Autora: Mariana Capela Lombardi Moreto(*)
Muito tem sido discutido sobre a produção antecipada (ou autônoma) de provas nos casos em que existente cláusula compromissória, o que, via de regra, sujeitaria as partes à arbitragem. Nos casos em que há urgência, parece não haver muita dúvida de que o recurso ao Judiciário é permitido. Isso porque o próprio artigo 22-A da Lei nº 9.307/1996 (“Lei de Arbitragem”) prevê que, antes de instituída a arbitragem, as partes poderão recorrer ao Poder Judiciário para a concessão de medida cautelar ou de urgência.
A dúvida surge nos casos em que não há urgência, ou seja, nas hipóteses do artigo 381, II e III, do Código de Processo Civil, quando a prova a ser produzida via produção antecipada da prova seja suscetível de viabilizar a autocomposição ou outro meio adequado de solução de conflito, ou quando o prévio conhecimento dos fatos a serem explorados via produção antecipada da prova possa justificar ou evitar o ajuizamento de arbitragem.
Partindo do pressuposto de que o artigo 22-A da Lei de Arbitragem somente permite o ingresso em juízo em casos de urgência, parece evidente que, ausente esse requisito, a produção antecipada da prova, tal qual a disputa principal, deveria se dar via arbitragem. Embora a solução pareça fazer sentido à primeira vista, há que se levar em consideração o tempo dispendido e os custos envolvidos na instauração de qualquer procedimento arbitral.
Com efeito, o início da arbitragem é longo: da apresentação do requerimento de arbitragem à efetiva constituição do tribunal arbitral, há um longo caminho a ser percorrido. Não é raro que essa primeira etapa leve meses. Nesse contexto, o recurso ao Judiciário para a produção antecipada da prova parece fazer muito mais sentido: trata-se de procedimento mais simples, rápido e menos burocrático.
Isso tudo sem falar nos custos para as partes. Numa ação de produção antecipada da prova perante o Judiciário será atribuído à causa mero valor de alçada, já que, em não havendo um pedido principal, não haverá conteúdo econômico direto na causa. As custas, portanto, corresponderão a valor irrisório. Na arbitragem, a situação muda de figura. Por mais que o valor da causa seja baixo, em regra o custo dessa arbitragem preparatória será muito superior ao custo da ação de produção antecipada da prova perante o Judiciário, já que há um patamar mínimo que as câmaras arbitrais cobram para qualquer procedimento.
As dificuldades retratadas acima demandam duas soluções nos casos em que contratada entre as partes cláusula compromissória: ou bem a jurisprudência passa a flexibilizar o requisito da urgência como necessário para a produção antecipada da prova perante o Judiciário; ou bem as câmaras arbitrais passam a ter regramentos específicos para os casos de produção antecipada da prova, adaptando o procedimento "tradicional" para torná-lo mais célere e simples, e ainda menos custoso, tal qual uma arbitragem expedita. E claro que as duas soluções podem coexistir.
Nesse sentido, algumas câmaras arbitrais no Brasil já se movimentaram para prever regramentos específicos para os casos de produção antecipada da prova. É o caso, por exemplo, da Amcham – Câmara Americana de Comércio, da Câmara de Conciliação, Mediação e Arbitragem da Ciesp/Fiesp e do Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil Canadá – CAM/CCBC.
O movimento é positivo e mostra que as câmaras arbitrais não apenas estão atentas à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça como também reconhecem que o procedimento arbitral "tradicional" não é o mais adequado em matéria de produção antecipada de provas. Desse modo, estão criando alternativas para atender o jurisdicionado de maneira mais célere e eficiente.
De todo modo, considerando que nem todas as câmaras possuem disposições nesse sentido e que o Judiciário tende a manter o entendimento do STJ no sentido de que, nos casos em que haja cláusula compromissória e que não esteja presente o requisito da urgência, a produção antecipada de prova deve ser produzida perante a câmara arbitral, para evitar discussões acerca da jurisdição adequada, recomendamos desde logo que a escolha das partes seja expressamente prevista na cláusula compromissória.
A existência de cláusula compromissória que trate do assunto expressamente tende a sedimentar de vez a discussão – que, no nosso entendimento, sequer deveria existir, já que se trata, ao nosso ver, de hipótese de competência concorrente entre o Judiciário e a arbitragem.
*MARIANA CAPELA LOMBARDI MORETO
- Bacharela (2004), Mestra (2008) e Doutora (2012) em Processo Civil pela Universidade de São Paulo;
Advogada atuante nas áreas civil e empresarial e
-Sócia de Cescon Barrieu Advogados
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