loucura mundial e nacional, do incerto, dia 17 de abril, Carlos Fávaro assume vaga no Senado por MT após cassação de Selma Arruda.

Testemunhamos a posse de um Senador não eleito pelo sufrágio popular. Este que, deveria ser, um dos pilares mais fortes e eretos de uma sociedade democrática. 

​A Senadora Juíza Selma Arruda, como se sabe, perdeu o seu mandato por decisão da Justiça Eleitoral, por não ter observado as regras de arrecadação e aplicação de recursos de campanha.

​Naquela oportunidade, suscitou-se a questão que, por força de seu afastamento, dever-se-ia admitir que o candidato derrotado, mas de maior votação entre os demais, fosse convocado em caráter precário a ocupar a cadeira vaga, até a realização de novas eleições.

​O pedido foi analisado pelo Plenário do Tribunal Superior Eleitoral e, por decisão de expressiva maioria – que contou com o voto de três Ministros do STF –, foi indeferido, tendo presente que tal solução importaria denegar o princípio da maioria, pois um candidato que não expressa o querer do corpo eleitoral passaria a ocupar a cadeira reservada a um candidato legitimamente eleito.

​Ao ver o seu pedido negado, o candidato Carlos Fávaro buscou o apoio de seu partido (PSD) e do Governador do Estado de Mato Grosso, Mauro Mendes (aliado político), para ingressar com Ações de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs nºs. 643 e 644).

​Nessas ações, alegaram, em suma, que o fato de a representação do Estado de Mato Grosso no Senado ficar desfalcada de um representante imporia grave prejuízo ao Estado, que, sub-representado, teria menor poder de resistência em face do Poder Central.

​Despachando o pedido liminar em 31 de janeiro de 2020, o Presidente Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, houve por bem deferir monocraticamente a medida, a ser referendada pelo Plenário, assegurando ao candidato batido no pleito o exercício do mandato que lhe foi negado pelas urnas. 

​O tema é cercado de forte polêmica, que urge ser examinada pela nossa Corte Suprema, sob pena de se instaurar quadro de ilegitimidade de poder que só se viu igual no tempo dos senadores biônicos.

​Em uma democracia, não há salvação para a falta de voto. Não se concebe que um candidato que perdeu eleição (e que, como é óbvio, não representa a maioria) seja guindado ao posto da Casa Legislativa como legitimado a falar em nome dos eleitores do Estado.

​Eleição não é como concurso público em que se o primeiro colocado não puder assumir convoca-se o segundo, pois no concurso público apura-se essencialmente o conhecimento formal, ao passo que na eleição apura-se essencialmente a legitimidade, sendo esse um ponto fundamental de nossa ordem constitucional. 

​Aventa-se com o prejuízo pela sub-representação do Estado, mas é de se considerar, todavia, que os conflitos de interesse entre as referidas Unidades da Federação não são tão frequentes, nem mesmo agudos.

​Muito pior seria a possibilidade de substituição de um Senador da situação por outro de oposição ou vice-versa. Aí sim se teria uma grave distorção da vontade popular, num intolerável atentado contra a legitimidade do pleito.

​Ainda que no caso concreto isto não esteja em discussão – a ADPF se destina precipuamente ao exame dos preceitos constitucionais – trata-se de importante aspecto para definir o desate do litígio. 

Destaca-se, por fim, que a eleição suplementar para o cargo de Senador de MT, convocada para o dia 26 de abril passado, foi suspensa por conta da pandemia, sem prazo para ser retomada. 

Um episódio triste, pois o TSE e TER/MT perderam a oportunidade de inovar, implementar, reduzir custos. Poderiam ter autorizado uma campanha diferente, apenas pelas redes sociais e meios de comunicação. Quão mais barata seria essa campanha? 

​Mas, a eleição foi suspensa, o terceiro candidato derrotado foi empossado. Um tapa na cara da democracia. 

E agora? Saberá o STF dar solução a essa situação, o que se espera que seja urgente.

*RENATA PAULI LEITÃO - OAB/MT 10.476 e OAB/DF 55.310 suplementar



-Advogada graduada pela Universidade Federal de Mato Grosso(2003);
-Especialista em Direito Tributário e Eleitoral 
-Atuando em Mato Grosso e Brasília


Nota do Editor:

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