terça-feira, 2 de agosto de 2022

As audiências por videoconferência: o céu ou o inferno na solução de conflitos?


 Autora: Maria Rafaela de Castro(*)


As videoconferências hoje são uma realidade e foram elas que salvaram muitos jurisdicionais, advogados e juízes em tempos de pandemia. Elas já eram previstas antes disso, mas somente nesses últimos meses "viralizaram" como assunto do momento.

Referidas modalidades de audiências foram “a salvação da lavoura” em tempos de pandemia, com previsão no artigo 236 do CPC, aplicável ao processo do trabalho.

Essas audiências devem ser realizadas em tempo real e, para garantia de todos os presentes, gravadas, e, tiveram importância considerável, principalmente, na área trabalhista, em que foi preciso se reinventar.

Apesar disso, nem todo mundo "curtiu" essa nova forma de fazer audiência e do mundo processual girar. Mas houve certo "engajamento" dos advogados que precisavam movimentar processos e de juízes que queriam julgar.

Com todos nós no isolamento imposto pela Covid-19, as videoconferências foram a salvação da lavoura. E se tornou a prática judicial mais festejada por alguns meses.

Claro que havia muitas reclamações até porque sair da zona do conforto incomoda e mudamos os paradigmas rapidamente. Com o avanço da vacinação da Covid-19 e levando em consideração que a pandemia vem cessando, paulatinamente, permitindo o retorno das audiências presenciais, o mundo jurídico passa a se dividir novamente: queremos voltar ao mundo real das audiências?

Particularmente, como Juíza do Trabalho Substituta, sempre gostei da ideia de videoconferência porque realmente acredito que se promove, através delas, o acesso ao Judiciário no sentido mais amplo.

E explico: as videoconferências permitem que as pessoas que, por exemplo, não tenham condições financeiras para pagar a passagem de ônibus possam fazer sua audiência de sua casa ou do vizinho e, acreditem, isso é comum na esfera trabalhista. Ou também permite que aquelas pessoas que moram no interior do estado possam litigar sem pagar as despesas com deslocamento.

Seria o céu do acesso à justiça? Seria o céu também aos advogados que não precisariam esperar suas audiências nos fóruns e atrasar o seu labor e atendimento nos seus escritórios, principalmente, quando as audiências se atrasam e precisam ficar à disposição por horas e horas nas dependências físicas do fórum?

Seria, na prática, economia de tempo, de despesas como o estacionamento e combustível que subiu assustadoramente. Seria o céu da comodidade de trabalhar, muitas vezes, sem sair de casa? Veja-se a ótica de quem adota a prática do home office como a " queridinha" da modalidade do trabalho da vez.

As audiências surgem como a terra prometida ou o oásis no meio do deserto. Eu, como juíza, tive experiências positivas e gostei de pertencer a esse grupo em que a tecnologia se mostra o céu para otimizar o trabalho e resolver os processos.

Mas....sempre há o outro lado do "like". E eu respeito todos aqueles que pensam o contrário. Existem os profissionais e jurisdicionados que consideram um inferno fazer audiências virtuais. É o problema da conexão, o stress dos erros operacionais do computador, as pessoas que não possuem habilidade tecnológica, os ruídos externos, as roupas inapropriadas que criam embaraço (eu própria já pedi a várias partes para colocarem camisa porque acho que eles pensavam estar na praia rs) etc.

Enfim, ainda aduzem que é precioso ver o juiz olhos nos olhos e que é importante a sensação de presença do juiz e de todo o tribunal e até do colega da parte adversa. Em suma, para estes, a audiência virtual é o inferno na terra.

Compreendo, contudo, que entre o céu e o inferno há muito a ser dito e vivido. Houve, inexoravelmente, um papel final positivo das audiências virtuais nessa época "crazy" da pandemia.

Mas ....e agora que estamos voltando aos poucos à normalidade, o que faremos com nossa forma de fazer audiência? Nesse ponto, o importante é perceber que o objetivo é propiciar o acesso à justiça ao máximo de pessoas pois essa é a função do judiciário de ser a casa aberta para fazer a justiça.

Ao menos, sabemos que é real a perspectiva e resta-nos compreender e aceitar o modelo mais próximo a isso sem perder nossa essência humana, talvez, o maior dilema dos atuais tempos difíceis.









Um comentário:

  1. A Juíza do Trabalho Maria Rafaela de Castro escreve aqui sobre uma realidade contemporânea e dinâmica. Muitos não ousam tocar no assunto da justiça do trabalho, tão tradicionalista, haja vista sua fundação na CLT, rolando através da tecnologia moderna. Dra.Maria Rafaela trata a audiência em videoconferência com muita lucidez demonstrando no seu artigo os prós e as dificuldades do acesso á Justiça na telinha de nossos computadores e até telefones celulares. Parabéns Juíza.

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