quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Cobranças Abusivas de Consumidores Beneficiários do FIES


Prefacialmente, importante destacar que o consumidor possui a seu favor o princípio consumerista da inversão do ônus da prova, o qual determina que na hipótese daquele não possuir meios suficientes e hábeis de constituir provas robustas de seu direito, caberá à Instituição de Ensino comprovar, em processo judicial, de forma esclarecedora e convincente, a origem de dívidas imputadas ao consumidor, pois se trata nitidamente de relação de consumo.

Feitos tais esclarecimentos, a Lei 10.260/2001, que instituiu o FIES, em seu artigo 3º, disciplina que caberá ao MEC a gestão do referido fundo na qualidade de formulador da política de oferta do financiamento e supervisão de suas operações, bem como também é o órgão competente para formular o regramento dos requisitos e demais regras de concessão do financiamento, tanto aos alunos quanto às instituições de ensino.

Com efeito, uma das normativas primordiais da referida lei, em seu artigo 4º, § 4º, impõe expressamente que:

"Art. 4º São passíveis de financiamento pelo Fies até 100% (cem por cento) dos encargos educacionais cobrados dos estudantes por parte das instituições de ensino devidamente cadastradas para esse fim pelo Ministério da Educação, em contraprestação aos cursos referidos no art.1º em que estejam regularmente matriculados [...].

§ 4º Para os efeitos desta Lei, os encargos educacionais referidos no caput deste artigo deverão considerar todos os descontos regulares e de caráter coletivo oferecido pela instituição, inclusive aqueles concedidos em virtude de seu pagamento pontual. "

Diante de tal previsão, o MEC, fazendo uso de seu poder regulamentador, editou a Portaria do Ministério de Estado da Educação - MEC Nº 270 DE 29.03.2012, que dispõe sobre o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES), e regulamenta a adesão das mantenedoras de entidades privadas de educação profissional e tecnológica e dá outras providências, que prevê em seu artigo 3º, e §§s:

"Art. 3º São passíveis de financiamento pelo FIES até 100% (cem por cento) dos encargos educacionais cobrados das empresas ou dos estudantes por parte das unidades de ensino mantidas pelas entidades mantenedoras devidamente cadastradas nos órgãos de educação competentes e que tenham realizado adesão ao FIES.

§ 1º Para efeitos desta Portaria, são considerados encargos educacionais a parcela das mensalidades, semestralidades ou anuidades, fixadas com base na Lei nº 9.870, de 23 de novembro de 1999, paga à unidade de ensino e não abrangida por bolsas de estudo parciais de qualquer natureza, sendo vedada a cobrança de qualquer taxa adicional.

§ 2º Para cálculo dos encargos educacionais a serem financiados pelo FIES deverão ser deduzidos do valor da mensalidade, semestralidade ou anuidade informada, em qualquer hipótese, todos os descontos regulares e de caráter coletivo oferecidos pela unidade de ensino, inclusive os concedidos em virtude da pontualidade no pagamento."

Nesta esteira, consoante previsão da Portaria Normativa do MEC nº 24, de 20.12.2011 que alterou a Portaria nº 10, de 30 de abril de 2010 do MEC, a cobrança de taxa de matrícula e/ou qualquer mensalidade adicional durante o curso de alunos beneficiários do FIES, no percentual de 100%, é de todo ilegal.

Não obstante, o artigo 2ª-A da mencionada Portaria Normativa MEC nº 10 de 30/04/2010, assim dispõem:

"Art. 2º-A. É vedado às instituições de ensino superior participantes do Fies exigirem pagamento da matrícula e das parcelas das semestralidades do estudante que tenha concluído a sua inscrição no Sisfies.

De outro vértice, ainda que a Instituição de Ensino possa argumentar no sentido de que o valor do contrato com o FIES não seja suficiente para cobrir os custos dos encargos educacionais, há de se ressaltar que, uma vez que o consumidor já anuiu com as cláusulas do respectivo contrato e encontra-se com a contratação do FIES devidamente legalizada, a relação contratual está perfeita e acabada não havendo que se falar em alteração unilateral dos valores já firmados.

Outrossim, é de suma importância destacar que os valores de teto de financiamento do FIES são de conhecimento prévio e inequívoco da Instituição de Ensino, que a ele adere livremente, não podendo o consumidor suportar quaisquer ônus por relação cujos limites não são de sua responsabilidade.

Acerca do exposto, é o nobre entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, vejamos:
RECURSO INOMINADO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C DANOS MORAIS. COBRANÇA REFERENTE A MENSALIDADES DE CURSO DE GRADUAÇÃO. ALUNO COM CRÉDITO ESTUDANTIL - FIES. INEXIGIBILIDADE DOS DÉBITOS. INSCRIÇÃO INDEVIDA. DANO MORAL CONFIGURADO. SENTENÇA CONFIRMADA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO DESPROVIDO (TJ-RS - Recurso Cível: 71005489521 RS, Relator: Ana Cláudia Cachapuz Silva Raabe, Data de Julgamento: 10/06/2015, Segunda Turma Recursal Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 15/06/2015)
Desta feita, pode-se concluir, portanto que, a exigência de valores que ultrapassem aqueles constantes no contrato de financiamento assinado pelo consumidor junto à Instituição de Ensino devem ser declarados abusivos e ilegais, merecendo total amparo e intervenção do Poder Judiciário.
POR RÔMULO GUSTAVO DE MORAES OVANDO
















- Graduado em Ciências Jurídicas pela Universidade Católica Dom Bosco;
- Pós - Graduado em Direito Médico e Hospitalar pela Escola Paulista de Direito, São Paulo - SP;
- Pós - Graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Faculdade de Direito Damásio de Jesus - Unidade São Paulo - SP; 
- Pós - Graduado em Direito Civil e Direito Processual Civil pela Escola Paulista de Direito, São Paulo - SP; 
- Advogado, militante principalmente nas áreas do Direito Médico e Hospitalar, Direito Civil e Direito do Trabalho;
- Professor e Palestrante; e
- Sócio Fundador do Escritório Jurídico Ovando & Varrasquim Advogados
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