sábado, 6 de abril de 2019

Educação: Uma tristeza! Verifica-se que tudo é de uma lentidão irritante


Autor: Nelson Valente(*)

"O ensino médio está no fundo do poço", diz ex-ministro da Educação Rossieli Soares avalia os desastrosos resultados dos alunos das escolas públicas, divulgados pelo MEC. É o atual secretário de Educação do Estado de São Paulo. 

O Brasil dá mais ênfase ao topo, o ensino superior, do que à base, o ensino fundamental. O resultado é outra manifestação de instabilidade: a qualidade do ensino superior vem sendo puxada para baixo por causa da má qualidade do ensino médio; e este também vem perdendo qualidade por causa da piora no ensino fundamental. 

Outra insensatez é a incompetência para enfrentar o drama do magistério. Os professores são malformados e pessimamente remunerados. 

Como pretender, assim, uma educação de qualidade? Os cursos de formação de professores padecem de um abissal anacronismo. Colocar um computador na mão de quem não sabe manejá-lo significa muito pouco. Pensando bem: desde que essas máquinas terríveis entraram no cotidiano das escolas, qual foi o aperfeiçoamento dos conteúdos? 

A educação brasileira precisa ser urgentemente repensada, no bojo de uma grande reforma social. Mas enquanto as questões mais simples não forem devidamente resolvidas pela "burocracia governamental" parece que continuamos na firme disposição de enfrentar os grandes problemas educacionais através do discurso bonito, inflamado, sem consistência. É por isso que a educação brasileira continua a ser um triste pesadelo. 

Estamos vivendo tempos sombrios em matéria de qualidade do ensino, em nosso país, especialmente se considerarmos a educação pública. Os resultados são catastróficos. Houve queda no desempenho em matemática. Na redação foi pior ainda. Vamos caminhando para o fundo do poço. Ou seja, são estudantes que concluíram o ensino médio, sabe-se lá Deus como, mas padecem dos males do analfabetismo funcional. São incapazes de raciocínios elementares. O que se pode esperar dessa geração? 

Como se vê, há problemas em todas as frentes. A educação básica cresceu em números, é certo, mas não corresponde às expectativas no que tange qualidade. Enquanto se discute o sexo dos anjos, os resultados concretos estão aí, diante de todos, mostrando que há um longo caminho a ser percorrido. 

O curioso é que pouco se fala na formação e no aperfeiçoamento dos professores, em todo esse processo. Temos quase 3 milhões deles, no Brasil inteiro, mas é sabido que a qualidade do que se ministra nos cursos de magistério deixa muita a desejar. Temos que melhorar os cursos de preparação dos professores, na dupla condição de conteúdos mais adequados e uma presente interatividade, palavra que pode enriquecer, e muito, o que se passa hoje em sala de aula. Para acabar com essa vergonha, só uma ampla reforma. 

Toda vez que se aborda um plano de governo, em que nível, surge a expressão qualidade do ensino. Uma tristeza! Verifica-se que tudo é de uma lentidão irritante. 

Como professor universitário, estou absolutamente convencido de que a origem de todos os males da educação brasileira, sua crises, insuficiências, distorções e injustiças, localiza-se no Ensino Fundamental, já chamado em outros tempos de primário e ginasial ou primeiro grau. 

É lamentável o estado do Ensino Fundamental neste País. Ademais, os professores não recebem formação adequada para enfrentar os novos desafios de uma educação que se transforma a todo instante por força da heterogeneidade da clientela, não raro sem hadness para a aprendizagem formal; pelas rápidas mudanças tecnológicas; pela impropriedade curricular e pelos descaminhos dos processos didáticos inadequados e, o que é pior, pela desqualificação social e salarial do magistério, submetido à pobreza crescente, tanto do ponto vista econômico quanto do aperfeiçoamento profissional, cada vez mais precário. 

Enquanto isso, o analfabetismo cresce, em vez de decrescer, seja pelos milhões acumulados de seres humanos que nunca pisaram numa sala de aula, seja por outros milhões que deixam a escola sem nada aprender, como é o caso dos analfabetos funcionais, essa nova praga que ameaça comprometer o futuro da nação. Isso significa que a maioria desses jovens chega ao final do curso sem saber ler e escrever ou fazer as quatro operações aritméticas, o que é tão mais grave quanto se sabe que ler, escrever e calcular são os pré-requisitos básicos da vida cultural e da sobrevivência competitiva dos seres humanos. 

É o ovo da serpente gerando um perigoso veneno, em doses que aumentam continuamente e dão origem aos graves problemas que vêm caracterizando as crises até aqui invencíveis, e se instalaram no mercado de trabalho e nos Ensinos Médio e Superior brasileiros. 

É mister investir tudo na qualificação do Ensino Fundamental e na extinção do analfabetismo, tanto puro quanto funcional, para que se salve o futuro do País. 

É preocupante a falta de conhecimento de diversos profissionais de diferentes áreas em relação à Língua Portuguesa. Alegam essas pessoas que a simples troca de um Z por um S não muda o valor de uma petição advocatícia, a receita de um médico ou, ainda, o relatório de um administrador. Puro engano: um texto mal escrito abala a imagem do profissional que o escreve e, sem dúvida, desqualifica o trabalho.

Infelizmente, o descaso com o nosso idioma é notório. Além disso, há o desprezo pelas regras gramaticais e ortográficas, como se houvesse um desejo recôndito de prestigiar a ignorância. Não se quer exagerar os cuidados com a norma culta da língua, mas por que valorizar o linguajar sem regras? 

Devemos ter cuidado com o que se fala e com o que se escreve, pois a nossa imagem está sendo sempre avaliada. A proliferação de "houveram", "menas". “hs” (para responder horas), "mts" (para abreviar metro), o uso da 2ª pessoa para o pronome http://V.Sa . e as constantes derrapadas na concordância verbal, parecem um festival de mau-gosto. Entre as incorreções que destoam no uso da língua, são frequentes pequenos descuidos, até perdoáveis, mas há casos de barbarismo contra a pureza da língua nos aspectos sintáticos, regenciais, ortográficos, sem falarmos de troca tão comum de tratamento, como também de organização ilógica de ideias, o que acarreta, frequentemente, ambiguidades e interpretações errôneas de pensamento. O perigo é a perpetuação desse hábito. 

Nossos estudantes leem pouco, consequentemente quando têm que escrever "a sério" o desastre é inevitável. Crase, vírgula, ponto é vírgula são elementos indispensáveis da língua portuguesa. São muitas regras, é verdade, mas não há como fugir da sua aplicação. Por exemplo: separar o sujeito do verbo com uma vírgula é "pecado capital". 

A compreensão desse fato enseja uma profunda mudança no ensino do Português, sabendo-se, entretanto, que é o povo que faz a língua. 

Pode-se concluir que a leitura liberta e leva a conhecer melhor o mundo, o outro e a si mesmo. A linguagem manifesta a liberdade criadora do homem. 

Vive-se o convencimento generalizado de que lemos muito pouco (o índice é de menos de 2 livros por ano). Nos últimos tempos, surgiu uma estranha doença entre nossos jovens: DE (Déficit de Escrita). 

Se os alunos têm dificuldades de escrever e expor com clareza suas ideias é porque sua cota de informação e leitura é mínima, para não dizer inexistente. 

Quando os jovens são chamados aos concursos públicos, o que, infelizmente, está ocorrendo com frequência cada vez maior, a falta de familiaridade com a norma culta da língua tem levado a resultados desastrosos, como assinalam os famosos Exames de Ordem da OAB. 

As reprovações acontecem em massa (às vezes o índice é de 80%). Lê-se pouco e escreve-se mal, o resultado só pode mesmo ser deprimente. Isso infelizmente alcança também os exames para o magistério. É fácil imaginar o que ocorre quando o indivíduo se expressa verbalmente, em que as agressões ao vernáculo doem em nossos ouvidos. 

Se os alunos têm dificuldades de escrever e expor com clareza suas ideias é porque sua cota de informação e leitura é mínima, para não dizer inexistente. 

Ocorreu-nos proclamar da volta da caligrafia às nossas escolas. Nos bons tempos, ela era praticamente obrigatória, com os educandos levados a preencher as linhas paralelas com letras, sílabas e palavras que, como consequência, nos traziam o conforto de uma adequada expressão escrita. 

Aos poucos, o hábito foi sendo superado e, para muitos, o exercício da caligrafia era a comprovação da obsolescência dos nossos métodos. Nada mais triste do que essa falsa visão de modernidade, hoje agravada pela fúria do acesso aos computadores de qualquer maneira.

O uso das máquinas (blackberry, por exemplo) acelera a resposta, dá uma agilidade aos dedos, mas não facilita o raciocínio, que requer mais tempo para que os neurônios se organizem, de maneira disciplinada e inteligente, nas caixas cranianas. Do jeito que as coisas caminham, e com essa velocidade coloca-se em risco a sobrevivência da nossa língua inculta e bela, como dizia, no começo do século passado, o inesquecível poeta Olavo Bilac. 

Um aluno do interior perguntou-me se deveríamos condenar a linguagem popular, "pois esse pessoal fala de forma inadequada". Foi necessário esclarecer a diferença entre linguagem popular e regionalismos. Primeiro, as expressões, apesar de inovadoras, podem vir a figurar em dicionários e vocabulários de transmissão da norma culta ou padrão, sem nenhuma dificuldade. Os regionalismos são sempre aceitos. 

Em segundo lugar, temos a questão controvertida da chamada popular. O filólogo Antonio Houaiss (in memorian) chegou a popularizar o verbete "mengo", diminutivo do clube mais popular do Brasil. Mas, ele jamais aceitaria adotar a palavra "probrema" ou "areoporto" – e dar-lhes o status de uma expressão legítima do português contemporâneo.

Vê-se, pois, que há uma abissal diferença entre linguagem popular e regionalismos. A prosódia, que é a forma de dizer a palavra, tem total liberdade, não se devendo exigir que um gaúcho fale com a mesma pronúncia do que um paranaense. O que, em virtude do Acordo de Unificação da Língua Portuguesa, que é eminentemente ortográfico, passemos a impor a Portugal ou Angola, por exemplo, o nosso gostoso e incomparável sotaque. Cada povo que cuide das suas peculiaridades prosódicas. Mas escrever de uma forma é medida de inteligência e simplificação, que já vem tarde.

O Museu da Língua Portuguesa, de São Paulo, realizou uma interessante e concorrida mostra, intitulada "Menas – o do certo do errado, o errado do certo", em que todas essas questões foram debatidas por professores e especialistas. É claro que o ex-presidente Lula foi muito lembrado, pois no início do seu primeiro mandato presidencial era comum utilizar a palavra "menas". Foi devidamente aconselhado e abandonou o hábito. 

Os puristas, especialmente os gramáticos, concordam esses equívocos, tipo "ela está drumindo" ou "o incêndio me trouxe perca total". São frutos da linguagem coloquial, que se admite na fala, mas se condena na escrita. 

É lamentável o estado do Ensino Fundamental neste País. É o ovo da serpente gerando um perigoso veneno, em doses que aumentam continuamente e dão origem aos graves problemas que vêm caracterizando as crises até aqui invencíveis, e se instalaram no sistema educacional brasileiro. 

*NELSON VALENTE




















-Professor universitário, jornalista e escritor

Nota do Editor:

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