Autor: Rogério Alves (*)
A propriedade privada é um dos direitos mais importantes no âmbito particular do indivíduo. A Constituição Federal (CF) prevê proteção legislativa no artigo 5º, inciso XXII, para o indivíduo, e no artigo 170, inciso II, como princípio fundamental da ordem econômica. Os demais direitos sobre este tema são descritos em lei ordinária, especialmente no Código Civil.
Tramita atualmente no Senado Federal o Projeto de Lei (PL) nº 4/25, que trata da atualização legislativa no âmbito das relações civis, a chamada "Reforma do Código Civil". Dentre as inovações legislativas, destacam-se temas ligados ao direito de família, principalmente no que tange aos bens em diferentes situações, estabelecendo novas diretrizes para o exercício do direito à propriedade privada.
Uma das inovações diz respeito à ampliação da autonomia dos cônjuges e companheiros na gestão dos bens comuns, conferindo maior flexibilidade na administração, sempre respeitando o regime definido na união estável ou no casamento. Ampliou-se a proteção legislativa sobre a união estável, visto que atualmente o regime aplicado a essa união, segundo o art. 1.725 do Código Civil, equivale à comunhão parcial de bens. No texto da reforma, essa proteção foi estendida aos demais regimes previstos no Código Civil. Inclusive, tanto no casamento quanto na união estável, o casal poderá estabelecer regime de bens atípico ou misto em relação às regras existentes, desde que não contrarie normas cogentes ou de ordem pública.
Um exemplo de alteração importante está no artigo 1.639 do PL nº 4/25, que permite a modificação do regime de bens após a celebração do casamento por meio de escritura pública, sem a necessidade de autorização judicial. Além disso, o artigo 1.653-B do mesmo projeto prevê a alteração condicionada do regime, após determinado prazo, por meio de cláusula inserida no pacto antenupcial ou convivencial, desde que realizado por escritura pública. Essas medidas visam simplificar e desburocratizar os procedimentos para modificar as condições iniciais da união, conferindo maior autonomia e praticidade aos cônjuges ou companheiros.
Outro ponto relevante é a partilha de bens, tanto na separação ou dissolução da união quanto na sucessão hereditária. O PL nº 4/25 traz regras mais claras, buscando evitar litígios e garantir uma divisão mais justa e equilibrada, com ênfase na proteção dos direitos dos filhos.
Uma das alterações que visam o equilíbrio patrimonial na separação ou dissolução está prevista no inciso VIII do art. 1.659 do PL nº 4/25. Nesse regime de comunhão parcial, não se comunicam entre os cônjuges ou conviventes as indenizações obtidas judicialmente contra o ofensor, em razão de danos causados a uma das pessoas da união ou a bens particulares, exceto o lucro cessante decorrente do dano. Quanto às demais regras, o texto da reforma apenas complementa de forma específica cada situação, para evitar discussões em eventual ação judicial sobre a dissolução da união.
Na partilha de bens na sucessão hereditária, o PL nº 4/25, no inciso I do art. 1829, exclui o cônjuge ou convivente sobrevivente da concorrência na primeira e segunda ordem de sucessão. Assim, os descendentes recebem o espólio do falecido; na ausência destes, os ascendentes; e somente na ausência de ambos, o cônjuge ou convivente sobrevivente terá direito, passando a ser o terceiro na ordem sucessória.
O texto da Reforma do Código Civil, embora revogue os artigos 1.711 e seguintes, que tratam do bem de família — que pode sofrer expropriação judicial em virtude de dívida — traz inovações legislativas mais simples visando à proteção patrimonial familiar, não excluindo as normas previstas sobre esse assunto na Lei nº 8.009/1990. Uma delas está no art. 391-A, que prevê que, salvo no cumprimento de obrigação alimentar, "o patrimônio mínimo de existência da pessoa, da família e da pequena empresa familiar" não poderá sofrer penhora em razão de débitos oriundos de ação judicial, com exceção da "morada de alto padrão", cuja metade responde patrimonialmente pela dívida contraída pelo ente familiar.
Outra forma de proteção patrimonial está inserida no art. 1.848 do PL nº 4/25, que permite ao testador estabelecer cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade sobre os bens da legítima, sem necessidade de justificar sua vontade para que sejam válidas. O § 1º do referido artigo permite que os beneficiários do testamento, com autorização judicial e havendo justa causa, alienem os bens gravados, mediante sub-rogação ou levantamento dos gravames.
Essas e outras alterações do Código Civil contidas no PL nº 4/25 refletem a evolução social, que gerou vasta jurisprudência, servindo de base para as discussões e a elaboração do texto em tramitação no Senado Federal. Essas mudanças buscam consolidar e institucionalizar normas legais, com o objetivo de reduzir demandas judiciais e simplificar o entendimento das relações privadas.
Importante destacar que o PL nº 4/25 está em tramitação e sujeito a alterações até sua aprovação final no Senado Federal, na Câmara dos Deputados e na sanção Presidencial, porém seu conteúdo levantam intensos debates em nossa sociedade, que certamente influenciará no resultado final.
Trata-se de um processo longo e complexo, que exige análise minuciosa da realidade social e da aplicabilidade prática das normas a serem definidas. É certo que a nova lei civil não atenderá integralmente a todas as necessidades sociais, cabendo ao Poder Judiciário preencher lacunas por meio da interpretação em ações individuais, até que se formem precedentes repetitivos que sirvam de referência para a solução de conflitos, até que novas reformas legislativas se façam necessárias. Em suma, a atualização legislativa do Código Civil é um ciclo contínuo, indispensável para que o ordenamento jurídico acompanhe as transformações sociais, tecnológicas e culturais do presente século, garantindo maior segurança jurídica, justiça e adequação às demandas contemporâneas.
Fontes:
*ROGÉRIO ALVES
-Advogado
Graduado no Centro Universitário Nove de Julho(2004);
-Especialista em Direito Público pela Escola
Paulista de Direito( 2007);
-Advogado
parceiro da Buratto Sociedade de Advogados e Shilinkert Sociedade de Advogados;
-Palestrante
do Departamento de Cultura e Eventos da OAB Seção São Paulo
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