sábado, 5 de julho de 2025

A elite avança com educação enquanto o povo se perde na distração


 


@2025 Marcio Cavalcante 

Um dia desses, li o seguinte texto no meu Facebook (coisa de velho já?): "Enquanto te dizem que 'ler é coisa de otário' e que a faculdade não serve para nada, a elite ESTUDA. Estuda MUITO. E ocupa as melhores universidades PÚBLICAS… Te distraem com dancinhas, apostas, futilidades… enquanto te afastam da única coisa que muda tudo: CONHECIMENTO. Não se engane: educação é poder. E eles sabem disso."

Este texto consolida sua intenção exatamente porque educação é poder. Nas escolas públicas, a falta de livros, laboratórios e atividades extracurriculares contrasta com as instituições particulares, que dispõem de infraestrutura completa e turmas reduzidas.

Como disse Paulo Freire: "Quem não educa para a liberdade educa para a domesticação" (FREIRE, 1970, p. 56). Uma educação precária reproduz a submissão social, enquanto um ensino de qualidade emancipa. No entanto, quando se diz que "ler é coisa de otário", o que está em jogo é a naturalização da ignorância como estilo de vida.

István Mészáros mostra que esse cenário decorre da lógica capitalista de reprodução social. Nas escolas particulares de ponta, o currículo inclui inglês fluente, tecnologia de ponta e preparação para vestibulares. O sistema público, em geral, limita-se ao mínimo previsto pelos Parâmetros Curriculares Nacionais, sem projetos críticos. Para Mészáros, "as estruturas ideológicas da sociedade capitalista transitam pelo sistema educacional, naturalizando a divisão entre dominantes e dominados" (MÉSZÁROS, 1970, p. 89).

Há também a percepção de Pierre Bourdieu ao destacar o capital social: redes de contatos, prestígio e acesso a oportunidades também se concentram nas camadas privilegiadas, ampliando o abismo entre dois universos simbólicos da educação em geral (BOURDIEU, 1986, p. 51).

Esse abismo — fenda, buraco, fosso educacional — reflete-se nas trajetórias dos estudantes: enquanto alunos dessas escolas particulares têm bolsas, olimpíadas de conhecimento e networking, os da rede pública enfrentam deslocamentos longos, falta de material e turmas superlotadas, dificultando o acesso às universidades mais concorridas. Freire insiste que "a educação deve ser um ato de coragem que questione o status quo" (FREIRE, 1970, p. 34); sem recursos para incentivar a criticidade, a escola pública mantém o aluno no mesmo patamar em que nasceu.

Para romper esse ciclo, é urgente investir em bibliotecas equipadas, formação continuada de professores e currículos que incluam pesquisa, debates e intercâmbio cultural. A mudança exige, portanto, reformular o papel da escola, incluindo formação política, cultura digital e ética, para que o aluno não apenas estude, mas compreenda por que e para que estuda. Além de não culpar os jovens por se distraírem.

Não podemos depender apenas de professores abnegados — eles existem, mas são um em um milhão —, enquanto a maioria dos estudantes sequer entende como funciona a tecnologia que os mantém “online”. Valorizá-los é essencial, mas precisamos estruturar um sistema em que todos aprendam a navegar e questionar o mundo ao redor — e não apenas admirar "cases de sucesso" isolados.

Referências

BOURDIEU, Pierre. Os Três Estados do Capital: econômico, cultural e social. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1986;

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1970;

MÉSZÁROS, István. Sociologia do Capitalismo. São Paulo: Boitempo, 1970.

MARCIO CAVALCANTE














-Graduação com Licenciatura e Bacharelado em História - 2012 - PUC – SP;

-Graduação em Licenciatura em Geografia EAD – Facuminas – MG – 2020;

-Pós-Graduação em História Indígena e Afro Brasileira – Facuminas - MG – 2020; e

-Professor de História F2 e EM Colégio CB/COC – São Roque – SP.

-  Ramo de pesquisa: Trabalho: Saúde, Higiene e Segurança, suas representações e articulações por parte dos trabalhadores.

Instagram @historia.poiesis

Nota do Editor:


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4 comentários:

  1. Ótima análise, parabéns!

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  2. LETICIA RODRIGUES CAVALCANTE5 de julho de 2025 às 01:24

    Ótima análise, parabéns!

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  3. Texto que elucida o que é a educação atual. Há uma diferença abissal, entre o ensino da escola pública e particular. Ideologias de dominação que geram um senso comum, como : " ler é coisa de otário", se fazem presente nessas falas alienantes se propagando como "verdade". Ler o mundo é também, no mínimo ligar o "desconfiometro", parafraseando Descartes, "ler é existir".

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  4. Parabéns, professor por suas considerações!! Este texto nos mostra claramente uma realidade que poucos conseguem ver e que muitos veêm, mas não enxergam.

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