Autora : Adriana Soeiro Pino(*)
Cenário Atual
O novo marco regulatório da Educação a Distância (EaD), estabelecido pelo Decreto nº 12.456/2025, publicado em 20 de maio, introduz mudanças significativas que impactam instituições de ensino superior, docentes e estudantes. Esta ação foi necessária, a fim de resgatar a qualidade dos cursos ofertados na modalidade, que vêm se deteriorando desde 2020, após o período pandêmico.
De acordo com o Censo da Educação Superior de 2023, a Educação a Distância (EaD) tem se consolidado como uma das principais modalidades de ensino superior no Brasil. A rede privada concentra a maioria das matrículas na EaD, com 95,9% do total. Além disso, 90% das matrículas em licenciaturas nas instituições privadas foram em cursos a distância.
A modalidade representou 66,4% dos ingressos em cursos de graduação, totalizando mais de 3,3 milhões de novos estudantes. Entre 2013 e 2023, as matrículas em cursos EaD aumentaram 326%, enquanto as presenciais caíram 29,1%. De acordo com o censo, mais de 5 milhões de estudantes, que representam 49,7 % do total de alunos matriculados em 2023.
Histórico
Desde a implantação da modalidade a distância, a SEED/ MEC apresentou um documento com a definição desses Referenciais de Qualidade para a educação superior a distância no País. Esses Referenciais de Qualidade circunscrevem-se no ordenamento legal vigente em complemento às determinações específicas da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, do Decreto 5.622, de 20 de dezembro de 2005, do Decreto 5.773 de junho de 2006 e das Portarias Normativas 1 e 2, de 11 de janeiro de 2007, cujas orientações possuíam "função indutora, não só em termos da própria concepção teóricometodológica da educação a distância, mas também da organização de sistemas de EaD." (SEED- MEC)
A partir dos Referenciais da Qualidade e do Primeiro Marco Regulatório de 2017, as Instituições de Ensino Superior estruturaram seus respectivos cursos a distância, prezando inicialmente, pela formação de seus docentes para ocuparem a função de professor-tutor e ou tutor, pois, apesar da autonomia do estudante on line, estes exerciam um importante papel na condução da aula virtual. Isso pôde ser constatado pelos dados do Censo EAD 2009, que comprovaram que a mediação e o acompanhamento dispensado às turmas virtuais são um importante diferencial, pois a presença desse profissional diminuiu significativamente a evasão, mantendo, assim, a permanência dos estudantes nos cursos.
No entanto, com o passar do tempo, a função do tutor restringiu-se às orientações técnicas sobre funcionamento da Plataforma Virtual, resolução de questões puramente administrativas e ou aplicadores de avaliações presenciais. Portanto, neste quesito, o Novo Marco Regulatório resgatou as atribuições do tutor, previstas inicialmente nos Referenciais de Qualidade de 2007.
Um novo marco legal para a EaD
As instituições terão dois anos para se adaptar a todas as exigências do novo decreto, mas os estudantes já matriculados terão a garantia de finalizar o curso no formato contratado. Além disso, ainda são esperadas normas complementares e um calendário regulatório. Já estão disponibilizadas duas Portarias: 378 e 381, as quais definem o formado dos cursos em suas diversas modalidades, bem como restringem os cursos que poderão ofertá-las.
A Portaria 378 do MEC, de 19 de maio de 2025, estabelece os formatos de oferta, ou seja, presencial, semipresencial e a distância, embora instituições já utilizassem a modalidade semipresencial com outras nomenclaturas, como Flex e híbrido, esta foi oficializada pela Portaria em questão. Além disso, define cursos que não podem ser ofertados no formato EaD, com atividades síncronas e mediadas pelo tutor mediador. Sobre as modalidades de ensino, temos a seguinte estrutura:
Sobre as modalidades de ensino, temos a seguinte estrutura:
CURSOS PRESENCIAIS: de acordo com o novo decreto temos 30 % EaD com atividades síncronas e assíncronas, anteriormente eram até 40%;
CURSOS SEMIPRESENCIAIS: precisam oferecer no mínimo 30% de atividades presenciais e 20% de atividades assíncronas mediadas. No entanto, alguns cursos da área da saúde exigem 40 % de presencialidade e 20% de atividades mediadas síncronas;
CURSOS EAD : 10 % de atividades presenciais e 10% de atividades síncronas mediadas, limitando as turmas a 70 estudantes para cada mediador pedagógico;
O documento também proíbe a modalidade EAD para alguns cursos: licenciaturas, engenharias, medicina, enfermagem, odontologia, psicologia e direito.
A Portaria 381 define regras de transição para o novo Marco Regulatório do EaD, estabelecido pelo Decreto nº 12.456/2025, que é de 90 dias para a extinção das ofertas atuais, criando os cursos nos novos formatos: presencial, semipresencial e EAD; todos eles deverão ser permeados pelas DCNs independentemente dos tipos de modalidade. Especificamente, a portaria estabelece um calendário de processos regulatórios no Sistema e-MEC para o ano de 2025.
O que muda com o Decreto 12.456/2025?
O novo marco exige que os polos de EaD possuam Infraestrutura física adequada, com salas, laboratórios, bibliotecas e internet estável. A fim de garantir a identidade Institucional, haverá a proibição de compartilhamento de espaço com outras instituições e marcas. Está prevista a regulamentação específica para polos no exterior.
Com relação Corpo docente, o decreto redefine as funções, previstas anteriormente nos Referenciais de Qualidade de 2027 e acrescenta o mediador pedagógico.
São profissionais envolvidos na EaD:
•Professor conteudista, regente e coordenador: responsáveis pelo conteúdo e condução das disciplinas;
•Mediador pedagógico: nova figura obrigatória, atuando na mediação didática, ou seja, interação nos fóruns de dúvidas, participação nas lives e webinares ou mesmo atividades presenciais;
•Tutor: passa a ter papel administrativo, isto é, orientação com relação ao acesso à plataforma virtual, enviar lembretes sobre vencimentos de atividades e agendamento de avaliações presenciais, encaminhar as solicitações dos estudantes aos demais setores institucionais, por exemplo.
Com relação à obrigatoriedade das avaliações presenciais com peso maior na composição da média, não é novidade, sempre existiu, porém, desde a pandemia em 2020, ficaram suspensas. Embora o MEC tenha recomendado o retorno das provas e encontros presenciais desde 2022, houve resistência por parte das Instituições e respectivos polos parceiros, devido à logística, custos com material impresso, locação de espaço, além da natural recusa dos estudantes também. Sobre os tipos de questões, além das questões objetivas, será necessário incluir 1/3 de questões discursivas nas avaliações presenciais.
Outra garantia firmada pelo decreto é a proibição de contratos com os parceiros das Instituições educacionais, ou seja, os polos que são empresas terceirizadas não poderão celebrar contratos com os alunos. Agora, o vínculo educacional deve ser direto entre estudante e mantenedora da instituição. Essa medida fortalece os direitos do estudante e impede abusos por terceiros.
No caso da oferta das pós-graduações lato sensu, há vinculação direta ao credenciamento das graduações e suas respectivas modalidade, ou seja, se a Instituição não tiver autorização junto ao MEC para funcionamento EaD, não poderá oferecer lato sensu nesta modalidade. As IES que ofertam apenas stricto sensu continuam podendo oferecer lato sensu, mas agora precisam passar por um credenciamento simplificado.
De modo geral, o novo Decreto nº 12.456/2025 representa um marco importante para a consolidação da EaD como uma modalidade legítima, qualificada e transparente. Ao mesmo tempo, impõe restrições coerentes em áreas sensíveis como saúde e formação de professores, promovendo maior confiança da sociedade nos diplomas emitidos. No entanto, ficou claro também o poder que alguns Conselhos de Classe possuem junto ao MEC/ INEP, como por exemplo a OAB. O curso de Direito possui em sua grade uma série de disciplinas propedêuticas, que são a fundamentação teórica sobre sociedade, filosofia e as bases do direito, que poderiam perfeitamente ser realizadas nas Plataformas Virtuais. Diferente das disciplinas práticas, em que a presencialidade é imprescindível para a execução destas, como por exemplo, primeiros socorros da enfermagem, nas licenciaturas as aulas sobre prática de ensino ou mesmo no direito as disciplinas hermenêuticas que são embasadas na interpretação, portanto carecem de discussão.
A seguir, apresento uma breve análise das principais vantagens e desvantagens das alterações apresentadas. para cada um desses grupos:
Para as Instituições de Ensino Superior (IES)
Vantagens:
Valorização da qualidade acadêmica: O decreto estabelece padrões mais rigorosos para a oferta de cursos EaD, promovendo a excelência no ensino e fortalecendo a reputação das instituições comprometidas com a qualidade;
Encontros presenciais mediados: oportunidades que representam crescimento e estratégias para retenção de alunos; e
Clareza regulatória: Com definições mais precisas sobre formatos de cursos e exigências de infraestrutura, as IES têm diretrizes claras para planejamento e implementação de programas EaD.
Desvantagens:
Aumento de custos operacionais: A necessidade de infraestrutura física adequada para polos EaD, como laboratórios e bibliotecas, pode elevar os custos para as instituições, especialmente aquelas com grande número de polos;
Restrições na oferta de cursos: A proibição de cursos 100% a distância em áreas como Direito, Medicina e Licenciaturas limita a expansão da EaD em setores com alta demanda, impactando a captação de alunos e a receita das instituições.
Para os Docentes
Vantagens:
Reconhecimento profissional: O novo marco valoriza o papel dos professores na EaD, substituindo a figura do tutor por profissionais com formação específica, o que pode resultar em melhores condições de trabalho e remuneração.
Maior interação com os alunos: A exigência de atividades síncronas e presenciais promove uma relação mais próxima entre docentes e discentes, enriquecendo o processo de ensino-aprendizagem.
Desvantagens:
Necessidade de adaptação: Professores terão que se adaptar a novas metodologias e tecnologias, o que pode demandar tempo e recursos para formação continuada.
Carga de trabalho ampliada: A obrigatoriedade de avaliações presenciais, contendo 1/3 de questões discursivas e atividades síncronas pode aumentar a carga horária dos docentes, exigindo uma reorganização das atividades pedagógicas.
Para os Estudantes
Vantagens:
Melhoria na qualidade do ensino: Com a implementação de padrões mais rigorosos e a valorização da interação com professores, os estudantes podem esperar uma formação mais sólida e reconhecida;
Experiência de aprendizagem enriquecida: A combinação de atividades presenciais e síncronas proporciona uma aprendizagem mais dinâmica e engajadora;
Encontros presenciais mediados: possiblidade de desenvolvimento de competências socioemocionais; carreira e trabalhabilidade- atividades extensionistas.
Desvantagens:
Redução da flexibilidade: A obrigatoriedade de atividades presenciais e síncronas pode limitar a flexibilidade que caracteriza a EaD, dificultando a conciliação dos estudos com outras responsabilidades;
Possível aumento de custos: A necessidade de deslocamento para atividades presenciais e a infraestrutura exigida podem resultar em custos adicionais para os estudantes, impactando especialmente aqueles de regiões remotas ou com menor poder aquisitivo.
Em resumo, o novo marco regulatório da EaD busca elevar a qualidade do ensino a distância no Brasil, promovendo uma formação mais robusta e reconhecida. No entanto, as mudanças trazem desafios significativos para instituições, docentes e estudantes, exigindo adaptações e investimentos para que os benefícios sejam plenamente alcançados. Um dos riscos é que as Instituições estimulem a entrada de alunos na modalidade EaD até início de agosto de 2025, prazo que que as regras anteriores ainda estarão válidas.
REFERÊNCIAS:
BRASIL. Decreto nº 12.456, de 19 de maio de 2025. Dispõe sobre a oferta de educação a distância por instituições de educação superior em cursos de graduação e altera o Decreto nº 9.235, de 15 de dezembro de 2017, que dispõe sobre o exercício das funções de regulação, supervisão e avaliação das instituições de educação superior e dos cursos superiores de graduação e de pósgraduação no sistema federal de ensino.
Disponível em : https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2025/decreto/D12456.htm Pino,
Adriana Soeiro. Curso de pedagogia on line: os referenciais de qualidade da EAD. São Paulo. / Adriana Soeiro Pino. 2012. 187 f.
MEC. Referencias De Qualidade Para Educação A Distância (2007).
Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12777%3Areferen ciais-de-qualidade-para-ead&catid=193%3Aseed-educacao-a-distancia&Itemid=865 Acessado em maio de 2025.
*ADRIANA SOEIRO PINO
-Graduação em Pedagogia - Faculdades Integradas de Guarulhos (1991);
-Mestrado em Educação pela Universidade Nove de Julho (2012); e
-Doutorado em Educação pela Universidade Nove de Julho (2017);
-Atualmente é professora de ensino superior da Faculdade FATEC- Unidade Tatuapé -SP , Gestora de EaD e Diretora do Externato José Bonifácio -SP ;
-Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Educação a Distância, atuando principalmente nos seguintes temas: Educação a Distância, tecnologias, linguagens, aprendizagem na era digital, educação em rede e inglês .
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