sábado, 18 de julho de 2020

Reeducação: O que a história das doenças nos ensina



Profª Stela Maris Leite Carrinho de Araujo(*)


Em 2020, estamos sob o impacto de uma pandemia. Não farei aqui considerações sobre a Covid-19, pois quaisquer informações serão de buscas virtuais que, de forma alarmante, nos conduzem às leituras e persuasivas reflexões, de pronto, eivadas das posturas polarizadas que se espalham como os vírus. Querem fazer um teste? Digitem no Google quaisquer sequências de três números e terão suas buscas encaminhadas para uma informação sobre a pandemia. E pasmem, a maioria delas de um teor assustador.

Por esta razão, acima exposta, podemos, como educadores, refletir a respeito da necessidade urgente de mudanças nas matrizes curriculares de formação docente para que entendamos o que subjaz quanto aos processos de recepção de textos nos meios virtuais? Pela obviedade da necessária autonomia de busca de informação, contextualização do conhecimento e leitura crítica dos meios. Leitura, estratégias de leitura, ler além do que está expresso, identificar inferências, não se contentar com o superficial, percorrer os caminhos dos hipertextos para identificar a raiz da informação. 

Isto posto, julguei interessante percorrer leituras sobre as epidemias, pandemias que assolaram a humanidade, provocando mudanças em todos os segmentos sociais, científicos, espirituais, econômicos.
Todos nós, certamente, lemos muito sobre o vírus e vimos especialistas degladiando-se em intermináveis "lives" para a análise de medidas assumidas pelo segmento político de gestão mostrariam-se eficazes, ou não. Médicos, biólogos, virologistas tiveram suas biografias expostas à avaliação pública, sendo valorizados, ou confrontados nos debates. Isto reforçou a efemeridade de certas posturas científicas quando Institutos e revistas científicas foram expostas para argumentar sobre suas verdades.
Historiadores, até este ano, consideravam doenças que abalaram a humanidade e esta teve que aprender a enfrentar seus infortúnios para continuar a vida sobre a Terra. A história da humanidade é pontuada por doenças que atingiram a sociedade em diferentes momentos, deixando marcas e aprendizados e, principalmente, ensinamentos de sobrevivência e convivência, devido à tragédia do número de mortos, catalisando transformações significativas e impulsionando o desenvolvimento científico, objetivando a proteção da vida humana na Terra.
As doenças marcantes foram a varíola, sarampo, tifo, febre tifoide, febre amarela, cólera, Aids, ebola, peste bubônica e diferentes tipos de gripe. São doenças que atingiram brutalmente a humanidade.

A varíola foi uma das doenças que mais matou seres humanos ao longo da história, causando epidemias e pandemias em diferentes locais do planeta. É uma doença infectocontagiosa causada por vírus (também conhecida como bexiga, é uma doença infecto-contagiosa. 

É causada por um vírus "Orthopoxvirus", um dos maiores vírus que infectam seres humanos, com cerca de 300 nanômetros de diâmetro, o que é suficientemente grande para ser visto como um ponto ao microscópio óptico, provocando bolhas e lesões na pele, doloridas que infeccionam grudando em vestimentas e lençóis, causando febre e desconforto tanto na pele quanto nas mucosas.

A doença é transmitida pelas secreções da pessoa infectada e pelo compartilhamento de objetos e contato com as crostas que se desprendem das pústulas que a doença causa. 

A varíola foi uma pandemia no Império Romano no século II d.C. Acredita-se que a doença tenha surgido na Índia, na antiguidade, e tenha se alastrado a partir da Mesopotâmia, então um território romano. Era conhecida também como "peste antonina" (nome da família que governava a região na época), chegando a causar a morte de 2.000 pessoas por dia, em Roma, em 166 d.C. Acredita-se que cerca de cinco milhões de pessoas morreram por causa da doença.

A varíola também atingiu o Japão por volta dos anos 735 e 737. Uma expedição japonesa, que voltava da China, trouxe a doença. Há relatos que 1/3 da população japonesa morreu da doença. A longínqua e gelada Islândia também teve surto da doença, levando a óbito 25% da população. Constataram que a doença se espalhou no país advinda de objetos de um islandês que teve a doença na Dinamarca e seus objetos vieram contaminados.
Em nosso país a doença apareceu em 1563, na ilha de Itaparica, espalhando-se pela cidade de Salvador. A população indígena foi fortemente atingida. O último caso de varíola no Brasil foi registrado em 1971, no Rio de Janeiro.

Outra doença devastadora foi a peste Bubônica. A peste Bubônica é causada por uma bactéria: “Yersínia Pests” que vive nos ratos e é transmitida aos humanos por uma pulga que vive nos roedores infectados. Após um humano estar infectado, pode transmitir a outros humanos por meio de suas secreções.
A peste Bubônica atingiu a Europa, o Norte da África e parte da Ásia, durante o século XIV. Na Europa era denominada peste Negra e levou a óbito 50 milhões de pessoas entre os anos 1347 a 1353. 

A peste Negra provocou mudanças profundas na Europa Medieval. É sabido que não foi a primeira vez que tal doença atingiu a humanidade. O surto na Europa, acredita-se tenha surgido, advindo da Ásia Central. Há relatos bíblicos que citam a doença no Livro de Samuel, quando pontua que uma doença causada por ratos atingiu os Filisteus.

Houve também esta peste entre os Bizantinos por volta de 541 e 544, advinda do Delta do Nilo. Segundo estudiosos a doença causou a morte de dez mil mortes diárias. A peste Negra espalhou-se pela Itália trazida por genoveses que fugiam de Caffa no século XIV. A peste provocou significativas transformações nos aspectos sociais, políticos e econômicos no continente Europeu: os laços da servidão enfraqueceram, os salários aumentaram e houve modificações no comércio. Cidades sucumbiram pela incompetência de governantes. Houve transformação quanto à visão humana de sua fragilidade diante da morte iminente e profunda influência nas expressões artísticas.

A peste Bubônica seguiu seu séquito de morte pelo continente europeu e, em 1665, atingiu Londres, matando cerca de cem mil pessoas, num total estimado em 420 mil habitantes. Outro surto ocorreu em Marselha, em 1720, quando um navio vindo da Síria trouxe a doença, levando a óbito cerca de 40 mil pessoas de um total de 90 mil habitantes.

Por volta de 1918 a mutação de um vírus "Influenza" causou muitas mortes até 1919, 1920. Os mesmos sintomas de uma gripe como coriza, dor de cabeça, febre, tosse até complicações mais graves que levavam à pneumonia e à morte. Era a denominada, por forças das circunstâncias da guerra, a Gripe Espanhola.
Como estava o mundo quando a denominada Gripe Espanhola assolou parte da civilização? Primeiro que Gripe Espanhola foi o nome que recebeu uma pandemia de mutação de vírus influenza que se espalhou pelo mundo entre 1918 e 1919. Pela precariedade de recursos da época historiadores e cientistas não sabem com exatidão o local dos primeiros acometidos com a gripe. Há relatos que esta gripe tenha surgido em dois lugares simultâneos: nos USA e na Índia. 

Os historiadores e especialistas da área da saúde, até hoje, não sabem o local exato onde esse novo tipo de gripe surgiu. O surto instalou-se no contexto da Primeira Grande Guerra (conflito mundial que foi um marco na história da humanidade, pois foi a primeira guerra do século XX e o primeiro conflito envolvendo nações que mobilizam todos os seus recursos para viabilizarem o combate. O conflito foi de 1914 a 1918, resultando transformações que aconteciam na Europa, as quais fizeram diferentes nações entrar em choque. Como consequência a geração de jovens cresceu traumatizada com os horrores da guerra e num saldo de 10 milhões de mortos. Os desacertos da Primeira Guerra Mundial contribuíram para que, em 1939, uma nova guerra acontecesse). E a gripe espalhou-se rapidamente pelo mundo, causando a morte de cerca de 50 milhões de pessoas, embora algumas estatísticas falem em até 100 milhões de mortos.
A doença chegou ao Brasil por volta de setembro de 1918 e espalhou-se por grandes centros, sobretudo por Salvador, São Paulo e Rio de Janeiro. A cidade de São Paulo, por exemplo, pode ter contado com até 350 mil pessoas infectadas.

A gripe espanhola recebeu esse nome em razão da forte divulgação do problema na imprensa espanhola. Como foi uma doença que aconteceu num contexto de guerra, as grandes potências ocidentais envolvidas no conflito, cujos meios de comunicação sofriam forte censura – isso porque divulgar as notícias de que a gripe espanhola tinha afetado suas tropas poderia ser muito ruim para o moral dos soldados e poderia espalhar pânico na população. Assim, esses locais passaram a censurar as notícias relacionadas com a doença.

Como a Espanha não estava envolvida com a guerra, não havia necessidade de censurar a imprensa e, assim, as notícias sobre a enfermidade espalharam-se a partir do que a imprensa espanhola noticiava. Foi por essa razão que a pandemia recebeu o nome de gripe espanhola. Existem algumas teorias a respeito dos prováveis locais nos quais a gripe espanhola possa ter surgido: Estados Unidos, China e Reino Unido, India. A teoria mais aceita pelos estudiosos do assunto é de que a gripe espanhola teria surgido em campos de treinamento militar nos Estados Unidos. Isso porque os primeiros casos da doença também foram registrados lá. Esses casos aconteceram em trabalhadores de uma fábrica em Detroit e em soldados instalados em um campo militar no estado do Kansas.

Outro elemento que reforça que a gripe espanhola surgiu nos Estados Unidos é que ela se difundiu pela Europa logo depois que soldados norte-americanos foram enviados para a frente de guerra nesse continente. Assim, o contato de soldados contaminados com pessoas nos mais variados locais permitiu o alastramento da doença pelo continente europeu, principalmente nas frentes de guerra. A gripe espalhou em três ondas de contágio, entre março de 1918 e maio de 1919. Entre essas ondas, a segunda, iniciada em agosto de 1918, foi a pior delas, pois foi a mais contagiosa, causando a morte de milhões de pessoas. Em abril de 1918, as tropas britânicas e francesas registravam os primeiros contaminados pela gripe espanhola e, nos meses seguintes, uma série de países europeus apresentou seus primeiros casos da doença: Grécia, Espanha, Dinamarca, etc. Na segunda onda da doença, que aconteceu entre agosto e dezembro de 1918, Ásia, África, América Central e do Sul foram afetados.

A segunda onda de difusão da gripe espanhola tornou a situação alarmante em diversas partes do planeta porque a quantidade de infectados disparou e os sintomas registrados tornaram-se muito graves, o que contribuiu para que a taxa de mortalidade aumentasse bastante. 

Nos casos mais graves, os pacientes apresentavam graves problemas respiratórios, dificuldade para respirar e, até mesmo, problemas digestivos e cardiovasculares. Foram registradas também pessoas que se recuperaram da doença, mas contraíram de novo com sintomas agravados. Os médicos procuravam tratar os pacientes da forma que fosse possível, mas o conhecimento médico na época ainda era muito limitado.

Os médicos e cientistas do período não sabiam o que causava a doença, pois os microscópios não tinham capacidade de enxergar o vírus causador da gripe espanhola. Os microscópios conseguiam observar apenas bactérias, micro-organismos maiores que um vírus. É mister salientar que não havia antibióticos. Alguns locais não tomaram as medidas de prevenção necessárias para combater a gripe espanhola e o resultado foi catastrófico. Um caso muito conhecido é Filadélfia, cidade na costa leste dos Estados Unidos que se recusou a seguir as indicações dos especialistas de evitar aglomerações. 

Nessa cidade, em setembro de 1918, um desfile dos soldados que estavam sendo enviados para a Primeira Guerra Mundial foi realizado e mobilizou cerca de 200 mil pessoas nas ruas. O resultado foi a disseminação da doença de maneira violenta e a morte de cerca de 16 mil pessoas em um período de aproximadamente seis meses. 

Em mais de um ano de pandemia, estima-se que a gripe espanhola tenha causado a morte de cerca de 50 milhões de pessoas. Algumas estimativas mais alarmistas apontam que esse número possa ter chegado até o total de 100 milhões de mortos. Acredita-se que 1/3 da população mundial tenha sido afetada. 

Os historiadores acreditam que a gripe espanhola tenha chegado ao Brasil em setembro de 1918, portanto durante a segunda onda da doença. A princípio, a imprensa brasileira não deu muita importância para o surto, mas à medida que a doença foi se espalhando, os desdobramentos do problema ganharam repercussão.

Tanto no Brasil como em outras partes do mundo, foi necessário improvisar leitos para atender a todos os que contraíam a gripe espanhola. Fala-se que a gripe espanhola chegou ao Brasil por meio do "Demerara", um navio que saiu da Inglaterra, passou por Lisboa e atracou em Recife, Salvador e Rio de Janeiro. O navio chegou ao Brasil na data mencionada (setembro de 1918) e, nesse mês, a imprensa de Salvador, por exemplo, reportou centenas de pessoas doentes. Logo a doença se espalhou pelo país, pois não havia medicamentos que a combatessem. A difusão foi rápida e afetou, sobretudo, as cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo. Apesar de essas terem sido as duas cidades mais afetadas, todo o país foi atingido, inclusive regiões remotas, como a Amazônia. 

Como não existia nenhuma forma de curar a doença – os médicos passavam alguns medicamentos para amenizar os sintomas e esperavam o corpo do paciente reagir –, as recomendações das autoridades eram no sentido de que as pessoas evitassem aglomerações, lavassem suas mãos com frequência e evitassem contato físico. 

A gripe espanhola impactou severamente a rotina das pessoas no Brasil e causou milhares de mortes. Existem dados que apontam que a cidade de São Paulo possa ter tido cerca de 350 mil casos, o que representava mais da metade da população da capital paulista, e um total de 5.331 mortos. Já o Rio de Janeiro – na época capital do Brasil – registrou cerca de 12.700 mortes, o que representou 1/3 do total de mortes no país. 

A quantidade alarmante de casos de gripe espanhola no Brasil fez com que o sistema de saúde brasileiro, que não era público, não suportasse a quantidade de pessoas doentes. 

Faltavam leitos e médicos para atender a quantidade de pessoas doentes, sendo necessário improvisar leitos e hospitais para o atendimento das pessoas. Para evitar que a doença se alastrasse mais ainda, a ordem das autoridades foi a de determinar o fechamento de bares, fábricas, escolas, teatros etc. 

Todo tipo de aglomeração pública foi evitado pelas autoridades, que foram aconselhadas pelos principais especialistas que o Brasil possuía na época. A quantidade de mortos em pouco tempo também extrapolou a capacidade de enterros que os cemitérios locais poderiam realizar. Não havia caixões suficientes e os coveiros trabalhavam freneticamente. 

Até afastamento do trabalho foi ordenado para se evitar a disseminação da gripe espanhola, mas isso era um luxo que pouquíssimas pessoas possuíam no Brasil do começo do século XX. 

No Rio de Janeiro, o Congresso e o Senado foram fechados e, em Salvador, a imprensa local repercutia a difusão da doença por toda a cidade. Isso resultou na interdição de alguns serviços públicos, assim como na proibição da realização de eventos públicos, inclusive festividades e cultos religiosos. A gripe espanhola no Brasil afetou até mesmo Rodrigues Alves, vencedor da eleição presidencial em 1918. Doente, ele não pôde tomar posse em novembro de 1918 e acabou falecendo em janeiro de 1919. Estima-se que, ao todo, a gripe espanhola tenha causado a morte de 35 mil pessoas aqui no Brasil. 

Em 1981, a CCD, o Centro de Controle de Doenças dos USA começou a registrar um aumento significativo de doenças raras e jovens que, diante de históricos saudáveis apresentavam, de repente, cânceres e pneumonias. Os médicos constataram que o sistema imunológico desses pacientes estava gravemente enfraquecido. 

No ano seguinte, os especialistas, após pesquisas constataram que o enfraquecimento do sistema imunológico era causado por um vírus: HIV. Os casos de AIDS (Adquired Immune Deficiense Syndrome) multiplicavam-se, com 75 milhões de infectados (até 2018) e 32 milhões de mortes. No Brasil, quase um milhão de infectados.

A AIDS é disseminada por meio dos fluidos do corpo: sangue e sêmen. Estigmatizou-se grupos cujas relações eram promíscuas, com muitos parceiros, pois a transmissão dá-se por relações sexuais sem proteção, compartilhamento de seringas nos grupos usuários de drogas, transfusão de sangue contaminado e das mães grávidas portadoras do vírus que transmitem para os filhos. Só depois de muitos estudos surgiram os coquetéis que permitem uma vida, evitando-se as doenças oportunistas que atacam o sistema. A Aids provocou um temor que abalou relacionamentos, promoveu a necessidade de programas educacionais sobre DSTs. 

Outra doença devastadora foi descoberta na República Democrática do Congo e Sudão: o ebola. Cientistas afirmam que o vírus advém do morcego e que o transmite para outros animais. O ser humano contrai o vírus quando manipula animais mortos infectados., a partir dessa infecção o homem transmite para outros homens por meio de seus fluídos corporais: saliva, leite materno, sangue, suor. É uma doença altamente contagiosa. 

Entre 2013 e 2016 um surto epidêmico atingiu a Libéria, Serra Leoa e Guiné. Neste surto mais de 29 mil pessoas foram infectadas e mais de 11 mil pessoas faleceram. Os sintomas são febre alta, muitas dores no corpo, vômitos e sangramentos. Não existe um protocolo de tratamento para a doença, nem cura. Os que sobrevivem, ainda que a doença apresente um alto índice de letalidade, apresentam dores constantes nas articulações, problemas de visão e audição. 

O que sabemos, hoje, sobre a pandemia da Covid-19 ainda é muito pouco para definirmos origem, contágio e protocolos de tratamento, mas neste momento fala mais alto nosso instinto de preservação da vida: isolamento, uso de máscaras, higienização, medicamentos possíveis, mas tudo dependerá de como rege nosso organismo e sistema imunológico. É um estado de emergência que move todos os segmentos sociais. A educação tem papel essencial neste contexto: cidadania, disciplina quanto ao respeito às normas e regras, higiene, ecologia, preservação ambiental – principalmente na relação dos animais silvestres com humanos, alimentação, vida saudável, mente e corpos sãos. 

Dias atrás li um post no Facebook de um grande amigo Professor Dr da UERJ/FAT, Nelson Tavares Matias, profissional competente, educado, sensato que expunha as conclusões sobre aeronaves que voltavam de combates na II Grande Guerra: "Durante a II Guerra Mundial, os Aliados mapearam os buracos de bala em aviões que foram atingidos por fogo nazista. Procuravam fortalecer os aviões, reforçar áreas fortemente espancadas por artilharia inimiga para poder resistir ainda mais a essas batalhas. Seu pensamento imediato foi reconstruir e reforçar as áreas do avião que tinham mais pontos vermelhos (ou que recebiam mais balas). Teoricamente, era uma dedução lógica. Afinal, estas foram as áreas mais afetadas. Mas Abraham Wald, um matemático, chegou a uma conclusão diferente: os pontos vermelhos representavam apenas os danos nos aviões que conseguiam voltar, que chegaram em casa. As áreas, que realmente deveriam reforçar, eram os lugares onde não havia pontos, pois esses são os lugares onde o avião não sobreviveria ao ser atingido. Este fenômeno chama-se "desvio de sobrevivência". É quando olhamos para as coisas que sobreviveram quando devíamos concentrar-nos nas que não. O que você está olhando nessa crise?” Para pensarmos!! 

REFERÊNCIAS

HAYS, J.N. Epidemics and Pandemics Their Impacts o human history. Austin: Texas, 2005;

https://www.facebook.com/nelson.t.matias 

https://br.historyplay.tv/noticias/voce-acha-que-o-coronavirus-e-assustador-conheca-3-pandemias-que-mataram-milhoes-de-pessoas;

SILVA, Daniel Neves. "Gripe espanhola"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/historiag/i-guerra-mundial-gripe-espanhola-inimigos-visiveis-invisiveis.htm Acesso em 22 de junho de 2020; 

SOUZA, Christiane Maria Cruz de. A Gripe Espanhola na Bahia: saúde, política e medicina em tempos de epidemia e 

SOUZA, Christiane Maria Cruz de. A epidemia de gripe espanhola: um desafio à medicina baiana. 

*STELA MARIS LEITE CARRINHO DE ARAÚJO

-Mestre em Educação- UNISAL SP;
-Licenciada em Português e Inglês -UNISAL Lorena; 
-Pedagoga; e
Supervisora de Ensino - SEESP.








Nota do Editor:
Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

sexta-feira, 17 de julho de 2020

Que País é Este?

Autor:Michel Reis(*)
"Nas favelas, no Senado
Sujeira pra todo lado
Ninguém respeita a Constituição
Mas todos acreditam no futuro da nação
Que país é esse?" – Trecho da música "Que País é este?", da banda Legião Urbana.

Quando Renato Russo escreveu a letra acima, lá nos anos 1978, lançando-a, posteriormente, em 1987 com o Legião Urbana, sua crítica acertava o tom do momento histórico em que se vivia. Sua composição, ainda no regime militar, e seu lançamento durante o governo civil antes da promulgação da atual constituição federal, que consta de 1988, acerta o tom com uma leitura que só demonstra como o ciclo de descumprimento à constituição federal, ou de uma interpretação míope e conveniente com atos absurdos e abusivos quanto a ordem e a moral. O problema não é exatamente o momento em que a música fora composta ou lançada, mas sim o fato de que continua sendo ecoada até os nossos dias e se projeta, de forma quase profética, para o futuro.
Vivemos num país que passou pela amarga realidade de Impeachment presidencial em dois momentos: Fernando Collor de Melo, em 1992 e Dilma  Vana Rousseff, em 2016. Nestes dois processos vimos escancaradamente como a constituição não é a lei maior do país, mas interesses e conchavos o são.
Nos outros momentos da história do nosso país, pós 1988, percebemos claramente que não existe uma lei que regente da ordem democrática e reguladora dos poderes constituídos e das instituições nacionais.
Percebemos, nos últimos tempos, que o poder Legislativo acaba tendo o poder executivo nas mãos podendo derrubar vetos presidenciais ou simplesmente arquivar projetos deste por quaisquer motivos que sejam, incluindo os "nada republicanos" sob a exigência da prática da cultura de "troca de favores"; percebemos que o poder judiciário, que tem ganhado destaque nos últimos tempos pelo protagonismo estranho que nosso Supremo Tribunal Federal, nas pessoas de seus ministros, tem tomado pela usurpação dos poderes legislativos e executivos, sendo ele mesmo a "vítima, investigador e julgador" das ações populares e políticas. Isso demonstra como àqueles que deveriam ser os guardiões da Constituição estão agindo de maneira estranha e deixando claro que esta não serve para nada quando não se pode torcê-la para interesses espúrios.
A classe política muda-a com emendas que tornam-na um verdadeiro penduricalho e cabides ideológicos e de atos criminosos, mostrando claramente que a mesma deve ser seguida sob a ótica da conveniência, mas deve ser posta à parte sempre que não se quiser obedecê-la. Eis ai o problema.
Quando a constituição fora formada e promulgada, a ideia era abranger e proteger todos os brasileiros, filhos desta pátria amada, como mãe gentil dos filhos deste solo. Porém percebemos que, apesar dos discursos inflamados que sugerem proteção aos seguimentos do povo, dividindo-os como minorias e tentando promover, para tapeação, a ideia de inclusão social, ocorre o inverso justamente pelo desconhecimento da grande parte da população desta tal Lei.
Maior que rege a nação e pelo fato dos políticos distorcerem-na e com conluio ou iniciativa, do próprio poder judiciário. Estes roubam, desviam, fraudam e se corrompem para manter suas regalias sob o discurso de que lá estão para garantir e promover os direitos básicos e constitucionais da população que não tem moradia digna, não tem saneamento básico, acesso à educação de qualidade e a comida. Isto tem ficado mais evidente com os escândalos de desvios de recursos emergenciais em plena Pandemia do COVID-19 e as incursões judiciárias não contra estes, mas contra quem pensa diferente de sua filosofia e provoca inquietações contra suas condutas.
Mas isso não é, lamentavelmente, apenas um problema nos poderes públicos, embora estes devessem dar o bom exemplo. Diariamente somos bombardeados com informações de que nossos pares, e me refiro a população, tem aproveitado este momento para também praticar ou acentuar ainda mais outras práticas que agravam os problemas e empurram a população mais fundo no buraco. E para estes também não há lei, pois se espelham nos figurões do poder público e a estes recorrem para apadrinhamento ou financiamento de defesas e fugas da mira da opinião pública. Isto tudo por que não há uma lei maior, que esteja regendo a nação, pois a que outrora deveria fazê-lo está constantemente sendo rasgada e ignorada.
Em Israel, segundo as tradições religiosas, no período anterior à monarquia quando ainda eram “teocráticos” e conduzidos por "juízes", mas sem seguir a lei maior que regia o estado de Israel naquele período, lê-se o seguinte na passagem bíblica de Juízes 21.25: "Porque naquele tempo não havia rei em Israel e cada um fazia o que bem lhe parecia"
Pois bem, embora não sejamos oficialmente uma monarquia há mais de um século, cada qual faz o que quer, incluindo suas sujeiras e distorções da verdade, por não haver uma lei que realmente esteja regendo os rumos e comportamento, e da qual todos estejam submetidos. Não importa se é no centro do poder político, no palácio da justiça ou nas periferias. Ninguém tem lei maior, a sujeira se espalha e nos faz perguntar, em tom quase que incrédulo diante do que vemos: "Que país é este?".

*MICHEL DOS SANTOS REIS
















- Graduado no Curso de Pesquisa e Extensão sobre combate ao Bullying pela Universidade Estadual Sudoeste da Bahia;
Graduado no  curso livre de "Política Contemporânea , da plataforma SABERES, oferecido pelo Instituto Legislativo Brasileiro(ILB), do Senado Federal ; 
-Graduando em HISTÓRIA pela UNOPAR EAD;
 e
-Palestrante e escritor amador

Nota do Editor:

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quinta-feira, 16 de julho de 2020

Valor da Pensão Alimentícia pode ser Afetada pela Pandemia?


Autora: Allana Jéssika Santos Souza (*)


Atualmente, estamos vivenciando um forte momento de pandemia no país, como forma de prevenção da doença medidas legais e paralegais estão sendo tomadas por estados e municípios do país.

No DECRETO Nº 10.282, DE 20 DE MARÇO DE 2020 foi decidido que as medidas de distanciamento e isolamento ficariam a cargo de cada município, isso devido aos números de casos inconstantes em cada localidade.

Neste ínterim, fóruns, cartórios e escritórios de advocacia se mantiveram fechados, neste meio tempo grande parte da população sofreu reajustes de salários ou perderam seus empregos.

Recentemente foi publicada a pesquisa intitulada: O impacto econômico da pandemia de coronavírus no Brasil, realizada pelo banco BTG Pactual e FSB em que foram constatados que cerca de 11% dos entrevistados já perderam o emprego, 69% cortaram gastos na família e outros 56% vão atrasar pagamentos de dívidas. 

Neste cenário nos deparamos com inúmeros casos de atrasos no pagamento da pensão alimentícia sob a alegação de falta de condições financeiras para o cumprimento da obrigação. Neste caso surge a dúvida: Como cobrar a pensão alimentícia atrasada? O valor da pensão alimentícia pode ser revisado em tempos de pandemia?

Os impactos econômicos ocasionados pelo novo coronavírus no direito de Família

Conforme apontam especialistas e a própria doutrina majoritária o valor monetário da pensão alimentícia é arbitrado pelo juiz não com base apenas no valor do salário do ou dose progenitores, mas sim, considerando a possibilidade de quem paga a pensão e a necessidade do alimentado.

Tal analise é conhecida como binômio (necessidade/possibilidade), portanto para que haja uma revisão do valor da pensão, seja para aumento do valor ou diminuição deverá ser comprovado as mudanças nas condições do credor ou do devedor de alimentos.

Entende-se que, comprovada a redução da capacidade econômica do devedor é passível o pedido de revisão de pensão, independente do momento, seja pandêmico ou não.

Ressalta-se, entretanto, que o momento de pandemia pelo covid-19 surge como um agravante ao caso, ficando a carga da interpretação do juiz fixar o reajuste ou não.

Decisões judiciais

Em se tratando de um momento singular os magistrados tenham autonomia quase total em relação as resoluções das demandas acerca do reajuste das pensões alimentícias, visto que em caso de falta de jurisprudência ou leis especificas fica a cargo da interpretação analógica do magistrado a sua decisão.

Neste caso, a recente decisão da Justiça de Minas Gerais que deferiu parcialmente o pedido de tutela provisória de urgência no caso de redução de valor de pensão alimentícia, demostra que a relação binômia tem maior peso em detrimento da comprovação de ganhos do devedor de alimentos. Tal decisão manteve os alimentos in natura.

O magistrado ressaltou que o comunicado feito pelo empregador ao requerente não deu certeza quanto ao valor mensal que será recebido. Com isso, não haveria como reduzir a pensão alimentícia ao importe pretendido de um salário mínimo mensal. Por outro lado, com base no artigo 300 do Código de Processo Civil, o pedido de tutela de urgência foi acolhido para que o requerente não amargue uma obrigação que não terá como cumprir. O juiz entendeu, então, como razoável a redução para 2,4 salários mínimos  – metade do que era pago anteriormente –, mantidos os alimentos in natura e incluindo a parcela devida a título de 13º salário.
(IBDFAM, 2020)
Tal decisão demostra a sensibilidade da justiça frente as questões jurídicas, importante ressaltar que tal revisão se deu exclusivamente em momentos de diminuição dos valores arrecadados por parte do devedor de alimentos, comprovado reajuste em futuro período a defesa da requerente poderá ingressar com novo pedido para reexame dos valores devidos ao alimentado.

Tal decisão se firma no texto legal contido no artigo 1.699 do Código Civil, que estabelece: Se, fixados os alimentos, sobrevier mudança na situação financeira de quem os supre, ou na de quem os recebe, poderá o interessado reclamar ao juiz, conforme as circunstâncias, exoneração, redução ou majoração do encargo.

Em casos similares, entende-se que o pedido de tutela de urgência é cabível, visto que conforme o artigo 300 do CPC "A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo."

Aplicando-se ao caso concreto a demora no reexame do valor da pensão alimentícia pode ocasionar o descumprimento do pagamento da obrigação, seja total ou parcial, o que poderá resultar em um pedido de prisão do devedor.

Contudo, é preciso ressaltar que não somente em casos de diminuição dos valores arrecadados pelo devedor de alimentos possibilita o pleito do pedido de reexame dos valores outrora fixados.

Ainda conforme a redação do artigo 1.699 do Código Civil, havendo mudanças nas condições financeiras de quem recebe alimentos é passível o pedido de revisão dos valores.

Ainda segundo a pesquisa do banco BTG Pactual e FSB, cerca de 15% das mulheres já perderam seus empregos, contra 8% dos homens. Além disto 19% das pessoas que perderam o emprego tinha a renda familiar de até um salário mínimo.

Tais resultados demostram que a parte mais afetada são as classes com menor poder aquisitivo, cujo qual detém a maior parte dos pedidos de pensão alimentícia deferidos.

Diante deste cenário, nada retira o direito da requente entrar com pedido de reexame dos valores da pensão alimentícia com o intuito de aumentar o valor pago pelo credor dos alimentos, ou menos, realizar a conversão do valor em pagamento de alimentos in natura, tendo como base legal a diminuição das condições do alimentado frente a possibilidade do devedor de alimentos no atual período. 

Referências:

Os brasileiros e o Coronavírus: visões sobre a pandemia e seus impactos econômicos. BTG Pactual digital. Disponível em: https://www.btgpactualdigital.com/blog/coronavirus/pesquisa-os-brasileiros-e-o-coronavirus. Acesso em 01 jul. 2020. 

Juiz minora pensão alimentícia após redução de salário por conta da pandemia do coronavírus. IBDFAM – Instituto brasileiro de Direito de Família. Disponível em: http://www.ibdfam.org.br/noticias/7222/Juiz+minora+pens%C3%A3o+aliment%C3%ADcia+ap%C3%B3s+redu%C3%A7%C3%A3o+de+sal%C3%A1rio+por+conta+da+pandemia+do+coronav%C3%ADrus. Acesso em 28 jun. 2020. 

 *ALLANA JÉSSIKA SANTOS SOUZA













-Bacharel em Direito pelo Centro Universitário de Goiás - Uni-Anhanguera em 2019/2;
-Aprovada no XXIX da Ordem dos Advogados do Brasil;
-Autora de artigos nas áreas de Direito de Família e Direito do Trabalho;
Instagram: @allana_jessika
E-mail: Allanajessika@hotmail.com
Diretora Executiva da http://www.ajsolucoesdigitais.com

Nota do Editor:


Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

quarta-feira, 15 de julho de 2020

Inscrição Indevida do Consumidor em Banco de Dados



Autora: Angela Garcia da Silva(*)


Mesmo que a ação ajuizada para questionar a inscrição anterior ainda não tenha transitado em julgado, desde que demonstrada a verossimilhança das alegações do consumidor será permitido a flexibilização da súmula 385/STJ.
"Admite-se a flexibilização da orientação contida na súmula 385/STJ para reconhecer o dano moral decorrente da inscrição indevida do nome do consumidor em cadastro restritivo, ainda que não tenha havido o trânsito em julgado das outras demandas em que se apontava a irregularidade das anotações preexistentes, desde que haja nos autos elementos aptos a demonstrar a verossimilhança das alegações.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.704.002-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 11/02/2020 (Info 665)"

A súmula 385 do STJ, objeto de muito questionamento pela doutrina por atentar contra direitos dos consumidores recebeu uma nova roupagem agora com o Informativo 665 do STJ.

De forma simples, compreendamos o caso, na hipótese de um consumidor adquirir algum produto de mercado e ficar em débito com o fornecedor, o mesmo poderia lançar o nome do consumidor nos bancos de dados de restrição / cadastros de proteção ao crédito (exs.: SPC e SERASA).

Sendo assim, após a quitação integral a fornecedor deve procurador os serviços de proteção ao crédito e congêneres para que efetue a retirada do nome do consumidor de seus bancos de dados, a exclusão deve ocorrer em até 5 dias úteis de acordo com súmula 548 STJ.

Acontece que, nem todas empresas respeitam estes prazos e até mesmo chegam a ultrapassar o período de prescrição do lançamento destes dados que é de 5 anos, ou seja após este período não interessa se houve ou não pagamentos, o nome do consumidor não pode estar mais no rol de "maus pagadores".
"Art. 43. § 1° Os cadastros e dados de consumidores devem ser objetivos, claros, verdadeiros e em linguagem de fácil compreensão, não podendo conter informações negativas referentes a período superior a cinco anos."

Quando ainda, de modo geral em casos concretos empresas lançam o nome do consumidor nos bancos de dados sem respeitar as regras devidas da legislação, como por exemplo a prévia notificação do consumidor.

"Art. 43 § 2° A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele."

Deste modo, empresas aproveitam de determinadas situações e com a brecha desta Súmula, na qual proibiria que houvesse indenizações ao consumidor que já negativado de maneira legal, um futuramente sofresse lançamento equivocado, não seria permitido posterior indenização, presumindo que: "se o nome foi sujo de maneira lícita" agora “sujo de maneira ilícita” não é caso de indenizações.

Por conseguinte, a súmula em questão foi reformulada quanto as tratativas de uma primeira ação envolvendo negativações lícitas fosse sanada, (não há mais essa necessidade) com o devido trânsito em julgado, para que então uma nova ação pudesse ser pleiteada buscando uma indenização por lançamentos no banco de dados de modo indevido. 

Isto posto, ainda que a ação ajuizada para questionar a inscrição anterior ainda não tenha transitado em julgado, desde que confirmada a verossimilhança das alegações do consumidor será consentido a flexibilização da súmula 385/STJ.

REFERÊNCIAS:

Dizer o direito News. INFORMATIVO COMENTADO.
Disponível em:
Acesso em 28. mai. 2020.

BRASIL. Lei 8.078/1990. Código de Defesa do Consumidor.
Disponível em:
Acesso em 28. mai. 2020.



 ANGELA GARCIA DA SILVA





















-Advogada
-Bacharel em Direto pela Faculdade Morgana Potrich – FAMP;
-Pós Graduada em Direito Constitucional pela Damásio (Faculdade IBMEC São Paulo);
Agente Administrativo do Setor de Licitações da Fundação Integrada Municipal de Ensino Superior – FIMES;
Instagram: angelaags

Nota do Editor:

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terça-feira, 14 de julho de 2020

Considerações sobre o Estupro de Vulnerável



Autor: Sergio Luiz Pereira Leite(*)


Em recente artigo aqui publicado, falei sobre os crimes hediondos, asseverando naquela oportunidade e enfatizando isso agora, que os crimes com essa designação são aqueles considerados mais cruéis para e pela a sociedade.

 O CONCEITO DE VULNERÁVEL

Pois bem, o estupro de vulnerável é um desses crimes que a sociedade abomina, vê nele uma repulsividade muito grande e a legislação penal, sempre atenta aos clamores populares, fê-lo inserir nessa categoria.

Em primeiro lugar e para a melhor compreensão do tema, cumpre definir o que é vulnerável.

Vulnerável é algo ou alguém que esta suscetível a ser ferido, ofendido ou tocadoVulnerável significa uma pessoa frágil e incapaz de algum ato. O termo é geralmente atribuído a mulheres, crianças e idosos, que possuem maior fragilidade perante outros grupos da sociedade.

Na sociedade, um indivíduo vulnerável é aquele que possui condições sociais, culturais, políticas, étnicas, econômicas, educacionais e de saúde diferente de outras pessoas, o que resulta em uma situação desigual. O fato de existirem indivíduos em uma situação vulnerável faz com que exista uma desigualdade na sociedade.

Vulnerável é um termo que também está presente no direito penal brasileiro relacionado ao estupro. Estupro de vulnerável é um crime que consta no Código Penal e designa um tipo de violência ao indivíduo vulnerável, por exemplo, crianças e idosos.

A FIGURA PENAL PUNÍVEL

Na seara do Direito Penal e, em especial no estupro, o apenamento aos crimes praticados contra tais pessoas, está incluído no artigo 217 A da legislação substantiva penal, que diz:

"ARTIGO 217 A -  Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.
§ 1º Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.
§ 2º (VETADO)
§ 3º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave:
Pena - reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos.
§ 4º Se da conduta resulta morte:
Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos."
Pela leitura da norma acima descrita, advinda com a promulgação da Lei de número 12.051/2009, se percebe que ela enquadra como vulnerável não somente a pessoa menor de 18 anos, mas também quando essa prática criminal envolve vítima portadora de enfermidade ou deficiência mental.

Se da ação resulta lesão corporal de natureza grave, o agente se submete a uma pena de reclusão de 10 a vinte anos e, se da ação delitiva resultar a morte da vítima, a pena reclusiva será fixada em um mínimo de 12 e máximo de 30 anos. 

A JURISPRUDÊNCIA

A jurisprudência, desde a edição da lei nº 12.051/2009, sempre puniu, de forma rigorosa, mas dentro dos limites legais, o infrator que cometeu um crime dessa espécie.

Esse é o entendimento da jurisprudência pacificada no STJ sobre o tema, como ficou estabelecido em recurso repetitivo julgado em agosto de 2015 na Terceira Seção, sob relatoria do ministro Rogerio Schietti Cruz (Tema 918).

Naquele julgamento, foi consignado que, "para a caracterização do crime de estupro de vulnerável previsto no artigo 217-A, caput, do Código Penal, basta que o agente tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa menor de 14 anos".

O repetitivo foi ainda um dos precedentes que deram origem à Súmula 593, publicada no Diário da Justiça Eletrônico em novembro de 2017, segundo a qual "o crime de estupro de vulnerável se configura com a conjunção carnal ou prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo irrelevante eventual consentimento da vítima para a prática do ato, sua experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente".

A título de informação e para os leigos, as súmulas sintetizam o resumo de entendimentos consolidados nos julgamentos do tribunal e servem de orientação a toda a comunidade jurídica sobre a jurisprudência firmada pelo STJ, que tem a missão constitucional de unificar a interpretação das leis federais. Nesse mesmo diapasão se elencam inúmeros julgados, um dos quais me permito transcrever a ementa, assim expressa, verbis:
"[…] 1. A literalidade da Lei Penal em vigor denota clara intenção do Legislador de proteger a liberdade sexual do menor de catorze anos, infligindo um dever geral de abstenção, porquanto se trata de pessoa que ainda não atingiu a maturidade necessária para assumir todas as consequências de suas ações. Não é por outra razão que o Novo Código Civil Brasileiro, aliás, considera absolutamente incapazes para exercer os atos da vida civil os menores de dezesseis anos, proibidos de se casarem, senão com autorização de seus representantes legais (art. 3.º, inciso I; e art. 1517). A Lei Penal, por sua vez, leva em especial consideração o incompleto desenvolvimento físico e psíquico do jovem menor de quatorze anos, para impor um limite objetivo para o reconhecimento da voluntariedade do ato sexual. 2. A presunção de violência nos crimes contra os costumes cometidos contra menores de 14 anos, prevista na antiga redação do art. 224, alínea a, do Código Penal, possui caráter absoluto, pois constitui critério objetivo para se verificar a ausência de condições de anuir com o ato sexual. Não pode, por isso, ser relativizada diante de situações como de um inválido consentimento da vítima; eventual experiência sexual anterior; tampouco o relacionamento amoroso entre o agente e a vítima. 3. O Supremo Tribunal Federal pacificou o entendimento ‘quanto a ser absoluta a presunção de violência nos casos de estupro contra menor de catorze anos nos crimes cometidos antes da vigência da Lei 12.015/09, a obstar a pretensa relativização da violência presumida". (HC 105558, Rel. Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 22/05/2012, DJe de 12/06/2012). […]" (EREsp 1152864 SC, Rel. Ministra LAURITA VAZ, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 26/02/2014, DJe 01/04/2014).
Com estas anotações, percebemos o quão grave e repulsivo para a sociedade é o crime em análise, não sem razão inserido nos crimes ditos hediondos. Devemos ainda considerar que expressivo número de delitos desse naipe são praticados em ambiente familiar á vítima.

*SERGIO LUIZ PEREIRA LEITE


 -Advogado militante nas áreas cível e criminal na Comarca de Tietê, Estado de São Paulo.

 Nota do Editor:

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