quinta-feira, 10 de outubro de 2019

Preocupação com a Democracia!


Autor: Douglas Borges Flores(*)

Peço licença para iniciar este escrito com um pequeno fato que me aconteceu nas eleições do ano de 2018, nas quais fui coordenador de fiscalização junto a uma das zonas eleitorais aqui no Distrito Federal nos dois turnos eleitorais ocorridos, representando uma das coligações. 

Em certo momento da votação de segundo turno, por volta das 15:00 daquele domingo, quase que simultaneamente, surgem dois eleitores, cada qual com quase dois metros de altura e de compleição física forte. Cada um com a camiseta do seu candidato, opositor do outro. Eles distanciavam três ou quatro pessoas entre eles. Fato inusitado foi que as pessoas entre estes dois eleitores decidiram por retornar à fila mais tarde, o que os avizinhou. 

Na minha função de observador do pleito, identificado como representante de uma das coligações, estava como espectador de um barril de pólvora, dado toda a virulência com que se davam os debates do período eleitoral. 

Quando ambos se aproximaram da seção onde votariam, percebi que conversavam amistosamente. Para minha surpresa, quando o primeiro deles se ausentou da área de votação, cumprimentou o outro citado eleitor e, ali, se apresentaram, desejando que em um futuro próximo se encontrassem para mais uma conversa. 

Essa situação me fez entender, caro leitor, que, muito embora haja momentos de tensão e acreditemos que o rumo da disrupção seja inevitável, a democracia alimenta o oxigênio do sistema existente e nos assegura de que permaneceremos sob o palio da soberania popular. 

Essa reflexão abre duas vias: seria a democracia o problema ou seria a democracia a solução. 

A saída para a primeira, caminho da disrupção, é a ditadura. Seja ela de um déspota de direita ou de esquerda. Contra a democracia, apenas a ditadura serve. 

A segunda saída, à qual nos filiamos apaixonadamente, nos faz acreditar que o sistema que sustenta nossa segurança, avança, amadurece e evolui com os solavancos que sofre. 

Contra a ditadura, viva a democracia, pujante e fortalecida, mas não basta, a nosso ver. 

Não basta que o povo escolha seus representantes, até porque, essa escolha deve ser liberta e informada, a fim de que se faça refletir apenas os anseios de edificação social, contudo, pelas mais diversas razões, o voto, em alguns e combatidos casos, perde seu valor para ter um preço. 

Mas, a corrupção é um mal existente e, ciosos disso, nossos órgãos competentes são atentos e oficiosos quanto a este desarranjo. Isso é avanço, é garantia! 

A democracia irriga o valor das nossas relações, em especial baseando a legitimidade das regras postas. Em uma República, em que a coisa pública é dever de todos, é essencial que o Estado se ocupe em promover segurança jurídica e estabilidade das relações. 

Por meio de instituições fortalecidas, os três Poderes da República se mostram mais pujantes. O contrapeso entre as ações destes se dá como mecanismo do dia a dia. 

Os eventuais desacertos na construção do Brasil do amanhã não ferem a democracia, enquanto a respeitem como regra maior. 

A democracia avança. Para fomentar esta evolução é necessário que nossos dirigentes incluam no dia a dia, desde a educação básica, os valores do debate e da argumentação. Além disso, a fulanização da política cria personagens histriônicos, que, quando muito, se inspiram em carroças vazias. Não há ideias. 

A divergência é algo natural dentro de um grupo, mas, a heterogeneidade de pensamentos tem sido tratada de forma visceral, o que leva a extremos e à elevação do nível de tensão na sociedade, como um todo. 

A discussão não passa pelos tópicos do que se convencionou chamar da Escola Sem Partido, seus congêneres ou antagonistas. 

O que se sustenta é que o debate de ideias não existe em nossa sociedade, apequenando-se em personificações. De parte a parte, se discutem pessoas e o valor das ideias acaba sucumbindo diante desta primeira discussão. 

As ideias do candidato A ou candidato B pouco importam. 

Bandeiras acabam sendo levantadas por quem pouco as conhece, quando conhece algo sobre elas. A histeria toma conta e se solidifica no âmbito da sociedade, gerando sentimento do Nós contra eles. 

A coexistência é fruto da boa convivência e do valor de saber que cada um importa. Discutir ideias e propósitos durante o período eleitoral e ter dialética sobre os rumos políticos, durante o mandato, apontando soluções, enriquece a democracia. A divergência não deve ser vista como elemento de guerra ou como ofensa pessoal. Ter ideia diferente não deve ofender ao próximo. 

Deveríamos, nós, Brasileiros e Brasileiras, buscar a construção de um projeto básico de País, onde imperassem as ideias de segurança jurídica e a de que cada cidadão, em todo e qualquer de seus atos, pensasse se estaria ou não contribuindo para o seu País, o que podemos convencionar chamar do Bem para o Brasil. 

Risível este argumento enquanto permanecer a mentalidade de nossos primeiros colonizadores, qual seja a de exploração. 

A mentalidade de colônia de exploração faz com que, na análise das circunstâncias, o valor que a atitude terá em face do seu País reste negligenciado. 

Por enquanto, não vislumbramos que a oxigenação da ideia democrática seja possível enquanto o enriquecimento do debate de ideias não acontecer. Com isso, são furtadas as chances de a concórdia ser a base das relações. 

O estabelecimento da coexistência, seja por meio da disseminação do debate saudável, seja por meio da qualificação do debate ocorrido, com a pulverização de ideias e menos desinformação, é o caminho saudável. 

Para encaminhar o fim deste humilde arrazoado, pensamos que a discussão política deve ser marcada pelas ideias e os ideais. Por isso, confiantes na democracia em evolução, entendemos que a escolarização da disciplina debate e oratória deve ser priorizada, para que as futuras gerações construam ideias com mais consistência e menos violência. 

Para a geração atual, importante que haja combate à desinformação e proliferação da civilidade, demonstrando que, em período eleitoral ou no exercício do mandato, cada qual defende o que vê como o melhor para o Brasil, incluindo para quem tem ideias antagônicas. Vemos isso como o sentimento de pertencimento. 

Valendo-se dessa pujança, precisamos pensar no Brasil do amanhã e que política nos conduzirá. 

Sistemas eleitorais refletem o que seu povo pensa sobre como deve ser a sua representação. No caso do Brasil, elegemos representantes para os Poderes Executivo e Legislativo. 

Para os cargos de chefia de Poder Executivo, eleição majoritária. Para o Poder legislativo, exceto para o cargo de senador da República – eleição majoritária -, os eleitos o são por escolha proporcional. 

Quanto ao Poder Legislativo, cuja importância é negligenciada pelo eleitor, para onde muitos até se esquecem em quem votaram, sofre efeito direto da fulanização, por vezes empossando alguns desertos de ideias eleitos, sendo que a sua atribuição é estabelecer o parâmetro básico, a Lei.

Por isso, ponto que reputamos essencial na evolução democrática é que haja a identificação das bandeiras e ideais defendidos por cada partido político e que, com isso, começaremos nova fase na qual a discussão se dará em nível estratégico e não em bate boca para a sobreposição de egos, em detrimento à dialética. 

A importância de os partidos políticos assumirem as suas bandeiras - com vigor - ganharia alto relevo, decretaria o ostracismo e o fim daqueles que não se assumissem, e os partidos atrairiam para si os olhares daqueles todos que pensam igual. 

Com isso, fortalecidos os quadros da composição partidária, evidentemente, se faz fortalecida a defesa de suas bandeiras, no âmbito interno dos partidos e a identidade destes com seus eleitores. 

A eleição do modo como sugerido faria com que a figura da liderança partidária tivesse mais ferramentas a fim de fazer a função legislativa menos belicosa, e, com o reduzido número de partidos, mais viável sua discussão e concerto. Com esta harmonização, ganhamos todos, a nosso ver. 

A discussão empolga e faz imaginar uma máquina estatal mais ágil, com eleições mais baratas e atos governamentais mais harmônicos com ideais pretendidos e chancelados pela composição dos propósitos eleitos. 

Democracia pujante, democracia em evolução são bases que incentivam a discussão, mas, anteriormente, é a democracia permitindo que haja esta. A fim de responder, a preocupação com a democracia é apenas o incremento da discussão de sua evolução e nenhuma outra. 

Confiemos nas instituições e confiemos na democracia. 

*DOUGLAS BORGES FLORES

- Graduado em Direito(2008) pelo UNICEUB- Centro de Ensino Unificado de Brasília;
- Pós Graduado em Direito Público Material(2009) pela Universidade Gama Filho;
 Extensão em Licitações e Contratos com a Administração Pública pela Fundação Getúlio Vargas(2010);
-Membro Julgador do TED – OAB/DF; -Secretário-Geral da Comissão de Direito Sindical e Associativo da OAB/DF;e
- Membro das Comissões de Direito Eleitoral, Direito Previdenciário e de Assuntos Legislativos da OAB/DF.




Nota do Editor:

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Um comentário:

  1. Excelente reflexão.
    A democracia para evoluir e detonar amadurecem nosso país exige mudança de postura de seus cidadão quanto á deixar de debater posicões e começarmos a debater idéias, sem que tenhamos de ser extremistas.

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