Prefacialmente, é de bom alvitre destacar a existência de uma relação tradicional e originária que é estabelecida entre paciente e médico, que enquanto profissional liberal, desempenha suas atividades de maneira independente e individual. De outro norte, a descaracterização da relação médico-paciente gera como consequência a prestação de serviços médicos dentro de estabelecimentos hospitalares, os quais fornecem estrutura, equipamentos e materiais adequados, além do constante auxílio de diversos profissionais.
Nesse sentido, imprescindível frisar que o paciente ao ser submetido a tratamento dentro de hospitais, torna-se destinatário de um aglomerado de prestações médicas, podendo ser compreendidas entre diagnósticas, preventivas, hospitalares, cirúrgicas, terapêuticas, estéticas, etc. Não obstante, a atividade médica realizada no paciente não envolve apenas os profissionais médicos, mas também os demais profissionais da saúde, dentre eles os enfermeiros, técnicos de radiologia, técnicos de reabilitação, psicólogos, obstetras, dentistas, e outros que se fizerem necessário para garantir o sucesso do tratamento a que o paciente for submetido.
Ressalta-se que, atualmente, os hospitais estão extremamente modernos e há muito deixaram de ser instituições humanitárias e se transformaram em grandes empresas. Todavia, não podemos excluir os próprios nosocômios beneficentes, que tentam se fortalecer e não medem esforços para manter suas atividades ante a economia extremamente capitalista. Assim, é possível constatar que o desempenho individual e autônomo da atividade médica tornou-se raridade. O ato médico, em outros tempos prestado de forma exclusiva e individual, modificou-se para atividade ou ofício fornecido por hospitais de grande porte, sejam públicos ou privados.
Por conseguinte, diante dessas alterações temporais, a legislação pátria buscou, através do instituto da responsabilidade civil, garantir proteção e resguardo de direitos aos pacientes que são submetidos a algum tipo de intervenção dentro de ambientes hospitalares, bem como proporcionar maior segurança e diminuição de incidentes adversos no que tange ao exercício das atividades médicas, visando a mitigação da ocorrência de eventuais danos para ambas as partes.
Com efeito, no que tange aos danos (materiais, morais ou estéticos), impõe-se delimitar que o hospital pode incidir em responsabilidade contratual, em virtude de contrato de prestação de serviços firmado com o próprio paciente, relativo, sobretudo, à internação e atividades paramédicas ou, responsabilidade extracontratual, que surge das prestações exclusivamente médicas, sobre as quais, em regra, a instituição hospitalar não exerce qualquer interferência.
À vista disso, se o paciente firma pacto contratual diretamente com o hospital, sendo que este mantém liame contratual com o médico, a habitual relação binária (médico-paciente) passa a ser terciária (médico-pessoa jurídica-paciente).
Entretanto, na hipótese de o médico pactuar os serviços diretamente com o paciente, exercer suas atividades com total autonomia e independência, sem vinculação financeira, técnica, hierárquica ou funcional, com relação ao hospital, que se restringe a receber apenas pela fruição das acomodações postas à disposição do médico e do paciente, não haverá responsabilidade solidária do hospital, tampouco de natureza objetiva.
Por oportuno, é sabido que aos profissionais liberais, enfatiza-se neste caso, os profissionais da saúde, aplicam-se as diretrizes da responsabilidade subjetiva, alicerçada na comprovação da culpa no caso de ocorrência de dano ao paciente, recaindo sobre este o ônus da prova, nos termos do artigos 186 e 951 do Código Civil, artigo 14, §4°, do Código de Defesa do Consumidor e artigo 373, inciso I, do Código de Processo Civil.
De outro vértice, salienta-se que a responsabilidade objetiva é caracterizada por uma ação ou omissão, nexo de causalidade entre a ação/omissão que gerou algum dano, prescindindo avaliar se há a ocorrência de culpa ou não do agente causador do dano. A responsabilidade civil dos hospitais é objetiva com relação aos serviços por eles prestados, nos termos do artigo 14, caput, do Código de Defesa do Consumidor.
Isso porque, o contrato firmado entre paciente e hospital induz, por parte do estabelecimento, o dever de organizar de maneira adequada seus serviços, fornecer equipamentos e materiais hígidos, disponibilizar aos enfermos um corpo clínico qualificado e garantir a excelência dos serviços disponibilizados para o tratamento do paciente.
Dessa forma, é incumbência dos hospitais proporcionarem quadro clínico qualificado e suficiente para atender a demanda de pacientes, tendo em vista que tal dever caracteriza obrigação de resultado, pois os hospitais respondem pelos atos culposos de seus prepostos, exceto se o profissional for alheio ao corpo profissional do estabelecimento, cabendo a este o ônus de provar tal fato.
Isso posto, conclui-se que a responsabilidade civil dos hospitais restará caracterizada quando o paciente, ao permanecer sob seus cuidados, sofrer danos oriundos da qualidade dos serviços ali prestados como aqueles decorrentes de defeitos de aparelhagem, produtos, alimentação, ambiente, equívocos ou falhas cometidos por seus prepostos.
POR RÔMULO GUSTAVO DE MORAES OVANDO
- Graduado em Ciências Jurídicas pela Universidade Católica Dom Bosco;
- Pós - Graduado em Direito Médico e Hospitalar pela Escola Paulista de Direito, São Paulo - SP;
- Pós - Graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Faculdade de Direito Damásio de Jesus - Unidade São Paulo - SP;
- Pós - Graduado em Direito Civil e Direito Processual Civil pela Escola Paulista de Direito, São Paulo - SP;
- Advogado, militante principalmente nas áreas do Direito Médico e Hospitalar, Direito Civil e Direito do Trabalho;
- Professor e Palestrante; e
- Sócio Fundador do Escritório Jurídico Ovando & Varrasquim Advogados
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