quarta-feira, 23 de agosto de 2017

A Cobrança Diferenciada por Gênero na Balada


Uma polêmica recentemente surgiu no noticiário brasileiro. A nota técnica nº 02/2017 do Ministério da Justiça[1] concluiu que a diferenciação de preços entre homens e mulheres no setor de lazer e entretenimento é ilegal, constituindo prática abusiva tendente a punir o fornecedor com as sanções estabelecidas no art. 56 do Código de Defesa do Consumidor.

Isto porque a diferenciação de preço exclusivamente no gênero do consumidor contraria a disposição consumerista de igualdade nas contratações, além de criar cláusula discriminatória que coloca alguns consumidores em desvantagem exagerada.

Considerou-se que cobrar um valor menor de entrada para as mulheres seria equipará-las a “insumo” da atividade econômica, servindo como isca para atrair clientes do sexo masculino para seu estabelecimento, ferindo a dignidade do público feminino, que podem se sentir constrangidas e depreciadas por serem colocadas como atrativo para os homens.

Além disso, ressaltou-se que o preço desigual viola o princípio da isonomia, visto não existir uma relação lógica entre o elemento distintivo (ser do sexo feminino) e o tratamento desigual aplicado (menor valor de entrada). Defendem que a utilização do gênero pelos estabelecimentos comerciais tem o propósito de desnivelar materialmente o homem e a mulher, o que a Constituição Federal de 1988[2] não permite.

A conduta dos fornecedores de estabelecerem preços diferenciados para homens e mulheres é usual e pode até ser vista como vantagem pelas consumidoras. Contudo, no entendimento do Ministério da Justiça, esta diferenciação tem uma falsa aparência de regularidade e prestigia ainda mais a discriminação entre os sexos. 

Verdade que esse assunto não é pacífico entre os operadores do Direito. A Justiça Federal de São Paulo autorizou, em 01/08/2017, cerca de um mês depois da divulgação da Nota Técnica nº 02/2017 do Ministério da Justiça, que bares e restaurantes daquele estado cobrem preços diferentes para homens e mulheres nos estabelecimentos de lazer e diversão[3].

O juiz Paulo Cezar Duran entendeu que o governo deve intervir minimamente na atividade privada e que a diferenciação de preços pode aumentar a participação das mulheres no meio social. Ele sustentou que ainda existe o infeliz quadro de a mulher receber menos que o homem, e que o preço menor cobrado pelos estabelecimentos possibilita o público feminino frequentar a balada. Asseverou também que enquadrar a mulher como “isca” para que o local seja frequentado por mais homens, leva à ideia de que ela não tem discernimento para escolher onde quer frequentar e que não sabe se defender ou “dizer não” a eventuais situações de assédio de qualquer pessoa que dela se aproximar.

Percebe-se, portanto, que a discussão sobre a legalidade das cobranças diferenciadas está longe de acabar. Contudo, pode-se dizer atualmente que, à exceção do estado de São Paulo, os estabelecimentos situados nos demais estados brasileiros não podem mais cobrar valores diferentes para homens e mulheres. 

Caso se depare com a diferenciação de preços por sexo, o consumidor deve pagar o valor mais barato. Se o estabelecimento mesmo assim recusar a entrada, os órgãos de defesa do consumidor devem ser acionados, para que seja feita uma fiscalização e o estabelecimento autuado, podendo este pagar multa e até ter sua licença de funcionamento cassada.

Referências
[1] Acesso no link http://s.conjur.com.br/dl/nota-tecnica-homem-mulher.pdf ;
[2] Para o Ministério da Justiça, no entanto, não se pode confundir o caso analisado com a legalidade do tratamento excepcional entre homens e mulheres quando este tiver a finalidade de respaldar os valores constitucionalmente protegidos, como a gravidez;
[3] Acesso no link: http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/justica-de-sp-autoriza-cobranca-de-precos-diferentes-para-homens-e-mulheres-nas-baladas.ghtml


POR TÁVIA LORENZO MOTA



















- Graduada pela Faculdade Três Pontas - Grupo UNIS;
-Advogada de ReisMattos Advocacia

Nota do Editor:

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