sábado, 21 de março de 2020

Homeschooling obrigatório em tempos de coronavírus


Autora: Mariana Casoni(*)


Devido ao alastramento do COVID-19 no Brasil, vírus causador de infecção respiratória, o governo do Estado de São Paulo suspendeu as aulas como forma de conter sua transmissão. Desta maneira, crianças e jovens ficarão em casa por tempo indeterminado. Nestas horas muitos pais ficam sem saber o que fazer com os filhos e os deixam por horas na frente das telas da televisão e do celular, contribuindo para a agitação e o tédio deles.

Para muitos pais esta é uma rotina comum: a educação de seus filhos em casa, o chamado homeschooling. O termo de origem inglesa quer dizer educação domiciliar e vai além disso, representa um estilo de vida, no qual os filhos fazem atividades de aprendizado supervisionadas pelos pais. O aprendizado ocorre de maneira integral e não apenas nas horas fixadas pelos pais; todo passeio ou atividade tornam-se matéria de aprendizado.

Pode-se pensar que este modo de vida seja algo novo, no entanto esta prática era comum antes do século XIX, visto que não existia o sistema escolar como conhecemos hoje. Os pais educavam seus filhos em casa e aqueles que tinham condições contratavam um tutor para educar seus filhos.

No Brasil, este modo de vida tem ganhado notoriedade pelo aumento da adesão por parte das famílias que, compreendendo a importância de uma educação de qualidade, optam por educar os filhos em casa. Ainda não há, no país, uma lei que regulamente o homeschooling, mas também não há lei que o impeça. Segundo a Declaração dos Direitos Humanos no artigo 26, parágrafo 3: "Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos." Assim, os pais têm liberdade de escolher aquilo que é melhor para seus filhos.

Muitas pessoas podem criticar a prática do ensino domiciliar, no entanto ao longo dos anos percebe-se que os alunos que vivem esta realidade apresentam um nível muito mais elevado do que aqueles que estudam na escola regular. Segundo a ANED, Associação Nacional de Educação Domiciliar, o estudo em casa com duração de duas horas é muito mais eficaz do que as cinco horas em que o aluno fica na escola.

Sabe-se que os índices educacionais no Brasil não são nada favoráveis ao desenvolvimento dos alunos, o último exame do PISA (2018), Programa Internacional de Avaliação de Estudantes, tradução de Programme for International Student Assessment, o qual avalia os alunos da faixa etária dos 15 anos, no mundo todo, mostrou que

68,1% dos estudantes brasileiros estão no pior nível de proficiência em matemática e não possuem nível básico. Assim, caiu da posição 65ª para a 70ª posição nesta disciplina. Em ciências, nenhum aluno conseguiu chegar ao topo da proficiência na área e 55% não atingiram o nível básico. Sobre leitura e compreensão de texto, o país também não avançou. Cerca de 50% dos brasileiros não atingiram o mínimo de proficiência que todos os jovens devem adquirir até o final do ensino médio.[1]
  
Conclui-se, a partir dos dados do PISA, que infelizmente o Brasil não tem avançado nos índices educacionais, pelo contrário, tem decaído ano após ano, resultado de um sistema educacional ineficaz. Diante desta realidade alarmante, muitos pais optam pelo ensino domiciliar como uma alternativa segura de que seus filhos serão alfabetizados e estimulados a atingir suas potencialidades não só no nível educacional e de letramento, mas também como pessoa.

O ensino domiciliar não é somente uma prática de ensino diferenciada, mas é, sobretudo, um estilo de vida, no qual os pais estão dispostos a investir seu tempo e conhecimento para ensinar seus filhos da melhor maneira. Ele também não é uma afronta ao sistema escolar ou um modo de dizimá-lo, pelo contrário, nota-se que ambas as práticas podem existir na sociedade "uma prova disso é que a maioria dos países que lideram os rankings mundiais de educação permitem a educação domiciliar, como Finlândia, Austrália, Nova Zelândia, França, Canadá, Irlanda, Holanda e Dinamarca."[2]

Outro receio que paira quando se fala em educação domiciliar é em relação ao ingresso na universidade. Mesmo o jovem que não frequentou a escola regular é possível prestar o exame gratuito do Encceja (Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos). Ao prestar a prova, o jovem recebe um certificado de conclusão do ensino fundamental e do ensino médio, assim ele pode prestar o ENEM e os demais vestibulares sem problema algum.

Estima-se que no Brasil hoje haja 15 mil famílias que adotaram este modo de vida, claro que nem todas as famílias têm condições de adotar esta prática, seja por questões financeiras ou intelectual, mas é importante saber que ela é uma realidade presente em nossa sociedade e não devemos olhá-la com discriminação ou pavor sem antes conhecê-la melhor.

REFERÊNCIAS

[1]Guia do Estudante, disponível em: https://guiadoestudante.abril.com.br/atualidades/entenda-o-pisa-avaliacao-mundial-de-educacao-e-o-resultado-do-brasil/. Acesso em: 16/03/2020 e

[2]Associação Nacional de Educação Domiciliar, disponível em: https://www.aned.org.br/conheca/perguntas-e-respostas. Acesso em: 16/03/2020.

*MARIANA CASONI














-Graduada em Letras (2010) pela UNESP- Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho";
- Mestre em Literatura Comparada (2013) pela mesma Universidade;
- Professora de Língua Portuguesa e Literatura.
Currículo na Plataforma Lattes: http://lattes.cnpq.br/4705890322409799

Nota do Editor:
Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

sexta-feira, 20 de março de 2020

Verdade dos Jornalões e Jornaleros no Brasil


Guardião Verde(*)



Pois é, distintos leitores, em tempos de Covid-19, tratado carinhosamente como Coronavírus e depois de medidas tomadas, certas, ao meu modesto ver e outras totalmente equivocadas das "otoridades" brasileiras, uma vez que, estamos repetindo em escalas maiores e menores, experiências e erros que não deram certo em outros locais do mundo, vai sobrar depois de determinados confinamentos obrigatórios, muito tempo para leituras, questionamentos e pesquisas para aperfeiçoamento intelectual e também para tentarmos melhorar o que está errado. 

E começo aqui falando sobre a "gloriosa Imprensa Brasileira".


Alimentada financeiramente, desde sempre, por um sistema político famoso em promover em todos os níveis, o toma lá dá cá, com o advento do Governo anterior (TEMER) e do novo também, sentiu, no jargão popular, o "baque financeiro". Verbas outrora, destinadas, a promover, obras, programas, benefícios e também o SILÊNCIO, aos malfeitos (Roubos, Desvios, etc. etc!), foram literalmente cortadas e/ou redirecionadas para outros fins e também para a economicidade prevista pela atual Constituição Federal. Fez-se a devassa nas tais verbas publicitárias e naturalmente, haveria, houve e ainda há o chamado "chororô".

A imprensa televisiva sentiu o baque! E partiu para o ataque e desde o período pré-eleitoral, elegeu seu desafeto, talvez até por desconfiar que a continuidade das medidas tomadas pelo governo anterior teriam agora uma efetividade muito maior. E, por questões de "ser" Imprensa, teve que apoiar na esteira dos cortes efetuados, jornais e jornalistas, repórteres e outras várias fontes de informação que possibilitavam e possibilitam a composição dos jornais televisivos. Sim, porque grande parte das informações produzidas pelas televisões dependem da cadeia de informes, informações processadas, lá embaixo, nas reportagens de campo, junto às chamadas fontes.

Gritaria Geral. E não poderia ser diferente, quem sentiu mesmo, foram os chamados no Twitter os Grandes Jornais ou JORNALÕES, Estes muitas vezes atrelados aos interesses das televisões tiveram os maiores e mais profundos estudos e cortes. E sentiram muito mesmo, porque o advento da informação via Internet Mundial, propiciou e proporciona maior velocidade nas transmissões de determinados informes, não processados e informações. Fatos são transmitidos e informados ao público que tem a disponibilidade do meio, quase que em tempo real.

Os funcionários desses Jornalões chamados no Twiiter de "JORNALEROS", repórteres acostumados às benesses não só financeiras, por baixo dos panos, mas também a tratamentos diferenciados perderam o glamour de serem os donos intelectuais de determinadas reportagens e fatos. As benesses e os chamados tratamentos diferenciados viraram "defesas indiscriminadas de ideologias e ideias". Criaram dogmas seletivos na arte de informar, criaram um politicamente correto na maneira de transmitir informações, aderiram indiscriminadamente ao ditado do "faça o que eu mando e não faça o que eu faço". Revoltaram-se e querem e tentam ser o que denominam de 4º PODER. 

Criou-se uma Guerra de notícias e fatos entre o chamado "consumidor final/recebedor da informação" e "quem produz a chamada Informação."

Naturalmente que tudo foi sendo descoberto pelo consumidor final através desta possibilidade de obter informações. Redes Sociais, ganharam notoriedade, a disponibilização dos fatos e também a publicação e informação indiscriminada de tudo. Sem checagem de verificação. Nasceram as famosas FAKE NEWS, não aconteceu, mas publicaram e tornou-se Verdade. DESINFORMAÇÃO, na realidade!




Mas como recuperar o Glamour e o Destaque, outrora concedido?

Não podiam ficar só na revolta intelectual.

Aliaram-se a Imprensa Televisiva, aos Jornalões e partiram para o ataque massivo. Protegidos pelo tal "sigilo da fonte" e um "Código de Ética", que ignoram diuturnamente, passaram a publicar o que querem publicar, não importando muitas vezes se Falso ou Verdadeiro. Publicam e veiculam um Fato ou determinada Informação, massivamente, sem se importar com as possíveis defesas e/ou Contraditório. Passaram a "destruir reputações", não importando se pessoais ou não. Tudo o que publicam/publicaram, tornou-se "A MAIS PURA EXPRESSÃO DA VERDADE" e com ela tentam desesperadamente influir no comportamento e na opinião pública, não aceitando nenhuma "CONTESTAÇÃO", acerca do que foi publicado. Mesmo que essas "CONTESTAÇÕES" JOGUEM Luz, sobre a matéria e a tornem um possível equívoco ou uma "Mentira" deslavada. Passaram a acusar Leitores que a "ELES" discordam de "ATAQUES A IMPRENSA" e "ATAQUES À HONRA DE JORNALERAS E JORNALEROS". Passaram do dever cívico de INFORMAR, INVESTIGAR, PUBLICAR VERDADE, ao patamar do "AMEAÇAR" com processos judiciais. Patrulham diuturnamente as redes sociais. Sobrevivem, senhores Leitores, sem pedirem DESCULPAS PÚBLICAS, pelos equívocos cometidos, tudo em nome da "LIBERDADE DE EXPRESSÃO JORNALERA".

Ao povo ávido por informações e verdades, sobrou como forma de contestação e revolta a característica maior do povo brasileiro, A CHACOTA BARATA e a utilização dos famosos MEMES, o terror dos jornaleiros e jornaleras.

Mas mesmo assim, o Ego Intelectual, o Glamour outrora adquirido não os deixa enxergar, ver os erros que estão sendo cometidos e como forma de tentarem se sobrepor ao conhecimento público também são expressos através de MEME. Fica a Imagem...


*GUARDIÃO VERDE













A justificativa de seu anonimato é feita assim por ele:"Apenas um cidadão simples, com cinquenta e tantos anos de idade, revoltado com as bandalheiras, desmandos e roubalheiras patrocinadas pelo governo brasileiro. Não filiado a nenhum partido político e sem pretensões de concorrer a qualquer cargo público, diga-se cargo político, mas que sofre e revolta-se ,como tantos outros brasileiros, quando observa e sente na pele, o que tanto outros sentem.

É vedado o anonimato?Sim, mas no entanto, o próprio governo se vale deste "mecanismo", para apurar delitos. 

Então...Viva todos os cidadãos anônimos que vivem indignados, mas que não podem, até por questões profissionais ou força de conjunto normas que regem suas vidas, declararem abertamente suas Indignações e Anseios!"

Nota do Editor:

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quinta-feira, 19 de março de 2020

No interesse da criança:visitação em tempos de coronavírus


Autora: Vanessa Rocha de Oliveira(*)


 Resumidamente podemos falar que o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente é absoluto a fim de que seja assegurado a eles o direito "à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito e à liberdade e à convivência familiar e comunitária", inclusive conforme preceituam a Carta Magna, em seu artigo 227 e o Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo :

"Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão."
"Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária." 

Nas palavras de DA CUNHA PEREIRA:

"É a busca da saúde mental, a preservação da estrutura emocional e de seu convívio social."

A importância da aplicação deste princípio se dá diante da necessidade de amparo àqueles que se encontram em situação de vulnerabilidade.

Assim, em tempos que estamos vivendo de pandemia mundial, jamais vistos anteriormente, já contamos com algumas medidas determinadas pelos nossos governantes visando a proteção desses menores em especial, como a suspensão das aulas.

E como ficam as visitações nesse período?

Em princípio nada muda, desde os pais sejam conscientes dos cuidados com prevenção, limpeza e higiene, para o bem-estar dos filhos e da família como um todo.

Contudo, há exceções. Como veremos:

Decisão inaugural sobre o tema foi publicada no dia 12 de março próximo:

"O desembargador José Rubens Queiroz Gomes, da 7ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proibiu que um homem que viajou à Colômbia visite sua filha."

Tendo o pai chegado de viagem em 5 de março, a mãe entrou com uma ação no dia 10 requerendo que o homem só pudesse visitar a filha a partir do dia 21, quando chegaria ao fim um prazo de quarentena de 15 dias, e oferecendo compensação pelas visitas que não foram feitas no período. 

Com a inicial, foram juntados documentos médicos comprovando que a criança possui doenças respiratórias. A solicitação da mãe foi negada em primeira instância.

Ao julgar a questão em caráter liminar, no entanto, o desembargador do TJ-SP considerou que, levando em consideração o quadro da menina, "não haverá grande prejuízo se a criança permanecer mais nove dias sem ver o genitor", já que os pais são separados.

O magistrado acolheu parecer do Ministério Público, segundo o qual a decisão mais adequada é a de suspender as "visitas do pai à filha até o dia 21 de março". A partir da data, segue o texto, "ele deverá exercer seu direito normalmente, caso não tenha apresentado nenhum dos sintomas da gripe causada pelo coronavírus". 

As advogadas Nélida Moreno e Monize Crepaldi, responsáveis pela defesa da mãe, explicam que "a questão é que o pai passou por aeroportos movimentados, com viajantes de diversos países".

A defesa diz, ainda, que a criança, em menos de 12 meses, teve duas broncopneumonias, diversos outros problemas respiratórios, além de ter tomado antibiótico ininterruptamente durante um ano.

"A mãe, por tentativa extrajudicial, tentou de forma amigável pedir para o pai aguardar até dia 21 de março, pois a menina está no grupo de risco de doentes e tem dois anos." Mas ele (pai) foi irredutível. 

A tese apresentada pela defesa foi a "de que é preciso ter cautela extra, pois a menina, provavelmente, não sobreviveria se fosse contaminada", diz.

Sobre ter sido exigido que o pai passe por quarentena — embora não haja nenhuma recomendação nesse sentido por parte do Ministério da Saúde —, as advogadas explicam que a medida é apenas temporária e preventiva, e leva em consideração o fato de que o homem "esteve em contato com diversas pessoas antes das atuais medidas de segurança para conter o coronavírus serem adotadas".

Portanto, o direito tem de estar sempre atualizado e pronto para lidar com as situações que se apresentam na vida, como neste caso que trazemos como estudo e informação. Nem tudo está previsto na lei, porém os princípios a serem aplicados estão, qual seja, do maior interesse da menor, de sua preservação, este se sobrepõe ao direito da visitação, como forma de proteger a criança, parte mais frágil na relação, de maneira excepcional e temporária.

Lembrando sempre que bom senso e diálogo são a base fundamental para uma boa relação familiar, especialmente quando temos menores envolvidos nessa dinâmica. 

*VANESSA ROCHA DE OLIVEIRA

-Graduada pela Faculdade Brasileira de Ciências Juridicas -RJ 2002;
- Especialização em Direito e Processo Civil; 
- Apaixonada pelo Direito e Empreendorismo. 
Instagram: 
@rochaoliveiraadv @vanessa.canella

Nota do Editor:

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quarta-feira, 18 de março de 2020

Motivos para se interessar pelo Código Estadual de Defesa do Consumidor de Pernambuco



Autor: Eduardo Bauer(*)



Pode soar estranho, mas além do Código de Defesa do Consumidor os pernambucanos contam agora com um Código Estadual de Defesa do Consumidor (Lei nº 16.559 de 15 de janeiro de 2019). E você não leu errado, um dos Estados mais importantes para o fomento do Direito no Brasil possui agora uma legislação consumerista própria. 

Passada a novidade, vejamos as razões pelas quais esse código é de grande importância para todos os brasileiros e não apenas aqueles que vivem no território pernambucano.

1. Uma compilação de leis esparsas do Estado de Pernambuco sobre o Direito do Consumidor

O CEDC, como vem sendo chamado pelos órgãos de defesa do consumidor do estado pernambucano, é uma compilação de leis consumeristas esparsas no acervo legislatório da unidade federativa.

Conforme o art. 204 do CEDC/PE, foram revogadas 166 leis estaduais sobre a matéria regulada que agora estão em um único documento, por isso é possível afirmar que o código nada mais é do uma compilação. Alguns críticos do instrumento normativo indicam que o correto seria chamar de consolidação das leis consumeristas do Estado de Pernambuco e não de Código Estadual de Defesa do Consumidor.

Para se ter ideia do motivo dessa nomenclatura é importante trazer ao debate a estrutura do Código que conta com quatro títulos e alguns capítulos, quais sejam:
  • Título I: normas estaduais de proteção e defesa do consumidor (Capítulo I: disposições preliminares; Capítulo II: normas universais; Capítulo III: normas setoriais); 
  • Título II: penalidades; 
  • Título III: sistema estadual de defesa do consumidor (Capítulo I: disposições gerais; Capítulo II: cadastros estaduais de defesa do consumidor; Capítulo III: fundo estadual de defesa do consumidor); e
  • Título IV: disposições finais e transitórias. 
Chama bastante atenção o fato de que existe um capítulo de normas setoriais, isto é, em um único instrumento é possível localizar as obrigações de fornecedores de academias, postos de combustíveis, hospitais e estabelecimentos de saúde, entre outros. Causa espanto, no entanto, o setor de hotelaria e pousadas ser totalmente favorável aos estabelecimentos em detrimento daquele que se deve naturalmente proteger.

Independente das críticas, a grande vitória do CEDC/PE é trazer em um único instrumento legislativo as leis que os consumidores estaduais certamente não tinham conhecimento, mas os fornecedores sim, uma vez que é obrigação desses estarem dentro da legislação Federal, Estadual e Municipal para pleno funcionamento.

Destaque-se que as normas valem para as relações de consumo ocorridas nos limites do Estado de Pernambuco, ainda que a contratação ocorra por meio do comércio eletrônico. Portanto, um consumidor de PE que adquirir um produto/serviço do RJ terá resguardado seu direito pelo CDC e pelo CEDC/PE.

Por derradeiro, uma das grandes diferenças do CEDC/PE para o CDC é que a legislação estadual é mais objetiva e dita o que pode e principalmente o que os fornecedores não podem fazer. Vale a leitura do texto completo e uma pesquisa na sua região, uma vez que muitas leis estaduais são baseadas em leis de outros Estados que estão em vigência e não são divulgadas para o consumidor.

2. Inspiração para outros Estados criarem seus próprios instrumentos normativos 


Em complemento ao ponto anterior, a iniciativa do legislativo pernambucano inspira outros legislativos estaduais a criarem seus códigos de defesa do consumidor. Nos termos da Constituição Federal cada Estado da Federação deve promover a defesa do consumidor.


A norma não é perfeita e carece de retoques, porém o simples fato de consolidar em um único documento toda a legislação da matéria é de grande valia para o consumidor que diversas vezes se depara com situações abusivas. É importante relembrar que se trata de um código de defesa do consumidor e não meramente de relações de consumo. 

Os fornecedores possuem pleno conhecimento das regras que devem seguir enquanto que os consumidores muitas vezes só possuem acesso ao código federal, que como dito no ponto anterior carece de normas mais objetivas. 

Portanto, não é um devaneio pensar que outros Estados observem a inovação promovida pelos pernambucanos como uma inspiração e que em breve teremos outros códigos estaduais de defesa do consumidor.

3. Em menos de um ano de vigência, alterações importantes já foram promovidas 

No entanto, em menos de um ano de vigência o CEDC/PE já foi alvo de alterações de grande importância, partindo de sugestões da OAB/PE, PROCON/PE e associações representativas de consumidores e também de fornecedores, como do setor hoteleiro e de restaurantes.

O CEDC/PE foi publicado em 16/01/2019, tendo sua vigência 180 dias após a publicação (15/07/2019), existindo cinco leis próprias que alteram seus dispositivos, sendo uma relativa a própria vigência que originalmente seria de 90 dias (Lei Ordinária n° 16.565/2019). 

Noutro prisma, há alterações no tocante ao Fundo Estadual de Defesa do Consumidor e seu Conselho Estadual Gestor (Lei Ordinária nº 16.570/2019) e a título de aperfeiçoamento e revogação de diversos artigos, principalmente da parte setorial (Leis Ordinárias nº 16.757/2019 e 16.758/2019). 

Por fim, a Lei Ordinária 16.801/2020 altera o código a fim de proibir a cobrança de multa por fidelização na hipótese de furto ou roubo de aparelhos ou chip de celulares. Com isso é possível notar que o CEDC/PE aborda questões de cunho federal, o que leva ao próximo tópico. 

4. Associações e entidades ligadas aos fornecedores já ingressaram com ações no Supremo questionando a constitucionalidade de certos artigos 

Uma pesquisa no sistema de buscas do Supremo Tribunal Federal revela a existência de algumas ações diretas de inconstitucionalidade, como: 
  • ADIN 6.207 - Confederação Nacional do Sistema Financeiro - Consif; 
  • ADIN 6.123 - Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização - CNSeg; 
  • ADIN 6.220 – Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores - Anfavea; e
  • ADIN 6.086 - Associação Nacional das Operadoras Celulares - ACEL e Associação Brasileira de Concessionárias de Serviço Telefônico Fixo Comutado - ABRAFIX. 

Dessas acima apenas a ADIN 6.086 foi julgada e teve sua procedência nos seguintes termos:

Decisão: 

O Tribunal, por maioria, conheceu da ação direta e julgou procedente o pedido formulado para conferir aos art. 26, caput e § 2º; 28; 29; 35, II e § 2°; 45; 148; e 167, § 1°, da Lei nº 16.559/2019 do Estado de Pernambuco interpretação conforme à Constituição, a fim de excluir de seu âmbito de aplicação as empresas prestadoras de serviços de telefonia fixa e móvel e de acesso à internet, nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Edson Fachin, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio e Rosa Weber. 

Plenário, Sessão Virtual de 13.12.2019 a 19.12.2019.

É evidente que algumas associações seriam contra os regramentos do código estadual, porém é verdade que algumas disposições são inconstitucionais e outras de difícil aplicabilidade prática. 

A intenção não deveria ser atacar o instrumento no sentido de o reduzir a uma norma vazia, mas permitir que o mesmo tenha sua aplicação garantida de forma efetiva a promover o equilíbrio das relações de consumo, bastando relembrar que o referido código deve promover a defesa do consumidor.

* EDUARDO BAUER














-Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco – UNICAP (2015); 
-Pós-graduando em Direito Médico e Hospitalar pela Faculdade CERS; 
-Atuação na região Nordeste. Direito Médico e Hospitalar; Propriedade Industrial. Direito Civil e do Consumidor. 
E-mail:  eduardobauer.adv@gmail.com
Linkedin: https://www.linkedin.com/in/eduardobauer/

Nota do Editor:
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terça-feira, 17 de março de 2020

Justiça Gratuita




A gratuidade de justiça originou-se do Projeto de Lei 1433/48, elaborado pela Comissão Mista de Leis Complementares do Congresso Nacional, que foi aprovado e transformado na Lei 1.060 de 5 de fevereiro de 1950, sancionada pelo Presidente Dutra ([1]). Trata-se de Lei regulando o inciso 35 do artigo 141 do Capítulo II, que tratava dos "Direitos e Garantias Individuais"na Constituição Federal de 1946.

Sem sombra de dúvida trata-se de norma destinada a assegurar justiça social, possibilitando o acesso de todas as pessoas à Justiça, e não só àqueles que podem pagar para ver seus direitos examinados pelo Judiciário.

O texto primitivo da Lei 1060/50, porém, estabelecia que:
" Art. 4º A parte, que pretender gozar os benefícios da assistência judiciária, requererá ao Juiz competente que lhos conceda, mencionando, na petição, o rendimento ou vencimento que percebe e os encargos próprios e os da família.§ 1º A petição será instruída por um atestado de que conste ser o requerente necessitado, não podendo pagar as despesas do processo. Este documento será expedido, isento de selos e emolumentos, pela autoridade policial ou pelo Prefeito municipal.§ 2º Nas capitais dos Estados e no Distrito Federal, o atestado da competência do Prefeito poderá ser expedido por autoridade expressamente designada pelo mesmo."
Ou seja, cabia ao requerente provar sua necessidade da gratuidade de custas e despesas processuais, as quais abrangiam, segundo o texto original da Lei:

Ocorre que o Código de Processo Civil, que derrogou parte da Lei anterior, estabelece em seu artigo 99 que:

"Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso. 
§ 1º Se superveniente à primeira manifestação da parte na instância, o pedido poderá ser formulado por petição simples, nos autos do próprio processo, e não suspenderá seu curso. 
§ 2º O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos. 
§ 3º Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural. 
§ 4º A assistência do requerente por advogado particular não impede a concessão de gratuidade da justiça"
Ou seja, se o requerente do benefício for pessoa física ([2]) não precisa mais fazer prova de sua necessidade, cabendo à parte contrária, se quiser, formular impugnação (artigo 100 do CPC), numa inversão, a nosso ver, absurda do ônus processual.

Com efeito, a jurisprudência majoritária tem se orientado no sentido de que basta a declaração da parte, para que o benefício seja concedido.

Muito embora o parágrafo único do artigo 100 do CPC, em caso de má-fé do requerente, estabeleça uma multa equivalente ao décuplo das despesas que tiver deixado de adiantar, além da sujeição a processo crime por declaração falsa a parte contrária que pretenda a revogação do benefício, enfrenta dificuldades praticamente intransponíveis para provar a falta de necessidade do requerente.

Como a Lei não fixa um critério objetivo para a concessão do benefício, infelizmente, a desonestidade impera, em grande parte dos casos. Mesmo quando deferida pelo Juiz, a pedido do impugnante, a exibição de declarações de renda, extratos bancários e de cartão de crédito (o que dificilmente ocorre), o que se vê, na prática forense, é que há inúmeros "demandistas", que ocultam patrimônio e renda, pleiteiam e obtêm o benefício.

E é aí que reside a gravidade da questão: a isenção das verbas de sucumbência escancarou as portas para o abuso de direito, quando o requerente do benefício é Autor da ação.

O que se verifica, na prática forense, é que o número de ações com pedidos milionários, de procedência duvidosa, em que o Autor requer o benefício da gratuidade de justiça, tem aumentado substancialmente, já que isento de ter que fazer face às despesas e ônus sucumbenciais, especialmente honorários da parte adversa. Com isso, os pedidos mais estapafúrdios pipocam em juízo, causando prejuízo não só ao erário público e à parte contrária, que se vê obrigada a defender-se, como o atravancamento do Judiciário.

No Relatório do CNJ, "A Justiça em números 2019" lê-se:
"A concessão da AJG tem crescido ao longo dos últimos 4 anos, quando o índice passou a ser calculado. O índice foi de 27% em 2015, de 32% em 2016, 33% em 2017 e de 34% em 2018, ou seja, um aumento de 6,7 pontos percentuais no período. (p. 84)
Os gastos com assistência judiciária gratuita equivalem a 1,09% do total das despesas do Poder Judiciário, ao custo de R$4,91 por habitante. Os Tribunais Regionais Federais possuem os maiores gastos com assistência judiciária gratuita, proporcionalmente às suas despesas, e os tribunais de justiça, os maiores gastos por habitante. (p. 86) ([3])."
Observe-se que gratuidade de justiça e assistência judiciária não são exatamente a mesma coisa, já que a segunda inclui o pagamento, pelo Estado, de advogado para a parte, porém, o Relatório acima referido, trata dos gastos gerais com a gratuidade judiciária, além de apenas listar os casos solucionados, durante cada período, não mencionando aqueles em curso.

De qualquer modo, a nosso ver, esse aumento não reflete apenas o aumento de demandas "normais", mas também aquelas propostas por indivíduos que, titulares de direitos duvidosos ou até sem direito algum que, - beneficiados pela gratuidade - se aventuram em lides temerárias, principalmente ações de indenização das mais diversas, quase sempre com pedidos cumulados de danos morais absurdos, incentivados pelo fato de não terem nada a perder.

Está na hora de reformular o instituto, para fixar critérios objetivos e proteger quem realmente precisa da proteção do Estado.

REFERÊNCIAS

[1] Fac simile da tramitação do projeto pode ser visto em https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1226501&filename=Dossie+-PL+1433/1948 

[2] No caso de pessoas jurídica a prova deve ser feita juntamente com o pedido (Súmula 481 do STJ – Faz jus ao benefício da justiça gratuita a pessoa jurídica com ou sem fins lucrativos que demonstrar sua impossibilidade de arcar com os encargos processuais) 

[3] Vide resumo em https://www.cnj.jus.br/maior-parte-dos-brasileiros-e-atendida-por-juizos-unicos/ 

BATUIRA ROGERIO MENEGHESSO LINO





















-Advogado em São Paulo;
-Graduado em 1972 pela USP;
-Atuando na área de consultivo e contencioso cível;
-É sócio do escritório Lino, Beraldi e Belluzzo Advogados. 

Nota do Editor:
Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

segunda-feira, 16 de março de 2020

Impacto do Coronavírus na Economia





Autora: Maria Cristina de Oliveira(*)

A Bolsa de Valores sofreu grande impacto na semana que terminou e devem vir novas interrupções na semana que se inicia.

Desde 2008 que não acontecia expressivamente o Circuit Breaker, que é um mecanismo de interromper as negociações na Bolsa. Na época houve o fechamento por 5 vezes.

Agora já aconteceram 4 Circuit Breaker, sendo que ocorreu por duas vezes em um só dia. A queda na Bolsa brasileira chegou a quase 15%.

Nesta segunda a expectativa é das piores. Isso sinaliza mais desemprego e aumento de preços nos produtos.

O álcool gel é um exemplo. Por conta do coronavírus, ele já começa a faltar nas prateleiras dos mercados.

Algumas pessoas comentam de que o Governo deve intervir e tabelar o preço do álcool gel, para que os comerciantes não pratiquem os preços abusivos.

Não é esta ideia do Ministro da Economia, ele que quer dar liberdade aos comerciantes de promoverem seus preços, que façam seus acertos, contratos, negócios sem intervenção do Estado.

O Procon de Pernambuco quer multar as farmácias que aumentarem o valor do álcool gel. Será que esse é o melhor caminho?

É fato que o álcool gel começa a faltar nas prateleiras, pois teve uma significativa demanda e a oferta continua a mesma.

A lógica é que havendo mais demanda, para a mesma oferta, o valor sobe. Essa é a lei da oferta x demanda, que é uma lei natural. Ela simplesmente existe.

Se tem mais gente querendo comprar sem o aumento da oferta, o valor já subiu. Se o preço não acompanhar é até pior, porque se o valor do produto sobe e o preço não, então terá gente indo à farmácia para comprar por preço barato e vender no mercado paralelo pelo valor real que resultou da procura.

A ideia de tabelar o preço tem ar que coisa boa, mas na real não é, porque se obrigar o comerciante a manter o preço da época de baixa procura, para justificar que assim qualquer pessoa terá condições de comprar e proteger-se, quando o estoque das farmácias acabar não haverá esforço do comerciante em repor essa mercadoria e surgirão os mercados paralelos que fixarão novos preços.

Se as farmácias tiverem liberdade para negociar e venderem todo o estoque, elas terão incentivo para ampliar a quantidade de aquisição de novas mercadorias.

Por outro lado, o comprador, o consumidor fará sua tarefa de comprar onde lhe convém e isso gerar automaticamente a regulação dos preços, sem a intervenção direta do Governo.Haverá uma acomodação da situação, porque as pessoas irão resolver esse problema.

As farmácias irão comprar mais álcool gel, porque gerou renda e ela vai cobrar mais produto do fabricante, que vai aumentar sua produção, que precisará contratar mais gente para isso.

Quando o preço sobe o consumidor também compra somente o que lhe é necessário, será para quem realmente precisa.

Com mercado livre há uma rápida adequação da situação, logo haverá novamente mais produtos e rapidamente o preço cai, volta ao normal, porque a oferta atende a demanda.

Com a interferência do Governo para manter o preço, haverá pouco incentivo na fabricação e conseqüentemente pouco incentivo na venda do produto, logo irá demorar mais para voltar ao normal o mercado.

No meio dessa pandemia, o jeito é ficar em casa o máximo possível, aproveitar o tempo para separar as roupas que não está mais usando e prepará-las para doação. Sempre é tempo da solidariedade!

* MARIA CRISTINA DE OLIVEIRA
















- Professora, formada em Letras na PUCCAMP;
-Pós-Graduação em Ciência Política;
-Atualmente é funcionária pública federal.


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