segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

O cheiro do vazio



― Para Ondina ―

Recuso-me lembrar, mas se fecho os olhos as imagens voltam, dançando em minha memória. Elas são várias, inúmeras, sem limite algum. E elas têm vozes, claras. Elas chegam sorrateiras e em tons elevados, soltam palavras grávidas de desalento e de dor.

Todas essas imagens têm vida própria. E de tão vivas, tão reais, a gente pode tocá-las com os dedos, e pegá-las, e mantê-las firmes, presas na mão.

Uma imagem, por exemplo, é a de um sol descendo lentamente além, muito além do fim da praia, e além, muito além do quebradiço fragilizado da maré; é, nitidamente, uma imagem de um sol sendo engolido, assim, lentamente pelo fio de sangue do horizonte.

. Outra é a de uma lua bêbada pelo perfume dos jasmins, das rosas e dos delicados lírios do campo do nosso jardim, Uma lua, doentiamente curiosa, a nos espiar em nossa intimidade sob os lençóis e a tecer juras de um amor desenfreado, sem limites e sem um fim. 

Outra imagem, talvez mais viva ainda que as outras, é a de você como uma criatura de carne e osso, com todos os mecanismos da vida correndo em ordem dentro de você; com toda a sua beleza imensa e pesada como se fosse uma escultura em mármore talhada e transparente como vidros.

E tem essa outra imagem. Essa sim eu me recuso lembrar. Não quero me lembrar! NÃO!...Definitivamente, não!

Eu ficarei de olhos abertos, bem abertos, para assim não ver essa imagem. Essa imagem avassaladora de almas. Essa imagem medonha da sua partida, e da minha partida. Essa imagem medonha da nossa separação. Não quero ver essa imagem de nossas ausências.

Essa imagem do VAZIO, com o seu cheiro de dor e de lágrimas.

POR LUÍS LAGO











-Acriano (por criação); cearense (por paixão); ​paulista (por adoção);
-Psicólogo / Cronista / Fotógrafo (Não necessariamente nessa ordem); e
-Autor dos livros "O Beco" (poesias) Editora e Livraria Teixeira e "São tênues as névoas da vida" Âmbito Editores (ficção desenvolvida no estilo literário denominado "Realismo mágico")

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