quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

A Constitucionalidade da Lei das Cotas Raciais


AUTORA: GUIZELA DE JESUS OLIVEIRA(*)

A Constituição Federal Brasileira em seu artigo 206, inciso I e a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) de 1996 em seu artigo 3º, inciso I estabelecem que o ensino seja ministrado respeitando-se o princípio da igualdade de condições para o acesso e permanência na escola. 

Embasados nisto alguns Estados têm aprovado leis com o objetivo de garantir a reserva de percentual em suas universidades públicas aos estudantes com base em critérios de socioeconômicos, de raça e cor. 

Ocorreu que, muito se tem discutido acerca da constitucionalidade de tais leis, tanto, que foi necessário que o STF se pronunciasse acerca. 

A abolição da escravatura no Brasil se deu de forma lenta e gradual e por si só não foi capaz de qualquer melhora na vida dos ex-escravos. O projeto abolicionista não foi seguido de um processo de inserção dos negros na sociedade republicana que, por desigualdade de condições, não conseguiram acessar melhores posições sociais, permanecendo marginalizados.

O projeto abolicionista não trouxe consigo nenhuma política de inserção do negro na sociedade o que fez com que muitos permanecessem nas senzalas em troca de moradia e os outros fosse soltos a própria sorte, formando as conhecidas favelas. 

Assim, ante ao histórico conturbado do período pós abolicionista se fez necessário a criação de políticas afirmativas afim de que, o negro efetivamente tenha igualdade plena com os demais. 

A expressão "ação afirmativa" surgiu no bojo do movimento pelos direitos civis nos Estados Unidos. Naquela oportunidade observou-se que a mera revogação das leis segregacionistas era insuficiente para promover os grupos discriminados. Passou-se, desse modo, a se propugnar por medidas positivas.
No Brasil as prestações positivas tiveram início no século XX quando surgiu o Estado do Bem estar social, aumentaram-se as ações focadas nos setores sociais problemáticos na busca de atendê-los e diminuir efetivamente as desigualdades sociais. 

Desta feita, com o surgimento do estado voltado e preocupado com o bem estar social surgiram as primeiras políticas e prestações afirmativas que visam justamente diminuir as desigualdades socais.

Assim, em 2012 é que o Brasil criou uma medida importante de prestação afirmativa, qual seja, a lei das cotas raciais. 

Tal lei, estabelece que uma camada da população, camada esta mais necessitada de marginalizada, tenha preferência no acesso ao ensino superior. 

Em 30 de agosto de 2012 passou a viger a lei 12.711 que dispõe sobre o ingresso nas universidades federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível médio e dá outras providências. 

A Constituição Federal Brasileira em seu artigo 206, inciso I e a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) de 1996 em seu artigo 3º, inciso I estabelecem que o ensino seja ministrado respeitando-se o princípio da igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, vejamos: 

"Artigo 206, da CF 

O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; ""Artigo 3º, da LDB "Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola "
 O Ministro Marco Aurélio de Mello, aos referir-se acerca do artigo 208, V da constituição de 1988, asseverou que: 
"(...) a cláusula, “segundo a capacidade de cada um"somente pode fazer referência à igualdade plena, considerada a vida pregressa e as oportunidades que a sociedade ofereceu às pessoas. A meritocracia "sem igualdade de pontos de partida” é apenas forma velada de aristocracia. 
Afigura-se evidente que, para o ministro do Supremo Tribunal Federal citado, o mérito não pode ser aferido em uma perspectiva puramente linear, sem observar-se o princípio da igualdade material.

Para possibilitar que a igualdade material entre as pessoas seja levada a efeito, o Estado pode lançar mão seja de políticas de cunho universalista, que abrangem um número indeterminado de indivíduos, mediante ações de natureza estrutural, seja de ações afirmativas, que atingem grupos sociais determinados, de maneira pontual, atribuindo a estes certas vantagens, por um tempo limitado, de modo a permitir-lhes a superação de desigualdades decorrentes de situações históricas particulares.[1] 

A adoção de tais políticas, que levam à superação de uma perspectiva meramente formal do princípio da isonomia, integra o próprio cerne do conceito de democracia.[2]

Segundo dados do IBGE, no Brasil 98% dos afrodescendentes na idade de 18 a 25 anos não tiveram acesso à educação superior. 

Em face da iniquidade do sistema público de educação básica e do difícil acesso de estudantes negros de baixa renda, as cotas representam uma forma, ainda que paliativa, ação afirmativa que aumenta a possibilidade de acesso ao ensino superior. 

É imperioso reconhecer que as políticas públicas de ação afirmativa que possibilitam o acesso às universidades não maculam o princípio constitucional da isonomia, pois, como julgou o STF, são práticas diferenciadas que permitem compensar desigualdades existentes e justificam-se em virtude de discriminações impostas pela sociedade. 

Dados recentes informam que Pretos e Pardos representam 27% das matrículas em curso superior antes das cotas, eram 8%. 

Para que o critério a ser adotado na política afirmativa brasileira não fira o princípio da igualdade, deve passar pelo crivo da proporcionalidade, a partir da análise dos seus subprincípios. 

É importante que as Comissões de Avaliação das Universidades Federais sejam plurais e, contando com representantes de diversos perfis, façam uso de estatísticas e estudos, de forma, a acompanhar os avanços sociais, afim de minimizar os riscos de arbitrariedades e de perpetuação das políticas afirmativas, que só se justificam se tiverem respeitado seu caráter temporário. 

A política de cotas terá cumprido a sua finalidade quando houver melhora efetiva na educação básica de qualidade e o espaço universitário transformar-se em locus não só de formação acadêmica, mas também de formação de lideres que representam a diversidade de grupos sociais e sejam sensíveis aos benefícios para a sociedade advindos do pluralismo de ideias. 

REFERÊNCIAS

[1] ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL 186 DISTRITO FEDERAL, p. 50. 

[2] Idem

*GUIZELA DE JESUS OLIVEIRA















-Formada em Pedagogia pela Universidade Federal do Paraná;
-Formada em Direito pelo Centro Universitário Campos de Andrade;e
-Advogada inscrita na Ordem dos Advogados do Brasil seção Paraná sob o nº 64.516

Nota do Editor:

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Um comentário:

  1. Caríssima, sou um crítico voraz da educação brasileira, penso que virou tema político e onde tem política não haverão soluções reais.

    Abrir as universidades no critério de cotas ao meu singelo entendimento retirou do cidadão a gana e a competição que gera qualidade.

    Nosso gargalo está no ensino básico. Alunos na nona série com dificuldades ímpares 3m matérias de quinta série; este mesmo problema não vai acontecer com o cidadão sem base na Universidade?
    🤔🤔🇧🇷🇧🇷


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