quarta-feira, 3 de abril de 2019

Das Retenções de Empréstimos bancários em Conta Corrente e o Fim da Súmula 603 do STJ


Autor: Felipe Oliveira de Jesus(*)

Saudações meus caros consumidores, 

Em maio do ano passado publiquei um artigo intitulado 
“Retenção Salarial para Pagamento de Empréstimo e a Súmula 603 do STJ", ocorre que em 22 de agosto de 2018 a súmula 603 do STJ foi cancelada por decisão proferida no Recurso Especial nº 1555722/SP, contudo, embora tenham se passado aproximadamente 8 meses que isso ocorreu não tratamos do assunto desde então, sendo de suma importância conversarmos a respeito desta mudança na jurisprudência a fim de alertar aqueles que não tenham conhecimento sobre o fato. 

Pois bem, a súmula nº 603 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), não durou muito tempo, pois nasceu em fevereiro/2018 e faleceu em agosto/2018, tratando de um tema muito corriqueiro que é a retenção também conhecido como desconto em conta bancária destinado ao pagamento de empréstimo contratado com instituição financeira, a referida súmula possuía o seguinte enunciado: 
"Súmula 603 - É vedado ao banco mutuante reter, em qualquer extensão, os salários, vencimentos e/ou proventos de correntista para adimplir o mútuo (comum) contraído, ainda que haja cláusula contratual autorizativa, excluído o empréstimo garantido por margem salarial consignável, com desconto em folha de pagamento, que possui regramento legal específico e admite a retenção de percentual." (Súmula 603, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/02/2018, DJe 26/02/2018) 
Contudo, ao invés de trazer segurança jurídica a súmula foi interpretada de várias formas e durante a sua vigência boa parte dos tribunais entenderam em prol dos consumidores no sentido de que a instituição financeira não poderia realizar desconto em conta bancária, seja ela conta salário ou conta corrente, mesmo que no contrato de empréstimo houvesse cláusula contratual que autorize a sua retenção.

A única exceção para realizar os descontos seria a hipótese de empréstimo consignado que segue um regramento próprio autorizando a retenção em percentual de até 30% dos vencimentos diretamente da folha de pagamento do correntista, os demais descontos de empréstimos na conta do consumidor não seriam considerados lícitos quando provenientes de salários, vencimentos e/ou proventos do correntista era o que muitos entendiam pela leitura da súmula 603 do STJ. 

Entretanto, no acórdão proferido no julgamento do REsp nº 1555722/SP, a interpretação da súmula 603 do STJ se mostrou diferente daquela que vinha sendo adotada pelos diversos Tribunais no país até mesmo pelo próprio STJ por alguns de seus Ministros, cito aqui o Ministro Lázaro Guimarães, que julgou monocraticamente o REsp nº 1555722/SP, com base no entendimento a favor do consumidor, mas posteriormente o julgado foi revisto em análise do agravo interno pelo Banco, onde se entendeu que a súmula desejou proibir a situação que, "existindo o débito, ainda que o correntista autorize, o Banco possa fazer o cálculo do que é devido e, sem autorização judicial, invada o patrimônio bancário do consumidor e satisfaça o seu crédito, o que é bem diferente de contratar um mútuo e permitir o desconto autorizado das prestações contratadas". 

A diferença que se percebeu na interpretação e aplicação da súmula 603 do STJ e que não havia diferenciação entre conta salário e conta corrente, além de não ficar claro se o desconto foi autorizado pelo consumidor e quais encargos estariam sendo cobrados sem falar que o consumidor também poderia como mencionado no acórdão usar da prerrogativa do artigo 3º da Resolução nº 3.695/2009 do Conselho Monetário Nacional para cessar o desconto, senão vejamos: 
"Art. 3º É vedada às instituições financeiras a realização de débitos em contas de depósitos e em contas de pagamento sem prévia autorização do cliente. (Redação dada pela Resolução nº 4.480, de 25/4/2016.) 
§ 1º A autorização referida no caput deve ser fornecida por escrito ou por meio eletrônico, com estipulação de prazo de validade, que poderá ser indeterminado, admitida a sua previsão no próprio instrumento contratual de abertura da conta de depósitos. 
§ 2º O cancelamento da autorização referida no caput deve surtir efeito a partir da data definida pelo cliente ou, na sua falta, a partir da data do recebimento pela instituição financeira do pedido pertinente. "
Desse modo, os descontos realizados com a finalidade de amortização de dívida autorizado pelo consumidor constitui exercício regular do direito da instituição financeira não se constituindo um ato ilícito que obrigue a instituição a devolver valores e a indenizar o consumidor por danos morais, como decidido pela Segunda Seção do STJ no REsp nº 1555722/SP, situação em que uma consumidora teve os valores retidos em sua conta corrente de verbas decorrentes de rescisão de contrato de trabalho para o pagamento de parcela de empréstimo por ela autorizado, negando a restituição dos valores e a reparação por danos morais a consumidora. 

Em síntese, pela dificuldade de interpretação do enunciado foi cancelada a súmula 603 do STJ, no julgamento do REsp nº 1555722/SP, conforme artigo 125, §§ 2º e 3º, do regimento interno do tribunal. Assim, o consumidor deve ficar atento se autorizou ou não a retenção para pagar o empréstimo e caso tenha autorizado e assim não queira deve solicitar o cancelamento, uma vez que se consolidou o entendimento de que "é lícito o desconto em conta corrente bancária comum, ainda que usada para recebimento de salário, das prestações de contrato de empréstimo bancário livremente pactuado, sem que o correntista, posteriormente, tenha revogado a ordem". 

*FELIPE OLIVEIRA DE JESUS














Advogado inscrito na OAB/SP sob nº 330.434;
-Atua principalmente nas áreas do Direito do Consumidor, Cível e Trabalhista e
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