quarta-feira, 9 de maio de 2018

Retenção Salarial para Pagamento de Empréstimo e a Súmula 603 do STJ




A cultura dos precedentes é uma prática que acompanha a justiça nos sistemas de Common law, sistema este de concepção inglesa que pauta suas decisões na jurisprudência e nos costumes, utilizando-se de decisões anteriores como parâmetro para aplicação em casos futuros semelhantes aos já decididos. 

No Brasil vivemos em um sistema diferente, conhecido como romano-germânico ou Civil law, onde as decisões são tomadas com base em normas legais pré-fixadas, ou seja, levamos mais em consideração as leis do que os precedentes, entretanto, apesar de sermos um sistema legalista, também bebemos da fonte do sistema de precedentes nos conflitos entre normas pelas decisões reiteradas dos nossos Tribunais, formando-se jurisprudência e consolidando esta jurisprudência em súmulas editadas pelos Tribunais. 

O direito do consumidor também neste primeiro semestre de 2018 foi contemplado com a edição da súmula nº 603 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), com um tema muito interessante para os consumidores no que diz respeito à retenção do salário para pagamento de empréstimo bancário, situação muito corriqueira em nosso país, com a seguinte redação:

"Súmula 603 - É vedado ao banco mutuante reter, em qualquer extensão, os salários, vencimentos e/ou proventos de correntista para adimplir o mútuo (comum) contraído, ainda que haja cláusula contratual autorizativa, excluído o empréstimo garantido por margem salarial consignável, com desconto em folha de pagamento, que possui regramento legal específico e admite a retenção de percentual. (Súmula 603, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/02/2018, DJe 26/02/2018)"

A edição da súmula trouxe à tona um velho tema que já está na boca do consumidor e das instituições financeiras sobre a limitação salarial na cobrança de empréstimos bancários onde o consumidor se vê ilhado de tanta dívida contraída ao longo do tempo que prejudica, inclusive, suas verbas de natureza salarial e a instituição financeira por outro lado busca o adimplemento do seu crédito na forma que foi convencionado em contrato. 

Neste contexto, a súmula nº 603 resolve a divergência, pois se consolidou o entendimento que é proibido reter, em qualquer extensão, frisa-se, em qualquer extensão, os salários, vencimentos e/ou proventos de correntista para adimplir o mútuo (comum) contraído, ainda que haja cláusula contratual autorizativa, excluído o empréstimo consignado em folha de pagamento, que possui legislação específica que admite a retenção de percentual, afastando a posição de crédito superprivilegiado do banco. 

Nota-se, por meio deste entendimento, que o banco não poderá reter nenhum valor de natureza salarial para pagar o empréstimo comum realizado pelo consumidor, mesmo que haja cláusula contratual autorizando a retenção de valores, pois estaria o banco realizando a penhora do salário do consumidor, em conflito direto com o artigo 7º, inciso X da Constituição Federal e o artigo 833, IV do Código de Processo Civil.

Vejam que a margem de 30% dos vencimentos prevista na Lei nº 8.112/90 e pela Lei nº 10.820/2003, só é permitida para o empréstimo consignado, aquele que é realizado diretamente na folha de pagamento, ou seja, empréstimo que consta no holerite do consumidor em que a fonte pagadora (empresa ou órgão público) destina parte do salário para a instituição financeira (empréstimo com melhores taxas de juros e maiores prazos para pagamento, dada a sua liquidez pela margem consignável), outros empréstimos que não obedecem este regramento são comuns e não podem sofrer retenção do salário para pagamento, conforme entendimento sumular. 

Concluindo, a súmula nº 603 do STJ protegeu ainda mais o consumidor em termos de empréstimo bancário e limitou o banco na formação de um crédito superprivilegiado, tendo a instituição financeira que recorrer às vias ordinárias (ação de cobrança, monitória ou execução de título) para o caso de inadimplemento do consumidor, porém, mesmo com essa proteção não é aconselhável ao consumidor gastar mais do que ganha ou pegar dinheiro emprestado sem condições de arcar, pois mesmo diante de tal proteção, a dívida irá acompanhá-lo por longos anos no caso de não pagamento.


POR FELIPE OLIVEIRA DE JESUS






















- Advogado inscrito na OAB/SP sob nº 330.434;
-Atua principalmente nas áreas do Direito do Consumidor, Cível e Trabalhista e
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3 comentários:

  1. Caríssimo, sinto lhe informar que os bancos estão nem ai para esta súmula. Eles cobram essa margem de 30% e depois seduzem o correntista a se endividar oferecendo créditos extras...

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  2. Devemos ter "educação financeira", uma vêz que só devemos tomar emprestado aquilo que temos condições de pagar. Uma das causas dos altos juros cobrados, é a tutela da justiça...

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  3. A 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça cancelou, por unanimidade, no dia 22/08/2018, a Súmula 603 da corte.

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