segunda-feira, 4 de março de 2024

É boa a notícia que os salários estão em alta?


 

Autor: Haroldo da Silva (*)


O Boletim Salariômetro da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE-USP), do mês de janeiro de 2024, indicou uma elevação dos salários, em termos reais, da ordem de 2%. Isto é, os ganhos do trabalho passaram a refletir maior poder de compra, superando as médias dos preços, calculados pelo IBGE em seu indicador INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), que mensura a inflação para famílias que ganham até cinco salários mínimos; a maior parcela dos brasileiros.

A notícia, por si só é muito boa. Revela que estamos assistindo uma recuperação do poder aquisitivo das famílias mais pobres. É algo muito importante, pois salários muito baixos acabam dificultando a contratação de trabalhadores, pois os ganhos com os programas sociais – extremamente necessários para uma parcela dos brasileiros – acabam se aproximando muito dos ganhos relativos à ocupação formal.

Também é salutar, em termos sociais, o aumento dos salários mais baixos, acima da inflação (claro que por um determinado tempo). Isto tem como consequência imediata uma redução das desigualdades sociais, além de estimular a economia, pois essa parcela da população tem uma alta propensão marginal a consumir (gastam uma boa parcela daquilo que ganham a mais), pois suas carências de bens e de serviços são enormes. Falta-lhes quase tudo, em termos materiais. Em contrapartida, sua taxa de poupança é muito baixa. Mas, não vamos tratar dessa teoria econômica aqui. Sejamos pragmáticos.

Além dos pontos indicados até aqui, há que se lembrar que esses aumentos reais de salários para a camada menos abastada dos brasileiros têm como efeito imediato a ampliação da demanda por bens e serviços, mas como consequência passa a exercer pressão de preços desses itens, especialmente se a oferta deles não crescer proporcionalmente, em tempo semelhante. Dito de outro modo: só é sustentável a longo prazo o aumento real de salário se – e somente se – tivermos elevação da produtividade. Caso contrário, isso retroalimentará a inflação, num ciclo vicioso que já conhecemos.

O Brasil ainda tem uma taxa de desemprego elevada. Os efeitos da pandemia de Covid-19 resultaram em uma desocupação que chegou a ser o dobro do que é hoje. Segundo o IBGE, em janeiro, tivemos 7,4% da População Economicamente Ativa (PEA) em busca de ocupação. É importante dizer: as taxas de desemprego estão caindo, mas ainda existem muitos brasileiros no desalento, situação na qual – por várias motivações – não se busca a reocupação.

Melhorar salários também pode incitar parcela desses desalentados a voltar ao mercado de trabalho, até mesmo deixando o assistencialismo de lado. Reitero: os programas assistenciais são necessários e fundamentais, contudo, a racionalidade dos agentes econômicos revela que se a distância entre eles e os salários melhorarem, frente à subsistência, pura e simples, a subocupação e a informalidade serão menos atrativas.

Lembro-me, aqui, das aulas de economia que leciono, desde 2000: nas Ciências Econômicas, não há notícia que seja apenas boa ou má, depende muito. Por isso, a riqueza deste ramo do conhecimento das Ciências Sociais. Muito embora os aumentos salariais sejam excelentes, pois distribuem melhor a renda brasileira, extremamente concentrada, ajudam na venda de bens e de serviços, além de outros benefícios objetivos, isso pode resultar em maior taxa de inflação. Dá-se com uma mão e retira-se com a outra, logo mais. Mas, qual a saída? O aumento da produtividade!

O Brasil tem um encontro iminente com a melhoria de produtividade. Algo que é urgente e que já estamos atrasados, faz décadas. A produtividade, embora existam diferentes formas de apurar, em termos simples: significa fazer mais e melhor com menos recursos, proporcionalmente. Modernizar o parque fabril brasileiro é um dos caminhos. Segundo pesquisa da CNI, 38% das máquinas e equipamentos brasileiros estão próximos ao limite de uso indicado pelos fabricantes. Nem vou falar da melhoria da educação, algo já muito debatido e quase senso comum.

Ademais, eles (máquinas e equipamentos) têm 14 anos de uso em média, no Brasil. Baratear a modernização do parque fabril é um dos caminhos. A notícia adversa é que o governo brasileiro, embora saiba disto, e tenha feito propostas neste sentido [depreciação superacelerada], ao mesmo tempo, na prática dificulta a aquisição de tecnologia de ponta, vinda do exterior, mesmo que não haja similar nacional.

Não é novidade no Brasil, termos o diagnóstico certo, com o encaminhamento errado ou, quando muito, tímido. Esse é mais um exemplo. Enquanto isto, o desemprego alto, os salários baixos e o risco frequente da inflação abocanhar nosso poder de compra permanecem. A saída que assistimos é a de sempre: juros na lua! Há quem goste e defenda, mas isso é outra estória.

*HAROLDO DA SILVA













Doutor em Ciências Sociais / Política (PUC-SP) -1999
Mestre em Desenvolvimento Econômico (UFPR) -2002
Conselheiro do Corecon-SP (2023-2024)

Um comentário:

  1. Desburocratizar, privatizar, deixar questões ideológicas, reforma administrativa, uma tributária agora pra diminuir os impostos (a atual simplificou apenas, mas já ajuda no custo Brasil). O rasil avançaria, não?

    ResponderExcluir