sexta-feira, 13 de maio de 2016

Modestas impressões políticas



Honrada por estar estreando aqui no Blog do Werneck. Grata pelo convite! Tentarei corresponder à confiança e expectativa. Querendo colaborar.


Cresci brincando com cédulas eleitorais de meu avô que era político e por decorrência num ambiente político provincial de cidade pequena. Também cresci trabalhando, ajudando-o na confecção de comprimidos de pó de piramido, que para mim, era o "Remédio do Pinócchio" - meu avô era farmacêutico prático; devo ter sido iniciada nesta arte "pharmacéthica"pelos 4 ou 5 anos de idade, pois quando ele morreu eu tinha apenas 6.. Minha tarefa era a mais fácil, a contagem e embalagem dos comprimidinhos anti-febris em seus vidrinhos. Tudo muito asséptico. Eu trabalhava com alegria e orgulho. Meu avô foi prefeito e deputado. Hoje seria preso por exploração de trabalho infantil... E eu não teria aprendido como se fazem os taizinhos. Minha Mãe era Professora de primeiro ano, ensinou a ler e escrever muitas gerações de campo-larguenses. Depois de aposentada foi a primeira mulher candidata a vereadora na minha cidade. Ficou primeira-suplente. Era determinada e decidida e dedicada.

Meus dois tios, um dentista e um médico, na cidade, um de cada vez, revezavam-se no dever de bem representar o povo, eleitos.
Naquele tempo em que os vereadores representavam o povo pela Honra de representar o Povo e mais nada. Davam sua contribuição sem receber nenhuma gratificação. Por isso os políticos tinham mais qualidade; apresentavam-se por vocação e espirito de colaboração. Não havendo remuneração, era cargo desinteressante para a maioria e então conheci uma época em que os políticos eram as pessoas melhores e não as piores, como é hoje na maioria, em que a disputa é nivelada cada vez mais por baixo, pelos interesses mais mesquinhos.

Em 79 formei-me médica e em 80 iniciei minha carreira no serviço de Saúde Pública Estadual, onde me aposentei por tempo de serviço como médica de pronto-socorro-psiquiátrico. Foi lá que comecei a entender a política além das cédulas; foi lá que aprendi que na grande maioria dos casos a saúde do povo não depende dos médicos, mas sim dos políticos. Foi lá que me indignei vendo gente sendo transportada como bicho amontoada em ambulâncias fechadas, e a cada uma que chegava,da janela pensava: "Por que será que esses prefeitos não mandam os doentes e acompanhantes em kombis abertas, com janelas? Era gente humilde que vinha do interior para a capital sem nem enxergar nada da paisagem ou da cidade, naqueles vidros pintados de branco. A grande maioria não precisava de ambulância, só de condução. Isso faz quase 40 anos, melhorou, mas muito pouco, eu mesma em certa época que trabalhei pelo Programa de Saúde da Família, viajávamos cedinho horas e horas em kombis, em que as ports se abriam nas curvas, uns seguravam os outros para não cair, todos empurravam a Kombi quando encalhava nos lodaçais. Lembro-me do primeiro día de um jovem colega que muito faceiro apresentou-se animado e impecavelmente trajado e chegou ao Posto de Saúde com barro até a cintura...

Assim mesmo íamos alegres, parando na estrada almoçar sapecada de pinhão... Boas lembranças da juventude... Perguntava-me, porém, porque não tínhamos um transporte mais digno e mais seguro? Médicos prá lá e pacientes prá cá, todos transportados como carga sem importância... Por que sempre preferem gastar nos supérfluos?

Sempre que eu pensava que não tinha mais o que piorar, só podia melhorar, as coisas pioravam. E pioravam. E pioraram até este caos de saúde pública em que vivemos hoje. Fui a geração que testemunhou o desmonte da Saúde Pública. O povo mais necessitado contava com o Estado. Os que trabalhavam de carteira assinada eram beneficiados pelo plano de saúde chamado INPS. A carteirinha do INPS conferia um status melhor q o dos planos de saúde pagos hoje em dia. E quem podia ia nos consultórios particulares.Pagando ou não.
Hoje nem mais consultóriosparticulares existem.

Tudo isso acabou. O último concurso público federal para médicos foi em 78, um ano antes da minha formatura. Pelo INPS. Acho q todos já se aposentara faz tempo...E como é que é culpa dos médicos que não há médicos no interior? Depois que passaram as verbas de saúde para os municípios se auto administrarem, a farra começou, o que havia desmoronou, e o caos se instalou. Já vi ambulância transportando doente, em que a porta traseira se abriu e a maca escorregou e o doente morreu atropelado. Aqui na minha estrada.

Remédios básicos dos mais baratos faltavam. A gente sofria com os doentes a situação da falta de remédios. E teve um dia em que flagrei funcionários da farmácia despachando caixas de papelão fechadas para serem descartadas e eram de remédios vencidos, que nem sabiam que estavam lá. Faltaram e foram para o lixo vencidos por negligência. (cerca de 10.000 comprimidos)

Quando começaram a vir alguns medicamentos mais modernos, alguns tinham o monopólio, os queridinhos do diretor imprestável; então brigamos para que todos tivéssemos uma cota igual e escolhêssemos alguns pacientes para serem beneficiados - remédios mais modernos, com menos efeitos colaterais. Eu gastava a minha cota com os mais jovens.

Mais tarde ainda, começaram a vir medicamentos de última linha, em quantidade muito restrita, porém, que eram do monopólio do ambulatório de um único colega apadrinhado e os gastava com seus clientes do seu consultório particular, que lá iam busca-los, por serem muito caros.

Nesta época de repente me tornei política sem querer, Reorganizei a esquecida e exigida Comissão de Ética, travei uma briga com o diretor e metade dos colegas e de acordo com o Código de Ética Médica que pela Constituição Federal rege os atos médicos no país, convoquei eleições para a Presidência da Comissão e a Comissão de Ética em si, e mais tarde, com a ajuda da outra metade de colegas a eleição para a Direção Clínica do Hospital, de acordo com o figurino, com a presença do Conselho Regional de Medicina, da Associação Médica e do Sindicato dos Médicos, e bati chapa com o diretor. Ganhei por um voto. Ele me cumprimentou: "Parabéns, Sônia, a vitória é toda sua!" - e continuou lá como se nada tivesse acontecido. Entrei com processo na Secretaria de saúde Pública e no Conselho Regional de Medicina, não obtive nenhum apoio. No embalo da indignação me candidatei a deputada estadual, já em 2002, tive perto de 5.000 votos, mudou o governador e tudo continuou igual... Menos o diretor q mudou prá pior.

Eu já estava lá há 22 anos e entreguei os pontos. Pedi transferência.
Já me aposentei há alguns anos e até hoje não tive resposta nem da Secretaria e nem do CRM.

Que tipo de sangue corre nessas veias desses colegas-autoridades?

Cansei. O peso do piano, aos mais novos. Eu agora no máximo viro as páginas das partituras...

Até!

Por SONYA BRASILEIRA











- -Paranaense de Campo Largo, Região Metropolitana de Curitiba;
- Médica psiquiatra e terapeuta de orientação psicanalítica.
- Desde criança, queria ser escritora. Creio q sou a realização do
sonho da minha Mãe, de ser Médica. A Médica tornou-se, no entanto, a
melhor parte de mim, e quem sabe se torne a melhor parte da escritora,
que antes não vingou por falta de tempo - prefiro pensar que por falta
de talento.
- Publiquei quatro livros de poesias, tendo sido o terceiro "Maria
Desatino Rumo Destino" premiado com o primeiro lugar no Congresso de
Médicos-Escritores realizado em Maceió.
-De lá para cá apenas escritos esparsos e inéditos vez que a vida
profissional me absorveu literalmente.
- Já parei de exercer a clínica e.
- Agora tenho ensaiado alguns ensaios, mais esboços. ainda, porque
tenho me dedicado nos últimos 16 anos à política de base.

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