segunda-feira, 13 de julho de 2020

Quem tem mãe tem avó!


Autora: Clarissa Lago

A psicanálise com Lacan trouxe um legado bastante interessante; em uma das suas teorias, o autor ao reler Freud, acrescenta e desenvolve a questão do pai e sua função. 

A questão do pai para a psicanálise Lacaniana é fantástica, uma vez que para existir a função paterna, não se faz necessário ter o pai encarnado. Com isso em momento algum o autor extingue a necessidade de um pai - o representante da Lei, das normas, dos valores, dos limites, do super ego - mas, ao afirmar que o pai é uma função, nos ensina, afirma e exemplifica ao dizer que o pai é uma metáfora. 

O pai como metáfora não precisa estar encarnado na figura do genitor, mas sim em um discurso onde se faça presente essa Lei. E com isso a clínica psicanalítica dá saltos, até porque saímos já há muito tempo do modelo "família margarina comercial de TV" para uma família da realidade, onde se comporta muitas formas, enumerados valores, diversos modelos desde que existe amor e as figuras parentais possam estar estabelecidas e comportar as suas devidas funções. 

Pois bem, se para Lacan o pai é uma metáfora, o mesmo não pode se dizer da mãe. A mãe???? Ah...a mãe é uma metonímia!!!! Ora, ora, a extensão do seu corpo está em um outro ser, unidos inicialmente e talvez para sempre pelo cordão umbilical, talvez esse seja o corte mais difícil e complexo de se fazer na relação mãe -bebê. 

Mas calma, ...o corte se faz, precisa se fazer presente. Quem enuncia o pai é a  mãe, assim via o discurso da própria mãe, a função paterna entra nessa relação, estabelecendo um corte nessa simbiose mãe - bebê que aos poucos vai dando espaço para o surgimento do sujeito. 

Sempre acrescentava a seguinte premissa: Quem tem mãe, tem pai & quem não tem mãe...não tem ninguém! Nos dias atuais, acrescento mais outra: Quem tem mãe ...tem uma avó para seu filho! 

A verdade dos fatos é que tive uma mãezona! Claro que devo ter pago caro em análise, para essa mãezona um dia poder cair....e hoje saber que a mãe um dia falada em análise não é a mãe da realidade, hoje, uma senhora linda e mega simpática no auge nos seus 78 anos, mas sim...aquela mãe do simbólico que durante anos perpassou a minha vida. 

Pois bem, tive uma mãe tão forte e comprometida com a maternidade, que por diversas vezes no divã dizia: Não tenho a menor condição de ser mãe. Não quero ser mãe. Não posso ser mãe. - Enfim: eram tantos "Nãos" em análise, que não precisava nem ser um bambam da psicanálise para poder entender esses "Nãos" a nível do inconsciente. Basta ler Freud (1925) no texto A Negação para saber que em psicanálise se contraria o Evangelho segundo Mateus quando ele nos diz: "Que o teu sim seja sim, que o teu não seja não" (Evangelho de S.Mateus - Cap.5, vers.37). 

E foram anos e anos de análise até esse texto Freudiano de 1925 pudesse ser lido de forma mais suave. A mãe foi caindo aos poucos e lentamente...não só no simbólico como também no princípio da realidade...

De repente a mãe super poderosa precisava de cuidados, certa atenção, uma escuta mais acolhedora, palavras mais suaves, abraços mais apertados, o que nessa coluna se escreve de "melhor idade", sabemos, é uma forma com eufemismo que nosso editor encontrou para tratar de temas tão delicados que perpassam as várias formas do envelhecer. 

Claro que a velhice proporciona uma maturidade, sapiência, discernimento inegável. Não preciso nem chegar aos meus 80 anos para saber disso. Hoje estou com 41, jamais me comparo há 20 anos atrás no meu início de carreira não só como psicóloga, bem como professora universitária. Penso que o entusiasmo e a curiosidade da juventude, nunca devemos perder, mas com a maturidade somos muito mais cautelosos e advertidos com a vida. 

Há várias formas de envelhecer...você pode ter seus desejos singulares e estilo próprio para viver esse estágio da vida. Mas normalmente, o que se sabe teoricamente e percebemos na vida cotidiana é que envelhecemos como podemos. Erick Erikson já nos disse que na velhice refletimos o jovem que fomos. Acredito nele. 

Observo minha mãe, a quem dedico esse texto, sempre mãezona comprometida e hoje em dia como avó não poderia ser diferente. 

Fato que a mesma sempre diz "nunca pedi um neto" ; ora, ora, ...esse texto é auto explicativo. O que já escrevi para vocês em parágrafos anteriores? O que significa a negativa em psicanálise? O discurso do inconsciente não é o mesmo dos evangélicos...O discurso inconsciente aponta para um desejo nos restando desvendar. 

Certo é que, assim como minha mams, a repetição nesse caso seria quase que da ordem do impossível (entre risos e gargalhadas escrevo isso) fui ser mãe já madura, adulta, analisada, profissional realizada -embora sempre desejando mais e mais, ora: sou sujeito desejante! Mas, com isso, não estou dizendo que não tive ou não tenho minhas angústias com a gestação e a maternidade; ao contrário!!! Tenho sim!!! E por saber a teoria talvez por isso a postergação ao máximo da maternidade para poder viver esse momento em uma fase da minha vida que de fato pudesse estar de discurso, corpo e alma. 

Ao meu lado...eu tenho a melhor avó que meu filho pode ter. Mesmo com seus 78 anos, penso que há um rejuvenescer nessa dia a dia entre avó - e - neto. 

Mesmo com todas as dores de um corpo cansado, é a coisa mais linda de ver, aquela senhora fofinha carregando com tanto carinho, amor, gosto e ternura seu neto. Um neto para chamar de seu! 

Eles brincam juntos. A gargalhada espontânea e inocente de um completa a gargalhada do outro, o balbucio de um completa a sonoridade das palavras do outro, o segurar no terço de um completa as orações proclamadas do outro. Assim, avó e neto vão se completando, um descobrindo a vida e outro redescobrindo o sentido da vida ressignificando as coisas, revivendo aventuras, escrevendo novas h(y)stórias. 

E quando escrevo que cada um irá viver sua "melhor idade" como pode, pensei nisso a cada dia que observo a relação linda desses dois. Para uma mulher que sempre foi mãe acima de tudo, embora também fosse uma excelente profissional renomada e respeitada em sua área de atuação profissional, é quase certo que a melhor maneira de se viver a melhor idade e da melhor forma possível é sendo avó! 

E sendo avó meeeesmo!!!! ...até porque, hoje em dia a mãe sou eu! ...embora um pouco diferente da mãe que tive! Ora, ora...fiz e continuo apostando na psicanálise !!(Risos!) 

*CLARISSA LAGO

















-Psicanalista;
-Graduada em:
  -Psicologia pela Universidade Salvador (UNIFACS);
 -Pedagogia - Licenciatura Plena e Habilitação em Educação Orientação Educacional & Vocacional pela Universidade Católica do Salvador (UCSAL);
-Mestre em Educação pela Universidade Federal da Bahia (UFBA); e
-Especialista em Psicopedagogia pela Universidade Católica do Salvador (UCSAL);
-Atualmente exerce o ofício de psicanalista e supervisora clinica em psicanálise
Twitter: @LagoClarissa
Facebook: Clarissa Lago Psicanalista
Celular/ WhatsApp: 71 99990-6143
Consultório: 71 3354-9162

Nota do Editor:
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