terça-feira, 16 de junho de 2015

Seleção de Artigos Jurídicos


Amigos, como anunciado na outra postagem de hoje , vamos à postagem da subseção "Seleção de Artigos Jurídicos". Na semana que vem dentro da Seção "Direito" teremos a subseção "Comentários de Noticias e Artigos Jurídicos".

Mas deixando de lado a conversa vamos aos artigos que selecionei para hoje: 

As indicações presidenciais de Ministros para o STF contribuem para a sua politização?

Laís Simão
Acadêmica em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais
Postado em 15/06/2015 - 10:21 em Jus Navegandi (http://jus.com.br/

Com a posse de Fachin, o STF será composto por oito ministros indicados por um mesmo partido. Questiona-se a politização do Supremo e a influência do Presidente da República nas decisões judiciais.

A politização da Supremo Tribunal Federal - STF é um assunto levantado com frequência no decorrer da última década. Questionam-se a viabilidade democrática das indicações presidenciais para a composição de ministros do STF e a possível influência que o Presidente da República pode ter em decisões polêmicas cabíveis à corte.

Inspirado no modelo norte americano, a Constituição da República de 1988, em seu artigo 101, dispõe que o Supremo Tribunal Federal será composto por onze Ministros, escolhidos dentre cidadão com mais de trinta e cinco anos e menos de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada. No parágrafo único, do mesmo artigo, está determinado que os Ministros serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal.

Alguns segmentos entendem que a controvérsia se inicia no termo “nomear”. André Luiz Melo defende que o dispositivo alude apenas à função do Presidente de “nomear” após a aprovação do Senado Federal, estabelecendo uma lacuna constitucional em relação a quem seria responsável pela indicação. Obviamente não seria necessária nenhuma modificação do texto constitucional, apenas a criação de uma Lei que regulamentasse tal processo seria a solução para o suposto problema. 

Muito há que questionar a conveniência do Presidente da República nas indicações dos Ministros que compõe o Supremo Tribunal Federal. O modelo sustentado por Mariana Prado e Cláudia Türner analisa o padrão dos últimos Presidentes da República em tentar manter sua influência nas decisões públicas a partir de maiores números de indicações para o STF e, nesses nomes, a prevalência na escolha de pessoas cada vez mais jovens[1].

A hipótese de influência torna-se mais perceptível quando se nota a importância das posições dos Ministros em julgamentos conflitantes e polêmicos. A decisão do STF que permitiu o aborto de anencéfalos[2] exemplifica com clareza a situação. O Presidente da República que se elegeu em um partido conservador e, persiste com essas características em seu governo, pode não concordar com essa decisão e a maneira de promover a sintonia entre o entendimento dogmático do seu partido e a aplicação do direito pelo STF é a seleção das indicações dos Ministros que irão compor a casa.

Em resposta a teoria de Prado e Türner, Diego Werneck Arguelhes e Leandro Molhano Ribro indicam as limitações de suas análises. Os autores acreditam que existem de fato a influência interna nas indicações presidenciais, contudo, elas não são tão efetivas assim[3].

As decisões proferidas pelo STF são colegiadas, de modo que o entendimento de um único Ministro não irá interferir de maneira direta na aplicação do Direito e na uniformização das decisões constitucionais. Dessa forma, segundo eles, o Presidente da República não possui uma influência direta nas decisões e não contribui de maneira extremamente efetiva para a sua politização.

Contudo, os autores deixaram de analisar um importante aspecto na história política nacional. O PT encontra-se no governo Federal por treze anos e, atualmente, dos dez Ministros que compõem a casa, três foram indicados pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e quatro pela presidente Dilma Roussef. Pode-se concluir, portanto, que sete Ministros, dos dez, foram indicados pelo Partido dos Trabalhadores.

Insta salientar que no dia 16 de junho de 2015, haverá a posse de Edson Fachin como ministro do STF, também indicado pela atual presidente em virtude da aposentadoria do ex-ministro Joaquim Barbosa. Dessa forma, oito Ministros indicados pelo PT irão compor a casa.

Nesse contexto torna-se questionável a resposta dada por Arguelhes e Ribeiro no que se refere à influência realizada por parte do Presidente da República. Analisar apenas a figura do Presidente limita um entendimento melhor da atual composição do do STF, é necessário, portanto, ter como referência as convicções predominantes do partido que os indicam.

Os autores questionam, também, que independente do sistema colegiado de decisões, após a nomeação do Ministro nenhuma relação de dependência o prende ao Presidente da República mais. Não há controle das Decisões e a exoneração do cargo se dá a partir da sua aposentadoria, quando o Ministro alcança os 65 anos de idade. Um exemplo fático disso é o caso do ex-presidente dos Estados Unidos Dwight Eisenhower, que comenta abertamente que os principais erros que cometeu durante a sua presidência encontram-se na Suprema Corte, referindo-se aos ex-ministros Earl Warren e William Brennan. Dessa forma, não há nenhuma obrigação que prende o Ministro a manter qualquer tipo de vínculo com o presidente que o indicou. 

Além disso, Diego Arguelhes e Leandro Ribeiro ressaltam que o Presidente da República não indica os Ministros com base, apenas, em sua idade – uma vez que, conforme já mencionado, a aposentadoria é a única forma que o Ministro se desliga do cargo e quanto mais novo for maior tempo permanecerá nesse - e orientação política. No caso de presidencialismo por coalizão, como ocorre no Brasil, o Presidente tem uma responsabilidade indireta de agradar o partido da sua base e o da oposição. Essa prática foi denominada como barganha.

Outra prática recorrente na agência presidencial é a sinalização. Com ela o Presidente indica para o cargo de Ministro pessoas que se identificam com parcelas da sociedade que se sentem pouco representadas. Foi o caso da indicação do ex-Ministro Joaquim Barbosa pelo ex- Presidente “Lula” como primeiro negro a compor a casa. Percebe-se, assim, que a sinalização é uma forma de aumentar a popularidade do Presidente da República e, como consequência direta disso, contribuir para que consiga mais votos.

A barganha e a sinalização indicam que o interesse do Presidente da República vai além da politização do STF, uma vez que o que predomina nesses casos são fatores diversos da convicção e posição políticas dos agentes.

Deve ser ressaltada a importância do Senado no controle da politização do Supremo Tribunal Federal. Na história da República brasileira o Senado apenas rejeitou uma indicação de Ministro para o STF, o abolicionista Cândido Barata Ribeiro, indicado pelo ex-Presidente Floriano Peixoto, rejeitado em virtude das suas convicções políticas em 1893.

Acredita-se que há uma grande relação entre a politização e a rapidez em que ocorre as Sabatinas no Brasil. A mais recente sabatina ocorreu em 12 de maio de 2015, com duração de aproximadamente 12 horas o jurista Luiz Edson Fachin foi aprovado pelo Senado como o novo Ministro do STF. O processo que se baseia em respostas a determinados questionamentos dos Senadores foi exaustivo, e diversos senadores pediram seu encerramento[1].

Contudo, nos Estados Unidos, embora as regras sejam semelhantes às do Brasil, o processo se dá de modo diverso. A título de exemplo, a primeira Ministra mulher e latina Sônia Sotomayor passou por quatro dias de Sabatina, teve que conversar pessoalmente com 89 senadores, além de todos os membros da Comissão de Justiça[1]. Dessa forma, muitos criticam que a politização do STF apenas acontece em virtude da inércia do Senado em não escolher com calma e de modo mais rigoroso os futuros Ministros do Tribunal Superior.

A Constituição alemã influenciou todos os países da Europa e, alguns da África, no que se refere ao processo de seleção dos Ministros que irão compor o Tribunal Constitucional Alemão, Bundesverfassungsgerich. Diferente do Brasil, as indicações dos “Juízes Constitucionais”, semelhante aos Ministros do STF, são feitas pelo legislativo. É necessário que haja a aprovação por 2/3 da casa e, principal, há um limite de mandato. Os Juízes Constitucionais possuem um mandato fixo de 12 anos, não passível de reeleição. O quórum elevado de aprovação, aliado com a limitação do mandato, contribui para que não ocorra a politização do Tribunal Constitucional Alemão.

Conforme endossado pelo Ministro Luís Roberto Barroso[2], a pouca politização e o pouco ativismo judicial da Bundesverfassungsgerich contribuíram para a transição democrática na Alemanha pós guerra, sendo, portanto, um símbolo bem sucedido da ruptura do passado.

Dessa forma, a politização do Supremo Tribunal Federal é um assunto em voga e merece ser trabalhado pelos demais juristas no intuito de conter sua ocorrência. Numa sociedade tão plural quanto a brasileira a homogeneização de pensamentos e convicções da Suprema Corte pode acarretar extemos prejuízos na tutela dos direitos fundamentais. Portanto, quanto mais diversificado o entendimento dos Ministros do STF, mais legitimas e justas serão suas decisões.

[1] COUTINHO, Filipe; HAIDAR, Rodrigo. EUA e Brasil tem mesmas regras mas jogos diferentes. Conjur. jul/2009.

[2] BARROSO, Luís Roberto. Supremo Tribunal Brasileiro, Suprema Corte Americana e Tribunal Constitucional Alemão: algumas notas sobre as distinções existentes. Disponível em: http://www.luisrobertobarroso.com.br/wp-content/uploads/2011/08/STF-Suprema-Corte-Corte-Constitucional_Merval.pdf (Data de acesso: 14/06/2015) 

[1] “Quando a sessão atingiu oito horas de duração, o senador Omar Aziz (PSD-AM) arrancou risos dos presentes ao criticar a duração da sabatina. "Não acho humano uma pessoa passar dez horas e meia sentado. Nem na época da escola, quando a gente ficava de castigo", afirmou. Ele reclamou que as questões formuladas ao jurista se repetiam. Disse ainda que nunca havia visto uma inquirição durar tanto tempo no Senado. “E ele nem é réu”, afirmou Aziz, para risos de parlamentares e de Fachin.” – SALOMÃO, Lucas; RAMALHO, Renan. CCJ do Senado aprova por 20 votos a 7 indicação do Luiz Fachin para o STF. G1. mai/2015. 
Notas

[1] PRADO, Mariana; TÜRNER, Cláudia. A democracia e seu impacto nas nomeações das agências reguladoras e ministros do STF. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 250, p.28, jan./abr. 2010.

[2] Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 54

[3] ARGUELHES, Diego Werneck; RIBEIRO, Leandro Molhano. Indicações presidenciais para o Supremo Tribunal Federal e seus fins políticos: uma resposta a Mariana Prado e Cláudia Türner. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 255, 2010.



Desídia no desempenho das respectivas funções

Advogado Sérgio Nascimento

Sérgio Nascimento

Advogado regularmente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil - OAB Seccional Goiás. • Especializando em Direito e Justiça do Trabalho pela AMATRA18/FASAM. • Advogado em Sérgio Nascimento Advocacia • Advogado Associado em Maria Tereza Caetano Advogados Associados • Membro da Comissão da Advocacia Jovem (CAJ) - OAB/GO • Membro do Instituto Goiano de Direito do Trabalho - IGT. • Membro da Comissão de Direito do Trabalho - OAB/GO.

Postado no dia 15.06.2015 em jusbrasil.com.br


Desdia no desempenho das respectivas funes


O artigo 482 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) trata das hipóteses que constituem motivos para justa causa da rescisão do contrato de trabalho pelo empregador e especialmente em sua alínea e trata da “desídia no desempenho das respectivas funções”, mas o que vem a ser desídia?

Segundo Maurício Godinho Delgado:

"Desídia no desempenho das respectivas funções. Trata-se de tipo jurídico que remete à ideia de trabalhador negligente, relapso, culposamente improdutivo. A desídia é a desatenção reiterada, o desinteresse contínuo, o desleixo contumaz com as obrigações contratuais.

Para autorizar a resolução culposa do contrato, exige, assim, regra geral, a evidenciação de um comportamento repetido e habitual do trabalhador uma vez que as manifestações de negligência tendem a não ser tão graves, caso isoladamente consideradas.

Neste caso, a conduta desidiosa deve merecer exercício pedagógico do poder disciplinar pelo empregador, com gradação de penalidades, em busca da adequada ressocialização do obreiro.

Mostrando-se ineficaz essa tentativa de recuperação, a última falta implicará na resolução culposa do contrato de trabalho". (Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: Ltr, 2002, p. 1171/1172)”.

Desta forma, em simples palavras, pode-se dizer que o "trabalhador desidioso" é aquele que durante seu contrato de trabalho pratica atos repetitivos que venham a causar prejuízo, com desrespeito/descumprimento de suas obrigações junto a empresa de maneira diligente, conforme as orientações previamente estabelecidas pelo empregador.

São repetitivas "faltas" do empregado junto à empresa. Exemplos comuns de desídia que podem ser citados são: atrasos rotineiros, produção malfeita, faltas injustificadas, estes dentre outros.

Um ponto importante a ser destacado quanto às faltas injustificadas, são os já conhecidos "atestados de comparecimento" apresentados reiteradamente pelo empregado, em que fica claro um horário específico de atendimento médico, mas o empregado se ausenta durante todo o seu dia (horário) de trabalho.

Este tipo de falta ao se tornar reiterada e injustificada, poderá ser considerada desídia do empregado (falta de atenção, de zelo, desleixo, incúria, negligência).

Face ao princípio da imediaticidade a empresa deve aplicar no momento da prática desidiosa a penalidade ao empregado, sob o risco de se não a fizer de imediato, vir a configurar o “perdão tácito”, que é a renúncia do empregador em punir o empregado que comete a falta, ora presumida em face do decurso de lapso temporal entre a falta cometida e a punição ao mesmo.

Nestes casos a empresa deve aplicar de modo gradual as penalidades (obedecidos os requisitos da imediaticidade, proporcionalidade e singularidade da punição), pois deve ter o caráter pedagógico, ou seja, de “recuperar” o empregado a não mais agir de forma desidiosa no exercício de suas funções.

Deste modo, aplicará primeiro advertências, posteriormente suspensões, para somente então aplicar a pena máxima, que é a justa causa, prevista no artigo 482, e, da Consolidação das Leis do Trabalho.

Para o trabalhador desidioso esta "demissão por justa causa" face a desídia no desempenho das respectivas funções, traz sérias consequências na hora de receber "seus direitos" (verbas rescisórias) dentre as quais:

- não tem o direito de receber 13º salário;

- não tem o direito de receber férias proporcionais;

- não poderá levantar o Fundo de Garantia.

Apenas tem o direito de receber o saldo de salário (incluindo horas extras, adicional noturno ou qualquer outro adicional que acompanha o salário) e férias vencidas, se houver.

Enfim, a desídia é um dos motivos da rescisão do contrato de trabalho por justa causa e percebendo o empregador a sua ocorrência no ambiente do trabalho deve de imediato aplicar as penalidades ao empregado de forma gradual, como ensinamento pedagógico, sob o risco de que se não houver aplicação imediata da penalidade ao empregado gere o perdão tácito, mas havendo a aplicação imediata e gradual (advertências, depois suspensões) sem resultados de melhoras do empregado no exercício de suas funções, poderá então culminar com a demissão por justa causa, que restringirá ao empregado o recebimento de algumas verbas no momento da rescisão contratual.

ADVOCACIA EM ALERTA. STF AFASTA EXIGÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO PARA BIOGRAFIAS

Cassiano Freitas
José Cassiano Freitas - Macapá- AP
Formado em Direito, com especialização em Processo Civil e Mestrado em Direito Constitucional. Procurador de Estado

Postado em http://ideiasefatostucujus.blogspot.com.br/ no dia 12.06.2015

O cerne da Decisão do Supremo Tribunal Federal – STF diz respeito à declaração de inconstitucionalidade dos artigos 20 e 21 do Código Civil, que limitavam o direito de expressão. O art. 21 do Código Civil esclarece que “a vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma”. Comentando o art. 21 do Código Civil, o ex-Ministro do STF, Cezar Peluso, no Código Civil Comentado, 4. Ed. Barueri, Manole, 2010, p. 42 e 43, esclarece que o “Corolário de regra constitucional (art. 5º, X, da CF/88), é vedada a intromissão de estranhos na vida privada. Trata-se de obrigação de não fazer decorrente da lei e cujo descumprimento pode ser coibido mediante provimento jurisprudencial de natureza cominatória”. E isso, no entender do STF, colide com o direito à liberdade de expressão previsto na Constituição Federal. Em assim sendo, os artigos 20 e 21 do Código Civil são inconstitucionais.

Segundo informou o Jornal Nacional de 10 de maio de 2015, “A ministra relatora, Cármen Lúcia, votou pela liberação das biografias não autorizadas. Afirmou que os dois artigos do Código Civil usados como argumento de defesa da necessidade de autorização prévia para publicação afrontam a Constituição. A ministra disse que a Constituição garante, de forma clara, a liberdade de expressão. E que se houver difamação ou calúnia, isso tem que ser tratado na Justiça, com indenizações. A ministra criticou a censura prévia, que priva o leitor de acesso a informação”.

O direito à igualdade e o direito à liberdade encontram-se previstos em todas as declarações de direitos espalhadas pelo mundo, sendo assegurados a todos os cidadãos, sem exceção, nos termos da lei. A Magna Carta Libertatum, emanada do Rei João Sem Terra, em 1215, no entanto, foi a primeira que trouxe expressamente esses direitos. Segundo Gustavo Henrique Schneider Nunes, no artigo intitulado “O direito à liberdade de expressão e o direito à imagem”, publicado na internet, no site Jus Navigandi, “A Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia, datada de 12 de janeiro de 1776, influenciada pelos escritos de Hobbes, Locke, Rousseau e Montesquieu, foi a primeira declaração de direitos fundamentais, em sentido moderno.

Ela consubstanciava, dentre outros direitos, que todos os homens são por natureza igualmente livres e independentes. Segundo ainda colhemos do artigo acima referido, “Pouco tempo depois, em 17 de setembro de 1787, a Constituição dos Estados Unidos da América foi aprovada pela Convenção de Filadélfia, sendo que em 1791 foram inseridas as dez primeiras Emendas, assegurando-se, dentre outros direitos fundamentais: a liberdade de religião e culto, de palavra, de imprensa, de reunião pacífica e direito de petição (Emenda 1ª), e a proibição da escravatura e servidão involuntária (Emenda 13ª)”.

Por sua vez, em 1789, a França brindou o mundo com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que diferentemente das declarações norte-americanas, apesar de também ter sido influenciada pelos ideais contratualistas, não estava preocupada com a situação concreta que afligia a comunidade local. Ao contrário, era abstrata e universalizante, eis que marcada pelo intelectualismo, mundialismo e individualismo. Por essa razão é considerada o documento marcante do Estado Liberal, que norteou várias Constituições que lhe sucederam mundo afora, tendo, inclusive, influenciado a Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948.

Traço comum de todas as declarações de direitos mencionadas é o entendimento de que o homem deixou de ser confundido com o Estado, tornando-se um sujeito de direitos, inclusive em relação ao próprio Estado. Segundo ainda Gustavo Henrique Schneider Nunes, “... durante o desenvolvimento do processo histórico a liberdade passou a ser contemplada como direito fundamental do homem, baseando-se em dois aspectos: a ausência de constrangimento e a autonomia (ou autogoverno). Esses dois aspectos tratam-se da liberdade negativa e da liberdade positiva”. Segundo ele, “a liberdade negativa impõe ao Estado a obrigação de não praticar atos capazes de interferir em determinada esfera individual. Aqui o ser humano age de acordo com seu livre-arbítrio".

A Constituição brasileira, no seu art. 5º, inciso IV afirma que “é livre a manifestação de pensamento, vedado o anonimato”. Acrescenta ainda o inciso IX do art. 5º da Constituição Federal que “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.” Ressalte-se ainda que segundo a DECLARAÇÃO DE PRINCÍPIOS SOBRE LIBERDADE DE EXPRESSÃO da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, aprovada no seu 108º período ordinário de sessões, celebrado de 16 a 27 de outubro de 2000, “A liberdade de expressão, em todas as suas formas e manifestações, é um direito fundamental e inalienável, inerente a todas as pessoas. É, ademais, um requisito indispensável para a própria existência de uma sociedade democrática”. Como se vê, a liberdade de expressão é um direito fundamental. Por outro lado, não podemos perder de vista que o inciso X do mesmo artigo 5º. da Constituição Federal assegura o direito a inviolabilidade da intimidade, quando diz que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. Sobre a Decisão do STF, confiram a notícia encontrada no site da Corte Suprema: 

“Por unanimidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal julgou procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4815 e declarou inexigível a autorização prévia para a publicação de biografias. Seguindo o voto da relatora, ministra Cármen Lúcia, a decisão dá interpretação conforme a Constituição da República aos artigos 20 e 21 do Código Civil, em consonância com os direitos fundamentais à liberdade de expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença de pessoa biografada, relativamente a obras biográficas literárias ou audiovisuais (ou de seus familiares, em caso de pessoas falecidas).


Na ADI 4815, a Associação Nacional dos Editores de Livros (ANEL) sustentava que os artigos 20 e 21 do Código Civil conteriam regras incompatíveis com a liberdade de expressão e de informação. O tema foi objeto de audiência pública convocada pela relatora em novembro de 2013, com a participação de 17 expositores.

Confira, abaixo, os principais pontos dos votos proferidos.

Relatora

A ministra Cármen Lúcia destacou que a Constituição prevê, nos casos de violação da privacidade, da intimidade, da honra e da imagem, a reparação indenizatória, e proíbe “toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística”. Assim, uma regra infraconstitucional (o Código Civil) não pode abolir o direito de expressão e criação de obras literárias. “Não é proibindo, recolhendo obras ou impedindo sua circulação, calando-se a palavra e amordaçando a história que se consegue cumprir a Constituição”, afirmou. “A norma infraconstitucional não pode amesquinhar preceitos constitucionais, impondo restrições ao exercício de liberdades”.

Ministro Luís Roberto Barroso

O ministro destacou que o caso envolve uma tensão entre a liberdade de expressão e o direito à informação, de um lado, e os direitos da personalidade (privacidade, imagem e honra), do outro – e, no caso, o Código Civil ponderou essa tensão em desfavor da liberdade de expressão, que tem posição preferencial dentro do sistema constitucional. Essa posição decorre tanto do texto constitucional como pelo histórico brasileiro de censura a jornais, revistas e obras artísticas, que perdurou até a última ditadura militar. Barroso ressaltou, porém, que os direitos do biografado não ficarão desprotegidos: qualquer sanção pelo uso abusivo da liberdade de expressão deverá dar preferência aos mecanismos de reparação a posteriori, como a retificação, o direito de resposta, a indenização e até mesmo, em último caso, a responsabilização penal. (Leia a íntegra do voto do ministro Luís Roberto Barroso.)

Ministra Rosa Weber

A ministra Rosa Weber manifestou seu entendimento de que controlar as biografias implica tentar controlar ou apagar a história, e a autorização prévia constitui uma forma de censura, incompatível com o estado democrático de direito. “A biografia é sempre uma versão, e sobre uma vida pode haver várias versões”, afirmou, citando depoimento da audiência pública sobre o tema.

Ministro Luiz Fux

O ministro destacou que a notoriedade do biografado é adquirida pela comunhão de sentimentos públicos de admiração e enaltecimento do trabalho, constituindo um fato histórico que revela a importância de informar e ser informado. Em seu entendimento, são poucas as pessoas biografadas, e, na medida em que cresce a notoriedade, reduz-se a esfera da privacidade da pessoa. No caso das biografias, é necessária uma proteção intensa à liberdade de informação, como direito fundamental.

Ministro Dias Toffoli

Para o ministro, obrigar uma pessoa a obter previamente autorização para lançar uma obra pode levar à obstrução de estudo e análise de História. “A Corte está afastando a ideia de censura, que, no Estado Democrático de Direito, é inaceitável”, afirmou. O ministro ponderou, no entanto, que a decisão tomada no julgamento não autoriza o pleno uso da imagem das pessoas de maneira absoluta por quem quer que seja. “Há a possibilidade, sim, de intervenção judicial no que diz respeito aos abusos, às inverdades manifestas, aos prejuízos que ocorram a uma dada pessoa”, assinalou.

Ministro Gilmar Mendes

Segundo o ministro, fazer com que a publicação de biografia dependa de prévia autorização traz sério dano para a liberdade de comunicação. Ele destacou também a necessidade de se assentar, caso o biografado entenda que seus direitos foram violados publicação de obra não autorizadas, a reparação poderá ser efetivada de outras formas além da indenização, tais como a publicação de ressalva ou nova edição com correção.

Ministro Marco Aurélio

O ministro destacou que há, nas gerações atuais, interesse na preservação da memória do país. “E biografia, em última análise, quer dizer memória”, assinalou. “Biografia, independentemente de autorização, é memória do país. É algo que direciona a busca de dias melhores nessa sofrida República”, afirmou. Por fim, o ministro salientou que, havendo conflito entre o interesse individual e o coletivo, deve-se dar primazia ao segundo.

Ministro Celso de Mello

O decano do STF afirmou que a garantia fundamental da liberdade de expressão é um direito contramajoritário, ou seja, o fato de uma ideia ser considerada errada por particulares ou pelas autoridades públicas não é argumento bastante para que sua veiculação seja condicionada à prévia autorização. O ministro assinalou que a Constituição Federal veda qualquer censura de natureza política, ideológica ou artística. Mas ressaltou que a incitação ao ódio público contra qualquer pessoa, grupo social ou confessional não está protegida pela cláusula constitucional que assegura a liberdade de expressão. “Não devemos retroceder nesse processo de conquista das liberdades democráticas. O peso da censura, ninguém o suporta”, afirmou o ministro.

Ministro Ricardo Lewandowski

O presidente do STF afirmou que o Tribunal vive um momento histórico ao reafirmar a tese de que não é possível que haja censura ou se exija autorização prévia para a produção e publicação de biografias. O ministro observou que a regra estabelecida com o julgamento é de que a censura prévia está afastada, com plena liberdade de expressão artística, científica, histórica e literária, desde que não se ofendam os direitos constitucionais dos biografados”.

Não é possível perdermos de vista ainda que a noção de liberdade é demasiadamente ampla, em razão disso, deve ser entendida como um ideal a ser seguido pelos legisladores e operadores do Direito. E é por ser o direito à liberdade extremamente amplo, não consistindo tão somente no direito de ir e vir, amparado por habeas corpus, que o cidadão também tem direito à liberdade de expressão, de culto, credo ou religião, de profissão, de desenvolver atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença, dentre outros. Para Pedro Frederico Caldas, no seu livro vida privada, liberdade de imprensa e dano moral, São Paulo: Saraiva, 1997, p. 64, “Ser livre comporta dimensão física (poder ir, vir, ficar, fazer, não fazer) e dimensão moral, ou liberdade psicológica (de pensamento, de crença, de expressão oral ou verbal)”.

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