quarta-feira, 9 de outubro de 2019

A Instituição Financeira Tem Alguma Responsabilidade na Venda On-Line de um Produto Não Entregue?


Autor: Ian Ganciar Varella(*)

Um cliente que compra de produtos em um site de vendas e efetua o pagamento através de um boleto bancário de uma instituição financeira, caso não receba os produtos pode responsabilizar a instituição financeira que emite o boleto?

No artigo de hoje vamos falar um pouco sobre a responsabilidade civil.

1. Argumentos favoráveis ao consumidor

Traremos argumentos que asseveram a possibilidade de configurar a responsabilidade civil da instituição bancária que não vende o produto e só emite o boleto bancário.

Para configuração da espécie de responsabilidade objetiva, em princípio, são exigidos três requisitos, quais sejam: que os danos abrangidos sejam pessoais, que tais danos tenham acontecido no exercício de uma atividade profissional e que, embora não se possa dizer que foram causados pelo responsável ou por sua atividade, guardem alguma conexão com tal atividade profissional.

Não paira dúvida que as instituições bancárias são fornecedoras de serviços e os clientes, consumidores. Deste modo, passam a retorquir pelo pagamento de transações realizadas sem a aprovação do cliente pela internet, bem como, as fraudes decorrentes da prestação dos seus serviços, mesmo em caso de culpa concorrente do correntista, nos termos do art. 14 do CDC.

O Tribunal Bandeirante vem entendendo que as instituições financeiras devem arcar com os prejuízos acarretados por fraudes na internet, invocando a possibilidade de inversão do ônus da prova, ou seja, obrigando à instituição financeira a provar que o correntista usuário do serviço bancário pela internet agiu de má fé, e classificando a responsabilidade dos bancos como "Responsabilidade de Natureza Objetiva", fundada no risco profissional, conforme jurisprudência abaixo:
"DT21742466 - DANO MORAL - Responsabilidade civil- Contrato Bancário - Movimentação bancária não autorizada, via lnternet - Dano moral caracterizado -Obrigação de indenizar - Código de Defesa do Cliente - Aplicabilidade - inversão do ônus probatório - indenização arbitrada em R$ 15.000,00 -Prova decorrente da experiência comum – Inteligência do artigo 335 do Código de Processo Civil – Valor equitativo e que guarda relação com o dano moral sofrido - Decadência afastada - Prazo previsto no artigo 27, do Código de Defesa do Cliente -Questão "sub judice" que não se enquadra nas hipóteses de "vício do produto ou serviço", mas no fato do produto ou do serviço" - Ação procedente -Recurso provido. "[1]

Assim, entende-se que a obrigação de ofertar segurança às operações realizadas através da internet não é do correntista, e sim da instituição financeira.

2. Argumentos favoráveis à instituição financeira

Será que o cliente que reclama ou protocola uma ação judicial para reaver o valor pago no boleto pode colocar a instituição financeira no polo passivo, se a responsabilidade de entregar o produto não é do banco.

Qual empresa falhou na prestação de serviço? O site de vendas ou a instituição financeira?

Vejamos alguns casos em que as instituições financeiras são responsáveis por: 
(I) assaltos no interior das agências bancárias (REsp 787.124⁄RS, Primeira Turma, DJ 22⁄05⁄2006);
(II) inscrição indevida em cadastro de proteção ao crédito (REsp 1149998⁄RS, Terceira Turma, DJe 15⁄08⁄2012); 
(III) desvio de recursos da conta-corrente;
(IV) extravio de talão de cheques (REsp 685.662⁄RJ, Terceira Turma, DJ 05⁄12⁄2005);
(V) abertura não solicitada de conta-corrente;
(VI) clonagem ou falsificação de cartões magnéticos;
(VII) devolução de cheques por motivos indevidos; entre outros, com fundamento no art. 14 do CDC – o que não é o caso.

Em situações como a emissão de boleto e não entrega de produtos, em que se constata fato exclusivo de terceiro e da vítima, o dano eventualmente sofrido não é gerador de responsabilidade, uma vez que inexiste o nexo causal.

Saliente-se que se o boleto foi pago e consta como pago pelo site de vendas, o motivo dos produtos não terem sido entregues não é a falta de pagamento e sim, o desleixo da empresa vendedora de produtos.

A cadeia de fornecimento é um fenômeno econômico de organização do modo de produção e distribuição, do modo de fornecimento de serviços complexos, envolvendo grande número de atores que unem esforços e atividades para um desígnio comum, qual seja a faculdade de oferecer no mercado produtos e serviços para os clientes. 

Não pertencendo à cadeia de fornecimento não há como responsabilizar o banco pelos produtos não recebidos. Ademais, também não se pode considerar esse suposto estelionato como uma falha no dever de segurança dos serviços bancários.

Extrapolando esse raciocínio, todos os bancos operando no território nacional, incluindo operadoras de cartão de crédito, seriam solidariamente responsáveis pelos vícios, falhas e incidentes na entrega de produtos e falha na prestação de serviços que forem adquiridos, utilizando-se um meio de pagamento disponibilizados por essas empresas, o que definitivamente não encontra guarida na legislação de defesa do consumidor.[2]

3. Melhor caminho a ser trilhado

O cliente que adquire um produto e não recebe, o melhor é reclamar em sites próprios, PROCON ou pleitear os direitos que entende como devido perante a empresa que vende os produtos e não contra a instituição financeira. 

Lembrando que há site de vendas que garantem o dinheiro de volta e somente nesse caso, entendo como devido a inclusão da instituição financeira ou do site que permita a venda por terceiros.

Portanto, como o entendimento recente do STJ, é de que a empresa emissora de boleto não pode ser responsabilizada pela falha na prestação de serviço de terceiro. 

Desse modo, o consumidor deve reclamar os direitos perante o fornecedor que vendeu os produtos e não entregou. 

REFERÊNCIAS

[1] TJSP - Apelação Cíve|7.070.755-8 -19' C. Dir. Priv. - Rel. Desemb. Seöasflão Alves Junqueira - J. 24.04.2007; e

[2] RECURSO ESPECIAL Nº 1.786.157 - SP (2018⁄0260420-8.)

*IAN GANCIAR VARELLA

-Advogado;
-Bacharel em Direito pela UNIFEO(2015);
-Especialista em Direito Previdenciário- pela Faculadade Legale(2016);
-Especializando em Prática Previdenciária, pela Faculdade Legale(2017) ;
-Membro Efetivo da Comissão de Direito Previdenciário da OAB/SP;
-Autor de diversos artigos publicados em Jornal Jurid, Jus, Folha Nobre, Jusbrasil e
-Palestrante;
contato @ianvarella.adv.br
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Nota do Editor:

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