quinta-feira, 3 de julho de 2025

O Testamento Cerrado


  ©2025 Sergio Luiz Pereira Leite


Em artigo anterior postado em agosto de 2020 https://oblogdowerneck.blogspot.com/2020/08/o-testamento-e-suas-formas-testamento.html teci algumas considerações sobre as formas de testamentos públicos, os especiais e mencionei, ainda que de forma suscinta, o testamento cerrado. Volto agora à baila, com um maior aprofundamento sobre esta forma de testamento.

Sílvio de Salvo Venosa descreve o que vem a ser testamento: O testamento é ato solene. Juntamente com o instituto do casamento, forma um dos atos mais solenes de nosso direito privado. Portando, para que o negócio jurídico valha e ganhe eficácia, há necessidade de que sejam obedecidas as formalidades descritas na Lei, para cada espécie de testamento.

A solenidade existente nas formas, que se exteriorizam perante testemunhas, constitui a garantia extrínseca do ato (VENOSA, 2014, p. 223). As principais características do testamento são: ser ato personalíssimo, feito pelo próprio testador, sem interferência de terceiro, nem mesmo com poderes especiais; constituir negócio jurídico unilateral, uma vez que o testador declara sua vontade para que seja cumprida após sua morte. Com efeito, a sua vontade, pessoalmente manifestada, é suficiente à formação do testamento.

Ou seja, testamento público há de ser definido como sendo um documento legalmente reconhecido, redigido em Cartório de Notas, que permite ao testador dispor de seus bens materiais após o seu falecimento. Não olvidemos que existe também o testamento particular (artigo 1.876 e seguintes do CC), que pode ser escrito de próprio punho ou de forma mecânica, assinado na presença de três testemunhas, que o devem subscrever, que fica em poder do próprio testador ou de suas testemunhas.

Todas as demais formas de testamento são públicas, ou seja, existe a necessidade de que o testador faça as suas disposições de última vontade perante o tabelião, de suas testemunhas e a indicação de testamenteiro, que será a pessoa por ele indicada para apresentar e requerer ao juiz de direito, a abertura do testamento.

O regramento do testamento cerrado, que é uma modalidade de testamento ordinário, está contido no artigo 1.868 e seguintes do Código Civil Brasileiro. E diz o seguinte:
Artigo 1.868 – O testamento escrito pelo testador, ou por outra pessoa, a seu rogo, e aquele assinado, será válido se aprovado pelo tabelião ou seu substituto legal, observadas as seguintes formalidades:

I - que o testador o entregue ao tabelião em presença de duas testemunhas;

II - que o testador declare que aquele é o seu testamento e quer que seja aprovado;

III - que o tabelião lavre, desde logo, o auto de aprovação, na presença de duas testemunhas, e o leia, em seguida, ao testador e testemunhas;

IV - que o auto de aprovação seja assinado pelo tabelião, pelas testemunhas e pelo testador.

Parágrafo Único – O testamento cerrado pode ser escrito mecanicamente, desde que seu subscritor numere e autentique, com sua assinatura, todas as páginas.
O testamento cerrado do Código Civil atual traz três inovações em cotejo com a legislação anterior: fez diminuir o número de testemunhas, de cinco para duas; impede ou exclui a possibilidade de ser efetuado por quem não sabe assinar e admitiu a possibilidade de ser escrito mecanicamente, desde que o testador numere e autentique, com sua assinatura, todas as páginas e, portanto, abre a possibilidade de ser feito por pessoa surda-muda, contanto que o escreva todo, o assine de sua mão e que, ao entregá-lo ao oficial público, perante suas testemunhas, escreva, na face externa do papel ou do envoltório, que aquele é o seu testamento, cuja aprovação lhe pede (artigo 1.873 do CC).

No caso de pessoa capaz, após ser redigido o testador o apresenta ao tabelião, na presença das duas testemunhas, declarando o seu testamento. O tabelião, na presença do testador e suas testemunhas, lavra, no próprio instrumento do testamento, em seguida à última palavra, auto de aprovação.

Mas o que é o auto de aprovação? Sua definição está no artigo 1.869 do nosso diploma substantivo civil, dizendo que o auto de aprovação é lavrado no próprio instrumento de testamento em seguida à última palavra nele contida. E é por meio desse auto de aprovação que o tabelião (ou seu substituto legal), sob sua fé, informa que o testador lhe entregou aquele testamento para ser aprovado na presença das testemunhas.

Perguntarão alguns, qual é a vantagem desse tipo de testamento? Diria eu ser, prima facie, a forma secreta com que ele se faz, inibindo situações vexatórias de eventuais parentes preteridos. Mas também vislumbro alguma possível desvantagem, consistente em ser um instrumento secreto e, por isso mesmo e se não for localizado, pode surgir a problemática da aplicação das regras de sucessão legal, também chamada por muitos de sucessão legítima.

Também pode ocorrer o rompimento do lacre, que poderá ser considerado como a revogação do testamento pelo testador, a teor do que explicita o artigo 1.972 do Código Civil, ao dizer:
 Artigo 1.972 – O testamento cerrado que o testador abrir ou dilacerar, ou for aberto ou dilacerado com o seu consentimento, haver-se-á como revogado.
Destarte, como em regra um testamento só pode ser revogado por outro testamento válido, esse artigo faz uma exceção à essa regra, especificamente no caso de um testamento cerrado, que pode ser revogado nas situações acima esplanadas.

O testamento cerrado não pode ser realizado por incapaz, por pessoa analfabeta e aí se incluiria o surdo-mudo analfabeto. Os cegos não podem fazer o testamento cerrado, conforme proibição contida no artigo 1.867 do Código Civil.

Depois de aprovado e cerrado o testamento, o tabelião lançará, no seu livro, nota do lugar, dia, mês e ano em que o testamento foi aprovado, fará o seu registro (sem especificar o seu teor) e o entregará ao testador.

Para descobrir se existe um testamento, seja ele cerrado ou público, é necessário solicitar uma certidão específica na Central Notarial de Serviços Eletrônicos Compartilhados (CENSEC) ou diretamente em um cartório de notas. Essa certidão informa se há registro de testamento, escritura de renúncia ou repúdio de herança ou legado em nome da pessoa falecida. No caso do testamento cerrado, o sigilo é mantido até a morte do testador, sendo necessária uma ação judicial para sua abertura e conhecimento do seu conteúdo.

Após a abertura, o juiz verificará se há vícios que o tornem nulo ou suspeito de falsidade antes de determinar seu cumprimento. Cumpre ainda dizer que, se ficar comprovado cabalmente que algum dos herdeiros destruiu o testamento cerrado, terá ele praticado indignidade e será afastado da sucessão, o que se fará por meio de ação própria, a teor do que dizem os artigos 1.814 e 1.815 da lei substantiva civil, direito esse que se extingue depois de 4 anos, contados da abertura da sucessão.

Estas, em rápida e singela síntese, o que podemos exteriorizar a respeito do testamento cerrado, evidentemente sem exaurir o tema, visto a existência das múltiplas facetas específicas, sempre destacando a cautela ao testador de se consultar e se fazer acompanhar por um advogado militante na área do Direito das Sucessões.

Fontes de consulta

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 7: direito das sucessões / Carlos Roberto Gonçalves. – 11. ed. – São Paulo: Saraiva, 2017 BRASIL;

DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. 2. ed. Revista dos Tribunais, 2014;

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito Das Sucessões. 28ª ed. Saraiva, 2014. v.6;

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil. São Paulo: RHJ, 2014;

GOMES, Orlando. Sucessões. 13. ed. rev., atual. e aum. de acordo com o Código Civil de 2002. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 115;



http://www.academia.edu/25859801/Testamento_Cerrado_repensando_ refletido_e_redemocratizado_na_Era_Digital

Vade mecum. 24ª Ed. Saraiva, 2017.

SERGIO LUIZ PEREIRA LEITE















-Advogado graduado pela Faculdades de Ciências Jurídicas e Administrativas de Itapetininga (03/76) e

-Militante há mais de 45 anos nas áreas cível e criminal na Comarca de Tietê, Estado de São Paulo.

Nota do Editor:

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