domingo, 12 de fevereiro de 2023

Mal-estar nas redes sociais


 Autor: Bruno Miranda (*)

Estudos correlacionam o aumento de diagnósticos de depressão e o aumento do uso (e abuso) das redes sociais. Permanecer conectado de forma excessiva às redes sociais gera a falsa sensação de proximidade com as outras pessoas, o que mascara o real sentimento de isolamento relatado pelos usuários. Parece irônico que nos sintamos tão solitários numa época onde a capacidade de fazer contato com qualquer amigo de infância ou reencontrar parentes que há muito tempo não vemos esteja, literalmente, na palma da mão. É que o contato virtual não atinge nossos sentidos da mesma forma que o contato presencial. Bater papo com uma pessoa querida envolve muito mais do que os poucos estímulos sensoriais proporcionados por uma tela. Entretanto, este tipo de comunicação se torna mais prático, e muitas vezes nos damos por satisfeitos com os limites que isso nos impõe. A conveniência de se conectar quase instantaneamente a um amigo que mora longe de você gera uma concorrência desleal contra os custos da socialização “à moda antiga”: Atravessar a cidade para uma entrevista ou reunião com amigos exige mais tempo, algum dinheiro e esforço físico. Além disso, quando chega a hora de encerrar a reunião, é muito mais prático e rápido desligar a tela do que atravessar a cidade, pegar trânsito, arriscar ser assaltado, gastar com combustível, tomar chuva, etc. A proposta parece boa demais para recusar.

Além do isolamento e o contato social distanciado fisicamente, outro ponto importante que pode facilitar o desenvolvimento de transtornos depressivos tem a ver com a constante comparação com o outro que fazemos ao consumir o conteúdo das redes sociais de forma excessiva. Nestas redes, todos parecem perfeitos, com dentes excessivamente brancos, um bom automóvel e uma boa casa para morar, além de fazer muitas viagens e jantares em ótimos restaurantes. É claro que ninguém vai publicar um vídeo de discussão com o marido ou alguma besteira que fez no trabalho, aparentemente ali só há espaço para a perfeição. E quando a gente compra essa ilusão e comparamos a vida dos outros com a nossa, podemos ficar abatidos pois ali vemos somente o show e não vemos o que acontece por detrás do palco. Já em nossas próprias vidas, temos acesso completo, tanto aos momentos bons quanto aos momentos péssimos, e inevitavelmente acreditamos que a vida daquelas pessoas se resume somente ao que é bom e bonito. Precisamos sempre nos lembrar de que no palco não se expõem as dificuldades técnicas, e que aquelas imagens dizem respeito somente a uma pequena parte da vida daquelas pessoas. Inclusive muitas delas podem até estar infelizes pela maior parte do tempo, e utilizam aquele espaço como forma de receberem aprovação dos outros e sentirem-se um pouco melhores com as próprias vidas (estudos indicam maior atividade cerebral no sistema de recompensas do cérebro quando o usuário da rede recebe uma curtida ou comentários em suas publicações, o que pode vir a causar dependência das redes sociais similar a outros tipos de dependência).

Também nas redes sociais a desigualdade social se torna escancarada. A esmagadora maioria da população mundial vive com poucos recursos (quase metade da população mundial vive com menos de 6 dólares por dia), mas nas redes sociais os usuários podem visualizar todo tipo de produto e serviço, especialmente aqueles dos quais nunca poderão usufruir. Essa desigualdade pode gerar no indivíduo o sentimento de que ele possui menor valor na sociedade (o que não é verdade) pois o mesmo possui menor poder de consumo, trazendo também a frustração de sempre desejar e nunca poder ter.

Ao utilizar meios cibernéticos para se comunicar, o ser humano espreme a amplitude de suas percepções e sentimentos para que se enquadre no formato de máquina e seja enviado com um clique. Reduzir nossa forma de comunicação a texto, áudio e video é um movimento em direção a nos tornarmos tão iguais quanto as máquinas que utilizamos para nos comunicarmos (e ao mesmo tempo em que isso acontece, os setores de pesquisa e desenvolvimento das inteligências artificiais buscam tornar as máquinas tão iguais quanto os seres humanos). É ficção científica no mundo real, debaixo dos nossos narizes.

Precisamos limitar nosso consumo diário destas ferramentas da mesma forma como limitamos o consumo diário de certos alimentos ou atividades. Retomar certas práticas e costumes não é ser antiquado, mas prezar pela naturalidade e espontaneidade da condição humana em proveito de nossa saúde mental.

 *BRUNO HENRIQUE MELGAREJO MIRANDA

-Psicólogo clínico de abordagem psicanalítica
Graduação pela FMU (2016);
-Pós graduando em Saúde mental, psicopatologias e assistência psicossocial pela Anhanguera
-Experiência em hospital psiquiátrico
-Atendimento particular online a jovens e adultos.
CRP 06/145555






Nota do Editor:

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4 comentários:

  1. Muito bem colocado. Só nos falta ficar sensível, e tentar mudar...o mais dificil

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    1. Mudar os hábitos é sempre difícil mesmo, mas fazendo um pouquinho por dia a coisa acontece 😌

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