sábado, 25 de novembro de 2017

A Escola Brasileira e a Necessidade do Ensino de Ciências


Ao longo dos meus de 42 anos de magistério e de vivência no Ensino de Biologia e também dos mais de 37 anos de Ensino Superior formando profissionais em nível técnico e superior, mais particularmente professores nas diversas áreas, especialmente Licenciados de Biologia e Pedagogia, além de tantas outras áreas profissionais, posso dizer sem medo que já vi muitas coisas e vivi muitas situações no magistério a na arte de ensinar. Por outro lado, também parece óbvio que nesse tempo pude desenvolver muitas manias e assumi inúmeras convicções sobre a Educação e o sobre o Ensino brasileiro, em especial o Ensino de Ciências e, mais particularmente das Ciências Biológicas.

Por conta dessa vasta experiência que acumulei, resolvi escrever um pouco sobre as minhas impressões no que diz respeito às mudanças que estão sendo propostas para a “nova” grade curricular do Ensino Médio a ser instalada no país. Sem dúvida existe uma grande necessidade de mudanças, mas o que me preocupa é saber se o tipo de mudanças que estão sendo propostas são aquelas que efetivamente precisam ocorrer para que saiamos do atraso, do marasmo e do verdadeiro abismo educacional em que nos encontramos como nação, quando nos comparamos com outros povos. Em especial nas áreas relacionadas às Ciências Naturais, estamos ainda tentando inventar a roda, enquanto tem muita gente viajando pelo espaço sideral.

Como já disse, eu ministro aulas no curso de Pedagogia e tenho sentido que progressivamente o Ensino de Ciências tem ficado cada vez mais longe da realidade atual e, o que é bem pior, da necessidade que ele faz para a vida das pessoas no tempo presente. Tenho sentido que particularmente, os estudantes de Pedagogia estão claramente mais distanciados e menos interessados pelas áreas científicas, mormente das Ciências Naturais. Ora os Pedagogos são os professores do primeiro nível escolar, o Ensino Fundamental, e penso que seja exatamente aí que deve começar a acontecer o trabalho efetivo de instigar os alunos ao envolvimento com conhecimento científico. Assim, creio que precisamos de pedagogos mais ligados nas Ciências e infelizmente não é isso que tenho observado.

É preciso ficar claro a todos, principalmente aos futuros professores, que Ciência não é diletantismo e que o cientista não é um velho bruxo cheio de ideias idiotas ou um louco sem juízo, aos contrário, o cientista deve ser entendido como uma pessoa igual a qualquer outra, que apenas possui um interesse primário maior na melhoria da qualidade de vida da humanidade e do planeta. Aquela figura mítica do cientista velho barbudo de óculos de fundo de garrafa, que parece viver de si e que não está nem aí para a realidade, tem que desaparecer do cotidiano escolar e da sociedade como um todo, porque o país precisa de cientistas. As escolas têm que agir séria e ativamente na identificação e desenvolvimento desses futuros cientistas dentro de suas respectivas comunidades.

O conhecimento científico é algo muito importante, talvez até seja o mais importante na formação dos jovens estudantes, mas a crença generalizada nas escolas brasileiras e mesmo nas comunidades ainda é aquela que diz: “o aluno precisa saber Português e Matemática, o resto não é prioritário” e esse ranço tem que mudar. Estamos no século XXI e a Ciência dita as normas pelo mundo afora, exceto aqui no Brasil, onde a coisa está realmente muito atrasada e feia sob vários aspectos. É por isso que o país segue na rabeira do conhecimento pagando “royalties” sobre quase tudo e não tendo nenhuma das nossas maiores universidades colocadas entre as 100 melhores do mundo.

Infelizmente tenho recebido alunos, nos diferentes cursos de graduação, mas principalmente alunos do curso de Pedagogia, que nunca tiveram nenhuma informação e que não apresentam uma visão mínima do que seja Ciência e nem de para que ela serve. A maioria dos estudantes chega ao terceiro grau ainda acreditando que Ciência é coisa do outro mundo e que os homens que atuam em ciências são pessoas muito distantes da realidade, entretanto é a Ciência que, na grande maioria das questões e situações, nos tem dito todos os dias, o que devemos fazer e como tudo deve ser feito. Vejam bem, estamos cercados de Ciência por todos os lados, somos direta ou indiretamente manobrados por ela, mas não temos essa noção e não damos a devida relevância a isso no cotidiano e nem na formação escolar de nossos jovens estudantes.

Penso que isso seja um imenso contrassenso e, por isso mesmo há necessidade de trabalhar para que sejam estabelecidas outras relações entre as comunidades individuais, a Sociedade como um todo e a Ciência. Entendo que prioritariamente a escola possa e deva atuar no estabelecimento dessa missão e o começo dessa tarefa é exatamente tratar de priorizar o Ensino de Ciências. Penso também que o momento que vivenciamos, em que se está propondo uma mudança no Ensino Médio, seja bastante propício para essa tomada de atitude. Entretanto, como será possível cumprir essa tarefa, haja vista que o senso comum se mantém preso a dogmas ignorantes e crendices infundadas, como o que foi citado acima? Pois então, essa é a questão que nos cabe discutir aqui.

A chamada reforma (mudança curricular) do Ensino Médio tem que atentar para esse aspecto e priorizar o aprendizado do conhecimento científico para permitir que o Brasil possa pensar em se estabelecer como potência científica e galgar posições melhores no cenário científico internacional. A Ciência existe para tentar melhorar as condições de vida das pessoas e se continuarmos achando que isso é pouco, certamente vamos seguir vivendo na contramão da história e mantendo a dependência direta dos outros países que sabem da importância do conhecimento científico. Temos que ser ousados, pensar alto e obviamente fazer Ciência custa caro, mas temos que investir porque não podemos continuar eternamente sendo guiados pelas mãos e pelos interesses dos outros países.

Posso até estar errado, mas, pelo que tenho visto até aqui, essa reforma que está sendo proposta, me parece mais uma adequação momentânea endereçada, um pequeno ajuste orientado e encomendado por alguns setores com alguns interesses, do que propriamente para uma mudança do Ensino Médio, que a meu ver deveria ser muito mais ampla do que aparentemente está se pretendendo. Talvez até haja cabeças e mãos estrangeiras interferindo nesses interesses para que continuemos limitados e presos às grandes potências e isso não deve ser assim. Temos que ter em mente que será preciso romper o cordão umbilical e procurar desenvolver um modelo educacional nosso, genuinamente brasileiro, preocupado com os interesses nacionais.

Para começar deveria se partir do zero e não adequar aquilo que não é bom ao interesse de quem quer que seja de fora do país. De imediato deveríamos ter que responder a algumas perguntas sobre o modelo curricular que está aí. Por exemplo, ele foi estabelecido quando? Por quem? Baseado em quê? Com que intuito? Os resultados que ele trouxe foram bons? Eu acredito que ninguém, ninguém mesmo, saberá responder tais questões, porque nunca houve essa preocupação. O que aconteceu foi que simplesmente se elencou um grupo de disciplinas imaginadas por alguém e se passou a ministrar essas disciplinas de maneira arbitrária e se entregou o resultado nas mãos de Deus. Lamentavelmente, até hoje a coisa continua assim, se discutem disciplinas, mas não se discutem os conteúdos curriculares dessas disciplinas e a assim a situação segue "como dantes no quartel de Abrantes".

Entre os anos 1997 e 2000, portanto já está fazendo 20 anos, quando os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), foram estabelecidos, parece que havia um pouco essa preocupação de mudar e adaptar aqui e ali alguns conteúdos. No entanto os anos passaram e os Livros Didáticos não se adequaram e mantiveram seus textos básicos. Desta forma, a maioria dos professores; que infelizmente está presa aos conteúdos desses Livros Didáticos ou das apostilas dos Grandes Sistemas Educacionais, as quais também não mudaram absolutamente nada nos últimos 40 anos, em termos de conteúdo; praticamente se esqueceram dos PCNs.

Aliás, sou capaz de apostar que se questionarmos os professores formados nos últimos 10 anos, pelo menos, eles não saberão dizer o que são os PCNs. Eu mesmo já fiz esse questionamento com alunos de terceiro e quarto anos do curso de Biologia e do segundo ano do Curso de Pedagogia e quase a totalidade nunca ouviu falar dos PCNs. Isso tem um significado pior do que se pode a princípio imaginar, qual seja, as editoras querem manter os seus interesses e como não existe fiscalização elas acabam conseguindo e assim mantêm o status quo e publicam o que querem de acordo com interesses muitas vezes externos e os infelizes dos professores acabam trabalhando contra os interesses nacionais.

Em suma, nunca houve, de fato, nenhum critério para definir o que se ensina e muito menos porque ou como se ensina no Brasil. Acredito que temos agora uma grande oportunidade para fazer isso e não acho que seja apenas no Ensino Médio. Essa ação deveria englobar tanto o Ensino Médio, quanto e principalmente, o Ensino Fundamental, onde o ensino começa a acontecer, porque na verdade se ensina muito o que não é importante e se deixa de ensinar coisas fundamentais para os alunos e isso não acontece só com as áreas das Ciências, como tentarei exemplificar um pouco mais à frente.

Será que um aluno é melhor ou pior em Português por ele sabe o que é um Anacoluto ou uma Onomatopeia, ou mesmo um Polissíndeto? Será que um aluno é melhor ou pior em Biologia se ele sabe o que o Ciclo do Ácido Pirúvico, ou um Parênquima Paliçádico, ou ainda que o celoma enterocélico se formou de evaginações da parede do arquêntero? Será que um aluno é melhor ou pior matemática se souber o que é o apótema ou que seno ao quadrado de alfa mais o cosseno ao quadrado de alfa é igual ao raio, que é 1, ou ainda e vai por aí afora. Será que um aluno é melhor ou pior em História só porque ele conhece sobre a História da China? Enfim, será que essas coisas são importantes mesmo? Por favor, peço que me desculpem, mas penso que todas essas coisas constituem umas grandes besteiras que não servem para nada ao cidadão comum e à vida cotidiana.

Obviamente, essas coisas só não são apenas besteiras para quem trabalha com elas e dependem desse conhecimento diretamente, mas esse é um número insignificante de pessoas dentro da sociedade como um todo. Eu não me considero um idiota por não saber algumas coisas que não sejam importantes para o meu dia a dia ou para o cotidiano da comunidade onde convivo, mas certamente eu me sentiria muito inútil se eu não soubesse nada daquilo que acontece sempre comigo ou com os que convivo. Só para dar um exemplo: eu não me sinto o pior cara do mundo por não saber qual a principal riqueza do Azerbaijão, mas preciso sim, saber que existe um país chamado Azerbaijão que fica na Ásia e se for necessário que eu descubra a maior riqueza do Azerbaijão, certamente eu irei atrás dessa informação, mas isso não interessa a todos os meus colegas de escola ou a todos os estudantes brasileiros. 

Os Ensinos Fundamental e Médio precisam enfocar aquilo que é genérico e suficientemente abrangente, que pode interessar, de alguma maneira, a todos os envolvidos no processo ensino- aprendizagem. A escola deve se preocupar com aquilo que qualquer pessoa comum poderá ter que vivenciar em dado momento da sua vida, mas todo o resto, que só interessa a alguns e em algumas situações é supérfluo e deve ser deixado de lado. Essas questões supérfluas não devem ser tratadas no ensino generalizadamente, porque elas não interessam às comunidades, elas interessam apenas a algumas pessoas específicas, as quais deverão, a seu tempo, tomar conhecimento dessas questões por conta própria.

Sou Biólogo e Professor de Biologia e tenho visto tanta bobagem que se "ensina", na verdade que se fala para o aluno, que não faz o mínimo sentido, porque, além de não interessar, na maioria das vezes ele é incapaz de entender, o que é e para que serve aquilo. São conceitos inúteis e de aplicabilidade ultra específica, como por exemplo: as reações de claro e escuro no processo fotossintético. O que interessa isso para um aluno de Ensino Fundamental ou mesmo de Ensino Médio? Ele precisa apenas saber o que é, para que serve e onde ocorre a fotossíntese e não há necessidade de descrevê-la bioquimicamente, porque jamais ele se envolverá com isso na sua vida, a não ser que, por acaso, venha ser um estudioso de fisiologia vegetal ou bioquímica celular vegetal.

Aliás, é bom dizer, que a maioria dos professores também não entendem nada de algumas dessas coisas; mas como está no conteúdo programático, ou no “Livro Didático”, ou na apostila da disciplina, ou porque costuma cair no vestibular, mesmo sem entender o que está falando, ele informa e o aluno tem que se virar para tentar aprender. Por outro lado, a exterminação da Biodiversidade Brasileira que é um assunto relevante, um problema nacional real, efetivo e de interesse mundial, muitos dos “Livros Didáticos” não citam e assim o “professor” também não informa, a não ser que caia no vestibular, mas se não cair no vestibular, não precisa saber. Caramba! Será que só eu vejo que esse negócio está errado e que não se pode ensinar assim.

Vou dar alguns exemplos agora daquilo que acontece na vida de todo mundo, que precisa ser ensinado e não se ensina em nenhum curso regular de Ensino Fundamental ou Médio. Quem é a maior autoridade Jurídica do município? Quem é a maior autoridade Legislativa do Município? Quem é a maior autoridade Administrativa do Município? O que faz um Promotor Público? Quem pode mais o Juiz ou o Promotor Público? A quem devo recorrer para receber meu seguro se for envolvido num acidente de trânsito? Porque o preço das passagens é caro? Quem decide o preço das passagens? Eu tenho direito a seguro de acidente de trânsito? Como buscar os meus direitos e com saber meus deveres? Por que não existe uma matéria (Disciplina) chamada Direito Constitucional em todas as escolas? Por que não se obriga os alunos a ler (estudar de alguma forma) a Constituição Federal, a Constituição do seu Estado e a Constituição do seu Município (Lei Orgânica do Município). O que é uma cidade? O que é um bairro? Por que as cidades são compostas de bairros? Comprei um terreno, posso construir qualquer coisa, por exemplo, uma padaria nele? Enfim, são tantas coisas importantes que as escolas não ensinam e o aluno cresce e chega a idade adulta sem nenhuma informação.

Isso sim é que precisa ser revisto e não essas bobagens que estão por aí de filosofia de gênero e de sexualidade precoce nas crianças das escolas. O aluno precisa saber que existem dois sexos e que eles se diferenciam nesse ou naquele aspecto físico e fisiológico. O gênero humano é um e os sexos são dois. Todo o resto é balela que não interessa a grande maioria das pessoas. É um absurdo achar que o jovem estudante que ainda nem sabe agir como um cidadão, já tenha que assumir posições outras sobre sua sexualidade. Aliás, posições essas muitas vezes erradas e infundadas a respeito das mais diversas tramas ideológicas programadas por interesses outros e que não cabem ser discutidas aqui. 

Pois então, voltando ao eixo desse artigo e ao nosso ponto de vista de que é fundamental ensinar ciência para o desenvolvimento do Brasil. Quero dizer que aprender sobre Ciência é algo que interessa a qualquer um, pois a Ciência está na casa de todo mundo, na TV, no Rádio, no Cinema, no Jornal, na Revista, apresentando e vendendo produtos, dando instruções, procedimentos e orientações sobre os mais diversos temas. As pessoas são movidas pela Ciência e certamente será bom que saibam se dar melhor com esse fato e a escola precisa cumprir essa função, ocupando essa lacuna e suprindo essa falha histórica que existe no país. Aprender sobre Ciência serve inclusive para impedir que certos aspectos ideológicos absurdos sejam tratados como questões científicas.

E digo mais ainda, pois até para enganar as pessoas, há quem faça uso da Ciência, quanta propaganda enganosa, quanta idiotice se vende em nome da Ciência e ninguém questiona. A permissibilidade do estado é total nessa área, talvez até por ignorância do próprio estado, assim como acontece com as pessoas. Se a Ciência fosse efetivamente informada, possivelmente menos gente fosse enrolada e quem sabe até o estado também teria mais conhecimento das coisas e das verdade científicas. A escola tem que se fazer presente orientando sobre a importância efetiva da Ciência e dos cientistas para o desenvolvimento de uma nação.

Em suma, aproveitemos a reforma do Ensino Médio que está em curso para fazer uma reforma efetiva da educação, ou pelo menos do ensino, no Brasil. Vamos colocar no papel aquilo que, de fato, seja importante e vamos levar para as escolas somente isso, pois o resto é prática funcional individual, é condição de vida das pessoas nas suas necessidades e a sociedade está aí para apresentar e comprovar suas nuances e as respectivas diferenças. As pessoas são diferentes e isso é bom, mas o aprendizado delas genericamente não pode ser, porque tem que existir condições iguais para todos, em termos de formação mínima. Nem muito ao mar e nem muito à terra. É preciso apresentar apenas uma visão global, com algum aprofundamento e destaque somente daquilo que for relevante à sociedade ou ao planeta.

Priorizar Ciência é uma das coisas de interesse genérico que precisa ser assumida pelo estado, mas detalhar questões científicas também não é o melhor caminho a ser tomado, porque esse caminho tem que ser descoberto por quem tem o verdadeiro interesse na questão envolvida. O Brasil precisa de cientistas e a escola pode e deve ser o principal instrumento que propiciará e suprimento dessa falha, por isso mesmo a Ciência e os fatos científicos atuais e midiáticos devem estar presentes no cotidiano escolar, a fim de tentar atrair mais jovens aos meios científicos.


POR LUIZ EDUARDO CORRÊA LIMA










-Professor Titular de Biologia  UNFATEA/Lorena/SP;
-Monitor de Educação Profissional – SENAC Guaratinguetá/SP e
-Professor de Biologia do Ensino Médio – DAMASCO/Caçapava/SP.

NOTA DO EDITOR :
Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

sexta-feira, 24 de novembro de 2017

O Silêncio das Almas que Reformarão a Justiça Brasileira

Quantas almas ainda precisam ser pisoteadas por vigaristas impunes no Brasil? A quem cabe ser desumano? À Justiça ou aos que cometem a injustiça? Incrivelmente esta resposta não é clara. Toda a nação clama por uma conduta decente das autoridades sobre a corrupção, e deparamo-nos, por vezes, com decisões mais politicamente confusas do que justas.

Diante de tantos fatos que vêm ocorrendo em nossa república, e, além, em muitos dos mundos deste planeta onde haja gente, cada vez mais me questiono: o Brasil tem algum resquício de alma e de humanidade? Vou além e pergunto: o ser humano tem mesmo alma e humanidade? As crianças pequenas têm. Mas que cultura silencia a alma adulta? O Brasil de Rui Barbosa, que tanto viu triunfarem as nulidades e crescerem as injustiças no século XIX, vem sufocando, há muito, nossa substância autônoma. Assistimos sem emoção ao "espetáculo" dos crimes "oficiais" que afundam o País; vemos violência diariamente cada vez menos afetados com as mortes; sofremos explorações tributárias e humilhações econômicas calados e desesperançosos etc. Generalizações podem ser uma armadilha intelectual e quero com as minhas simplesmente instigar-nos ao lugar incomum, diferente do falso conforto da sombra. Adiante deixarei mais claras estas indagações.

"Alma, do latim anima", segundo o dicionário Houaiss (2009), p.97, é o "conjunto das atividades imanentes à vida (pensamento, afetividade, sensibilidade etc.), entendidas como manifestações de uma substância autônoma ou parcialmente autônoma em relação à materialidade do corpo." Ou ainda: "natureza moral e emocional de uma pessoa ou de um grupo; índole, caráter".

Sobre "sociedade humana" entendo que seu objetivo seja o bem comum da maioria dos cidadãos e cidadãs, proteção dos integrantes e evolução das pessoas em harmonia.

Ainda buscando margens, segundo John Rawls, em Uma Teoria da Justiça (1971), "a justiça é a virtude primeira das instituições sociais, tal como a verdade o é para os sistemas de pensamento. Uma teoria, por mais elegante ou parcimoniosa que seja, deve ser rejeitada ou alterada se não for verdadeira; da mesma forma, as leis e as instituições, não obstante o serem eficazes e bem concebidas, devem ser reformadas ou abolidas se forem injustas”. Acrescento uma visão pessoal. A justiça, assim como a política e outras áreas de atuação humana, é feita por pessoas que erram e acertam. Nenhuma dessas áreas pode ser resumida na pessoa que erra ou na pessoa que acerta. As pessoas que acertam, no entanto, devem ser apoiadas, e as que erram devem ser corrigidas em prol da sociedade.

Somos verdadeiramente uma sociedade? Somos brasileiros intelectualmente autônomos, plenos em pensamentos, afetividade e sensibilidade? Ou ainda, agimos com um bom sentido de moral e de boa índole? Quais de nós têm alma? Quais de nós sente a dor da morte de uma pessoa inocente e se mobiliza para corrigir e evitar que isto volte a acontecer? Mais ainda, por que o vazio da alma não incomoda a muitos que seguem decididos para o silêncio imutável da finitude? E se a alma está em silêncio como saber se está lá?

Morre-se muito no Brasil. Mais de 61 mil homicídios em 2016. E as mortes por causas indiretas, imensuráveis, como a corrupção estabelecida? Morre-se pelo mero fato de estar andando em uma rua, à noite. Ou de dia mesmo. Simplesmente morremos por estarmos num Brasil que não protege suas almas. Morremos aos montes, dia após dia, com o aval da impunidade que humilha o cidadão trabalhador e honesto. Morremos por más políticas públicas de pessoas que desviam verbas imprescindíveis à segurança pública e aos hospitais, para seus interesses próprios e que seguem, ano após ano, praticando, livres, seus abusos genocidas. Morremos, nesta república, por que há criminosos que insistem em matar inocentes e sabem que são mais organizados, poderosos e corajosos do que aquela "segurança pública". É uma sociedade esta que mata e causa sofrimento e humilhações aos seus cidadãos?

Em uma sociedade há pessoas que trabalham para sobreviver e sustentar suas famílias, seguem corretamente os preceitos da boa convivência e harmonia de uma sociedade que protege e contribui com seus semelhantes. Estas pessoas gastam suas energias e usam suas habilidades intelectuais em prol do bem comum e, necessariamente, em favor do seu interesse e da saúde de sua família, quando obedecendo às leis e conduzindo-se com ética. Manifestam o necessário respeito à vida humana e ao social. Há, porém, os indivíduos que, ao invés de produzirem honestamente, buscam trapacear, burlar e explorar o trabalho de outras pessoas. Há desses indivíduos em todas as classes sociais, todos os países e com diversas formas de educação e instrução. Acredito que estes infratores, especificamente, causem o sofrimento e a morte humana. Acredito ainda que uma sociedade consciente, visando ao interesse da maioria, deva identificar, julgar e aplicar penas a estas pessoas no intuito de reeducá-las ao convívio numa comunidade pacífica. Mas defendo que seja repensada a vigilância para infratores reincidentes e que demonstram claramente que preferem o crime à vida social. Certos da impunidade, reiniciarão seus delitos. E quantas vidas devem pagar por um único homicida? Instigo mais: todo criminoso é recuperável e "ressocializável"? É fundamental que o Brasil pense nisto.

Por que somos omissos frente a tanto mal? Sabemos que os patifes são mais persistentes do que os homens de bem. Podemos mudar! É passada a hora, contudo, de repensarmos e agirmos sobre os que perderam a alma. E que mesmo várias vezes tendo tido a chance de se arrepender e se corrigir continuam a matar e causar sofrimento aos brasileiros inocentes. Questiono aqui o sistema que permite que isto ocorra, e se repita reiteradas vezes. E que sociedade é a que permite isto? Repensemos aqueles que, usando de posições privilegiadas, ao invés de fazerem simplesmente o que manda a lei e preconizarem a ética e a moral, corrompem-se causando sofrimento e morte de pessoas. Corrupção pública é uma forma de crueldade. E as autoridades omissas? Quão desalmados? É hora de mudar esta realidade que protege um criminoso com argumentos desconexos sobre justiça? O Brasil é maior. Indago mais, há aquele criminoso que não queira se reintegrar corretamente à sociedade? Como pensar este indivíduo de uma maneira que a sociedade seja a prioridade e não ele? Precisamos fazê-lo.

E sigo provocando: onde está a alma de quem mata. Tem alma o legislador que deturpa leis em favor próprio e de comparsas? Por onde anda a alma de quem liberta um assassino serial, ou um político corrupto contumaz? E onde está a alma do fiscal que extorquiu? Por que dorme tranquila a alma do médico que não denunciou as condições desumanas de trabalho? Em resumo, onde estava a alma da pessoa que perdeu a chance de tomar a correta decisão e não fez o que deveria ter sido feito?

Finalizo antecipando as perguntas dos nossos filhos e netos: Que natureza moral ou emocional têm os brasileiros? Existe alma neste Brasil calado? Somos verdadeiramente uma sociedade humana? Que justiça foi reformada em nosso País? Que leis criadas por suspeitos foram abolidas no Brasil? Em 2017, que sociedade brasileira foi repensada quando trouxe tanta morte, criminalidade, impunidade e sofrimento para seus cidadãos? Por quem continuamos esperando para tomar nossas decisões? 

É hora de repensar… como mudar?

POR JACINTO LUIGI DE MORAIS NOGUEIRA











-Médico formado em 2003 pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará; 
 Anestesiologista especializado no SANE-RS / Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul / IC-FUC.; e
- Profissional liberal.

Nota do Editor:
Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

quinta-feira, 23 de novembro de 2017

A Teoria Cognitiva da Depressão e o Budismo:Revelando as Forças Psicológicas Inerentes ao Budismo



O texto a seguir foi apresentado como um discurso no Primeiro Simpósio Anual de Primavera sobre Budismo e Psicologia, patrocinado pelo Departamento de Cultura da Sede de Pittsburgh da SGI-USA, realizado na Universidade de Pittsburgh em 11 de abril de 1992, e publicado na revista Seikyo Times (SGI-USA) em sua edição de outubro de 1992 e na revista Terceira Civilização (BSGI) de julho de 1994( págs. 28 a 33):

Tenho atuado no campo da geriatria nos últimos quinze anos. Em 1983, após seis anos de trabalho na comunidade, vim ao Instituto e Clínica de Psiquiatria Ocidental (ICPO). Fui designado para uma equipe de trabalho na Unidade de Pacientes Internados de Psiquiatria Geriátrica. Durante sete anos, tratamos de mais de mil pacientes idosos com uma variedade de distúrbios, mas a maioria deles sofria ou da Doença de Alzheimer ou de grande depressão. Foi nessa época que me tornei mais e mais interessado no fenômeno da depressão.

Via a depressão atacar pacientes com uma malignidade e totalidade que parecia privá-los da essência de sua humanidade. Vi famílias, que por gerações foram acossadas pelo suicídio e depressão. Vi pacientes que sofriam prolongadamente a perda de pessoas queridas, ou que não conseguiam se adaptar à aposentadoria, ou cujos problemas não solucionados de uma existência de insatisfação haviam finalmente se transformado em reflexão sombria e arrependimento constante. E vi pacientes que ficavam deprimidos sem nenhuma razão, mas sofriam a moléstia tão profundamente quanto aqueles que possuíam bons motivos para tanto.

Em 1989, iniciei treinamento na psicoterapia interpessoal, e em maio de 1990, juntei-me ao Dr. Charles Reynolds e à equipe do Programa de Prevenção da Depressão na Velhice como um psicoterapeuta. Esse programa é destinado ao estudo da manutenção de terapias para a depressão na população geriátrica.

Enquanto trabalhava como terapeuta, fui atraído a explorar totalmente o significado filosófico da depressão conforme esta ocorre na vida humana moderna. Como um praticante budista, considerei importante examinar teorias referentes à doença emocional e de que maneira estas se relacionam com a filosofia budista.

Naturalmente, eu me perguntava se a crença de uma pessoa desempenhava algum papel para prevenir ou aumentar a vulnerabilidade para a depressão. Esta tarde, gostaria de dividir com os senhores algumas observações que fiz a respeito da visão de mundo que está contida nos ensinos de Nitiren Daishonin e que relação esta tem com a depressão. Antes de fazê-lo, penso que seja importante explicar a que me refiro por depressão.

A vida pode oferecer uma infindável série de dificuldades. Algumas vezes, somos capazes de enfrentar de frente esses desafios e superá-los, Outras, eles parecem oprimir-nos. A vida é cheia de altos e baixos. E nós de fato ficamos deprimidos, desanimados e estressados. Contudo, para a maioria das pessoas, isto é uma condição temporária. Ás vezes, basta uma palavra de encorajamento, uma pausa para descanso. algumas vezes, o problema se resolve.

Quando falamos sobre doença emocional, depressão profunda, começamos a verificar que a depressão assume uma vida própria. Um aglomerado de sintomas surge na vida da pessoa, desânimo, distúrbio no sono, perda de apetite, nenhuma energia, pouca concentração, perda de interesse e incapacidade para desfrutar a vida.

Quando isto acontece, nem mesmo uma palavra amável, uma caminhada sob o sol, uma mudança nas circunstâncias são suficientes. O bom senso deixa de prover um remédio e a pessoa parece cair num abismo escuro de desespero e falta de esperança. Porém, também podemos pensar na depressão como um continuum, estendendo-se desde a tristeza transitória de ver os Piratas (1) fracassarem novamente, não conseguindo vencer o Campeonato Mundial, ao tipo de depressão que pode levar a pessoa a concluir que o suicídio é a única solução lógica, sensata e atraente. Independentemente de onde a pessoa possa se encontrar nesse continuum, o ponto importante é que esse sentimento resiste ao tempo, e é caracterizado pela disfunção e infelicidade.

Há muitas teorias da depressão, e aqui estão algumas delas : Existe a teoria tradicional psicanalítica, que se concentra na "perda do objeto" e na "perda da auto-estima". Temos também a explanação mais comum, exposta primeiramente por Karl Abraham, de que a depressão é uma raiva voltada para dentro. Mais recentemente, há uma forte evidência de que a depressão seja uma doença biológica envolvendo desequilíbrios metabólicos no cérebro. O conceito budista de "unicidade da mente e do corpo" (shiki shin funi) foi interpretado principalmente como a "mente" influenciando o "corpo".

O reconhecimento de que os processos biológicos do corpo influenciam a mente também é compatível com a teoria budista. Tive muitas oportunidades para discutir os conceitos budistas com o meu colega Dr. Mark Miller, professor assistente de psiquiatria e diretor médico do Programa de Prevenção da Depressão na Velhice.

Com respeito a shiki shin funi, o Dr. Miller disse :

"Não há mais dúvida de que existe uma relação íntima, recíproca, entre a mente e o corpo. Durante muitos anos, os médicos tiveram muitas experiências curiosas que demonstravam claramente essa ligação. entretanto, não havia nenhuma prova científica. Aqui, no ICPO efetuamos estudos sobre o sono que mostraram nitidamente diferenças na atividade cerebral ente os pacientes deprimidos e os não-deprimidos."
"Sabemos também que viúvas que perderam os maridos recentemente sofrem supressão nos sistemas imunológicos. Só agora estamos começando a entender a sutil interação entre ciclos de sono e insônia, ritmos circadianos, sensibilidade à luz e como estes podem afetar a emoção humana. Nunca houve uma época mais excitante ou esperançosa para estar envolvido neste campo. À medida que a pesquisa nessas áreas progride, torna-se mais aparente que o conceito budista de shiki shin funi continuará a ser validado. "

Os estudos também têm mostrado claramente que fortes fatores genéticos estão envolvidos na depressão. Alguém com um membro da família de parentesco de primeiro grau com depressão é muito mais vulnerável a ela. E embora haja fatores múltiplos em operação, a genética parece desempenhar o papel de maior amplitude. Essa noção condiz com a conceituação budista de que os males da mente são "doenças cármicas". Certamente, nascer numa família em particular, onde a vulnerabilidade é transmitida por meio de genes é um expressivo indicativo do carma.

O que considerei mais intrigante é a teoria cognitiva da depressão, desenvolvida pelo Dr. Aaron Beck, um pesquisador e clínico psiquiátrico da Filadélfia altamente respeitado. A teoria do Dr. Beck sobre a desordem emocional representou uma mudança paradigmática no campo da psicologia. Até os anos 60, a psicologia comportamental utilizava um simples modelo estímulo-resposta. Não havia o reconhecimento de que as variáveis cognitivas como a expectativa, auto-verbalizações, estilo explanatório e predições poderiam desempenhar algum papel no aprendizado e no comportamento humano. Com o advento da escola cognitiva da psicologia, prestou-se mais atenção aos processos do raciocínio do indivíduo, o "diálogo interno" que a maioria de nós chamamos de pensamento.

Esse modelo para a interação da cognição, emoção e comportamento é surpreendentemente similar ao princípio budista dos cinco componentes da vida. Nesse modelo, a vida do indivíduo é considerada uma união temporária dos cinco componentes e segue o seguinte caminho : (1º) Forma; (2º) Percepção; (3º) Concepção; (4º) Volição; e (5º) Consciência.

Em outras palavras, a consciência é vista como um "ambiente" habitado por nossa força vital. Essa consciência, então, habita nossa forma, ou entidade física que possui cinco órgãos sensoriais. Por intermédio dessa forma percebemos o mundo e integramos essa informação com a nossa mente (percepção). Então, criamos noções mentais a respeito daquilo que percebemos (conceito) e, aí, agimos com base naquilo que foi percebido (volição).

De uma perspectiva budista, os problemas surgem quando a vida do indivíduo é afetada pelos três venenos da avareza, ira e estupidez (2). Quando a vida das pessoas é dominada pela avareza, ira ou estupidez, as percepções delas são distorcidas e as ações que efetuam só servem para levá-las a sofrer mais ainda. Essa idéia é, na realidade, parte de uma teoria bastante profunda e esclarecedora do budismo, denominada itinen sanzen (3) . Em síntese, o budismo sempre reconheceu o importante papel da cognição no comportamento humano.

Nesse trabalho com pacientes que sofriam de depressão profunda, o Dr. Beck observou que a depressão primariamente não era um distúrbio de ânimo, mas um resultado de visões negativamente preconceituosas do eu, do mundo e do futuro. Constatou-se que essas "visões distorcidas" ou distúrbios cognitivos, conduzem a manifestações afetivas, de motivação e comportamentais. Uma pessoa propensa à depressão tenderá a ter pouca auto-estima, a enxergar o ambiente como hostil e obstrutivo, e será bastante pessimista com relação ao futuro.

Além disso, segundo o Dr. Beck, todos nós desenvolvemos "esquemas" ou modos de ver o mundo, que são padrões cognitivos duradouros que formaram por meio de nossa interação com o ambiente. Embora muitos sejam resultado de nossa interação na infância com adultos de relevância, também somos influenciados por nossas crenças (religião) e pela nossa "experiência acumulada" (carma). Ademais, esses esquemas operam abaixo da superfície da consciência normal e funcionam mais ou menos como respostas automáticas.

Uma vez ativado, o esquema influencia o processamento de novas experiências por meio da atenção seletiva e da reconstituição de memórias passadas por intermédio da lembrança seletiva. Em outras palavras, enxergamos e escutamos aquilo que queremos enxergar e escutar, e lembramo-nos somente daquilo que queremos lembrar. Deste modo, nossos padrões cognitivos tornam-se auto-confirmantes.

Apesar de não acreditar que a teoria cognitiva seja a explicação para a depressão, ela certamente esclarece um dos caminhos da depressão. Se aceitarmos a idéia de que essas cognições ou pensamentos distorcidos e negativos causem ou perpetuem a depressão, então, pelos propósitos da discussão de hoje, considero importante examinar os conceitos de eu, mundo e indivíduo conforme expressos nos ensinamentos budistas.

Felizmente, existe um amplo volume de escrituras originais de Nitiren Daishonin e seis de suas principais obras foram traduzidas para o inglês (4) . Elas são denominadas de Gosho e consistem em cartas a seus discípulos bem como teses.

Uma das principais razões de essa teoria da depressão ter chamado a minha atenção foi o fato de eu, por acaso, estar estudando "A Essência Real de Todos os Fenômenos" , e ter me deparado com a seguinte afirmação :

"Por eu ver as coisas desse modo, sinto imensurável alegria apesar de ser agora um exilado" (The Major Writings of Nishiren Daishonin, vol. I, pág. 94)

Nitiren Daishonin escreveu essa carta na Ilha de Sado, sob a pior provação possível e, contudo, exprimia imensurável alegria por causa da maneira como via as coisas. Isto me inspirou a examinar as escrituras de Nitiren Daishonin de uma nova perspectiva. Como ele via o mundo, o eu e o futuro ? Como ele explicava o mundo aos seus seguidores ?

Com respeito ao mundo, seria bom observar que as seitas do budismo predominantes naquela época mantinham uma visão essencialmente negativa do mundo. Em primeiro lugar, era universalmente aceito por todos os budistas que os Últimos Dias da Lei (6) já haviam se iniciado. Muitos eruditos budistas interpretavam isto como uma era de grandes sofrimentos, na qual a prática e os ensinos budistas tradicionais perderiam todo poder.

Em segundo lugar, o ,mundo estava realmente tumultuado. Na introdução do "Rissho Ankoku Ron" ("A Pacificação da Terra Por Meio da Propagação do Verdadeiro Budismo") , Nitiren Daishonin declara :

"Nos anos recentes, há distúrbios incomuns no céu, estranhas ocorrências na terra, fome e peste, todos afetando cada canto do império e se espalhando pelo país inteiro ... Mais da metade da população já foi lavada pela morte, e em todas as famílias alguém se aflige." (The Major Writings of Nishiren Daishonin, vol. II, pág. 3)

Atravancada por uma visão negativa do mundo, reforçada pelos acontecimentos, a pessoa naturalmente julgaria o ambiente obstrutivo e hostil. determinadas seitas do budismo de fato ensinavam as pessoas que, enquanto estivessem neste mundo, deveriam aprender a aceitar o seu carma e orar ao Buda Amida par que, depois da morte, pudessem encontrar paz e segurança num paraíso. Essa visão de mundo inerentemente negativa no final levaria as pessoas a uma resignação passiva com relação aos males e sofrimentos da vida e à extenuação ainda maior da energia vital.

A visão de mundo de Nitiren Daishonin e muito diferente. Ele não era cego para os incríveis sofrimentos das pessoas comuns, e ele também era consciente das predições lúgubres concernentes aos Últimos Dias da Lei. Contudo, ele optou por uma interpretação totalmente diferente desses fatos e descobriu grande júbilo e esperança neste mundo. Ele disse a um de seus discípulos :

"Para aqueles que se preocupam com a próxima existência, é preferível ser um mortal comum nesses Últimos Dias da Lei do que reis poderosos nos Primeiros e Médios Dias da Lei. Por que as pessoas não acreditam nisso ? Do que ser um sacerdote chefe da seita Tendai, é melhor ser um leproso que recita Nam-myoho-rengue-kyo !" (The Major Writings of Nishiren Daishonin, vol. III, pág. 93)
Isto porque ele esta convicto de que havia chegado o tempo para a revelação da prática budista que poderia conduzir todas as pessoas à iluminação. No Gosho "A Transformação do Carma Determinado", ele afirma :

"A vida é o tesouro mais precioso de todos. Um dia a mais de vida vale mais do que dez milhões de ryo de ouro ... Um dia de vida vale mais do que todos os tesouros do universo." (The Major Writings of Nishiren Daishonin, vol. III, pág. 93) (9)

Nitiren Daishonin oferece-nos uma visão de mundo esperançosa, porém equilibrada. No Gosho "A Felicidade Neste Mundo", ele diz :

"Jamais permita que os impasses da vida o perturbem. Afinal, ninguém pode escapar dos problemas, nem mesmo santos ou sábios ... Sofra o que tiver que sofrer. Desfrute o que existe para ser desfrutado. Considere tanto o sofrimento como a alegria como fator da vida, e continue orando o Nam-myoho-rengue-kyo, não obstante o que aconteça. Então, experimentará a infinita alegria da Lei. " (The Major Writings of Nishiren Daishonin, vol. III, pág. 199)
Quando discuti esses pontos com o Dr. Miller, ele observou :

"O budismo ensina o indivíduo a abraçar toda a vida, tanto a boa como a má, o que considero ser uma filosofia bastante correta. Estimula o desenvolvimento de uma resistência para os sofrimentos e provações que todos nós temos de enfrentar algumas vezes. Essa atitude concorda totalmente com as metas da psicoterapia. O terapeuta está sempre buscando meios de abrir os olhos do paciente para novas possibilidades e interpretações para os acontecimentos recentes e também para os do passado. O budismo parece incorporar um tipo cordial de esperança que não se abstrai das dificuldades da vida."

Com base na visão de mundo de Nitiren Daishonin, os membros da SGI recebem uma mensagem bastante poderosa quando encontram uma crise pessoal. Nunca lhes é dito para simplesmente aceitar o carma e esperar uma existência melhor no próximo mundo. Eles sempre são incentivados a agüentar a luta e jamais desistir. A grande recompensa ou benefício da prática budista está em aprender a interpretar os problemas como oportunidades para o crescimento individual e não como uma evidência de quanto o mundo é conturbado, ou de quanto somos inadequados como seres humanos.

Quanto à visão do "eu" de Nitiren Daishonin, verificamos uma perspectiva que habilita o indivíduo a enfrentar todas as dificuldades com grande fé em sua própria capacidade inerente. Nitiren Daishonin encorajava constantemente seus discípulos a superar todos os sofrimentos por intermédio do desenvolvimento de suas próprias naturezas de Buda. Ele sempre identificou o eu como o lócus da força do Buda. No Gosho "Sobre Atingir o Estado de Buda" , ele afirma :

"Nunca deve procurar os ensinos de Sakyamuni ou dos Budas e bodhisattvas do universo fora de si mesmo. O domínio dos ensinos do Buda não o livrará dos sofrimentos mortais a menos que perceba a natureza de sua própria vida." (The Major Writings of Nishiren Daishonin, vol. I, pág.4)

Na "Carta de Ano Novo" , ele declara :

"Quanto à questão de onde exatamente existem o inferno e o Buda, um sutra diz que o inferno se encontra debaixo da terra e um outro sutra diz que o Buda está no oeste. Entretanto, uma análise mais cuidadosa revela que ambos existem em nossos próprios corpos" (The Major Writings of Nishiren Daishonin, vol. I, pág. 271)

A Dra. Gay Herrington é uma outra colega com quem tive muitas conversas sobre a interação do budismo e a psicologia. Ela é psicoterapeuta na Clínica de Prevenção da Depressão, um projeto-irmão do Programa de Prevenção da Depressão na Velhice.Com referência ao"domínio dos ensinos budistas", ela disse :

"A nossa sociedade pressiona fortemente o indivíduo a ganhar domínio sobre todas as áreas da vida. Espera-se que a pessoa esteja no comando sempre. Todavia, a sociedade não ensina às pessoas como fazer isso de uma maneira sustentável, nem respeita o valor inerente delas. O budismo parece adotar uma abordagem holística que capacita o indivíduo a ser focalizado interiormente apesar de ainda encontrar os desafios diários de viver numa sociedade dirigida materialmente."
O domínio da teoria e técnica psicológica não protege o terapeuta de cometer erros em sua própria vida, nem o torna um bom profissional. Em última análise, o terapeuta deve vir a entender a sua própria vida para ser eficiente. Considero isto essencial também para ser feliz".

A mensagem subjacente da visão budista do "eu" é que o indivíduo nasce com a capacidade inerente para superar todas as dificuldades e alcançar um estado extraordinário de auto-realização. Além disso, não há distinção entre o eu e a realidade última. Mais propriamente, essa distinção é uma simples questão de percepção, apesar de profunda. Como Nitiren Daishonin expressa no Gosho "Sobre Atingir o Estado de Buda" :

"Enquanto iludida, a pessoa é chamada de mortal comum, mas uma vez iluminada, é chamada de Buda" (The Major Writings of Nishiren Daishonin, vol. I, pág. 4)

Em seguida, examinei a visão de futuro. No Gosho "Carta a Myoiti-ama" Nitiren Daishonin declara :

"Aqueles que crêem no Sutra de Lótus são como o inverno; o inverno nunca falha em se tornar primavera. Desde os tempos antigos, nunca ouvi ou vi o inverno tornar-se outono. Nem tenho sequer ouvido de algum crente no Sutra de Lótus que se tornou um mortal comum. " (Escrituras de Nitiren Daishonin, vol. I, pág. 336)

Essa passagem do Gosho tem inspirado seus discípulos há mais de 700 anos e é uma afirmação de franco otimismo.

Na época mais difícil de sua vida, enquanto exilado na Ilha de Sado, Nitiren Daishonin escreveu "O Verdadeiro Aspecto de Todas as Leis" e disse :

"A princípio somente Nitiren recitou o Nam-myoho-rengue-kyo , mas então duas, três e cem seguiram, recitando e ensinando as outras pessoas. Isto acontecerá também no futuro ... Sem dúvida, no tempo do Kossen-rufu toda a nação japonesa recitará o Nam-myoho-rengue-kyo. Isto é tão certo quanto uma flecha mirar a terra e nunca errar o seu alvo. " (Escrituras de Nitiren Daishonin, vol. I, pág. 367)
De uma cabana fria e rude no meio de um cemitério na Ilha de Sado, Nitiren Daishonin conseguia exprimir audaciosamente a sua esperança e convicção de que as gerações futuras abraçariam o seu budismo. A visão de futuro de Nitiren Daishonin não significava aspirar a algum outro paraíso mundano em busca de paz e segurança. Ensina que a vida neste mundo contém potencial ilimitado para a felicidade e realização.

Tenho examinado essa visão do "eu", mundo e do futuro, o que poderíamos concluir da pessoa que abraça tal filosofia de vida ? A Dra. Herrington observou :

"A felicidade tornou-se muito fugidia para muitas pessoas de nossa sociedade. Parece que as atitudes e perspectivas expressas pelo budismo provêem não apenas proteção contra a depressão, mas também podem levar a uma satisfação imensa. O budismo diz ao indivíduo que existe uma forma de experimentar a vida como algo valioso e que vale a pena, incondicionalmente. Também diz que você pode fazer a diferença."

Finalmente, analisemos a questão "Por que estamos presenciando um aumento tão alarmante na incidência da depressão em nossa sociedade ? ". Um outro líder no campo da teoria cognitiva é Martin Seligman, Ph.D., o primeiro da teoria "desamparo assimilado". Recentemente ele publicou o livro Learned Optimism (Otimismo Assimilado), que esclarece o papel do "estilo explanatório" otimista e pessimista nas áreas da depressão, realização e saúde. O Dr. Seligman apresentou algumas opiniões sobre o recente aumento da depressão na sociedade americana, que alguns têm denominado de "Era da Melancolia".

Ele atribui esse acontecimento a dois fatores. Primeiro, há, em nossa sociedade, uma crescente exaltação do "eu" . Na sociedade americana, enfatiza-se cada vez mais que o "eu" seja a fonte de significado, valor, estima e satisfação existencial. O Dr. Selingman refere-se a isto como o "eu máximo". Juntamente com isso, surgiu um senso diminuído de comunidade e um compromisso diminuído para com um propósito elevado. Ele diz :

"A vida dedicada a nada maior do que si é realmente um vida pobre."

Solicitei os comentários do Dr. Miller :
"A nossa sociedade exerce um alto grau de pressão externa sobre o indivíduo -- escola, trabalho, competição, etc. As pessoas se aplicam tanto à busca material que não possuem energia nenhuma para dar atenção aos assuntos interiores. Você pode ser muito bem sucedido em nossa sociedade sem prestar muita atenção ao seu eu interior, até que algo vá mal."
Tenho visto muitas pessoas idosas, quando se deparam com a aposentadoria, problemas de saúde ou a morte do cônjuge, não têm nenhuma perspectiva do verdadeiro valor da vida. Como nunca cultivaram sua vida interior, mesmo quando voltam-se para a religião, é simplesmente por obrigação. Elas fazem tudo o que se espera delas, mas nem assim encontram alguma felicidade. Muitas vezes, estão meramente tentando agradar a igreja. Em contraste, o budismo oferece uma abordagem sistemática do domínio sobre a vida interior e do crescimento construtivo. Isto capacita o indivíduo a suportar o sofrimento e o prepara para as perdas que inevitavelmente acompanharão os anos finais da vida."

Na filosofia budista, acredito que podemos encontrar uma verdadeira esperança e otimismo, com base em nossa busca interior da verdade e em nosso sonho comum de harmonia entre todas as pessoas. Em seu discurso na ocasião da Palestra Anual em Memória de Gandhi em 11 de fevereiro de 1992, o Presidente Ikeda comentou o seguinte a respeito de Gandhi :

"Como ele próprio (Gandhi) disse : 'Continuo um otimista, não que haja qualquer evidência de que a possibilidade de eu conceder esse direito prospere, mas por causa de minha fé inabalável em que esse direito prospere no final.' ... Por ser incondicional, o otimismo dele não conhece beco sem saída ou impasse. Contanto que a pessoa abrace essa convicção, o seu otimismo fornecerá uma promessa de infinita esperança, visão e vitória ... Na tranqüilidade de suas palavras, sentimos uma autoconfiança invencível, o grito triunfante reservado somente às almas que alcançaram o verdadeiro autodomínio."
Tenho a sincera esperança de que, de algum modo, tenhamos revelado a força psicológica inerente no budismo. Gostaria de concluir com um pequeno trecho da poesia de Emily Dickinson que sinto ser apropriada :

Esperança é o seremplumado ---que pousa n'álmaE canta a cantigasem palavrasE nunca pára jamais
Notas: 

(1) Piratas : PIRATES, time de beisebol dos Estados Unidos;

(2) Correspondem às nossas ações quando manifestamos os estados inferiores da vida de fome, maldade e animalidade. O budismo nos ensina que da a vida, todos os fenômenos e todas as coisas do Universo possuem 10 estados (ou caminhos, ou mundos, ou condições) de vida, que são : inferno, fome, animalidade, maldade (ou ira), tranqüilidade, êxtase (ou alegria), erudição, absorção, bodhisattva e buda;

(3) Itinen Sanzen : Teoria dos "Três Mil Mundos em Um Único Instante de Vida", desenvolvida por Tientai, em seu livro "Maka Shikan" (Grande Concentração e Discernimento);

(4) No Brasil os Goshos foram publicados, em seis volumes, com o nome de ESCRITURAS DE NITIREN DAISHONIN, pela Editora Brasil Seikyo.

O texto acima foi apresentado como um discurso no Primeiro Simpósio Anual de Primavera sobre Budismo e Psicologia, patrocinado pelo Departamento de Cultura da Sede de Pittsburgh da SGI-USA, realizado na Universidade de Pittsburgh em 11 de abril de 1992, e publicado na revista Seikyo Times (SGI-USA) em sua edição de outubro de 1992 e na revista Terceira Civilização (BSGI) de julho de 1994( págs. 28 a 33). 

Ele é de autoria de LEE WOLFSON Psicoterapeuta do Instituto e Clínica de Psiquiatria Ocidental (ICPO) do Centro Médico da Universidade de Pittsburgh. Membro da SGI-USA desde 1972, ele também ocupa cargo de vice-responsável de área Filadélfia (USA) e responsável de regional.

Traduzido e Revisado 

POR 

-Professor Adjunto do Departamento de Estudos Budistas da BSGI (Associação Brasil Soka Gakkai Internacional) 
Rianchocosta@gmail.com

Nota do Editor:
Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Cobranças Abusivas de Consumidores Beneficiários do FIES


Prefacialmente, importante destacar que o consumidor possui a seu favor o princípio consumerista da inversão do ônus da prova, o qual determina que na hipótese daquele não possuir meios suficientes e hábeis de constituir provas robustas de seu direito, caberá à Instituição de Ensino comprovar, em processo judicial, de forma esclarecedora e convincente, a origem de dívidas imputadas ao consumidor, pois se trata nitidamente de relação de consumo.

Feitos tais esclarecimentos, a Lei 10.260/2001, que instituiu o FIES, em seu artigo 3º, disciplina que caberá ao MEC a gestão do referido fundo na qualidade de formulador da política de oferta do financiamento e supervisão de suas operações, bem como também é o órgão competente para formular o regramento dos requisitos e demais regras de concessão do financiamento, tanto aos alunos quanto às instituições de ensino.

Com efeito, uma das normativas primordiais da referida lei, em seu artigo 4º, § 4º, impõe expressamente que:

"Art. 4º São passíveis de financiamento pelo Fies até 100% (cem por cento) dos encargos educacionais cobrados dos estudantes por parte das instituições de ensino devidamente cadastradas para esse fim pelo Ministério da Educação, em contraprestação aos cursos referidos no art.1º em que estejam regularmente matriculados [...].

§ 4º Para os efeitos desta Lei, os encargos educacionais referidos no caput deste artigo deverão considerar todos os descontos regulares e de caráter coletivo oferecido pela instituição, inclusive aqueles concedidos em virtude de seu pagamento pontual. "

Diante de tal previsão, o MEC, fazendo uso de seu poder regulamentador, editou a Portaria do Ministério de Estado da Educação - MEC Nº 270 DE 29.03.2012, que dispõe sobre o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES), e regulamenta a adesão das mantenedoras de entidades privadas de educação profissional e tecnológica e dá outras providências, que prevê em seu artigo 3º, e §§s:

"Art. 3º São passíveis de financiamento pelo FIES até 100% (cem por cento) dos encargos educacionais cobrados das empresas ou dos estudantes por parte das unidades de ensino mantidas pelas entidades mantenedoras devidamente cadastradas nos órgãos de educação competentes e que tenham realizado adesão ao FIES.

§ 1º Para efeitos desta Portaria, são considerados encargos educacionais a parcela das mensalidades, semestralidades ou anuidades, fixadas com base na Lei nº 9.870, de 23 de novembro de 1999, paga à unidade de ensino e não abrangida por bolsas de estudo parciais de qualquer natureza, sendo vedada a cobrança de qualquer taxa adicional.

§ 2º Para cálculo dos encargos educacionais a serem financiados pelo FIES deverão ser deduzidos do valor da mensalidade, semestralidade ou anuidade informada, em qualquer hipótese, todos os descontos regulares e de caráter coletivo oferecidos pela unidade de ensino, inclusive os concedidos em virtude da pontualidade no pagamento."

Nesta esteira, consoante previsão da Portaria Normativa do MEC nº 24, de 20.12.2011 que alterou a Portaria nº 10, de 30 de abril de 2010 do MEC, a cobrança de taxa de matrícula e/ou qualquer mensalidade adicional durante o curso de alunos beneficiários do FIES, no percentual de 100%, é de todo ilegal.

Não obstante, o artigo 2ª-A da mencionada Portaria Normativa MEC nº 10 de 30/04/2010, assim dispõem:

"Art. 2º-A. É vedado às instituições de ensino superior participantes do Fies exigirem pagamento da matrícula e das parcelas das semestralidades do estudante que tenha concluído a sua inscrição no Sisfies.

De outro vértice, ainda que a Instituição de Ensino possa argumentar no sentido de que o valor do contrato com o FIES não seja suficiente para cobrir os custos dos encargos educacionais, há de se ressaltar que, uma vez que o consumidor já anuiu com as cláusulas do respectivo contrato e encontra-se com a contratação do FIES devidamente legalizada, a relação contratual está perfeita e acabada não havendo que se falar em alteração unilateral dos valores já firmados.

Outrossim, é de suma importância destacar que os valores de teto de financiamento do FIES são de conhecimento prévio e inequívoco da Instituição de Ensino, que a ele adere livremente, não podendo o consumidor suportar quaisquer ônus por relação cujos limites não são de sua responsabilidade.

Acerca do exposto, é o nobre entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, vejamos:
RECURSO INOMINADO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C DANOS MORAIS. COBRANÇA REFERENTE A MENSALIDADES DE CURSO DE GRADUAÇÃO. ALUNO COM CRÉDITO ESTUDANTIL - FIES. INEXIGIBILIDADE DOS DÉBITOS. INSCRIÇÃO INDEVIDA. DANO MORAL CONFIGURADO. SENTENÇA CONFIRMADA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO DESPROVIDO (TJ-RS - Recurso Cível: 71005489521 RS, Relator: Ana Cláudia Cachapuz Silva Raabe, Data de Julgamento: 10/06/2015, Segunda Turma Recursal Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 15/06/2015)
Desta feita, pode-se concluir, portanto que, a exigência de valores que ultrapassem aqueles constantes no contrato de financiamento assinado pelo consumidor junto à Instituição de Ensino devem ser declarados abusivos e ilegais, merecendo total amparo e intervenção do Poder Judiciário.
POR RÔMULO GUSTAVO DE MORAES OVANDO
















- Graduado em Ciências Jurídicas pela Universidade Católica Dom Bosco;
- Pós - Graduado em Direito Médico e Hospitalar pela Escola Paulista de Direito, São Paulo - SP;
- Pós - Graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Faculdade de Direito Damásio de Jesus - Unidade São Paulo - SP; 
- Pós - Graduado em Direito Civil e Direito Processual Civil pela Escola Paulista de Direito, São Paulo - SP; 
- Advogado, militante principalmente nas áreas do Direito Médico e Hospitalar, Direito Civil e Direito do Trabalho;
- Professor e Palestrante; e
- Sócio Fundador do Escritório Jurídico Ovando & Varrasquim Advogados
Contatos
- Endereço Comercial: Rua Treze de Maio, nº 3.181 - Sala 08, Bairro Centro, em Campo Grande - MS;

- Tel: (67) 3382-0663/ (67) 98199-9657;

- Twitter: @romuloovando

Nota do Editor:

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