sábado, 24 de novembro de 2018

Por que Ler Mulheres


Uma ocasião,
meu pai pintou a casa toda
de alaranjado brilhante.
Por muito tempo moramos numa casa,
como ele mesmo dizia,
constantemente amanhecendo.
 Adélia Prado 

Somos fortemente condicionados pela cultura e estamos mergulhados em um mundo social em que as relações de gênero ainda são problemáticas. Felizmente, desde as primeiras lutas feministas, ocorreram mudanças e, hoje, temos maior consciência do quanto a opressão da mulher é nociva para todos, mulheres e homens. Mas é preciso destacar que se trata de um processo longo e paulatino e que, mesmo assimilando a necessidade de transformação, muitas vezes nos surpreendemos repetindo padrões na maneira de falar, de nos vestir, de nos comportar, de nos relacionar e na forma diferenciada de criar meninos e meninas. Daí a necessidade de continuar problematizando a questão de gênero, até que as mentalidades e os comportamentos se redimensionem de fato. 

Como mulher que vive e produz conhecimento em uma sociedade ainda desigual quanto às questões de gênero, enfrentei resistências para me definir como feminista, ainda que no percurso tenha sido inevitável me posicionar como tal. Em Sejamos todos feministas, a nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie  argumenta a favor do uso da palavra "feminista" para se definir em vez da sugerida expressão "luta por direitos humanos", pois não a usar seria uma maneira de fingir que as mulheres não foram excluídas ao longo dos séculos. Então, falar do tema da leitura de obras de mulheres se constitui neste texto como um ato feminista 
que julgo importante para contribuir com as mudanças ainda necessárias em termos de igualdade entre os gêneros.

Nessa perspectiva, a literatura escrita por mulheres é resultado de um processo de recuperação de uma voz silenciada na história, envolvendo a conquista tanto do espaço da escritura, quanto da construção da identidade. 

Desde o século XIX, as mulheres lutaram por direitos básicos, como educação, voto e representação e, somente há 30 anos, têm ocupado novas posições em diferentes esferas sociais. A partir dessas conquistas, hoje, a literatura de autoria feminina tem, sem dúvida, um espaço considerável entre as publicações. No entanto, chama a atenção que nos programas escolares e universitários ainda predominam a leitura e a discussão de obras de homens.

Investigando a autoria feminina desde 2000, naturalmente, sou impelida a levar textos de mulheres para o estudo em sala de aula. Meus alunos de graduação em Letras, em geral, desconhecem as autoras e relatam que leram poucas mulheres em sua formação. Então, torna-se evidente o quanto ainda precisamos promover ações de estímulo à leitura de obras femininas. 

Com esse intuito, alguns grupos têm se reunido para ler mulheres, como o Leia Mulheres, um movimento informal nos moldes de clube de leitura criado por leitoras e profissionais do livro em 2015 na cidade de São Paulo. É aberto a todos que se interessam e tem grupos em 86 municípios do Brasil. Sendo coordenado e mediado sempre por mulheres, o clube se reúne mensalmente para ler obras de autoras de qualquer lugar e tempo. Em moldes parecidos, coordeno um Curso de Extensão na UFRGS, que tem o propósito de ler poesia de autoria feminina.

Portanto, apesar de toda a revolução feminista e suas repercussões em nossos dias, a pergunta que dá título a este artigo justifica-se pela marginalização dos textos femininos na educação formal. Existe uma demanda de criação de hábitos de leitura em nosso país, contemplando obras diversificadas, canônicas e não canônicas, representativas dos diferentes grupos que compõem nossa sociedade. Para  atingir leitores que, por natureza, são plurais no que se refere a gênero, raça e classe social, faz-se urgente a oferta de leituras que levem em conta tal pluralidade.

POR CINARA FERREIRA


















- Doutora em Letras, área de Literatura Comparada, UFRGS e
-Docente do Instituto de Letras, da UFRGS.

Nota do Editor:

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sexta-feira, 23 de novembro de 2018

Escola & Família

Parceria entre escola e família sempre foi importante e eficaz; no entanto, esse assunto tornou-se polêmico em virtude do “jogo de empurra” que se vê atualmente, pois os pais, apesar de restrições às interferências na educação dos filhos, anseiam que o professor faça o que eles, por falta de tempo e questões estruturais da família, não fazem.

Poucos valorizam o contato com a escola, principalmente na participação em reuniões pedagógicas, momentos para inteirar-se das dificuldades e desempenho do filho, e de conversar sobre resultados.

Observa-se que a família tende a deixar para a escola a responsabilidade da educação das crianças, não está havendo, de fato, uma integração entre escola e família no que concerne às responsabilidades de cada lado, que devem ser complementares: a eficácia do professor aumenta quando a criança já chega à escola com bons hábitos, e ela aprende melhor na escola quando há estímulos vindos da família, independente do nível socioeconômico.

O aluno clama por direitos, mas pouca importância dá aos seus deveres, não sabe lidar com frustrações. Os pais exigem da escola parcela da formação que não cabe a ela, esquecem que são responsáveis por mostrar o caminho da persistência, da hierarquia e da disciplina, o que tornaria mais fácil o papel reservado à escola, instituição que tem como vocação transmitir conhecimentos, facilitar a aprendizagem, ajudar a desenvolver a criatividade, estimular o espírito crítico, mostrar a necessidade de adquirir conhecimentos e técnicas que farão dos alunos cidadãos capacitados para ter sobrevivência digna e relevante, tanto individualmente quanto em sociedade. E, obviamente, ser valiosa ferramenta de reforço de conceitos que devem ter sido transmitidos às crianças por seus pais.

É dever deles – e se possível dos demais membros da família – a expressão do amor, e isso influi diretamente no resultado escolar da criança. São dois elementos que se somam, lembrando que atividades conjuntas são importantes ferramentas para a integração das tarefas desses dois lados, que formam as crianças. 

Na sociedade atual pais e escolas são peças insubstituíveis. É época de falta de oportunidades, índices alarmantes de violência e pobreza, diferenciação de classes, falta de tempo, conceito de família em redefinição, desigualdade que causa isolamento social. Se os pais e a escola interagirem de forma contínua conseguirão resolver os problemas, considerar as causas dos conflitos e dificuldades, para certamente encontrar, em conjunto, soluções que favoreçam a família, os educadores, a instituição escolar e, principalmente, os alunos. Não pode a escola fazer de um jeito e a família de outro, senão o maior prejudicado acaba sendo quem deveria ser preservado: o aluno. Essa é a razão de ser da parceria entre a escola e a família.

Pais que enxergam os professores como aliados, e professores que veem os pais potencializando o rendimento escolar, terão maiores possibilidades de conversar abertamente sobre os problemas dos alunos e buscar soluções. 

Muitas vezes, a dificuldade diante da falta de estudo dos pais impede que eles ajudem os filhos nas tarefas escolares, mas isso não impede que participem em atividades de música, esportes, ouçam leituras.  Eles podem dialogar, conversar, doar-se. As brincadeiras, o afeto e o elogio são incentivos, e para isso não é necessário ter estudo. Essas atitudes facilitam de sobremaneira a integração com a atividade escolar.

Pais têm dificuldade para atender todos os afazeres da casa e cumprir sua jornada de trabalho – ou de busca de trabalho – e essa realidade pode afetar participação mais ativa no cotidiano da criança e nos estudos. Entretanto, faz-se necessário que se esforcem, de forma a viabilizar a parceria com a escola. Nenhum dos lados pode se isentar da responsabilidade que lhe compete. 

Os pais que se organizam para depois das aulas verificarem os deveres escolares podem mostrar que estudar fora da sala de aula é bom, e os professores perceberão melhora no comportamento do aluno e maior facilidade em seu aprendizado.

Cumprir a proposta pedagógica apresentada para os pais é obrigação da escola. Pais e escola na verdade devem formar uma equipe que trabalhe baseada em colaboração e compartilhamento, lembrando que princípios e valores de ambos os lados precisam ser compatíveis. 

O professor é fundamental para que a criança tenha êxito na realização de suas escolhas profissionais, mas alunos são passageiros em sua vida, ao passo que a família é para sempre.

Nas últimas pesquisas, o Brasil é considerado o país onde os professores são os mais desvalorizados do mundo. Cabe também aos pais empenharem-se na luta para reverter esse processo e dar as mãos aos docentes, para que juntos possam cobrar uns dos outros, e das autoridades, o que é devido.

Após décadas de intensa liberalidade, quando o “sim” era quase sempre a única resposta oferecida às crianças, a realidade atualmente vivida mostra que pais e escolas precisam voltar a saber dizer “não”, e, mais do que isso, como dosar com o “sim” e quando isso pode ser feito. É a dinâmica do aprendizado de quem precisa ensinar. 

Da harmonia entre pais e escolas depende o futuro de nossa nação e da sociedade em geral.



POR GENHA AUGA


-Bacharel em Comunicação Social, com Habilitação em Jornalismo Impresso -(MTB: 15.320);
-Cronista do Jornal online “Gazeta Valeparaibana” - desde fevereiro de 2012;e
-Direção Geral da Trupe de Teatro “Seminovos” – Sede de ensaios no Teatro João Caetano de São Paulo (Secretaria Municipal de Cultura-Prefeitura de São Paulo) – autora de textos e roteiro - desde 2015 com apresentações em Teatros, CEUs, Saraus, Hospitais, Escolas, Residenciais para Idosos, Centros de Convivências, Eventos, Instituições de Apoio às Crianças Especiais.

Nota do Editor:

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quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Antídoto à Crise Pós-Moderna: Busca pelas Virtudes Cristãs


Diversos filósofos e sociólogos conceituam nossa época como sendo a pós-modernidade. Uma era instável, na qual o sujeito está submetido à sua própria capacidade para se realizar.

Zygmunt Bauman chamou nossa época de modernidade líquida, na qual todas as estruturas que antes davam substrato à vida humana, uma orientação e solidez se liquefazerem, se adaptando constantemente ao desejo individual. 

O projeto de vida administrada e orientada pela ciência que a modernidade pregoou não se concretizou, gerando uma lacuna no sentido da existência do projeto humano, no qual essa utopia moderna se estabelecia como um tipo de superação do medieval.

Não há mais nada que limite o indivíduo e sua liberdade, não há padrões ou censuras nas quais ele deve se adaptar. Cabe ao indivíduo olhar a realidade que o cerca e adaptar-se a ela, identificando condutas e assumindo posturas de acordo com o lugar em que se situa.

As referências que antes orientavam o sujeito se esfacelaram diante da autoconstrução individual. A modernidade líquida é marcada por esse primado do indivíduo, que age e move-se com rapidez e não se prende a nada sólido. Nem a estruturas que antes o condicionava como o tempo e o espaço são barreiras, pois ele é “nômade” e “extraterritorial” e se move na velocidade do sinal eletrônico. 

A percepção do mundo nos faz perceber a história e a realidade sem uma perspectiva de finalidade. As gerações mais jovens cada vez mais desconfiam da possibilidade de se criar um Estado capaz de regular a vida dando uma orientação sólida, justa, boa, sem conflitos ou ambivalências, isso parece ser uma quimera romântica. 

O indivíduo percebe-se como responsável por encontrar-se e realizar-se. Aquilo que era confiado a humanidade enquanto tal, agora é dado a administração do indivíduo e seus recursos.

Não se pode ficar parado, o mundo é veloz e eu devo ser também. Devo estar num processo de atualização constante, quem para logo é marginalizado, substituído. O processo é contínuo, mas não é claro o caminho a ser seguido, somente que devemos correr em direção a algo.

Reside certa angústia neste constante processo de individualização, pois os sujeitos estão somente justapostos. O indivíduo tem empatia pelo problema do outro, pois ele sofre de coisas semelhantes, mas isto não gera um problema coletivo, cada qual tem a obrigação de resolver suas próprias questões. "A única vantagem que a companhia de outros sofredores pode trazer é garantir a cada um deles que enfrentar os problemas solitariamente é o que todos fazem diariamente – e, portanto – renovar e encorajar a fatigada decisão de continuar a fazer o mesmo" (Bauman, Z. Modernidade Líquida. Zahar, 2000. p.49).

O ego está nu e só, caminha sem direção. Toda esta autodeterminação do sujeito gerará uma enorme angústia, parafraseando a Freud em sua famosa obra "o mal-estar na civilização".

Bauman fala sobre o mal-estar da pós-modernidade, onde homens e mulheres abdicaram de um tanto de sua segurança em nome de mais liberdade e autonomia, na busca do prazer e que possibilita uma pequena segurança individual. E este estado é permanente, a "individualização é uma fatalidade, não uma escolha" (idem, p.47), na qual o indivíduo está condenado a tatear em busca de si.

Nesse cenário difuso e confuso, parece que a humanidade deve recorrer a tradição ocidental que começou a ser perdida a partir do humanismo. 

Reencontrar a finalidade do homem que ocidente elaborou na junção entre a percepção clássica, dada pelos gregos e o embate da moral cristã.  E a tradição católica compreendeu que há um ideal de homem a ser buscado, que viver guiado pela satisfação dos desejos e paixões conduzem o ser humano ao vício e ao pecado, e consequentemente a se perder em si mesmo e a danação eterna.

A vida humana individual é confusa e incapaz de orientar o sujeito eficazmente, pois o intelecto individual é incapaz de dar finalidade a si mesmo.

Naturalmente, nós humanos sentimos uma atração a ordem, beleza, verdade, bondade ... que percebemos fora de nós. Esses elementos que não estão dados a alma individual, mas antes, devem ser buscados. Essa compreensão confere finalidade ao homem, não uma finalidade reduzida, que se esvaece com o desejo individual, mas uma finalidade que confere ao indivíduo a participação no projeto de humanidade. 

Dessa maneira, longe dessa confusão pós-moderna na qual grande parte da humanidade se encontra.

E para tal processo, a tradição católica compreendeu que existem virtudes que o sujeito deve buscar para que viva sua vida com propósito, rompa com o egoísmo de suas paixões, alcance um ideal de humanidade e cumpra com sua vocação à vida eterna e sobrenatural. As virtudes são sempre disposições individuais, não é uma característica, mas uma inclinação, um esforço constante para ter hábitos que conduzam ao bem.

A tradição católica definiu dois tipos de virtudes: teologais e humanas.

As virtudes teologais são virtudes infusas na alma humana por Deus para fazê-lo viver com um filho de Deus. Elas são a fé, a esperança e a caridade.

A fé "é a virtude teologal pela que cremos em Deus e em tudo o que Ele nos disse e revelou, e que a Santa Igreja nos propõe" (Catecismo, 1814). Pela fé o homem entrega-se inteira e livremente a Deus, e se esforça por conhecer e fazer a vontade de Deus: "O justo vive da fé" (Rm 1,17).

A esperança “é a virtude teologal pela que aspiramos ao Reino dos céus e à vida eterna como felicidade nossa, pondo nossa confiança nas promessas de Cristo e apoiando-nos não em nossas forças, mas nos auxílios da graça do Espírito Santo” (Catecismo, 1817).

A caridade "é a virtude teologal pela qual amamos a Deus sobre todas as coisas por Ele mesmo e a nosso próximo como a nós mesmos por amor de Deus" (Catecismo, 1822). Este é o mandamento novo de Jesus Cristo: "que vos ameis uns a outros como eu vos amei" (Jo 15,12).

"As virtudes humanas são atitudes firmes, disposições estáveis, perfeições habituais do entendimento e da vontade que regulam nossos atos, ordenam nossas paixões e guiam nossa conduta segundo a razão e a fé. Proporcionam facilidade, domínio e satisfação para levar uma vida moralmente boa" (Catecismo, 1804). Estas "se adquirem mediante as forças humanas; são os frutos e os gérmenes dos atos moralmente bons" (Catecismo, 1804).

Entre as virtudes humanas há quatro chamadas cardeais porque todas as demais se agrupam em torno delas. São a prudência, a justiça, a fortaleza e a temperança (cf. Catecismo, 1805).

A prudência "é a virtude que dispõe a razão prática a discernir em toda circunstância nosso verdadeiro bem e a eleger os meios retos para o realizar" (Catecismo, 1806). É a "regra reta da ação".

A justiça "é a virtude moral que consiste na constante e firme vontade de dar a Deus e ao próximo o que lhes é devido" (Catecismo 1807).

A fortaleza "é a virtude moral que assegura nas dificuldades a firmeza e a constância na busca do bem. Reafirma a resolução de resistir às tentações e de superar os obstáculos na vida moral. A virtude da fortaleza faz capaz de vencer o temor, inclusive à morte, e de fazer frente às provas e às perseguições. Capacita para ir até a renúncia e o sacrifício da própria vida por defender uma causa justa" (Catecismo, 1808).

A temperança "é a virtude moral que modera a atração dos prazeres e busca o equilíbrio no uso dos bens criados. Assegura o domínio da vontade sobre os instintos" (Catecismo, 1809). A pessoa temperada orienta para o bem seus apetites sensíveis, e não se deixa arrastar pelas paixões. No Novo Testamento é chamada "moderação" ou "sobriedade" (cf. Catecismo, 1809).

Dessa forma, regressar a essa tradição sobre a compreensão do ser humano, sobre o propósito de sua existência, desvela-se como uma maneira de se viver neste momento caótico em que vivemos. Essa orientação de vida mescla suas raízes no período clássico e funde a reflexão de sábios e santos homens, que interpretaram e conduziram ao longo da história inúmeras almas diante as vicissitudes da vida. A busca pelas virtudes eleva o sujeito a humanidade, o que condiz com a graça de ser Filho de Deus.

POR FÁBIO DA FONSECA JÚNIOR



-Católico, professor de filosofia e história.

Nota do Editor:

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quarta-feira, 21 de novembro de 2018

A Aplicabilidade do CDC nos Empréstimos Bancários



Antes de adentrar-se a temática dos empréstimos bancários, vale consignar de forma preambular o conceito de empréstimo segundo as normas do Direito Civil Brasileiro, o ato de emprestar significa basicamente entregar a outrem um bem móvel ou imóvel, obrigando a pessoa que recebeu o bem (coisa) de entregá-lo em boas condições ou outro bem de mesma qualidade e quantidade. De modo preliminar o empréstimo se divide nas modalidades: o mútuo e o comodato. Nesta linha de pensamento o jurista Flávio Tartuce, leciona:

" Comodato – empréstimo de bem infungível (insubstituível) e inconsumível, em que a coisa emprestada deverá ser restituída findo o contrato (empréstimo de uso)
Mútuo – empréstimo de bem fungível e consumível, em que a coisa é consumida e desaparece, devendo ser devolvida outra de mesma espécie e quantidade (empréstimo de consumo)."

Nessa banda, é imperioso relembrar o conceito de bem fungível que é o bem (coisa) que pode ser trocada, pode ser substituída por outra de mesma qualidade e de mesma quantidade, exemplo: um telefone celular, um computador, já o bem infungível, é aquele insubstituível, não poderá ser substituído por outro bem. Neste trabalho somente se irá aprofundar no empréstimo na modalidade de Mútuo, em específico no tocante ao contrato de empréstimo (mútuo oneroso).

Destarte, perpassado as explicações preliminares a doutrina denomina também o empréstimo de dinheiro ou mútuo oneroso de Mútuo feneratício, este capitulado no diploma legal 591 do Código Civil Brasileiro:

''rt. 591. Destinando-se o mútuo a fins econômicos, presumem-se devidos juros, os quais, sob pena de redução, não poderão exceder a taxa a que se refere o art. 406, permitida a capitalização anual".

Nesta modalidade de empréstimo existe a cobrança de juros, então nessa linha de pensamento o consumidor ao ingressar numa financeira ou uma instituição bancário com o fim de realizar um empréstimo ele deve de pronto atentar, ter atenção plena no que tange a cobrança de juros, a quantidade mensal e global dos juros do contrato de empréstimo, atenção ao juros de mora ou juros em decorrência do atraso no pagamento, portanto, é realmente importante para o consumidor ter tal planilha clara, objetiva que realmente aborde plenamente os juros cobrados no contrato de empréstimo. 

A informação acima mencionada é de responsabilidade da instituição bancária ou da financeira, nessa banda o fornecedor deverá de pronto dar informação clara, precisa, objetiva no que tange a cada uma das cláusulas contratuais e principalmente no que tange aos juros contratuais num contrato de empréstimo. Reitera-se nestes contratos não se permite cláusulas abusivas e nem cláusulas obscuras, ambas são ilegais.

Outro ponto importante que deve ser esclarecido de forma cabal é a aplicação do Código de Defesa do Consumidor nos CONTRATOS BANCÁRIOS, ou seja, a natureza dos serviços prestados pelos Bancos por evidência o qualificam como ente FORNECEDOR DE PRODUTOS E SERVIÇOS e por evidência lógica é aplicável nos contratos bancários o Código De Defesa do Consumidor.

Nesse sentido o jurista Arnoldo Wald apud Carlos Roberto Gonçalves, leciona:

"Arnoldo Wald menciona que, pela própria natureza dos serviços prestados pela instituição financeira, impõe-se a sua responsabilidade objetiva pelos mesmos motivos por que se estabeleceu a do Estado, que mereceu até ser consagrada constitucionalmente. Na realidade, sendo impossível ao cliente conhecer a vida interna da instituição financeira, pelo grau de complexidade que alcançou, justifica-se que esta responda objetivamente pelos danos acusados, com base na teoria da culpa do serviço, consolidada e consagrada no campo do Direito Público".

O renomado autor acima corroborou e retirou qualquer dúvida sobre a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor aos contratos bancários, portanto, quando o consumidor se sentir lesado em um contrato bancário, seja de empréstimo ou outro contrato bancário é imperioso que procure os órgãos de proteção ao consumidor, ou procure seu advogado ou procure o ministério Público, ou a Defensoria Pública. 

Outro ponto de destaque no relato do autor é no que a Responsabilidade Civil para o Direito do Consumidor, para o Código de Defesa do Consumidor, em outros dizeres esta responsabilidade é OBJETIVA, não precisa de comprovação de culpa do fornecedor por parte do consumidor, noutras palavras, quem é detentor de todos os meios, de canais, do sistema bancário, da intranet do banco, da rotina bancária é justamente o Banco ou instituição financeira e exatamente por isso que a responsabilidade é objetiva nestes casos. Não é razoável e nem proporcional exigir uma prova de culpa do fornecedor pelo consumidor neste caso, quem possui os meios e o controle do negócio são exatamente as instituições financeiras.

Para corroborar com a fundamentação acima aludida é relevante trazer à baila a SÚMULA 297 DO STJ: "O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR É APLICÁVEL ÀS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS".

O Superior Tribunal de Justiça nos seus julgados já rechaçou, não acolheu a tese dos bancos de que o Código de Defesa do Consumidor só seria aplicável em alguns casos, em alguns contratos bancários, atualmente a doutrina e a jurisprudência de forma pacífica entendem que o código de defesa do consumidor é aplicável sim as instituições bancárias, financeiras.

Nessa linha de raciocínio o diploma legal 3 do Código de Defesa do Consumidor aduz:

 "Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
        § 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.
        § 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista."

Está explícito no Código de Defesa do Consumidor que os bancos, financeiras prestam serviços aos consumidores, portanto, é de fato e de direito a aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos contratos bancários. A relevância no que tange a esta aplicabilidade do CDC nestes contratos se dá, por exemplo: NA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA EM FAVOR DO CONSUMIDOR; A RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA, O DEVER DE INFORMAÇÃO CLARA, PRECISA E OBJETIVA DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS, dentre outros.

Importante é comentar o disposto no diploma legal 52 do Código de Defesa do Consumidor, este aduz:

"Art. 52. No fornecimento de produtos ou serviços que envolva outorga de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor, o fornecedor deverá, entre outros requisitos, informá-lo prévia e adequadamente sobre:
        I - preço do produto ou serviço em moeda corrente nacional;
        II - montante dos juros de mora e da taxa efetiva anual de juros;
        III - acréscimos legalmente previstos;
        IV - número e periodicidade das prestações;
        V - soma total a pagar, com e sem financiamento.
        § 1° As multas de mora decorrentes do inadimplemento de obrigação no seu termo não poderão ser superiores a dez por cento do valor da prestação.
        § 1° As multas de mora decorrentes do inadimplemento de obrigações no seu termo não poderão ser superiores a dois por cento do valor da prestação.           (Redação dada pela Lei nº 9.298, de 1º.8.1996)
        § 2º É assegurado ao consumidor a liquidação antecipada do débito, total ou parcialmente, mediante redução proporcional dos juros e demais acréscimos.
        § 3º (Vetado)". (Lei 8.078/1990)

No primeiro inciso se aborda que o preço, o valor do produto ou do serviço deverá ser em moeda nacional, ou seja, deverá ter um custo no moeda: REAL, além disso, neste contrato bancário deverá ser informado o consumidor de forma clara e precisa nas cláusulas sobre a planilha de pagamento, em outras palavras, deverá ser detalhada pela instituição financeira (banco ou financeira), toda forma de pagamento, parcelamento, duração do parcelamento, tabela ou planilha dos juros mensais e globais do contrato bancário, tais informações deveram ser prestadas antes e na data da assinatura do contrato, por evidência que no contrato de empréstimo bancário é notório que o consumidor deverá ter a sua cópia, infelizmente algo que nem sempre acontece no Brasil.

O consumidor deverá ter a atenção plena com relação as cláusulas contratuais, portanto, é imperioso, direito do consumidor a leitura do contrato e caso tenha dúvidas o fornecedor deverá sanar estas antes da formalização e assinatura do contrato, contemplando assim o princípio da informação e também o princípio da boa-fé nos contratos.

No percurso do trabalho relatou-se sobre o contrato de empréstimo, na modalidade mútuo oneroso, mas, isso não quer dizer que o código de defesa do consumidor não se aplica aos demais contratos bancários, em outros dizeres, TODOS OS CONTRATOS BANCÁRIOS SERÃO REGIDOS PELO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR (EXEMPLOS: ABERTURA DE CONTA; CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE BEM IMÓVEL; CONTRATO DE EMPRÉSTIMOS; ETC)

JURISPRUDÊNCIAS SOBRE O TEMA:
TRF-1 - APELAÇÃO CIVEL AC 25251 MG 2000.38.00.025251-1 (TRF-1)Data de publicação: 05/10/2007Ementa: DIREITO CIVIL - CONSUMIDOR. APLICAÇÃO DO CDC A CONTRATO DE EMPRÉSTIMO BANCÁRIO. NULIDADE DE CLÁUSULA QUE PERMITE APROPRIAÇÃO DE VALORES ENCONTRADOS EM CONTA DE AVALISTA . 1. O Código de Defesa do Consumidor é aplicável para revisão de contrato de empréstimo bancário, a teor da Súmula 297 do c. STJ . 2. Cláusula contratual que permite a satisfação da dívida pela apropriação direta pela CEF de valores encontrados em qualquer conta corrente do fiador, sem prévio aviso, se revela como vantagem exagerada, abusiva e iníqua, ofensiva ao direito de propriedade e ao devido processo legal, incidindo na nulidade absoluta descrita nos art. 51 , IV e § 1º , III , do CDC . 3. Apelação improvida
Encontrado em: :00003 ART : 00003 PAR: 00001 PAR: 00002 DIREITO CIVIL CONSUMIDOR. APLICAÇÃO DO CDC A CONTRATO... DE EMPRÉSTIMOBANCÁRIO. NULIDADE DE CLÁUSULA QUE PERMITE APROPRIAÇÃO DE VALORES ENCONTRADOS EM CONTA... DE AVALISTA . 1. O Código de Defesa do Consumidor é aplicável para revisão de contrato de empréstimo..."
"TJ-RS - Apelação Cível AC 70077355683 RS (TJ-RS)Data de publicação: 05/10/2018Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOSCONTRATOS. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMOAPLICAÇÃO DO CDC. Segundo inteligência da Súmula 297 do STJ, o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras. JUROS REMUNERATÓRIOS. A Segunda Seção do STJ, no julgamento do REsp nº 1.061.530/RS, submetido ao regime dos recursos repetitivos, firmou entendimento de que as instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios ao patamar de 12% ao ano ou à Taxa Selic, sendo admitida a revisão deste encargo apenas em situações excepcionais, em que caracterizada a abusividade da taxa pactuada. No caso em exame, os juros remuneratórios fixados no contrato revisando estão acima da taxa média de juros apurada pelo BACEN, pelo que configurada está a abusividade na pactuação deste encargo, a justificar a sua limitação. COMPENSAÇÃO E/OU REPETIÇÃO DO INDÉBITO. Segundo entendimento pacífico no colendo STJ, que culminou com a edição da Súmula n. 322, é cabível a compensação e/ou repetição simples do indébito, independentemente da prova do erro. Assim, tendo sido reconhecida a abusividade em alguns encargos contratados, é admitida a compensação e/ou repetição simples dos valores pagos a maior. HONORÁRIOS ADVOCATICIOS. REDUÇÃO. NÃO CABIMENTO.... Os honorários advocatícios serão fixados em conformidade com os critérios do art. 85, §2º, do novo CPC, e em patamar condizente com o exercício da atividade profissional da advocacia. In casu, não se mostra cabível a redução da verba, como postulado, pois fixada de acordo com os parâmetros estabelecidos por esta Câmara, para que representem remuneração adequada ao patrono da parte apelante e sejam compatíveis com a dignidade da profissão de advogado. APELAÇÃO DESPROVIDA. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70077355683, Primeira Câmara Especial Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Martin Schulze, Julgado em 25/09/2018).
Encontrado em: Primeira Câmara Especial Cível Diário da Justiça do dia 05/10/2018 - 5/10/2018 Apelação Cível AC 70077355683 RS (TJ-RS) Martin Schulze"
"TJ-RS - Apelação Cível AC 70077877462 RS (TJ-RS)Data de publicação: 03/09/2018Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL. APLICAÇÃO DO CDC . Segundo inteligência da Súmula 297 do STJ, o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras. JUROS REMUNERATÓRIOS. A Segunda Seção do STJ, no julgamento do REsp nº 1.061.530/RS, submetido ao regime dos recursos repetitivos, firmou entendimento de que as instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios ao patamar de 12% ao ano ou à Taxa Selic, sendo admitida a revisão deste encargo apenas em situações excepcionais, em que caracterizada a abusividade da taxa pactuada. No caso em exame, os juros remuneratórios fixados no contrato de empréstimo revisando estão destoando da taxa média de juros apurada pelo BACEN, pelo que impositiva se mostra a limitação desse encargo ao referido parâmetro de mercado. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70077877462, Primeira Câmara Especial Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Martin Schulze, Julgado em 28/08/2018).
Encontrado em: Primeira Câmara Especial Cível Diário da Justiça do dia 03/09/2018 - 3/9/2018 Apelação Cível AC 70077877462 RS (TJ-RS) Martin Schulze."
Da análise prévia dos julgados acima é interessante concluir que nos contratos bancários é realmente aplicável o código de defesa do consumidor (Lei 8.078/1990), nesta mão, não resta nenhuma dúvida no tocante a tal aplicabilidade no contrato de empréstimo assim como nos demais contratos bancários. 

Vale ainda consignar que o consumidor deverá estar atento a todas a cláusulas dos contratos bancários, atenção plena na leitura e se houverem dúvidas que o fornecedor, a instituição financeira ou bancária as resolva antes da assinatura do contrato cumprindo deste modo com o princípio da informação clara e precisa e também o da boa-fé, neste diapasão tanto a informação clara quanto a boa-fé deverão acompanhar toda a duração do contrato, ou seja, boa-fé prévia, antes do contrato, ainda na publicidade, boa-fé no percurso, no decorrer do efetivação do contrato e boa-fé posterior ao contrato. A transparência e a segurança jurídica são também relevantes no contexto dos contratos bancários, portanto, o consumidor deverá analisar estas variáveis quando for realizar um contrato bancário ou qualquer outro.

Referências Bibliográficas:

 Gonçalves, Carlos Roberto. Direito das obrigações, parte especial, tomo II: Responsabilidade civil/ Carlos Roberto Gonçalves, - 8 ed. – São Paulo: Saraiva, 2011. (Coleção sinopses jurídicas) P.160;

 Tartuce, Flávio. Manual de direito civil: volume único/ Flávio Tartuce. 2. Ed. rev. atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2012. p. 675; e

   Lei 8.078 de 1990 – Código de Defesa do Consumidor.

POR RODRIGO PEREIRA COSTA SARAIVA



- Advogado e Consultor Jurídico em São Luís- MA;
 - Bacharel em Direito pelo  UNICEUMA;
- Pós-graduado Latu Sensu em Direito e processo do Trabalho, com formação em Magistério Superior pela Universidade Anhanguera Uniderp/Rede LFG;
- Professor do Curso Preparatório Para o Exame da Ordem do IMADEC e
 - Co-autor do livro "Artigos Acadêmicos de Direito" - Editora Sapere, Rio de Janeiro -2014

Nota do Editor:

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terça-feira, 20 de novembro de 2018

Licença-Maternidade Especial para Mães de Filhos Prematuros





Novembro é considerado o Mês Internacional de Sensibilização para a Prematuridade e o objetivo é alertar sobre o crescente número de partos prematuros e como preveni-lo e informar sobre as consequências do nascimento antecipado para o bebê, para sua família e para a sociedade. É mundialmente conhecido por "Novembro Roxo". 

O tema é de extrema importância uma vez que vem tornando cada vez mais comum os casos em que a gravidez é interrompida antes do seu termo final, por meio de um parto prematuro. Segundo a Organização Mundial de Saúde, o parto prematuro é aquele considerado com nascimento da criança antes de completadas 37 semanas de gestação (OMS, 2016). 

No mundo, estima-se que 15 milhões de bebês nascem antes do prazo previsto. O Brasil aparece em décimo lugar, com 279 mil partos prematuros por ano. (PORTAL BRASIL, 2012). 

O nascimento prematuro é um dos maiores problemas ainda não solucionados da ginecologia/obstetrícia. Apesar de as estratégias de prevenção durante o pré-natal, e da assistência neonatal terem evoluído muito nos últimos anos, a sua incidência, morbidade e mortalidade neonatal continuam elevadas. Além disso, suas complicações estão entre as principais causas de morte no primeiro ano de vida da criança. (BITTAR, 2005, p. 09). 

Com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, a proteção à maternidade passou ser consagrada como direito social, previsto no artigo 6º da Carta Constitucional. Por sua vez, o artigo 7º, inciso XVIII, e artigo 201, inciso II, também garantem à gestante proteção constitucional.

Muito se fala a respeito da proteção à gestante, de modo que lhe é assegurado o salário-maternidade, previsto nos artigos 71 a 73 da Lei nº 8.213/1991, que dispõe sobre os planos de benefícios da Previdência Social, e também nos artigos 93 a 103 do Regulamento da Previdência Social - Decreto nº 3.048/1999. 

O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre vinte e oito dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade, de acordo com que preceitua o artigo 71 da Lei nº 8.213/1991. 

Com efeito, o salário-maternidade nada mais é do que a proteção social da mulher gestante. Trata-se de preservar a função fisiológica no processo de criação, facilitar o cuidado dos filhos e atenção à família, garantindo seus interesses profissionais e sua renda no mercado de trabalho, sem diminuir nem deteriorar sua condição feminina (CASTRO, 2016, p. 849). 

Para a concessão do benefício é exigida a carência para as seguradas contribuinte individual, especial e facultativa, em número dez contribuições mensais. Caso ocorra o parto antecipado, o período de carência é reduzido em número de contribuições equivalente ao número de meses em que o parto foi antecipado.

Independem de carência para o recebimento do benefício as seguradas empregadas, avulsas e empregadas domésticas. Já para a segurada especial se faz necessária a comprovação do exercício da atividade rural nos últimos dez meses imediatamente anteriores ao requerimento do benefício, mesmo que de forma descontínua. 

Por sua vez, um tema recente é a possibilidade de extensão do prazo de afastamento do salário-maternidade, criado por meio da Lei nº 11.770/2008, que instituiu o programa "Empresa Cidadã", destinado à prorrogação da licença-maternidade por sessenta dias adicionais, mediante concessão de incentivo fiscal. A finalidade do programa é garantir o aleitamento materno exclusivo durante os seis primeiros meses de vida, como recomenda a Organização Mundial de Saúde (MENEZES, 2014, p. 315). 

Embora seja um grande avanço legislativo, o Programa Empresa Cidadã não é o único a almejar a ampliação da licença-maternidade. Atualmente anseia-se pela ampliação da licença-maternidade para os casos de parto prematuro, um problema mundial que tem se tornado cada vez mais comum. 

O grande anseio partiu movido pelo alto índice de partos prematuros no mundo. Como já elencado, o Brasil é o 10º país com maior número de partos prematuros. Todavia, apesar do alto índice, ainda não há previsão legal expressa acerca do tema, de modo a garantir à gestante o direito de ampliar sua licença-maternidade caso ocorra o nascimento prematuro da criança.

De modo a preencher essa lacuna, encontra-se em estágio final de tramitação a Proposta de Emenda à Constituição nº 99/2015, que de forma ampla e abrangente, busca alterar o inciso XVIII do artigo 7º da Constituição Federal, para dispor sobre a licença-maternidade em caso de parto prematuro. Por meio dessa proposta, o inciso XVIII do artigo 7º da Constituição Federal passará a vigorar com a seguinte redação: ""icença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias, estendendo-se a licença-maternidade, em caso de nascimento prematuro, à quantidade de dias que o recém-nascido passar internado”. 

A pretendida alteração constitucional foi aprovada por unanimidade no Senado Federal no dia 09 de dezembro de 2015, e enviado à Câmara dos Deputados, com o otimismo de ser em breve aprovada, de modo a assegurar a gestante a licença-maternidade ampliada em caso de nascimento prematuro pela quantidade de dias em que o recém-nascido passar internado. 

Tal regulação se faz necessária em virtude do fato de as mães de filhos prematuros ficarem vulneráveis devido a interrupção prematura da gestação, além do cuidado excepcional com o filho fragilizado, além do fato de ter que se dividir entre os cuidados do filho e a tensão de ter de retornar ao trabalho antes da completa recuperação da criança, impedindo ou minorando a convivência entre mãe e filho. 

Ressalta-se que o artigo 227 da Constituição da República Federativa do Brasil elenca ser dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, com absoluta prioridade, entre outros direitos, o direito à vida e à saúde, a salvo de toda forma de negligência. Neste sentido é também o objetivo do Marco Regulatório da Primeira Infância – Lei nº 13.257 de 08 de março de 2016, que prioriza a convivência familiar para a primeira infância.

E é nessa ótica que se deve entender a licença-maternidade, como uma garantia legal e constitucional de proteção da família e a uma infância saudável, assegurando à mãe de filhos prematuros a possibilidade da licença-maternidade pela quantidade de dias em que a criança ficar internada, e também possibilitando ao recém-nascido um desenvolvimento sadio. 

É preciso registrar que a proteção à saúde da criança, bem como a proteção à maternidade contam com respaldo constitucional. O fato de a ampliação da licença-maternidade não possuir regramento específico legal, não pode impedir que o direito seja reconhecido. Apreciar o tema de maneira diversa acabaria por exaurir a real finalidade da licença-maternidade, em privilégio de uma interpretação literal de lei, sem considerar a garantia ao bem-estar da gestante e da criança. 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 

BITTAR, Roberto Eduardo Bittar. Condutas para o trabalho de parto prematuro. Rev. Bras. Ginecol. Obstet. vol. 27. Rio de Janeiro. Set. 2005;

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: > http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/ConstituicaoCompilado.htm<. Acesso em: 11 set. 2016;

_____ Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Disponível em: >http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8213cons.htm<. Acesso em: 11 set. 2016; 

_____ Decreto nº 3.048 de 06 de maio de 1999. Aprova o Regulamento da Previdência Social, e dá outras providências. Disponível em: >http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3048.htm<. Acesso em: 11 set. 2016;

CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 19. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2016;

GOES, Hugo de Medeiros. Manual de Direito Previdenciário. 11. Ed. Rio de Janeiro: Ed. Ferreira, 2016; 

KERTZMAN, Ivan. Curso Prático de Direito Previdenciário. 14. ed. rev., ampl. e atual. Bahia: Ed. Juspodivm, 2016;

MENEZES, Adriana de Almeida. Direito Previdenciário. 4. ed. rev. e ampl. Bahia: Editora Juspodivm, 2014; 

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Disponível em:> http://www.paho.org/bra/<. Acesso em: 07 set. 2016;

PORTAL BRASIL. Brasil está entre os dez países com o maior número de partos prematuros. Disponível em:> http://www.brasil.gov.br/saude/2012/05/brasil-esta-entre-os-dez-paises-com-o-maior-numero-de-partos-prematuros-aponta-oms<. Acesso em: 07 set. 2016; 
PREVIDÊNCIA SOCIAL. Instrução Normativa nº 77 de 21 de janeiro de 2015. Disponível em: > http://sislex.previdencia.gov.br/paginas/38/inss-pres/2015/77.htm<. Acesso em: 12 set. 2016;

SANTOS, Marisa Ferreira dos. Direito Previdenciário Esquematizado. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2016 e 

SENADO FEDERAL. Proposta de Emenda Constitucional nº 99. Altera o inciso XVIII do art. 7º da Constituição Federal, para dispor sobre a licença-maternidade em caso de parto prematuro. 
Disponível em: >https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/122324<. Acesso em: 11 set. 2016. 

POR CAROLINE  BOURDOT BACK


















-Advogada inscrita na OAB/SC sob o nº 26.487;
-Especialista em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho pela AMATRA XII e 
-Especialista em Direito de Família e Sucessões pela Anhanguera Educacional/LFG.

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