quarta-feira, 4 de junho de 2025

Existe relação de consumo entre condomínio e condômino?


 Autor:Vinicius Henrique Almeida Costa(*)
 

Em alguns processos que envolve discussão entre condômino e condomínio, principalmente quando se trata de reparação por danos e cobrança de taxa condominial, alguns advogados têm alegado a existência de relação de consumo entre o condomínio e o condômino para trazer uma eventual responsabilidade objetivo – com dispensa de dolo ou culpa e revisão de dívida. Mas realmente existe relação de consumo nestes casos?

O Código de Defesa do Consumidor é uma importante ferramenta para proteção dos consumidores que de fato se apresentam como a parte vulnerável da relação. Se fez necessária a criação desta legislação para evitar diversos abusos que os fornecedores praticavam e praticam na relação de consumo.

O primeiro passo então é analisar o que o CDC qualifica como consumidor e fornecedor de produtos e serviços:

"Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços."
Já no que tange à definição de condomínio e condômino, temos de recorrer ao Código Civil:

"Art. 1.331. Pode haver, em edificações, partes que são propriedade exclusiva, e partes que são propriedade comum dos condôminos.
Art. 1.332. Institui-se o condomínio edilício por ato entre vivos ou testamento, registrado no Cartório de Registro de Imóveis, devendo constar daquele ato, além do disposto em lei especial: 
I - a discriminação e individualização das unidades de propriedade exclusiva, estremadas uma das outras e das partes comuns;
II - a determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao terreno e partes comuns;
III - o fim a que as unidades se destinam."

Para que haja relação de consumo é necessário haver primeiramente um contrato de consumo entre as partes, tendo de um lado o vendedor, que explora a venda de um bem ou um serviço com finalidade puramente comercial e financeira, e de outro lado um comprador consumidor que adquire o bem com a finalidade de uso próprio.

Não há necessidade de haver entre eles um contrato por escrito, sendo admissível que o contrato se dê de forma verbal (como ocorre quando compramos um alimento, por exemplo), mas há clara necessidade de se ter alguém explorando uma atividade comercial e outro consumindo como destinatário final.

Na relação condominial temos então a área comum do empreendimento, cuja administração compete ao síndico, representante legal do condomínio, e temos as áreas privativas, que pertencem aos condôminos e são por eles administradas.

Esta relação entre condomínio e condômino pode ser compreendida como uma relação de interdependência e reciprocidade. O condomínio, como entidade coletiva e despersonalizada, existe para servir aos interesses comuns dos condôminos, proporcionando-lhes segurança, conforto e valorização patrimonial. Em contrapartida, os condôminos têm a responsabilidade de contribuir financeiramente para a manutenção do condomínio, respeitar suas normas e participar ativamente de sua gestão.

Não há entre condomínio e condômino uma relação contratual ou verbal que impute ao condomínio o fornecimento de produto ou serviço ao condômino como destinatário final. Mais, ainda que se leve a discussão para o campo da área comum, está também é de propriedade do condômino – que inclusive contribui com pagamento de taxa em rateio, o que faz com que a relação se torne ainda mais confusa e totalmente distante do que venha a ser uma relação de consumo.

Ao nosso ver, buscar a aplicação das regras do Código de Defesa do Consumidor em uma situação que envolva condomínio e condômino é totalmente inapropriado do ponto de vista jurídico. Inclusive este é o posicionamento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. CONSUMIDOR. PROCON. FISCALIZAÇÃO. MULTA ADMINISTRATIVA. ABRANGÊNCIA. CONDOMÍNIOS. DÍVIDA SUB-ROGADA. EMPRESA DE COBRANÇA.

1. A dívida cobrada em sub-rogação mantém a mesma natureza da original, para aferição da relação de consumo.

2. Inexistindo caráter consumerista na relação entre condômino e condomínio, tampouco haverá dita natureza na relação entre a empresa de cobrança contratada pelo condomínio e o condômino.

3. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt no REsp n. 1.419.490/PR, relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 20/6/2022, DJe de 24/6/2022.)
Portanto, diante da ausência de relação de consumo, da natureza que envolve a relação condomínio e condômino, da ausência de destinatário final e da existência de rateio de despesas na relação condominial, não há que se falar na aplicação do Código de Defesa do Consumidor nas discussões que envolvam condomínio e condômino.

*VINICIUS HENRIQUE ALMEIDA COSTA













-Advogado graduado pela Universidade FUMEC (2011);

-Pós graduado em Direito de Família e Sucessões (2015);

 -Especialista em Direito Imobiliário, consumidor e condominial e

-Áreas de atuação: Imobiliário, Condominial, Consumidor, Família e Sucessões, Cível e Trabalhista.

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