sábado, 22 de outubro de 2016

O desafio de educar para a cidadania


Recentemente, notamos que é cada vez mais comum encontrarmos nos meios de comunicação notícias sobre manifestações de protestos de alunos que ocupam escolas e controlam a movimentação bloqueando a rotina escolar em todas as suas funções. Ocupando esses espaços, esses estudantes declaram contrariedade a uma série de assuntos como, por exemplo, a reorganização das escolas estaduais de São Paulo em grupos por idade, a Medida Provisória nº 746/2016 que determina a Reforma do Ensino Médio e a PEC 241, apenas para citar alguns.

Observa-se que por um lado há uma motivação desses alunos em desenvolver a autonomia, a independência ideológica e política e em lutar por seus ideais educacionais. No entanto, o outro lado dessa moeda apresenta certa intolerância e resistência haja vista que, de certa forma, impõem suas ideologias impedindo manifestação divergente de outros estudantes que gostariam de manter a rotina do ano letivo. A reposição das aulas perdidas, o preparo para o ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) e o comprometimento do ano letivo são preocupações ressaltadas por jovens estudantes que defendem a manutenção da rotina escolar. 

Aprovo e incentivo a livre manifestação das mais diversas concepções e a convivência pacífica e democrática entre elas, mas noto descompasso entre o discurso e a ação desses jovens que ocupam as escolas em favor de suas reivindicações. Penso que há uma dicotomia entre lutar pela qualidade da educação impedindo que as aulas regulares aconteçam comprometendo o desenvolvimento do ano escolar com prejuízo certo para o aprendizado. Ocupar escolas e trancá-las não seria uma ação arbitrária tanto quanto as ações que estão desaprovando? Criticam o governo por falta de diálogo com a comunidade estudantil para traçar os melhores caminhos para a reforma do ensino médio, por exemplo, mas não mantêm diálogos com seus parceiros estudantes que apoiam o direito a manter as aulas regulares priorizando o estudo e que apresentam outras propostas para a manifestação. Não seria contraditório lutar por melhores condições de infraestrutura na educação e depredar patrimônio da escola ocupada? 

Na angústia de lutar pela democracia, muitas vezes, esses alunos agem de forma antidemocrática quando entram em confronto agredindo verbal ou fisicamente seus semelhantes apenas por terem ideias divergentes. Talvez, resgatar um velho ditado popular que diz: “o direito de um termina onde começa o direito do outro” pudesse ser um caminho para priorizar o respeito e a convivência pacífica inseridos em uma democracia que tem por princípio a diversidade de opiniões.

Há uma tendência em classificar essas ocupações como direito democrático de manifestação. No entanto, quando um grupo de estudantes ocupa a sede da Presidência da República em São Paulo gritando palavras de ordem como: ocupar e resistir e declaram que não sairão do local enquanto a PEC 241 e a Medida Provisória nº 746/2016 não forem revogadas, por mais esforço que eu possa fazer não consigo correlacionar o objetivo, a ação e o resultado pretendidos. Sob meu ponto de vista, embora líderes dos movimentos afirmem o contrário, não há predisposição para o debate. Esses jovens estão investindo suas energias de forma ineficiente e desorganizada. Penso que com o movimento organizado e determinado a estabelecer um diálogo com argumentação bem fundamentada o caminho poderia ser mais tranquilo e com sólidas conquistas.

Evidencia-se um desejo legítimo de mudança por parte desses estudantes que almejam atuar como agentes de transformação de um sistema de ensino pouco atraente para essa faixa etária. O desejo de conquistar o mundo é avariado pelo excesso de energia característico nessa fase da vida. A cabeça fervilhando de ideias e ideais, em certas ocasiões, ofusca o caminho mais fecundo a ser trilhado. O debate pacífico entre alunos com diversas opiniões agrega valor aos propósitos da luta e canaliza essa energia para a obtenção dos resultados ambicionados e contribui, ainda, para a conquista da autonomia de cidadãos conscientes de seu papel na sociedade. 

Engajados com a responsabilidade de incentivar que os jovens se mobilizem protagonizando uma reflexão sobre a educação/escola que querem a partir de uma perspectiva inovadora o Porvir, que é um dos programas do Instituto Inspirare, liderou uma pesquisa denominada “Nossa Escola em (Re)Construção”. Após ouvir cento e trinta e dois mil jovens de 13 a 21 anos de todas as regiões do Brasil que foram estimulados a refletir sobre suas experiências de aprendizagem e a expressar seus desejos em relação à educação, organizaram um relatório detalhado com a tabulação da pesquisa e produziram um vídeo que ilustra o debate promovido com essa iniciativa da equipe Porvir e demais colaboradores. A íntegra do relatório dessa pesquisa pode ser visualizada em: http://s3.amazonaws.com/porvir/wp-content/uploads/2016/10/06150937/RelatorioCompleto_NossaEscolaEmReConstrucao_Final.pdf e o vídeo em: http://porvir.org/nossaescola/. Esse é apenas um exemplo, dentre tantos, de movimento organizado em prol de mudanças substanciais e perenes que produzirão resultados reais para o ingresso desses jovens no mercado de trabalho ávido por profissionais bem preparados.

POR CHRISTIANE PEREIRA











-Formada em Artes Plásticas, Pedagogia e Magistério com especialização em Educação Infantil;
-Arte Educadora e Professora de Educação Infantil e Ensino Fundamental e
-Atuou como Orientadora Pedagógica e Educacional
Twitter: @Chris_PPereira
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4 comentários:

  1. Infelizmente essa visão de que nossos alunos sabem o que querem é uma ilusão de profissionais que amam sua digna função de ensinar. Entendam que sempre digo que educação no Brasil é uma farsa. Nossos alunos não querem nada e os professores( Como categoria) querem metade e assim os políticos induzem e manipulam a ambos nesse jogo sujo eleitoral cheio de promessas vãs.
    Quem quer impor suas ideias e ideais à força são TERRORISTAS. Isso mesmo, TERRORISTAS sem nenhum eufemismo. Nossos alunos, os mesmos que danificam, depredam, rabiscam, rasgam, sujam e quebram as escolas que hoje os vemos fingirem defender, faltam às aulas, faltam com o respeito aos professores, agridem entre tantos outros pontos negativos, só estão extrapolando suas ações por objeto de imposição mental programado por um partido nefasto à nossa democracia, onde deturparam e usurpam do direito à manifestação, tratando-a como instrumento de pressão psicológica e política.
    Isso está sendo um mecanismo usado em toda e qualquer pseudo manifestação. Na verdade, esse é o jogo que o partido das trevas sabe e gosta de jogar, pois assim fomentam suas candidaturas mesmo que em cargos minoritários pois o importante é o poder.
    Agora pergunto:
    Onde estão os pais destes pequenos delinquentes? Devemos responsabiliza-los direto por qualquer dano às escolas e retirar deles e dos pseudos estudantes qualquer regalia ou benefício que estejam usufruindo, pois que paga tudo de tudo neste país,trabalha e produz e não tem tempo para invadir, fingir manifestar atuando como bonecos mambembes...

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    1. Olá Álvaro!
      Sem falsa modéstia, amo minha profissão e faço parte desse grupo de professores, mencionado por você, apaixonados pela função de ensinar. Infelizmente, não há como negar a veracidade dos pontos da educação brasileira elencados por você. No entanto, creio que manter uma posição de esperança, mesmo que utópica, nos ajudaria a continuar na luta por uma educação de qualidade no nosso país. Entendo o seu comentário e percebo sua decepção ao constatar a dura realidade desses fatos, porém, como tudo na vida, sempre há uma escolha. Podemos decidir por interpretar que o copo está meio cheio ou que está meio vazio. Compreendo que é triste enfrentar a situação de muitas salas de aula brasileiras nas quais impera o total descompromisso com o aprendizado e o inaceitável desrespeito ao professor. Apenas para ilustrar esse desrespeito, há alguns dias, assombrada, vi um vídeo na internet que apresentava uma professora escrevendo no quadro e os alunos completamente focados na ação de um colega que... PASME... golpeou a professora com o joelho e foi... PASME NOVAMENTE... apoiado pelos outros que riam e filmavam a cena como se fosse um grande feito. Também me questiono quanto ao posicionamento de alguns educadores que mantém atitudes de descaso às suas funções, o que, em minha opinião, é ainda mais inaceitável dada a importância de ser um exemplo, uma fonte de inspiração para os alunos. Quanto aos pais, podemos ressaltar aqui dois tipos opostos: aqueles totalmente ausentes e indiferentes aos seus filhos e aqueles que os defendem com “unhas e dentes” como foi o caso da mãe que processou a professora porque tirou o celular do aluno totalmente alheio à aula. Felizmente, um juiz, consciente da nossa árdua tarefa de educar, indeferiu o pedido. Obviamente, estamos falando aqui de situações extremas sem a intenção de generalizar qualquer um dos grupos mencionados muito menos encerrar o debate sobre as questões educacionais. O que estamos tentando fazer é provocar reflexões que poderão nos conduzir pelo longo caminho da solução de tantos problemas.

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  2. Christiane,concordo muito com sua análise,é importante e urgente refletir e enfrentar esse grupo de militante partidário que agem com truculência e de forma antidemocrática. Esses jovens não sabem ler nem entender e muito menos respeitar nada e ninguém. Seguem palavras de ordem e são incapacitados para o diálogo,uma juventude perdida que se distancia cada vez mais do mundo civilizado. Pobre Brasil.

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    1. Olá Neide!
      Infelizmente, grande parte dos nossos jovens está sendo privada do incentivo às reflexões acerca do mundo. Muitas vezes o acesso que eles têm às informações é unilateral. Penso que a escola deveria proporcionar momentos em que os alunos fossem expostos à pluralidade de informações e ideologias para que pudessem analisá-las e desenvolver a própria convicção. Dessa forma, garantiríamos aos nossos estudantes ferramentas necessárias para a formação de uma opinião baseada nas próprias conclusões deles.

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