segunda-feira, 3 de outubro de 2022

Deflação!! Devemos comemorar?


 Autor: Fernando Crevelário

Um assunto que de tempos em tempos sempre recebe um destaque na mídia é a inflação: seja porquê ela está alta ou sob controle, mas dificilmente porquê ela está negativa, como nos últimos meses. 

Até o mês de Junho de 2022, a inflação (aumento dos preços de produtos e serviços) vinha apresentando níveis que variavam entre moderados e elevados, de acordo com o índice IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo - que é um dos mais utilizados no país para medir a inflação). No mês de Março essa taxa chegou a 1,62%, representando um aumento considerável dos níveis de preço para um único mês pesando no dia a dia do brasileiro. Tal aumento foi principalmente resultado da elevação no valor dos alimentos, que teve as quebras de safra como um dos fatores responsáveis. O cenário que vemos na tabela abaixo é muito parecido com os demais meses do primeiro semestre, tendo uma taxa de inflação preocupante sendo alavancada pela alta dos alimentos.



Entretanto, o crescimento do preço dos alimentos não é o único vilão, há outros fatores importantes a se destacar. Por exemplo, as tensões geopolíticas entre Rússia e Ucrânia geraram sanções comerciais e interrupção na produção de alguns bens de consumo (como por exemplo o trigo e óleo de girassol) para os dois lados, que acabaram impactando o mundo todo. É importante destacar também que a elevação no preço do barril de petróleo tem pesado no valor final do combustível ao consumidor. Além disso, a incerteza política devido às eleições fazem com que essa imprevisibilidade pressione os preços.

Um equívoco muito recorrente tratando-se do senso comum é que a inflação é algo ruim. Não é bem assim, pois, em um patamar adequado, a inflação é considerada positiva, pois representa desenvolvimento da economia. Isso mesmo: se a população aos poucos possui meios de aumentar seu consumo, esse aumento na demanda faz com que os preços precisem subir para que os donos de negócios possam expandir suas empresas, gerando empregos e fazendo a economia girar. O nível de inflação considerado “saudável” varia de país para país e acaba divergindo entre especialistas, mas de modo geral é entre 2 e 3% ao ano. O problema é quando a inflação encontra-se desregulada, fazendo com o que os preços aumentem de forma veloz, resultando em uma grave perda de poder de compra da população.

Visando evitar elevadas taxas de inflação, nos últimos anos o Governo utilizou uma política monetária para controle da economia, ou seja, o Banco Central elevou a taxa básica de juros buscando diminuir a quantidade de moeda em circulação. Para ficar mais fácil de entender tal política, imagine um cidadão comum que deixa de fazer um empréstimo por conta de uma taxa de juros elevada. Esse cidadão vai consumir menos por conta de não ter feito o empréstimo, evitando que os preços subam. Essa medida tem a sua eficácia, porém pode causar um enfraquecimento da economia se não for implementada na dosagem correta, ocasionando um desabastecimento da população.

Há, porém, um tipo de inflação que deve ser evitado a todo custo: a estagflação. Neste péssimo cenário, a economia do país encontra-se estagnada (ou até mesmo em recessão) enquanto os preços continuam subindo. Um caso notável foi da Argentina em 2017 quando a inflação registrada foi de 25% enquanto a economia recuou 2%. Um dos principais fatores que pode causar a estagflação é a desvalorização da moeda local (que pode ter sido resultado de uma má gestão pública), fazendo com que os investidores retirem cada vez mais o dinheiro do país (exemplo). Essa fuga de capital causa não apenas o aumento dos preços, como também gera desemprego, a queda no consumo, negócios são fechados e a economia por fim entra em recessão.

Mas e quanto ao momento atual do Brasil, estamos passando por uma estagflação? Felizmente a resposta é não. Isso acontece pois atualmente apresentamos um crescimento tímido, a expectativa do FMI é de que o PIB brasileiro cresça 1,7% neste ano de 2022, pouco abaixo dos 2% previstos pelo Governo Federal. O Brasil, assim como o mundo todo, ainda vem se recuperando dos efeitos da pandemia da Covid-19. As taxas de desemprego e os níveis de pobreza ainda estão longes do ideal, mas o Brasil vem retomando seu desenvolvimento a passos curtos.

Recentemente uma notícia provocou diferentes sentimentos na população. Não bastasse o mês de julho ter apresentado uma taxa de inflação negativa, agosto seguiu no mesmo caminho, de acordo com o IPCA. Essa queda nos níveis de preço recebe o nome de deflação e gerou esperança e otimismo em algumas pessoas, porém um pouco de confusão em outras. Estariam os preços caindo? A dona de casa poderá ir ao mercado e voltar com o carrinho um pouco mais cheio do que no mês anterior?

Antes de responder a pergunta vale relembrar algo mencionado anteriormente: a inflação, se bem controlada, é positiva para um país por impulsionar a movimentação da atividade econômica. A deflação, por outro lado, demonstra que a população não está consumindo, ou seja, os comerciantes estão baixando os preços e eventualmente precisarão cortar gastos para se manter, gerando demissões e trazendo prejuízos para a economia. De tempos em tempos o IPCA apresenta uma taxa mensal negativa, mas nunca por períodos maiores que três meses.

No caso atual do Brasil, essa deflação apresentada nos meses de Julho e Agosto não são resultado de uma queda nos preços dos alimentos. O IPCA leva em conta os preços de diversos tipos de produtos e serviços para compor sua taxa, tais como alimentação, transportes, habitação, vestuário, saúde, cuidados pessoais, educação, entre outros. A deflação dos meses de Julho e Agosto foi resultado principalmente da queda nos preços da categoria transportes, tendo a gasolina e o etanol apresentado quedas tão abruptas que puxaram o índice todo para baixo. Outros itens tiveram queda nos valores, apesar de pouco expressivas, como por exemplo o setor de comunicação, devido a reduções nos preços de telefonia fixa e móvel.

A boa notícia é que a queda nos valores dos combustíveis acaba beneficiando toda a cadeia de produção, tornando os fretes mais baratos. O cenário ideal seria aquele em que preço do diesel (principal combustível dos caminhões) apresentasse uma queda expressiva igual ao da gasolina e do etanol. O fato é que os alimentos, por exemplo, continuam subindo, mesmo não sendo um crescimento tão acentuado quanto nos primeiros meses do ano.

Portanto, se você é inimigo declarado da inflação, sugiro buscar aprender a conviver com ela e torcer para que os cenários nacional e internacional sejam favoráveis e que o governo exerça uma gestão competente para manter seus níveis controlados. Os verdadeiros males, tratando-se desse assunto, são a deflação e a estagflação, sem mencionar o maior pesadelo daqueles que viveram na década de 80 e início da década de 90: a hiperinflação, aquela terrível que faziam os preços aumentar todo dia.

Referências:









* FERNANDO CREVELÁRIO
























Economista graduado pela USP (2019);
Graduando em Contabilidade pela Trevisan

Nota do Editor:

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