quarta-feira, 26 de março de 2025

A Verdade sobre Prazo de Garantia


 Autora: Priscila Araújo Monteiro (*)

O Código de Defesa do Consumidor se tornou popular e bem conhecido pela sociedade consumista, de maneira que a maioria dos clientes já tem conhecimento dos seus direitos quando vão às compras.

No entanto o que muitos não sabem que o direito vai muito mais além do a letra da lei, pois por trás de todo conjunto normativo existem princípios e interpretações que podem aumentar ou diminuir o direito do cidadão.

Hoje falaremos do famoso prazo de garantia, que já foi esquematizado na cabeça do consumidor como 90 dias para bens duráveis, 30 dias para bens perecíveis, e ainda a famosa garantia estendida.

Notem que no artigo 26 do CDC diz que:


Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em:

I - trinta dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos não duráveis;

II - noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis.


No entanto, já se perguntaram a partir de quando inicia a contagem desses prazos de garantia?

Se é a partir do momento que se adquire um produto, ou a partir da entrega do bem?

Se seguirmos a letra a lei podemos observar que o parágrafo 1º do artigo 26 do CDC afirma que a a contagem do prazo de garantia se inicia a partir da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos serviços, mas na prática será que e assim?

De acordo com o entendimento dos Juízes, o prazo para iniciar a contagem da garantia é a partir da constatação do defeito.

Vejamos então uma decisão judicial do Egrégio TJRJ a fim de comprovar tal entendimento:

0172753-23.2021.8.19.0001 – APELAÇÃO

Des(a). HELDA LIMA MEIRELES - Julgamento: 17/04/2023 - SEGUNDA CAMARA DE DIREITO PRIVADO (ANTIGA 3ª CÂMARA CÍVEL)

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. COMPRA DE AUTOMÓVEL COM KIT GÁS. DEFEITO APÓS TRÊS DIAS DA COMPRA. RETIRADA. TROCA RADIADOR. DEFEITO NA DIREÇÃO. 1. Sentença que acolheu a prejudicial de decadência arguida pela ré e extinguiu o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, II, do CPC. 2. Apelo da parte autora em que requer anulação da sentença para que seja afastada a decadência, e determinado o prosseguimento da instrução criminal. 3. Relação de consumo. Incidência das normas do CDC. 4. Decadência não configurada na presente demanda. Art. 26, do CDC. Prazo de 90 (noventa) dias, fornecimento de serviços e produtos duráveis. Prazo que passa a contar do momento em que ficar evidenciado o defeito, no caso de vício oculto. 5. No caso dos autos, a parte autora demonstrou a garantia contratual de três meses, conforme documento de fls. 196. 6. Sendo assim, apesar de a garantia contratual ser um ato de mera liberalidade, esta agrega valor ao bem, vincula o fornecedor e o fabricante. 7. Assim, na presente demanda, o início do prazo legal para reclamar se inicia após o término do prazo contratual, conforme jurisprudência do STJ. Decadência não configurada. SENTENÇA QUE SE ANULA. RECURSO A QUE SE DÁ PROVIMENTO.(Grifos próprios)
Sim Senhores!

A partir do momento que há evidencia de defeito aí sim inicia o prazo de 30 dias para não duráveis e 90 dias para bens duráveis.

A título de exemplo, suponhamos que determinado consumidor efetue a compra de um aparelho celular, e após um ano de uso o produto apresenta defeito que não decorreu de mau uso, neste caso, o prazo de 90 dias, por ser produto durável, inicia após a constatação do defeito.

A maioria dos consumidores acreditam que, após a compra de determinado produto tem-se apenas o prazo de 30 e 90 dias ofertadas pela loja, como garantia do produto, e que, ultrapassados tais prazos, ocorre o término da garantia, ledo engano, tendo em vista que o prazo de garantia se inicia a partir da constatação do defeito, independente se já tenha ultrapassado os prazos de 30 e 90 dias.

Por mais que exista determinação legal, existem as interpretações dadas pelos Tribunais de Justiça que podem mudar o sentido da lei e alterar a aplicação do direito.

Diante de tais informações, será que você consumidor já matou a charada em relação à garantia estendida?

Perceba que a garantia estendida não passa de mero marketing, isso mesmo, apenas um direito que já é garantido por lei ao Consumidor.

Vejamos mais um exemplo: Consumidor entra em loja e adquire aparelho de ar condicionado, e ao concluir a compra o vendedor informa sobre o prazo legal de 90 dias contados da compra do produto, contudo, oferece garantia estendida. Isso pode?

Claro que pode, pois a garantia contratual, popularmente chamada de garantia estendida, tem previsão legal no artigo 50 do CDC, no entanto, o pulo do gato está no prazo da garantia legal.

Permitam-me explicar, a contagem da garantia estendida (contratual), só poderá iniciar após o término da garantia legal, vamos de exemplo mais uma vez:

Após a compra de aparelho de ar condicionado, o consumidor decidiu contratar garantia legal, no entanto, um ano após aquisição do bem, o aparelho apresentou defeito.

Neste caso, o prazo de 90 dias (garantia legal), para reclamar do defeito, se inicia após a constatação defeito, mesmo que já tenha se passado um ano, e a garantia estendida (contratual) se inicia apenas após o término da garantia legal de 90 dias.

Entendem que o entendimento dos Tribunais ampliou o prazo de garantia de produtos?

Pois antes tal prazo era de 30 e 90 dias após a compra, e desde 2012, o prazo de garantia legal só se inicia após a constatação do defeito.

Neste caso, será que a lei fornece limite de tempo para reclamação de constatação de defeitos?

Meus caros é obvio que os Tribunais precisam ser justos nas relações de consumo, neste sentido, a garantia legal não é eterna, vez que sempre será analisada a Vida Útil do bem.

Vida útil é o termo que se dá a durabilidade esperada do produto, assim, será analisado o tempo de uso do bem, se já cumpriu sua vida útil esperada.

Assim, voltando ao nosso exemplo anterior, caso o aparelho de ar condicionado adquirido apresentasse defeito 5 anos após sua compra, seria analisado se esse tempo de uso já caracterizou a vida útil do produto em questão, e caso seja constatado que sim, aí não há mais que se falar em prazo de garantia legal.

A grande questão hoje é que não existem tabelas informando prazo de vida útil dos produtos de forma taxativa, cabendo aos Tribunais analisar cada caso individualmente a fim de avaliar se o produto alcançou ou não seu tempo de utilidade esperado.

*PRISCILA ARAÚJO MONTEIRO



















-Bacharel em Direito pela Universidade Estácio de Sá (2012);

-Graduando em Nutrição pelo Centro Universitário Internacional - Uninter;

-Pós graduada em Direito Tributário pela Legale: (2023);

-Pós graduanda em Direito Imobiliário pela Legale;

-Advogada nas áreas do direito do Consumidor e Previdenciário

Nota do Editor:

Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

2 comentários:

  1. Excelentes esclarecimentos! São muitos aqueles que desconhecem seus direitos e, nesse sentido, esse texto se torna bastante útil.
    Parabéns!

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  2. Olá boa tarde prezado leitor. É necessário manter-se informado ante muitas informações distorcidas fornecidas pelas empresas com intuito de diminuir suas responsabilidades nas relações de consumo. Obrigada por apreciar o artigo.

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