terça-feira, 18 de junho de 2024

A perda de uma chance dá direito à indenização?


 Autora: Maria Rafaela de Castro (*)

Do que se trata a perda de uma chance e existe a possibilidade do direito à indenização?

A perda de uma chance ocorre quando existe a frustração de uma expectativa de alguém que está diante da chance concreta de realizar algo. Em suma, é quando se impede alguém de concretizar uma conquista material que tinha em vista, não fosse a sua ação dolosa ou culposa.

No julgamento do REsp 1.291.247, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino explicou que a teoria foi desenvolvida na França (la perte d'une chance) e tem aplicação quando um evento danoso acarreta para alguém a frustração da chance de obter um proveito determinado ou de evitar uma perda.

E, destaco, que já temos precedentes tímidos na esfera trabalhista, após pesquisas pelos tribunais de nosso país para melhor elucidar o entendimento desta juíza. Portanto, filio-me aos entendimentos esposados pela Justiça Comum, mais familiarizada com a temática.

Há precedentes do STJ que a reparação das chances perdidas tem fundamento nos artigos 186 e 927 do Código Civil de 2002, que estabelecem, respectivamente, uma cláusula geral de responsabilidade civil, utilizando um conceito amplo de dano, e o dever de reparar como consequência da prática de ato ilícito.

Essa possibilidade ocorre também na fase pré contratual, na medida em que mesmo na fase pré-contratual, quando são feitas as tratativas do contrato, embora o empregador seja livre para admitir ou não o empregado, já lhe é exigido um comportamento negocial pautado pela lealdade e pela confiança. Assim, cabe ao empregador se orientar por um dever de conduta, sem criar expectativas falsas ou vazias. Tudo em respeito ao princípio da boa-fé objetiva, inserido no artigo 422 do Código Civil.

Apesar não constar expressamente no nosso ordenamento jurídico, destaca-se que é uma faceta da responsabilidade civil, no qual aquele que causa dano a outra pessoa fica obrigado a reparar os prejuízos decorrentes do seu ato. O fundamento é que, em razão de um ato ilícito e injusto praticado por uma pessoa, alguém pode ficar privado da oportunidade de obter determinada vantagem ou, então, de evitar um prejuízo.

O comportamento contraditório de qualquer das partes é, em verdade, ato ilícito, que pode ensejar tanto indenização de índole moral quanto por perdas e danos, logicamente de acordo com o caso concreto. Assim, encerrar todo o processo seletivo, deixando o sinal verde para a contratação, tendo o trabalhador realizado todos os exames e sendo aprovado, cria uma expectativa de probabilidade de contratação que não pode ser rechaçada simplesmente porque o empregador mudou de ideia. Isso gera consequências.

Julguei, recentemente, um caso de atleta de futebol que deixou de aceitar propostas de outros clubes, pois um clube importante da cidade enviou para ela uma comunicação de minuta de contrato e, depois, disse que não teria mais interesse.

Quando se gera um prejuízo dessa monta mediante a criação de uma forte probabilidade, nasce o direito de indenizar. É assim que se caracteriza a teoria da perda de uma chance.

Então, surge, em via de mão dupla, a confiança, a boa-fé e a transparência nas negociações pré contratuais. Reputo isso como justo e moralmente aceitável em nossa sociedade moderna. Então, vamos amadurecer a jurisprudência!

* MARIA RAFAELA DE CASTRO
















-Graduada em Direito pela Universidade Federal do Ceará(2006);
-Pós -Graduada em Direito do Trabalho pela Faculdade Estácio de Sá (2008);
-Mestrado em Ciências Jurídicas na Universidade do Porto Portugal(2016);
-Doutoranda em Direito na Universidade do Porto/Portugal;
Juíza do Trabalho Substituta da 7a Região; 
-Formadora da Escola de Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará;
-Professora de Cursos de Pós Graduação na Universidade de Fortaleza - Unifor;
-Professora de cursos preparatórios para concursos públicos;
-Professora do curso Gran Cursos online;
-Professora convidada da Escola Judicial do TRT 7a Região; Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho; e
-Palestrante.
- Instagram @juizamariarafaela

Nota do Editor:

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