quarta-feira, 3 de maio de 2017

Bom senso e dano moral


Cada vez mais as pessoas usam a gratuidade dos Juizados Especiais Cíveis a fim de exigir seus supostos direitos. Qualquer problema, aborrecimento, transtorno já se torna indenizável, acredita o consumidor. E a culpa é de quem?

Ocorre que advogados ambiciosos atendem uma infinidade de clientes/consumidores e os incentivam a processar as empresas por qualquer motivo independente de fundamento jurídico relevante. Para piorar a situação, ainda orientam que, caso o consumidor não obtenha êxito, não há problema, pois o acesso é gratuito. 

Com isso, o consumidor cria uma expectativa de que poderá receber um valor, geralmente decorrente de dano moral, e obter vantagem com isso. Mesmo que o valor do dano seja ínfimo, usa o processo para tentar receber o famoso dano moral, e crê que a via judicial é a mais fácil e vantajosa.

O dano moral é uma ofensa a honra do indivíduo, onde a pessoa se sente ofendida, ferida em sua integridade moral e psíquica, e não simplesmente estressada ou cansada. A avaliação é totalmente subjetiva, sendo que em muitos casos, é difícil saber onde é ultrapassada a linha do “mero aborrecimento” para o “dano moral”. Cada caso deve ser muito bem ponderado em primeiro lugar, pelo advogado, que poderá dar a orientação jurídica acerca do problema enfrentado pelo consumidor.

Diversos transtornos fazem parte do cotidiano, situações desagradáveis acontecem, e podem ser contornadas por vias não judiciais, mas as pessoas já pensam logo em processar. Inúmeros passos podem ser dados antes de ingressar com uma ação judicial sobrecarregando ainda mais o Poder Judiciário e retardando a análise de questões mais relevantes. 

Há casos que parecem inacreditáveis, por exemplo, o garçom esqueceu de levar um refrigerante pedido 1 hora antes. A pessoa terminou o almoço e não veio sua bebida. Tem gente que já quer processar, não pagar a conta, fala alto, briga, ao invés de simplesmente chamar o gerente, ou aceitar a desculpa do garçom, no caso de um esquecimento. Imagina o “dano moral” que a pessoa sofreu por ter almoçado sem tomar o refrigerante que foi apenas esquecido! Mas, incrivelmente, tem gente que faz situações como esta parecerem tão dramáticas e realmente acreditarem que tem direito ao dano moral. 

Desculpem-me, mas há casos que parecem piada. E o pior é que há advogados que aceitam causas deste nível e dão entrada em ações sem fundamento ou com nítidos exageros. Isto faz com que pensemos em outro assunto, a litigância de má fé. Deveria ser mais usada e cobrada para que a seriedade da profissão seja reconhecida e o respeito volte a existir. A má fama dos advogados está cada vez maior, principalmente em questões relacionadas a direito do consumidor e juizados especiais.

O bom advogado deve orientar seu cliente e tentar resolver seus problemas, inicialmente de forma amigável, e por vias administrativas. Em casos que versam sobre erro na conta de empresas de telefonia por exemplo, que acontece frequentemente, o consumidor quer processar sem ao menos ter se dado ao trabalho de reclamar, contestar a conta, ligar pra ouvidoria ou dirigir-se a uma loja física. As vezes o problema pode ser solucionado por um gerente e o cliente ainda obter algum benefício, mas por preguiça e falta de informação, já querem “ir pro Juizado”, sem ter ao menos um protocolo de reclamação.

O gerente de loja física por exemplo, pode ter autonomia para alterar o valor de uma conta telefônica, retirando a cobrança indevida, e conforme o caso, ainda oferecer um mês gratuito ou algum serviço extra a fim de apaziguar o erro. Mas as pessoas já estão desacreditadas, ainda mais quando se trata de empresas de telefonia.

Não estou aqui defendendo as empresas, mas sim, o bom senso dos consumidores, e principalmente dos advogados, para que atuem de forma ética e moral, pensando no cliente como ser humano e não como uma possível fonte de renda. 

Cada vez mais encontramos escritórios que trabalham com quantidade, e não com qualidade. Aceitam qualquer tipo de ação baseada no CDC, e contratam estagiários para “copiar e colar” de forma até agressiva, com erros grotescos quanto a objeto da ação, gênero dos autores, jurisprudências sobre assuntos diversos do tratado na inicial, dentre outros absurdos. 

O dano moral, por mais mitigado que seja, ainda é uma questão polêmica e subjetiva, que deve ser encarada de forma individualizada, sendo analisado caso a caso. O problema jurídico, a violação, pode ser a mesma, mas as consequências geradas podem ser completamente diferentes de uma pessoa para outra. O que pode ser dano moral para um, não necessariamente será para outro, ainda temos que confiar na justiça e no bom senso também de quem julga.

Prezemos pela ética da profissão e o respeito da sociedade, principalmente em questões relativas a consumo. Também somos consumidores e clientes, muitas vezes insatisfeitos e devemos zelar pela melhor resolução do conflito, sempre com sabedoria.

POR LUCIANA WIEGAND OAB/RJ 130.297











-Advogada graduada em 2003 pela Universidade Estácio de Sá -RJ ;

-Autônoma, com escritório na Barra da Tijuca-RJ atende causas de Direito de Família e Consumidor;
Site de seu escritório:https://wradvocacia.wixsite.com/wradvocacia
 e
Contatos pelo WhatsaApp (21) 9 8118-4673

Nota do Editor:

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2 comentários:

  1. Bem, como em toda profissão, existem advogados e adevogados(?)...
    Advogado é uma profissão onde existem advogados ardilosos que seu ganho está acima do ganho do cliente.
    Explico:
    Um cliente procura um advogado com uma causa trabalhista. Este faz cálculos monstruosos, gesticula e aponta adversidades mil, que poderiam serem cobradas da empresa.
    Na audiência você percebe que ele não lhe orientou, não orientou suas testemunhas e tudo o que ele visava era o acordo oferecido, pois você pergunta ele o que é mais vantajoso, ele diz:
    -Olha, se você não aceitar o acordo, você vai demorar anos para receber.
    O que é uma verdade. Mas o advogado não podia antes ter lhe informado dessa possibilidade?
    Ou ter pelo menos estudado o processo e usado estratagemas que culminassem com um ganho real de algum ponto da causa que ele mesmo construiu?
    Parece um desabafo? Não é um desabafo. Foi uma realidade...
    Um detalhe:
    O juiz da causa já havia julgado dezenas de causas da mesma empresa onde nenhum empregado tenha saído com a verdadeira solução...

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  2. Gostei muito do seu artigo , no que concerne a negociação prévia, subjetividade da matéria , abuso do consumidor de se locupletar com a situação e com isso enchendo os tribunais com ações que poderiam ser resolvidas a contento . Tenho certeza que voce Luciana é uma pessoa íntegra e inteligente e não faz parte deste grupo de advogados que por incompetência , ganância e má fé se compactuam com o cliente para ferir o direito em sua essência e assim manchando a classe . Sabe que te admiro e fico feliz em sua colocação . Continue postando assuntos que nos faz pensar na hora de querer exigir direitos sem direito. Valeu doutora . Abraços Nanci

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