terça-feira, 26 de janeiro de 2021

O Processo Administrativo de Nulidade de Registro de Marca e a Segurança Jurídica




Autor: Luciano Almeida de Oliveira(*)


A interpretação da lei não é tarefa simples. Muitos notáveis se dedicaram à hermenêutica, entre os quais destaco o insuperável Carlos Maximiliano, autor da consagrada obra Hermenêutica e Aplicação do Direito, cuja primeira edição data de 1924.

A rotina da vida forense indica que não se pode esperar que o legislador elabore leis perfeitas, de texto claro e cristalino. A perfeição não é deste mundo e a beleza da vida forense está em decifrar a verdadeira intenção por trás do texto legal.

Uma redação que ainda causa alguma confusão é a do artigo 172 da Lei da Propriedade Industrial, Lei 9.279/96, doravante LPI.

Como se sabe o processo administrativo de nulidade de registro de marca é julgado pelo Presidente do Instituto Nacional da Propriedade Industrial e o seu procedimento está previsto na Seção II (Do processo Administrativo de Nulidade) do Capítulo XI (Da Nulidade do Registro).

Eis a transcrição do artigo 172 da LPI.

"Art. 172. O processo de nulidade prosseguirá ainda que extinto o registro."
Mesmo essa redação simples trouxe uma confusão para a vida de advogados e julgadores.

De fato, no nosso escritório tivemos oportunidade de atuar em um processo de administrativo de nulidade de registro de marca, promovido contra uma nossa cliente, por um terceiro cujo pedido de registro de marca fora definitivamente arquivado.

O referido arquivamento ocorreu em razão do não pagamento da concessão do registro por parte desse terceiro e o processo foi corretamente arquivado. Portanto o terceiro não tinha sequer legitimidade para promover o processo administrativo de nulidade.

Nesta altura convém ressaltar que o que se discute no Processo Administrativo de Nulidade é a validade do ato administrativo que concedeu o registro.

Por essa razão é que o legislador decidiu pelo prosseguimento do processo administrativo, ainda que extinto o registro objeto do processo de nulidade, conforme a redação do artigo 172 da Lei de Propriedade Industrial, tudo com vistas à segurança jurídica.

Abro um espaço para destacar um julgamento recente do Superior Tribunal de Justiça - REsp 1.832.148 - onde se decidiu que mesmo a renúncia ao registro de marca no INPI não leva à perda do objeto da Ação Judicial de Nulidade de Registro de Marca. Eis a fundamentação:
De fato, tratando-se de ato administrativo que vigeu e produziu efeitos no mundo jurídico, com presunção de legalidade, a situação em comento enseja a necessária proteção de eventuais direitos e obrigações gerados durante sua vigência. 

Nesse contexto, portanto, é que não comporta acolhida a tese preliminar da recorrente (perda superveniente do objeto da presente ação), uma vez que os efeitos decorrentes da eventual procedência do pedido de nulidade deduzido na inicial não são os mesmos daqueles advindos da renúncia ao registro correspondente. 
Vale destacar, por derradeiro, que o próprio art. 172 da LPI, ao tratar do processo administrativo de nulidade, estabelece que nem mesmo a extinção do registro marcário impede o prosseguimento deste, de modo que destoaria do razoável impedir a tramitação da ação judicial movida com idêntico objetivo.
Voltando ao caso concreto, o citado terceiro, que promoveu o processo administrativo de nulidade de registro de marca contra a nossa cliente, interpretou o artigo 172 da LPI de forma equivocada, o que o levou a pensar que poderia requerer a nulidade estando o "próprio" processo definitivamente arquivado.

Last but not least, a perfeição não é deste mundo! Não se deve procurar pelos mínimos erros em todos os caminhos da vida. A validade do ato administrativo se presume e a sua revisão só pode ocorrer por requerimento de pessoa com legítimo interesse e quando ocorrer afronta à lei, à segurança jurídica e prejuízo de terceiro.

*LUCIANO ALMEIDA DE OLIVEIRA

















-Advogado graduado pela Faculdade de Direito da Universidade Federal de Goiás(1996);
-Atua na área da propriedade intelectual (Marcas, patentes e Direito Autoral);
-Escreve há mais de 15 anos artigos de direito e crônicas para jornais e revistas;

Nota do Editor:

Todos os artigos publicados no O Blog do Werneck são de inteira responsabilidade de seus autores.

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