quinta-feira, 13 de junho de 2024

Pets, nossos filhos de 4 patas


Autora: Angela Llase Gonçalves(*)
 


O conceito de família tem se modificado através dos tempos e novas entidades familiares tem conquistado direitos e deveres na sociedade, assim temos famílias monoparental, homoafetiva e multiespécies.

Embora ainda seja um conceito novo, é inegável que atualmente as famílias multiespécies vem crescendo, muitos casais acabam programando a chegada dos filhos para o futuro, seja por condições financeiras, estudo ou estabilidade profissional.

Ou ainda os casais mais velhos que após a saída dos filhos já criados de casa sentem a necessidade de dar e receber afeto, e os pets preenchem esse vazio, pois serão eternas crianças com suas brincadeiras e manhas, dependentes de seus tutores.

Os animais de estimação deixaram de ocupar os quintais e passaram a conviver dentro das casas e apartamentos, cães que antes eram utilizados para fazer a segurança da casa e gatos que serviam como controle de roedores hoje vivem como verdadeiros membros da família, ocupando sofás e camas em nossos lares.

Desta forma cada dia mais os pets vem ocupando o status de filho dentro da estrutura familiar, conquistam o afeto, o carinho e o coração de seus humanos, em razão dessa convivência temos clínicas especializadas, hoteizinhos, banho e tosa e até pets celebridades na internet.

Segundo a ABINPET (Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação) até 2022 no Brasil já se totalizavam 167,6 milhões de pets entre cães, gatos, aves, peixes e outros, deste total 67,8 milhões de cães e 33,6 milhões de gatos.

O Brasil atualmente ocupa o terceiro lugar com mais pets no mundo, com esta população de pets cada vez maior e em virtude do afeto criado com seus tutores torna-se imprescindível novas normas que regulamentem essa convivência.

O artigo 82 do Código Civil é utilizado para designar a natureza jurídica dos pets, porém como se observa não menciona os animais:
"são móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social"
Sendo classificados como bens semoventes, ou seja, a eles é destinado o mesmo tratamento de "coisa"ou "objeto".

A proposta de reforma do Código Civil atualmente em discussão, traz uma nova proposta para a qualificação jurídica dos animais com a inclusão do art. 82-A, o qual propõe o seguinte texto:

"Dos Bens Móveis e Animais...

Art.82-A Os animais, que são objeto de direito, são considerados seres vivos dotados de sensibilidade e passíveis de proteção jurídica, em virtude da sua natureza especial.

§ 1º A proteção jurídica prevista no caput será regulada por lei especial, a qual disporá sobre o tratamento ético adequado aos animais;

§ 2º Até que sobrevenha lei especial, são aplicáveis subsidiariamente aos animais as disposições relativas aos bens, desde que não sejam incompatíveis com sua natureza e sejam aplicadas considerando a sua sensibilidade;

§3º Da relação afetiva entre humanos e animais pode derivar legitimidade para a tutela correspondente de interesses, bem como pretensão indenizatória por perdas e danos sofridos."
Importante salientar que os animais de estimação se diferenciam por sua natureza, não há como designar o mesmo tratamento que se daria por exemplo a divisão de uma manada de gado de corte e um cão ou gato criado no seio familiar em um divórcio.

Enquanto o primeiro facilmente se atribuiria um valor por arroba e a divisão seria meramente financeira, no segundo caso estaríamos tratando de afeto convivência.

Como estabelecer a guarda e os cuidados desse ser a um dos ex-cônjuges? Caberia o direito de visita? É possível visitar uma coisa, um bem móvel?

Essas são indagações que precisam ser sanadas, pois a realidade atual com relação aos animais de companhia é completamente diferente da estabelecida a época da criação do Código Civil de 2002.

O Ministro Luis Felipe Salomão já se pronunciou no sentido de que o atual regramento jurídico não se mostra suficiente para tratar dessas disputas familiares nos tempos atuais. Segundo o Ministro os animais de companhia são seres que, inevitavelmente, possuem natureza especial não se podendo tratar a questão como uma simples discussão de posse de propriedade. Ainda esclarece que não se trata de igualar os pets a filhos humanos, mas sim deixar de atribuir o conceito de meros objetos, pois são seres sensíveis.

As decisões no caso de um divórcio litigioso onde as partes não consigam chegar a um consenso sobre a guarda do pet, tem-se considerado o bem-estar dos animais e o interesse dos tutores, desta forma em um litígio o juiz poderá avaliar quem passava maior tempo com o pet, quem levava a consultas veterinárias, quem de fato teria o maior vínculo afetivo com o animal ou ainda quem possui maiores condições financeiras de manter os cuidados diários.

Além disso em alguns casos é possível pleitear uma ajuda com as despesas financeiras do pet, porém todas estas questões carecem de um regramento jurídico próprio dependendo de interpretação do magistrado.

Em alguns Estados do Brasil já é possível registrar o pet no cartório, o documento é uma "espécie de certidão de nascimento" e traz informações básicas do animal, como data de nascimento, espécie, cor da pelagem e dados do microchip caso o animal o possua.

A adesão dos cartórios a emissão desse documento não é obrigatória e, portanto, nem todos poderão se beneficiar de mais essa evolução dos direitos de nossos "peludos", este e outros documentos do pet são importantes para garantir ao tutor o vínculo com seu animal.

Enquanto não temos um regramento próprio para reger essa nova realidade, aos tutores resta utilizar-se de todos os meios probatórios em caso de uma disputa pela guarda do pet.

Referências:







*ANGELA LLASE GONÇALVES






















- Graduada em Direito pela Universidade Paulista – UNIP (2017);

- Pós-graduada em Direito de Família e Sucessões pela Faculdade Legale – (2022);

- Áreas de Atuação: Direito de Família e Sucessões, Direito Imobiliário e Direito Cível.

Nota do Editor:

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