terça-feira, 26 de março de 2024

Direitos Básicos x Entraves Sociais


 Autora: Cinara Luísa Ventura(*)

A Constituição da República de 1988, também conhecida como Constituição Cidadã, antes de versar acerca dos direitos fundamentais e sociais, estabeleceu em seu artigo 1ª, inciso III, que um dos pilares que convalidam a República Federativa do Brasil como Estado Democrático de Direito é o princípio da dignidade da pessoa humana.

Pois bem, o ser humano apenas pelo fato de existir em sociedade passa a obter deveres a serem cumpridos neste núcleo, e no que tange os direitos, atrela-se consigo o poder-direito de possuir dignidade e esta ser devidamente respeitada por seus semelhantes.

Dessa forma, considerar-se-á como princípio da dignidade da pessoa humana a gama de direitos e deveres elencados à Constituição e atribuídos ao ser humano que compõe o núcleo social.

O jurista Ingo Wolfgang Sarlet conceitua o referido princípio da dignidade da pessoa humana como "qualidade intrínseca e distintiva reconhecida a cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da Comunidade, ocasionado em um complexo de direitos e deveres que asseguram contra todo ato degradante".

Assim, tendo em vista que este princípio norteador do Estado Democrático de Direito visa garantir ao indivíduo condições mínimas para uma vida saudável e digna em sociedade, a Constituição da República de 1988 traz consigo uma gama de direitos de segunda dimensão, também conhecidos como direitos sociais, que agem como prestações positivas que são implementadas pelo Estado à sociedade, visando proporcionar melhores condições de vida.

O artigo 6º, caput, da referida Lei Maior reflete acerca da perspectiva de um Estado Social de Direito, elencando assim como direitos sociais, o direito à educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, transporte, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade, infância e assistência aos desamparados.

Todavia, analisando a execução dos direitos sociais, mais precisamente o direito à moradia e ao trabalho, verificamos a taxa de desemprego considerável que assola o país, bem como pessoas em situação de vulnerabilidade.

Neste espeque, o direito à moradia, embora tenha sido incluído ao artigo 6º, caput, da Constituição através da Emenda Constitucional de n. 26/2000, o próprio artigo 23, inciso IX, da Lei Maior já versava acerca dos entes federados promover programas de construção de moradias e melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico. Ademais, o êxito no tocante ao direito à moradia pode ser visto como resultado satisfatório do direito ao trabalho na vida do indivíduo.

Todavia, far-se-á salutar investigar a execução desses direitos tutelados pela Constituição, para verificar se o princípio fundamental do Estado Democrático de Direito, a saber, a dignidade da pessoa humana vem amparado a sociedade da forma prevista e consolidada pelo texto legal.

Neste espeque, ao estudar o direito ao trabalho através da taxa de desemprego, deparamos com o fato de que embora atualmente essa taxa tenha caído para 8%, não podemos deixar de pontuar a existência de subempregos e desigualdade salarial, que maculam as condições de vida em sociedade atingindo à dignidade da pessoa humana.

No tocante, a desigualdade salarial, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no ano de 2022, houve aumento de 22% sobre a diferença entre remuneração de homens e mulheres, resultando assim no entendimento de que as mulheres recebem 78% do que os homens auferem.

Por outro lado, no presente ano, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, apontou que a população em situação de rua no país ultrapassa 281.472 pessoas, lacerando o direito à moradia.

A título de conhecimento, em 2017, o IBGE constatou que 50 milhões de brasileiros viviam na margem da pobreza, o que está atrelado ao direito à moradia e o direito ao trabalho.

Dessa forma, é salutar que políticas públicas sejam criadas e aplicadas para reverter esta problemática, qual seja, os enfrentamentos da população preta brasileira no tocante a conquista integral do direito à moradia e emprego.

A título de exemplificação, em Belo Horizonte/MG, a prefeitura local visa incluir toda a população de rua no CAD Único para que seja possível que estas recebam o Bolsa Família, programa institucionalizado pelo Governo Federal. Não obstante, há programa para implantar a Casa de Passagem, local onde abrigam até 120 pessoas.

Ademais, a prefeitura da referida capital vem ampliando a as alternativas de habitação, no sentido de oferecer moradia com mobília às pessoas em situações de vulnerabilidade, como chuveiro, geladeira, cama e fogão. E por fim, até o final de 2024, a prefeitura pretende disponibilizar R$14,8 milhões, que podem beneficiar até 1.240 famílias, através dos programas "Bolsa Moradia" e "Locação Social".

Contudo, mesmo com o trabalho assíduo da prefeitura de Belo Horizonte/MG através do Censo de 2022, foi possível diagnosticar o aumento da população de rua, em virtude à Pandemia de COVID.

Isto posto, uma vez que restou comprovado que dentre as inúmeras políticas públicas desenvolvidas ainda esta não consegue abranger a população como um todo, far-se-á prudente que outras políticas venham a ser desenvolvidas, não apenas para cuidar da população carente que vivem às ruas, mas também para reduzir o desemprego e dar melhores garantias e condições dignas de labor à população brasileira, como meio de reduzir a desigualdade social.

REFERÊNCIAS

Brasil, A. (s.d.). IBGE: 50 milhões de brasileiros vivem na linha de pobreza. 

Brasil, A. (s.d.). Pesquisador explica estudo do IBGE sobre pobreza. 


CNJ, C. N. (s.d.). Grupo de Trabalho - Reconhecimento de Pessoas .

CNN. (s.d.). Quase 28 milhões de pessoas vivem abaixo da linha da pobreza no Brasil. 

Gomes, D. F. (13 de Fevereiro de 2022). De Quantos Graus Pode Ser Um Giro? Maria Fernanda Salcedo Repolês, Constitucionalismo, Espacialidade, Decolonialidade, Feminismo e Antiracismo. VIDERE, pp. 192-213.

Lenza, P. (2012). Direito Constitucional Esquematizado. São Paulo: Saraiva. Acesso em Julho de 2023, disponível em https://morumbidireito.files.wordpress.com/2015/03/direito-constitucional-esquematizado-16c2ba-ed-pedro-lenza.pdf




* CINARA LUÍSA SOUZA VENTURA























-Bacharel em Direito pela Doctum – Campus, João Monlebade/MG.

-Pós-Graduada em Advocacia Criminal pela Escola Superior de Advocacia (ESA/MG).

-Pós-Graduanda em Mercado Financeiro e de Capitais pela PUC Minas.

-Advogada atuante desde 2019.

-Membra da Comissão de Promoção de Igualdade Racial e Diretos Humanos da OAB/MG Subseção João Monlevade/MG.

-Membra da Comissão de Promoção de Igualdade Racial da OAB/MG Seccional de Minas Gerais.

-Membra da Associação Mulheres em Ação de João Monlevade/MG

Nota do Editor:

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