sábado, 2 de julho de 2022

Educação para quê?


 Maria Cristina Marcelino Bento (*) 


Para que Educação? Para que educação em tempo de guerra, um quase pós - pandemia causada pelo Corona vírus-19, momento em que a realidade virtual e aumentada se expande, aumento da quantidade robôs realizando as tarefas cotidianas entre outras tarefas... Para que Educação? Educar para quê?

Mas o que é educação? Vejamos...

Iniciemos pelo sentido etimológico da palavra - Do latim educare, educere, que significa literalmente "conduzir para fora" ou "direcionar para fora". Segundo o dicionário Etimológico o termo latino educare é composto pela união do prefixo ex, que significa "fora", e ducere, que quer dizer "conduzir" ou "levar". O significado do termo (direcionar para fora) era empregado no sentido de preparar as pessoas para o mundo e viver em sociedade, ou seja, conduzi-las para fora” de si mesmas, mostrando as diferenças que existem no mundo.

Está registrado na Constituição Federal Brasileira, art.205º que:

A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Segundo a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, no seu art. 1º
a educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais.
No artigo 53º do Estatuto da Criança e do Adolescente encontramos:
A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho.

Podemos afirmar, a partir do exposto acima, que o processo de educação tem como objetivo formar/preparar/instrumentalizar o ser humano para conviver e trabalhar.  Este... é o perfil de seres humanos pretendidos para a sociedade... Mas, como se define ser humano?

Oliveira (2013) "O ser humano, como unidade anímico-corpórea, é uma realidade material que transcende sua materialidade; ele é uma realidade espaço temporal que supera esse espaço temporalidade; é um sujeito mortal que ultrapassa a morte".

Santos Neto (2013) apoiado na cartografia grofiana deixou-nos o legado de que "é possível considerar a espiritualidade do ser humano e também a sua dimensão ecológica, que o liga ao mundo da natureza." Examinemos a citação a seguir do mesmo autor:

Esta maneira de compreender o ser humano implica numa concepção de educação, que chamo aqui de transpessoal. Educação Transpessoal, portanto, é aquela que se empenha, direta e intencionalmente, para educar o homem na e para a inteireza mediante a transmissão/construção -crítica, criativa e interdisciplinar dos conteúdos culturais necessários à manutenção e desenvolvimento da vida, e, também, mediante o trabalho de autoconhecimento que possibilita religar as dimensões da pessoa: o corporal, o emocional, oracional, o espiritual, o natural e o histórico-cultural. Chamo-a de transpessoal porque ela, como o nome sugere, vai além do ego pessoal e racional, embora não o despreze. (SANTOS NETO, 2013, p.23)
Eis a questão: como os responsáveis pela redação dos documentos acima citados, neste texto, compreendem o ser humano? Do mesmo modo, a indagação é valida os leitores e usuários destes documentos.

Há necessidade em ampliar o debate sobre nossa identidade, sobre autoconhecimento para a melhoria do viver, agir, interagir com o outro, e com as coisas.

Outra pergunta, como formar ou orientar os educadores, sob esta perspectiva? Educadores aqui deve ser compreendido como o responsável legal pelo menor de idade, toda a equipe escolar e todo ser humano. Afinal, educamos pelos nossos gestos, jeito de ser e não apenas pelas palavras.

Será a educação transpessoal um dos caminhos para a formação do ser humano neste século XXI, será o fundamento da educação 4.0 ou educação Nº alguma coisa, aliada a revolução industrial? O que pode promover a educação transpessoal?

o desenvolvimento integral do ser, a partir do momento que emprega as experiências transpessoais como meio de explorar e integrar as múltiplas dimensões do ser. Isso possibilita ilimitadas formas de aprendizado e harmonia consigo, com os semelhantes e com os demais seres que integram o ecossistema vida. Nessa configuração a educação transpessoal é uma abertura para repensar a prática educacional, cujo objetivo é agregar para o educando apoio no que se refere a: inteireza de si mesmo, compreensão da integralidade da realidade; construção individual e coletiva de aspectos culturais; formar pessoas numa perspectiva multidimensional e integral (SANTOS NETO, 2013, p. 30).

Sendo assim, teríamos o objetivo claro ao ato de educar, o gerador deste texto. Todavia, a quem interessa seres humanos formados pela perspectiva multidimensional e integral? Ou como dito por Freire, a quem interessa essa boniteza?

A todos aqueles que insatisfeitos com a compreensão estreita do ser humano e do mundo, percebem a pessoa em seu pulsar de corpo, razão, emoção e espírito. E assim percebendo-a desejam trabalhar com sua inteireza. Não importa, na verdade, o nome que se dê a esta forma de compreender a educação. Importa que seja um trabalho feito na/para inteireza, na direção da construção da vida com sentido, beleza, justiça e alegria. (SANTOS NETO, 2013, p. 35).
Creio que ainda há tempo, muito tempo para seguirmos semeando práticas educativas efetivas à uma educação "na direção da construção da vida com sentido, beleza, justiça e alegria". Sejamos teimosos, resistentes no cuidado e formação do ser humano.

Acredito que o mundo poderá ficar mais leve, mais bonito, justo com pessoas menos preocupadas em apontar erros. Pessoas capazes de ajudar na superação de mazelas.

Não estamos sozinhos nesta caminhada, há pedagogias que convergem com este diálogo, pesquisadores registrando os feitos, terapeutas em exercícios, profissionais da religião em ofício.

O ato de educar em construção, inovação, em processo...

Referências

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/518231/CF88_Livro_EC91_2016.pdf Acesso em: 28 abr 2022;

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9.394/96. 
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm. Acesso em: 1 mai 2022;

BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 16 jul. 1990. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8069.htm#art266. Acesso em: 1 mai 2022;

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 2011;

OLIVEIRA, R. A. DE. A relação entre o corpo e a alma do ser humano na teologia cristã: uma aproximação histórica e contemporânea. (The relation between body and soul of human being in Christian Theology: A historical and contemporary approach). HORIZONTE - Revista de Estudos de Teologia e Ciências da Religião, v. 11, n. 31, p. 1081-1105, 26 set. 2013;

SANTOS NETO, E. A espiritualidade, educação e formação de educadores: uma abordagem transpessoal voltada ao desenvolvimento da inteireza. Revista INTERESP nº3, 2013, p. 13-372013. 
Disponível 
https://revistas.pucsp.br/index.php/interespe/issue/view/1136 Acesso: 2 mai 2022.

*MARIA CRISTINA MARCELINO  BENTO
















-Graduada em Pedagogia pela UNISAL (1989) ; 

- Mestre em Educação pela UMESP-SBC (2008); 

-Doutora em Tecnologias da Inteligência e Designer Digital pela PUC/SP (2016); -  

-Atualmente é :

-Professora titular no UNIFATEA nos cursos de graduação e pós-graduação;

 Coordenadora Pedagógica no Núcleo de educação a distância no UNIFATEA e

 - Professora Coordenadora do Curso de Pedagogia – modalidade EAD na mesma instituição.

Nota do Editor:

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sexta-feira, 1 de julho de 2022

Mulheres que se acham demais...


 

Autora: Adriana  Rocha (*)

Dia desses eu e minhas amigas, falávamos sobre essa geração de mulheres mentirosas e insuportavelmente chatas, que fingem possuir a autoestima nas nuvens e que se acham imensamente superiores aos homens, não precisam de um namorado, ficante ou marido. As top five das assexuadas. 

Comentamos sobre essas feministas malucas que estão aí dando uma de "duronas"; disputando à faca entre elas o primeiro lugar, porém as mesmas nem sabem em que competição estão e qual é "o grande prêmio".

"Estou muito bem sozinha". "Homens estão em extinção". "Homens têm medo de mulheres independentes e poderosas como eu", "blá blá blá…" . Uma ova! Por mais bonita, bem sucedida, se é que você é tudo isso, admita: ninguém te quer e não o contrário. 

Eu arrisco a afirmar: uma mulher, por mais bem sucedida profissionalmente e economicamente que seja nunca será uma mulher realizada, se ela não for TAMBÉM, bem sucedida na dança do acasalamento, bêh… Vai me dizer que não gostas? Se não gosta, pode ser este mais um motivo de estar só, todo mundo gosta de gozar!

Será que é mesmo "muito melhor" sair todos os finais de semanas, com as mesmas amigas solteironas, "inteligentes" independentes e de ideologias idiotadas que passam a maior parte do tempo reclamando dos homens para depois irem dormir sozinhas, do que um saco de pipocas, chocolate, coca-cola e uns amassos? Ahhhhh…  Homens, aqueles ingratos.

Quem disse que só as mulheres evoluíram?  Acha mesmo que seria possível que nós mulheres aprendêssemos a dirigir, a trocar o chuveiro e os pneus e ninguém contasse nada aos homens?

Esse papo furado de que os homens não estão preparados para essa nova mulher seria revolucionário em 1940 na época da minha avó, D. Maria Angélica, que se casou e separou várias vezes, teve filhos em todos os casamentos, educou todos e morreu de boa…  Talvez tenha ficado mal falada na cidade, mas escolheu ser livre e feliz. 

Minha mãe não aprendeu a dirigir porque não quis, só foi estudar depois dos 50 anos e nunca ficou sem dinheiro ou emprego, até porque, a D. Dina, era a melhor costureira da região, tinha tempo para dar conta do trabalho, cuidar dos oito filhos e ser a gostosona do meu pai. Hoje em dia eles chamariam de "romantizar" a rotina cheia, a maternidade, a dupla jornada e etc.  

Meus pais sempre souberam que eu era libertária e sempre torceram para que eu encontrasse um companheiro maluco como eu para dividir a vida e nunca me fizeram pensar que escolher ser bem sucedida era sinônimo de ser mal amada.

Os homens não são incapazes, nós mulheres nos adaptamos aos novos tempos, mas os homens também. Todos nós precisamos de ajustes aqui e ali, mas está tudo caminhando, já até aprendi a cozinhar alguns pratos mais elaborados! Aprendi com meu marido e daí? Dia desses ele chegou a tempo de salvar a acelga das minhas mãos…

Tenho amigos homens e eles querem uma mulher para ser parceira e choram por um pé na bunda; eles também ficam perdidos sem conseguir agradar "essas fulanas" que nem sabem o que querem.

Eu ganho o meu dinheiro, gosto de tequila, de cerveja… dirijo "má ou meno", arroto bem alto, cuido do meu imposto de renda; sei pregar botão, mas alinhavo torto. Não sei por onde começa a receita de suflê de escarolas e só vou ao supermercado para comprar porcarias. No dia em que eu quis cozinhar o ovo perfeito dei um Google e deu muito certo. 

Compro botas e calças caras dividido em três vezes, mas eu pechincho na "brusinha"; bebo com as minhas amigas e nunca fui cobrada por ficar bêbada, por não esticar a cama ou ficar internada em meu escritório escrevendo.

Neste momento em que escrevo estou esperando meu marido chegar do mercado com meu shampoo e com a cerveja, é ele quem sabe escolher a carne, comprar peixe e fazer feira; vira e mexe está na cozinha preparando uma torta ou algo especial pra mim ou para o jantar da família, mas ele não é um paspalho, é o homem da casa: o que manda no "galinheiro".

Um maluco que escolheu me amar do jeito que sou: quem vibra com as minhas vitórias, se emociona com minhas histórias; ri da minha esquizofrenia e me salvou de jantar miojo pelo resto da vida.

E esse papo de "eu fico muito bem sozinha", pode ser papo furado de mulher que ninguém quer, porque será?

Conheço uma penca de gente que assume que precisa de alguém para amar, brincar, passear, irritar…  porque isso aqui não é uma competição é vida, e todo mundo quer a mesma coisa eu, você, a Maria, o Marco, a Matilde, o Rodrigo, o João, a Cris, a Camila; todo mundo quer subir na garupa do amor e viajar, todo mundo quer sossegar o rabo num relacionamento feliz e cheio de cumplicidade, de parceria, paixão, de mãos dadas, cercado de amigos ou quando estão a sós.

Chega desse discurso de ser mal compreendida pelo mundo e pelos homens. Tem muita gente dando sopa por aí, de ambos os lados, por inúmeras razões. Se você acredita mesmo que ninguém te merece porque és independente, poderosa, auto suficiente e que os homens não sabem lidar com isso, só quero lhe dizer uma coisa: você está sozinha porque é muito cheia de querer.

Bom, agora vou me arrumar porque meu marido está chegando, vamos tomar cerveja e ouvir rock juntos enquanto preparamos o jantar.

Nesta sexta-feira serei ajudante de cozinha. Muito justo. 

*ADRIANA ROCHA














Segundo suas próprias palavras:

"É escritora por paixão, cronista por necessidade de expressão e poetisa por puro tesão de recriar a paixão. "


Nota do Editor:


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terça-feira, 28 de junho de 2022

A injustiça causada pela ausência do advogado no processo


 Autora: Josiane Rodrigues Jales Batista (*)


A regulamentação da relação de emprego entre empregado e empregador é feita, também, pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de Maio de 1943 – Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, sendo que esta busca a harmonia nesta relação. Quando esta harmonia é rompida, a CLT/43 dá soluções no que tange aos conflitos existentes, bem como prevê sanções pelo descumprimento de seus artigos visando à proteção do empregado.

O trabalho é inerente à existência humana e a relação trabalhista é estabelecida quando de um lado figura o empregado que presta serviços de natureza não eventual mediante salário, e do outro o empregador, que admite, assalaria e dirige a prestação de serviços. (artigos 2º e 3º da CLT/43).

Quando há conflitos oriundos desta relação, tanto o empregado quanto o empregador podem acionar o Poder Judiciário para solução do litígio. Normalmente, o polo ativo das reclamações trabalhistas é composto pelo empregado, mas não é regra podendo o oposto ocorrer.

O legislador trabalhista, verificando a situação do empregado, que pleiteia valores para o seu sustento e que às vezes não tem condições financeiras para contratar um advogado para o patrocínio de uma reclamação trabalhista, instituiu o Princípio do Ius Postulandi, previsto nos artigos 791 e 839 da CLT/1943, que não sofreram alteração com o advento da Reforma Trabalhista (Lei.13.467/2017).

Este princípio possibilita o acesso à justiça sem o patrocínio de um advogado, ou seja, a parte pode pessoalmente comparecer em juízo para requerer um direito.

Ressalta-se que este princípio é facultado ao empregado e ao empregador, mas, na prática, é mais utilizado pelos empregados, tendo em vista, a hipossuficiência na relação.

Mas o que é o Ius Postulandi? A palavra ius tem origem latina, sendo de suma importância ressaltar seu significado:
a palavra latina jus, provinda do sânscrito iu, que significa ou da ideia de salvação, proteção, de vínculo ou ordem, já entre os romanos era fundamentalmente tida no mesmo sentido em que se tem o direito como lei (norma agendi) ou como o poder (facultas agendi). (PLÁCIDO SILVA, 2007, p. 809).
O legislador, portanto, conferiu aos empregadores e empregados a capacidade postulatória, ou seja, de estar em juízo pessoalmente, sem a constituição de um advogado desde que estejam no exercício de um direito.

Plácido Silva (2007, p. 1067) ainda ensina que a palavra postular vem "do latim postulare, tem o sentido de requerer ou pretender qualquer coisa em juízo, fazendo alegações que se mostram, desde logo, fundamentadas ou comprovadas".

Então, podemos dizer que o Princípio do Ius Postulandi foi criado como um meio de auxiliar a parte no acesso gratuito à justiça, uma vez que não haverá o pagamento de custas judiciais e nem o de honorários advocatícios. Ocorre, que na prática forense este princípio nem sempre traz benefícios ao litigante, causando, às vezes, prejuízos maiores do que o valor cobrado por um advogado.

A intenção do legislador foi a de estender um direito constitucional, do livre acesso à justiça, previsto no artigo 5º, XXXV, CR/1988, para a Justiça do Trabalho, mas fatalmente este instituto acarreta a parte alguns prejuízos por estar desacompanhado de um especialista da área.

Entre a doutrina, uma corrente entende que o princípio é imprescindível para viabilizar o acesso à Justiça, principalmente daqueles que não têm condições financeiras para contratar um advogado. Já outra corrente entende que este princípio propicia uma falsa justiça para as partes que se utilizam dele.

Em contrapartida, o artigo 133 da CR/1988 considerou o advogado indispensável à administração da justiça. A Lei nº. 8.906/1994, em seu artigo 1º, inciso I, dispôs ser privativo de advogado a postulação a órgão do Poder Judiciário.

Contudo, nos julgados a palavra "indispensável" não foi entendida como "obrigatória a presença em todos os processos", mas teve um sentido de fundamental, essencial ou relevante.

Na representação de seu cliente, em processos judiciais, o advogado tem a função de apresentar o pedido ao Judiciário, adaptando ao dispositivo legal, dialoga com as partes fazendo seu cliente compreender as fases processuais, nas audiências atua verificando as provas já realizadas nos autos e as que são necessárias a serem produzidas, faz pesquisas jurídicas e encaminha a documentação necessária à Justiça, dentre outras atividades.

Ele atua de forma representativa, isto implica dizer que se coloca no lugar de seu cliente na defesa dos interesses deste. Portanto, não se pode dizer que a parte não intervém diretamente no processo, tendo em vista que tal atuação é feita por seu advogado, devidamente constituído. A parte atua de forma significativa, uma vez que, ao narrar sua situação para seu advogado, ele verificará quais são seus direitos e assim os pleiteará.

Numa ação trabalhista, há vários procedimentos que realmente a parte poderá não conhecer e, em decorrência disto, é que seu advogado o auxiliará. Conjectura-se que a parte desacompanhada de advogado saberá e conhecerá todos os termos, bem como os procedimentos de uma ação trabalhista? Provavelmente não. Mas, isso não significa dizer que o processo se torna um debate fechado. Pelo contrário, o advogado se torna intérprete e interlocutor da parte, possibilitando que esta compreenda todos os atos praticados em uma audiência, por exemplo.

Juliano (2007, p. 77), sabiamente, diz que "todos sabemos que para exercer uma defesa, exige-se habilitação técnica. Como poderá ser feita justiça sem a assistência do advogado? Sem ela, a parte sofrerá prejuízos, que certamente com a intervenção de um advogado poderia ser outro o resultado".

Vislumbra-se que é justamente esta parcela da população, leiga e desprovida de recursos financeiros, que em uma audiência judicial, facilmente, irá se intimidar com a simples presença de um advogado, sucumbindo-se a uma covarde desigualdade, pois os empregadores, em sua maioria, mais abastados, nunca estão desprovidos de um bom advogado. O Ius Postulandi da forma que é percebido, promove a desigualdade processual entre as partes no processo, e na maioria das vezes, o reclamante, parte mais vulnerável, fica completamente indefeso e sem argumentos frente a um profissional treinado e competente para resolver as questões jurídicas. (TADEU, 2006).

Ainda, outro ponto contraditório é que no artigo 791, da CLT/1943 diz que a parte poderá "acompanhar as suas reclamações até o final". Este "até o final" refere-se exercer seu direito junto aos órgãos que integram a Justiça do Trabalho apenas. Logo, se a parte precisar recorrer ao Supremo Tribunal Federal – STF deverá estar representada obrigatoriamente por advogado.

Ora, como a parte, sem o conhecimento técnico saberá que precisa interpor um recurso? Ainda, o fato de que o "acesso à justiça" que o Ius Postulandi proporciona, só contempla a esfera trabalhista... E por fim, o princípio se limita as reclamações trabalhistas, pois não alcança a ação rescisória, a ação cautelar, o mandado de segurança e os recursos de competência do Tribunal Superior do Trabalho (Súmula 425, do TST). A parte deixa de ser hipossuficiente nas outras esferas? Eis a contradição deste instituto.

Outro problema é se a imparcialidade do Juiz poderá ser afetada, uma vez que na tentativa de explicar algum procedimento para a parte, este poderá instruí-la na busca de seus direitos.

O artigo 765, da CLT/1943 prevê que os juízes terão ampla liberdade na direção do processo, mas isso não significa dizer que poderá requerer algum direito para a parte se esta não o fizer. A interpretação deste artigo não pode ser feita em sentido latu sensu, ou seja, de forma ampla, pois o juiz deverá zelar pela imparcialidade e justiça das decisões.

Verifica-se, portanto, que é imprescindível a presença de um advogado para a eficaz prestação jurisdicional.

Na prática, percebe-se que o Ius Postulandi não é tão eficaz quanto na teoria. Na verdade, ele proporciona uma falsa justiça à parte, uma vez que só garante que esta não pague honorários advocatícios para ingressar com uma reclamação trabalhista.

O direito de acesso a Justiça é garantia constitucional a todo e qualquer cidadão, não sendo necessária a instituição de princípios que falsamente possibilitem este direito. Na verdade, o que se deve buscar é uma justiça eficiente e não uma simulação desta, ou seja, uma falsa aparência de justiça, sendo que isto ocorre com o princípio ora discutido.

O Ius Postulandi possibilita a parte ingressar sozinho, sem nenhuma capacidade técnica para tal e ainda prega-se a efetividade deste princípio, causando assim uma utópica sensação de êxito, quando na prática poderá se frustrar diante de procedimentos jurídicos de sua não compreensão e consequentemente perder o direito, por falta de alguma manifestação imprescindível.

Além disto, o Direito evolui a cada dia e este acontecimento, possivelmente, não é de conhecimento da parte, e mesmo se o fosse, não estaria devidamente preparada. O especialista da área, com certeza estará em constante reciclagem e isto implicará numa melhor defesa de seus clientes.

Na verdade o Ius Postulandi ilude a parte, pois esta acredita fielmente que obterá êxito, sozinha, na ação trabalhista, sem ao menos arcar com honorários. O Ius Postulandi não pode ser sinônimo de gratuidade somente, mas deve garantir um justo processo. E é o que se espera de um Estado Democrático de Direito, no qual se vive. Por não alcançar seus objetivos de maneira satisfatória, deve ser revisado pelo legislador, a fim de adequá-lo a realidade ou retirá-lo do ordenamento jurídico, uma vez que não acompanhou o dinamismo da sociedade.

Corroborando com este raciocínio, no dia 20 de Junho deste ano, a ABRAT – Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas ajuizou uma ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal para pleitear a declaração de inconstitucionalidade de artigos da Consolidação das Lei do Trabalho na parte que trata do chamado "jus postulandi" das partes no processo trabalhista.

O objetivo da ABRAT "é que o STF interprete a legislação em vigor, após a reforma trabalhista, segundo os ditames e princípios constitucionais, para declarar que a presença da advocacia trabalhista é requisito essencial, obrigatório e garantidor da ampla defesa das partes litigantes".

Entendem ainda que "a assistência jurídica às partes é imprescindível ao integral Acesso à Justiça, decisiva para a garantia dos direitos fundamentais e sociais postos na Constituição Federal, coibidora da discriminação e desigualdade processual e asseguradora de uma Justiça do Trabalho que garanta a todos e todas a sua face de Justiça Social".

O protocolo da petição pode ser consultado em https://abrat.adv.br/textos/recibo_46533_2022_220620_161042.pdf.

O desenvolvimento atual e a complexidade das reclamações trabalhistas, não suportam mais a utilização deste princípio, uma vez que está em divergência com várias outras garantias constitucionais, portanto, perfeitamente possível e aceitável sua revisão.

O Princípio do Ius Postulandi não é tão eficaz na prática forense quanto se pretendia, ou seja, ele não atende ao proposto inicialmente pelo legislador, por ter se tornado obsoleto. E com o múnus do advogado de contribuir para uma sociedade mais justa, livre e igualitária não é plausível que vários cidadãos ainda tenham suas garantias e direitos sem o zelo deste importante profissional.

REFERÊNCIAS

______, Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas. ABRAT. Disponível em https://www.instagram.com/p/CfCwf-Rmq-Q/?igshid=YmMyMTA2M2Y=. Acesso em 24 jun. 2022;

BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil. Brasil: [s.n.], 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 23 jun.2022;

 ______. CLT Comentada. Homero Batista Mateus da Silva. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019;

 JULIANO, José Alberto. Estudos Jurídicos Selecionados. Belo Horizonte: LEIDITATHI, 2007 ;

 ______, Tribunal Superior do Trabalho. TST aprova redação da Súmula 425 sobre o Jus Postulandi. Disponível em https://www3.tst.jus.br/jurisprudencia/Sumulas_com_indice/Sumulas_Ind_401_450.html#SUM-425.  Acesso em: 23 jun. 2022; 

 PLÁCIDO SILVA, de e. Vocabulário Jurídico. Atualizadores: Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho. 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007;

 TADEU, Leonardo. O Jus Postulandi na Justiça do Trabalho - Direito ou ameaça ao Direito. JurisWay, [S.I.:s.n.], 2006. Disponível em: http://https://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=38. Acesso em: 24 jun. 2022.

*JOSIANE RODRIGUES JALES BATISTA



 Advogada;
- Graduação pela Escola Superior de Negócios (2010);
- Pós-graduanda em Docência com Ênfase Jurídica pela Faculdade Arnaldo Jansen;
- Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela         Faculdade Dom Helder Câmara (2016);
- Membra  do Projeto Direito na     Escola(https://direitonaescola.com)
 - Membra da Comissão de Direitos Sociais e Trabalhistas da OAB/MG.; e
- Cocriadora do Verbum Est Vita @josianejrjb

Nota do Editor:

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domingo, 26 de junho de 2022

O Homem é um Animal Gregário


 Autor: Alceu Albregard Junior (*)

Ouço com tristeza mais uma amiga idosa me contar que não sai de casa ainda. Durante horas ao celular ela desabafa sobre seus temores em ver pessoas na rua, sem usar máscaras, temendo pela vida deles e pela sua. Ela fala que vê, pela televisão, pessoas em bailes, festas, igrejas, na praia. Acusa-as de insensatas, de suicidas, de quererem o mal para todos.

Ela conta que já está há mais de dois anos entrevada em seu apartamento, sem contato pessoal que ultrapasse as discussões com vizinhos. Sua sanidade se esvaiu ao longo do tempo. Sequer a limpeza de sua casa é feita, pois vê risco na presença de qualquer pessoa, mesmo que necessária para a faxina da casa. Parte mínima de seus temores têm fundamento, porém, o restante são exageros próprios do afastamento do convívio social a que ela própria se entregou.

Pessoas como ela, estão protegidas da Covid pelo isolamento social, mas são atingidas por outro mal. Elas são açoitadas pelo pânico e pela solidão. Limitadas no uso da tecnologia, o acesso dessas pessoas a produtos de uso diário ficou ainda mais limitado, pois estão disponíveis apenas para entrega por aplicativos de celular.

Mas essa minha amiga é apenas mais uma das pessoas que me dirige suas preocupações. Elas estão condenadas a ficar distantes dos filhos, dos netos, dos sobrinhos, que podem apenas olhar pela tela do celular. Isso considerando que nem todos idosos usam celular. Pessoas como ela sofrem ainda mais pela falta de contato, do colo, do calor da pele contra pele.

Mais afetadas pelo distanciamento e pela fragilidade física e psicológica, pela dependência de do convívio físico com outras pessoas, os idosos estão distantes da fiscalização diligente dos órgãos da imprensa.

Outro grupo igualmente atingido é o dos estudantes. Dirigentes de escolas de ensino fundamental e médio, explicam que são agora obrigados a manter, em busca de uma normalização das aulas agora presenciais, equipes de psicólogos voltadas a readaptação dos jovens. Os alunos encontram-se dispersos, revoltados, insociáveis. Esses jovens com necessidade de readaptação, atingem 30% dos alunos em grande parte das escolas que localizam esse problema e buscam atender às necessidades de seus alunos.

Não é para menos. Esses jovens estiveram por quase dois anos dividindo espaços apenas nas telas dos monitores, em jogos, em conversas, em aulas. Levemos em conta também aqueles que somente tardiamente entram em contato com outras crianças, porque nasceram no curso da pandemia.

O convívio social não é apenas necessário pela proximidade física com outros jovens. Na verdade, o distanciamento físico das famílias é, para o jovem, um momento de relaxamento, em que podem disfrutar saudavelmente de valores próprios da juventude, sem a interferência dos familiares.

Forçadas a conviverem permanentemente ao longo desses anos, dividindo o espaço físico apenas entre si, muitas famílias enfrentaram suas realidades, muitas vezes com aumento de tensão com a menor interação pessoal, limitada apenas aos familiares.

O aumento da tensão familiar foi de tal proporção que estudos mostram um aumento de 24% no número de divórcios somente no 1º semestre do ano de 2021.

O homem é um animal gregário. A realidade constatada e estudada há anos por filósofos como Rosseau, Lock e Hobbs foi posta a prova e venceu. Os danos econômicos causados pela pandemia foram profundos, mas os efeitos emocionais causados pelo afastamento social demonstram que a vida social não pode ser posta de lado.

Podemos trabalhar isoladamente, em casa, auferir nosso sustento no home office, realizar reuniões on line.

Porém, pela experiência que passamos no período de isolamento social, ficou bastante claro que o ser humano não irá substituir a interação social por uma tela de monitor sem sofrer consequências graves em sua saúde emocional.

*ALCEU ALBREGARD JUNIOR
















-Graduação em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie(1985);

-Atua principalmente nas áreas dos Direitos Tributário, Imobiliário e Consumidor.
Contato: alceu.adv@albregard.com.br

Nota do Editor:

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